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2 RESPONSABILIDADE CIVIL

2.2 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

2.2.4 Culpa lato sensu

O último pressuposto a ser estudado é a culpa lato sensu (culpa strictu sensu e dolo), e, conforme visto anteriormente, é exigido somente para a configuração da responsabilidade subjetiva, razão pela qual é chamado por alguns autores de elemento acidental.

A culpa em sentido amplo abrange “toda espécie de comportamento contrário ao Direito, seja intencional, como no caso de dolo, ou tencional, como na culpa”. (CAVALIERI FILHO, 2015, p. 48):

As semelhanças e, principalmente, as distinções entre o dolo e a culpa em sentido estrito podem ser extraídas da doutrina do mesmo autor (2015, p. 49):

Tanto no dolo como na culpa há́ conduta voluntária do agente, só́ que no primeiro caso a conduta já́ nasce ilícita, porquanto a vontade se dirige à concretização de um resultado antijurídico – o dolo abrange a conduta e o efeito lesivo dele resultante –, enquanto no segundo a conduta nasce lícita, tornando-se ilícita na medida em que se desvia dos padrões socialmente adequados. O juízo de desvalor no dolo incide sobre a conduta, ilícita desde a sua origem; na culpa, incide apenas sobre o resultado. Em suma, no dolo o agente quer a ação e o resultado, ao passo que na culpa ele só́ quer a ação, vindo a atingir o resultado por desvio acidental de conduta decorrente de falta de cuidado.

Também nesse sentido é a concepção de Gagliano; Pamplona Filho (2018, p. 188- 189):

[...] a culpa (em sentido amplo) deriva da inobservância de um dever de conduta, previamente imposto pela ordem jurídica, em atenção à paz social. Se esta violação é proposital, atuou o agente com dolo; se decorreu de negligência, imprudência ou imperícia, a sua atuação é apenas culposa, em sentido estrito.

O dolo, portanto, conforme explica Miragem (2015, p. 262), refere-se a uma atitude proposital do agente, que, agindo comissiva ou omissivamente, deseja a verificação do dano.

Por seu turno, a culpa em sentido estrito exterioriza-se pela imprudência, negligência ou imperícia do agente.

De acordo com Venosa (2018, p. 476), na imprudência o agente não receia o perigo, agindo precipitadamente, sem prever as consequências que a sua conduta pode provocar. Na negligência, o agente realiza de forma ineficiente ou deixa de realizar uma conduta essencial por falta de cuidado ou da atenção devida. Por fim, age com imperícia aquele que não possui as habilidades necessárias para executar ofício, profissão ou atividade. A título de ilustração:

É imprudente, por exemplo, o motorista que atravessa cruzamento preferencial sem efetuar parada prévia em seu veículo ou ali imprime velocidade excessiva. É negligente o motorista que não mantém os freios do veículo em perfeito funcionamento. É imperito aquele que se arvora em dirigir veículo ou operar uma máquina sem os conhecimentos e a habilitação técnica para fazê-lo (VENOSA, 2018, p. 477, grifou-se).

Em complemento, a culpa stricto sensu comporta outras modalidades mais específicas, derivadas das investigadas anteriormente, entre elas a culpa in vigilando, a culpa in

eligiendo e a culpa in custodiendo, compreendidas nos seguintes termos pela doutrina:

Na culpa in vigilando haveria uma quebra do dever legal de vigilância como era o caso, por exemplo, da responsabilidade do pai pelo filho, do tutor pelo tutelado, do curador pelo curatelado, do dono de hotel pelo hóspede e, ainda, do educador pelo educando. Já a culpa in eligendo era a culpa decorrente da escolha ou eleição feita pela pessoa a ser responsabilizada, como no caso da responsabilidade do patrão por ato de seu empregado. Por fim, na culpa in custodiendo, a presunção da culpa decorreria da falta de cuidado em se guardar uma coisa ou animal (TARTUCE, 2018, p. 370, grifou-se).

Estas, contudo, na opinião de Cavalieri Filho (2015, p. 58) e do autor supracitado, que utiliza expressões no passado e no condicional para abordá-las, perderam força com o advento do Código Civil de 2002, vez que referido códex estabeleceu em seus artigos não mais a culpa presumida como era na vigência do anterior, mas, sim, a responsabilidade objetiva para essas situações, é o caso do rol exibido no artigo 932 e do artigo 936.

Sobre a presunção da culpa e a responsabilidade objetiva, Tartuce (2018, p. 372) discorre que, apesar de o autor não precisar demonstrar a culpa do réu em ambos os casos, estes se diferenciam pelo fato de que, no primeiro, entendido como hipótese de responsabilidade subjetiva, o causador do dano só precisa provar que não teve culpa, enquanto que, para o segundo, essa comprovação não basta, o dever de reparar o dano somente será afastado se presentes uma das excludentes de nexo de causalidade.

Interessa, finalmente, apresentar a classificação utilizada pela doutrina (CAVALIERI FILHO, 2015, p. 56; TARTUCE, 2018, p. 373; PEREIRA, 2018, p. 94) quanto aos graus de culpa. A culpa é grave quando o agente, por mais que não seja a sua intenção, atua

com grosseira falta de cautela, a ponto de parecer que desejou o resultado, até mesmo pois havia como prevê-lo. O efeito é equivalente ao do dolo, isto é, o agente deverá arcar com a indenização em sua integralidade.

A culpa leve, grau intermediário na classificação, é identificada quando o ofensor age sem prestar a atenção normalmente esperada de uma pessoa comum. Neste caso, para fins de quantificação do quantum indenizatório, devem ser aplicados dois artigos do Código Civil (BRASIL, 2002), o 944: “A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização” e o 945: “Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano”.

A culpa levíssima, menor grau de culpa, caracteriza-se quando o dano causado só poderia ter sido evitado com o emprego de cautelas extraordinárias ou se o agente possuísse determina habilidade especial ou conhecimento singular. A indenização deverá considerar, igualmente, o disposto no artigo 945 do CC, com uma redução ainda maior do valor a ser pago.