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Siglas, Abreviaturas e Acrónimos

3. A Neonatologia e os cuidados paliativos

3.5. Cuidados paliativos pediátricos – principais conceitos

Os cuidados paliativos pediátricos apresentam características específicas. Apesar da sua menor prevalência em relação à população adulta, tratam de situações com grande impacto nas crianças, famílias e profissionais (Solomon, et al, 2011) o que justifica o desenvolvimento de equipas com competências diferenciadas (Feudtner, et al, 2011).

A Pediatria sempre reconheceu a necessidade de ver o doente num contexto que transcende a doença indo além das questões físicas, integrando pais, escola, sociedade e trabalhando em parceria com outras profissões (Reis, 2011). Assim, apesar do desenvolvimento de cuidados paliativos pediátricos ser posterior aos cuidados para adultos, incorpora na sua génese uma vantagem adicional, que deve ser mobilizada neste paradigma.

A OMS (2009) reconhece os cuidados paliativos pediátricos como uma área prioritária de intervenção programada e planificada. Implicam cuidados ativos e rigorosos, sustentados por conhecimentos técnico-científicos e um forte imperativo ético-deontológico. Trata-se de um cuidado integral do corpo, mente e espírito do utente pediátrico. Devem ser iniciados o mais precocemente possível, ou seja, desde o momento do diagnóstico de uma doença que ameaça (life-threatening) ou limita a vida (life-limiting). Podem manter-se independentemente da criança continuar a receber tratamentos curativos ou que prolonguem a vida. Estendem-se ao luto dos pais. Envolvem a prestação de cuidados multiprofissionais, hospitalares e comunitários. Visam o acompanhamento holístico da criança e família na diminuição do seu sofrimento, valorizado e respeitado em todas as vertentes: física, emocional, psicológica, cultural, espiritual e social. Podem ser implementados mesmo em locais com fracos recursos.

Cuidados paliativos neonatais em Portugal – Doutoramento em Bioética

Joana Mendes- Maio 2013 – Universidade Católica Portuguesa 26 Segundo o grupo de trabalho da Pediatria da EAPC é considera doença potencialmente fatal (life-threatening), toda a situação com grande probabilidade de provocar uma morte prematura. Entende-se por morte prematura aquela que pode ocorrer antes da idade adulta (Steering Committee of the European Association For Palliative Care task force on Palliative Care for Children and Adolescents, 2007).

Assim, apesar de uma doença potencialmente fatal, poder comprometer ou limitar o tempo de vida do seu portador, não deve ser confundida com o termo doença terminal (Steering Committee of the European Association For Palliative Care task force on Palliative Care for Children and Adolescents, 2007), momento a partir do qual a morte se torna eminente (Goodger, 2009).

Os CPP não aceleram ou atrasam o momento da morte, nem tão pouco se restringem à fase terminal. Limitá-los ao fim de vida, é interferir negativamente na qualidade, humanização e excelência dos cuidados que colocamos à disposição de crianças e famílias. Este aspeto traz importantes implicações no seu planeamento, que devem ser discutidas e avaliadas. Em algumas situações iniciar um plano de CP precoce, pode significar atuação no período pré natal, com todas as consequências daí recorrentes (Balaguer, et al, 2012).

O planeamento de CPN e em fim de vida é importante, possível e desejável. Veja-se, por exemplo no Reino Unido onde um quarto dos 80 000 RN admitidos nas UCIN, apresenta condições que ameaçam a vida (Goodger, 2009).

Os CPP apresentam particularidades em relação à trajetória da doença e a diversos fatores de desenvolvimento, farmacocinéticos e do metabolismo, familiares e sociais (European

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Joana Mendes- Maio 2013 – Universidade Católica Portuguesa 27 Association For Palliative Care, 2009; Oxford, 2009; Friebert, 2009; Justo da Silva, Mendes, Santos, 2013). O grupo de trabalho da Pediatria da EAPC anunciou algumas recomendações para a Europa. Considerou que os CPP são cuidados que visam a otimização da qualidade de vida das crianças e famílias. Todas as crianças devem ter a oportunidade de serem referenciadas a programas de CPP, desde o diagnóstico de uma doença considerada ameaçadora ou que limita a vida. Por último, os CP devem iniciar-se e manter-se independentemente do curso da doença e da manutenção de intervenções curativas ou que visem prolongar a vida (Steering Committee of the European Association For Palliative Care task force on Palliative Care for Children and Adolescents, 2007; Friebert, 2009).

O mesmo grupo de trabalho definiu os critérios de elegibilidade para CPP, posteriormente adaptada para a população neonatal pela ACT (European Association For Palliative Care, 2009; Goodger, 2009) constituído por 4 grupos:

1- No primeiro grupo encontram-se situações que ameaçam a vida, nas quais o tratamento curativo pode ser possível, mas ainda assim, pode falhar (European Association For Palliative Care, 2009). Nestes casos, o acesso a CPN pode ser necessário quando a intervenção curativa não tem sucesso ou durante um período de agudização da doença. À medida que a patologia progride dá-se uma transição gradual do paradigma. Em contraste, em caso de remissão total da doença, é dada alta à família (Goodger, 2009).

2- O segundo grupo refere-se a situações, com risco de morte prematura. Exigem longos períodos de tratamento intensivo. É o caso do HIV/Sida ou a prematuridade

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Joana Mendes- Maio 2013 – Universidade Católica Portuguesa 28 (European Association For Palliative Care, 2009). Nestas situações, os dois paradigmas, curativos e paliativos, devem coexistir no tratamento do doente e assumem uma alternância, de acordo com estádio da doença (agudização vs remissão). Assim, pode recorrer-se a tratamentos invasivos e com grande diferenciação tecnológica com o duplo objetivo de prolongar a vida e otimizar a qualidade de vida (Goodger, 2009).

3- O terceiro grupo é respeitante a situações progressivas, sem opção curativa. O tratamento é exclusivamente paliativo desde o início e pode estender-se durante vários anos, como por exemplo as doenças neuromusculares degenerativas (European Association For Palliative Care, 2009; Goodger, 2009).

4- Finalmente, no quarto grupo encontram-se as situações irreversíveis não progressivas, que podem conduzir a uma morte prematura. Muitas vezes, são acompanhadas de incapacidade grave e maior suscetibilidade para complicações de saúde. É exemplo deste grupo, as crianças com paralisia cerebral.

Apesar da situação dos cuidados paliativos pediátricos e neonatais em muitos países europeus ser substancialmente diferente, partilham contudo as mesmas dificuldades e desafios que Portugal. O pequeno número de doentes, as dificuldades de introdução do conceito na cultura médica, a heterogeneidade nos critérios de eleição, a escassez de recursos comunitários, as dificuldades no financiamento de programas, a escassez de dados epidemiológicos, de informação e de programas formativos pré e pós graduados constituem obstáculos ao desenvolvimento (Santos, Lopes, Mendes, 2012).

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