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No presente trabalho nos propomos a discutir a feira como espaço educativo em relação à africanidade ancorados no acervo histórico cultural que a feira de Bodocó nos traz. Esse é um espaço semanal de encontros diversos onde estão presentes múltiplos elementos da cultura negra em nosso município. Assim, o termo cultura é muito recorrente em nossa fala trazendo a necessidade de tecermos uma discussão mais aprofundada sobre

história dos escritos a seu respeito diversas definições e considerações. Dessa forma trazemos uma discussão sobre cultura certos de que estaremos minimizando sua diversidade e dimensão, pois esse é um conceito muito amplo para ser aqui discutido em sua totalidade, por isso não temos essa pretensão.

Trazemos uma fala acerca do conceito de cultura como uma forma de conhecermos um pouco acerca de sua trajetória histórica, seu processo de construção, sua relação com a diversidade humana e principalmente para compreendermos a importância do respeito à essa diversidade que compõe o rico universo de criações humanas compreendendo-a dentro das particularidades históricas de cada sociedade. Assim como nos diz Santos (2006) “só se pode propriamente respeitar a diversidade cultural se se entender a inserção dessas culturas particulares na história mundial” (p. 16).

Falaremos também de cultura africana e afrodescendente com o intuito de definirmos o conceito e, também, de colocarmos o que entendemos aqui acerca desse conceito, bem como de apontarmos parte do acervo cultural que há na feira de Bodocó e como ele está à disposição de uma educação ao ar livre, em meio às relações que ocorrem na feira. Assim, para melhor compreendermos a cultura africana e afrodescendente em nosso município partimos do conceito mais abrangente de cultura e depois discutiremos as especificidades o que não é tarefa fácil pelas diferentes concepções de cultura, pois “esta não é algo ou um modelo determinado e completo que permanece da mesma forma em qualquer conjuntura; ela é algo que se reorganiza de acordo com a estrutura em que se organiza” (DOMINGOS, 2011, p. 130).

Os autores que consultamos no estudo sobre cultura trazem discussões diversas e, algumas, diferenciadas com divergências de entendimento acerca de sua definição, mas encontramos dois pontos de concordância entre eles: a dificuldade de discutir e de conceituar cultura e sua intrínseca relação com o ser humano (CUCHE, 1999; LARAIA, 1999; SODRÉ, 1988; SANTOS, 2006; WHITE, 2009; DOMINGOS, 2015).

Como o ser humano traz em si, em sua essência, a cultura, ou como nos coloca Cuche (1999) “o homem é essencialmente um ser de cultura” (p. 09) e, inerente a essa mesma essência, encontramos a criatividade transformadora que age de maneira diversa criando e recriando ao longo do tempo e do espaço aí se dá um campo do diverso e do heterogêneo, onde observamos que “a cultura humana não é homogênea. É tremendamente variada, e essas variações tem também uma dimensão temporal, pois uma cultura muda

com o tempo” e também com, ou a partir, dos grupos humanos “[...] varia com os povos: a cultura dos esquimós não é a mesma dos pigmeus de Luzon ou da península da Malásia” (WHITE, 2009, p. 32-33).

Porém a entrada num mundo cultural ou o seu gradativo desenvolvimento ocorreu ainda no processo de “evolução” humana onde, para Cuche (1999) a hominização ocorreu justamente através da passagem do ser humano de um ser totalmente natural para um ser cultural. Em suas palavras coloca que:

O longo processo de hominização, começado há mais ou menos quinze milhões de anos, consistiu fundamentalmente na passagem de uma adaptação genética ao meio ambiente natural a uma adaptação cultural. Ao longo desta evolução, que resulta no Homo sapiens sapiens, o primeiros homem, houve uma formidável regressão dos instintos "substituídos" progressivamente pela cultura. [...] A cultura permite ao homem não somente adaptar-se a seu meio, mas também adaptar este meio ao próprio homem, a suas necessidades e seus projetos. Em suma, a cultura torna possível a transformação da natureza (CUCHE, 1999, p. 09- 10).

Nem todos os estudiosos da cultura afirmam que essa passagem do natural para o cultural se deu de maneira progressiva e, por tanto, lenta. Tendo como referência a discussão de Laraia (1999) percebemos que algumas explicações sobre o surgimento da cultura “tendem implícita ou explicitamente a admitir que a cultura apareceu de repente, num dado momento. Um verdadeiro salto da natureza para a humanidade” (p. 58). Dessa forma ele pauta sua colocação a cerca desse “salto” cultural com base em Lévi-Strauss e White que, embora concordem com a existência de um ponto ou um evento específico da história da humanidade para o surgimento da cultura, discordam acerca de que evento teria sido esse. Onde na posição do primeiro teria sido a convenção da primeira norma e, para o segundo, a capacidade humana de criar símbolos. Laraia (1999) nos explica essa divergência da seguinte maneira:

Claude Lévi-Strauss, o mais destacado antropólogo francês, considera que a cultura surgiu no momento em que o homem convencionou a primeira regra, a primeira norma. Para Lévi-Strauss, esta seria a proibição do incesto, padrão de comportamento comum a todas as sociedades humanas [...].

Leslie White, antropólogo norte-americano contemporâneo, considera que a passagem do estado animal para o humano ocorreu quando o

57).

Acreditamos, porém, que determinar um dado ou um evento para o surgimento da cultura entre a vastidão humana é de fato uma tarefa muito difícil, se não próxima do impossível, embora a cada dia o ser humano com seu desenvolvimento científico venha nos mostrando que muito deixou de ser inalcançável. Aguardemos. Podemos então colocar a esse respeito que na atualidade a ciência está pautada no entendimento de que “o salto para a cultura foi contínuo e incrivelmente lento” onde a cultura veio se desenvolvendo “simultaneamente com o próprio equipamento biológico e é, por isso mesmo, compreendida como uma das características da espécie” humana (LARAIA, 1999, p. 58 e 60).

Quando buscamos, então, a etimologia da palavra somos levados a compreender cultura como cuidado voltado ao campo, às atividades agrícola e pecuária, mas também do desenvolvimento das potencialidades humanas. Acerca dessa discussão temos também uma divergência, pois a partir de Cuche (1999) entendemos que essa palavra “vinda do latim

cultura que significa o cuidado dispensado ao campo ou ao gado, ela aparece nos fins do

século XIII para designar uma parcela de terra cultivada”, mas que somente em meados do século XVI “se forma o sentido figurado e ‘cultura’ pode designar então a cultura de uma faculdade, isto é, o fato de trabalhar para desenvolvê-la” (CUCHE, 1999, p. 19).

Já, quando tomamos como referência Sodré (1988), Chauí (1987), Domingos (2015) e Williams (1992) direcionamo-nos, em relação ao tempo-espaço, para a Antiguidade Clássica, pois “a etimologia da palavra cultura vem de colere, do latim- romano, que se traduz por cultivar, cuidar de algo, promover desenvolvimento, educar, formar [...]” (DOMINGOS, 2011, p. 131). Dessa forma percebemos que desde a antiguidade cultura relaciona-se ao cultivo, cuidado agrícola, assim como poderia ser “concebida como uma espécie de vigília em torno do crescimento natural da potencialidade do homem” e, também, “tudo que pudesse contribuir para um certo acúmulo de gostos, de crenças religiosas e morais ou para a representação de valores espirituais socialmente idealizados” (SODRÉ, 1988, p. 15 e 16). Notamos, então que na antiguidade já se pode notar cultura com sentidos que vão além do cultivo da terra.

Williams (1992) discute a cultura como objeto de estudo da sociologia com uma “sociologia da cultura” nos aponta a complexidade da palavra, em suas palavras coloca que:

Tanto o problema quanto o interesse da sociologia da cultura podem ser percebidos de imediato na dificuldade do termo que obviamente a define: "cultura". A história e o uso desse termo excepcionalmente complexo podem ser estudados em Kroeber e Kluckohn (1952) e Williams (1958 e 1976). Começando como o nome de um processo - cultura (cultivo) de vegetais ou (criação e reprodução) de animais e, por extensão, cultura (cultivo ativo) da mente humana - ele se tornou, em fins do século XVIII, particularmente no alemão e no inglês, um nome para configuração ou

generalização do "espírito" que informava o "modo de vida global" de

determinado povo (WILLIAMS, 1992, p. 10).

Voltando a dialogar com Cuche (1999) nós percebemos que até o século XVIII o movimento da palavra cultura, que vem associando outros significados em sua semântica, deve-se ao “movimento natural da língua e não aos movimentos das ideias” (p. 19). Nesse século o movimento iluminista passa a fazer uso desse vocábulo, porém adicionando complementos como “cultura das letras” e “cultura das artes”, porém:

Progressivamente, “cultura” se liberta de seus complementos e acaba por ser empregada só para designar “formação”, a “educação” do espírito [...] passa-se de “cultura” como ação (ação de instruir) a “cultura” como estado (estado do espírito cultivado pela instrução, estado do indivíduo “que tem cultura”). Este uso é consagrado, no fim do século, pelo Dicionário da Academia (edição de 1798) que estigmatiza “um espírito natural e sem cultura”, sublinhando com essa expressão a oposição entre “natureza” e “cultura” (CUCHE, 1999, p. 20).

Assim, para os filósofos iluministas franceses do século XVIII a cultura estava relacionada aos conhecimentos acumulados e transmitidos pela humanidade, tendo seu uso sempre no singular e associada a ideia de progresso, educação e razão, característicos do pensamento da época. Essa forma de entender e de usar a palavra cultura leva-a a similitude a um outro termo muito utilizado e difundido à época: civilização, que está ligada a uma concepção progressista de história. Porém na França o sucesso de civilização impedirá o desenvolvimento dos estudos e do conceito de cultura que terá maior abertura e espaço entre os pensadores alemães (CUCHE, 1999).

Na virada do século XVIII para o XIX na Alemanha, guiados pelo romantismo alemão e a busca pela unidade nacional, o termo kultur difundir-se-á entre os intelectuais

nos marcos de uma cultura nacional” (ORTIZ, 2002, p. 21). Esse debate acerca da cultura pelos pensadores alemães receberá um pouco da disputa política entre França e Alemanha, pois acaba se estabelecendo uma oposição entre as discussões entre cultura e civilização, uma vez que no entendimento germânico “a cultura se opõe então à civilização como a profundidade se opõe à superficialidade” (CUCHE, 1999, p. 25).

Ainda no século XVIII na Alemanha, segundo Williams (1992) e Cuche (1999), Herder (1774) “acrescentou o conceito de formas culturais específicas” (WILLIAMS, 1992, p. 15), abrindo o debate sobre a diversidade cultural contra o universalismo iluminista francês, também como uma forma de fortalecer o orgulho nacional alemão como nos mostra Cuche (1999):

Já em 1774, mas de maneira relativamente isolada, Johann Gottfried Herder, em um texto polêmico fundamental, em nome do "gênio nacional" de cada povo (Volksgeist), tomava partido pela diversidade de culturas, riqueza da humanidade e contra o universalismo uniformizante do Iluminismo, que ele considerava empobrecedor. Diante do que ele via como um imperialismo intelectual da filosofia francesa do Iluminismo. Herder pretendia devolver a cada povo seu orgulho, começando pelo povo alemão (CUCHE, 1999, p. 27).

Tomando como referências diversos autores como Laraia (1999), Sodré (1988), Cuche (1999) e White (2009), percebemos que o antropólogo britânico Edward Tylor (1832-1917) já no século XIX, formulou o conceito de cultura como o entendemos hoje. Nessa formulação Tylor partiu do pensamento alemão acerca de kultur e do que se pensava na França sobre civlization e, numa síntese, elaborou o vocábulo inglês e seu conceito:

culture. Laraia (1999) nos explica essa composição da seguinte maneira:

No final do século XVIII e no princípio do seguinte, o termo germânico Kultur era utilizado para simbolizar todos os aspectos espirituais de uma comunidade, enquanto a palavra francesa Civilization referia-se principalemtne às realizações materiais de um povo. Ambos os termos foram sintetizados por Edward Tylor (1832-1917) no vocábulo inglês Culture [...] Com essa definição Tylor abrangia em uma só palavra todas as possibilidades de realização humana, além de marcar fortemente o caráter de aprendizado da cultura em oposição à ideia de aquisição inata, transmitida por mecanismos biológicos.

O conceito de cultura, pelo menos como utilizado atualmente, foi, portanto definido pela primeira vez por Tylor (LARAIA, 1999, p. 25).

Acessando parte do texto de Tylor através de Cuche (1999) podemos destacar que: "Cultura e civilização, tomadas em seu sentido etnológico mais vasto, são um conjunto complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, o direito, os costumes e as outras capacidades ou hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro da sociedade" (TYLOR, 1871, p. 1 apud. CUCHE, 1999, p. 35). Dessa forma percebemos que Tylor traz em sua definição de cultura uma posição contrária ao pensamento do determinismo biológico que predominava à sua época que, inspirado no evolucionismo imbuia um caráter biológico a cultura.

O século XIX nos traz dois determinismos em relação à discussão sobre a cultura: o biológico e o geográfico. Essas concepções surgem no contexto do avanço colonial europeu sobre África e Ásia e o consequente fortalecimento do pensamento evolucionista enquanto classificador e categorizador da humanidade. Assim, o determinismo biológico atribuía capacidades inatas a determinados grupos humanos e o geográfico colocava o ambiente físico como um fator condicionante das características culturais dos povos. Mas o evolucionismo dava aos pensadores da época base para colocar que apesar dessas determinações haveria um processo de evolução cultural em que todas sociedades chegariam até a chamada civilização (LARAIA, 1999; SANTOS, 2006; WHITE, 2009; OLIVEIRA, 2014).

Assim, nesse contexto:

No século XIX foram feitos muitos estudos procurando hierarquizar todas as culturas humanas, existentes ou extintas [...] Segundo as versões mais comuns desses estudos, a humanidade passaria por etapas sucessivas de evolução social, que a conduziriam desde um estágio primordial onde se iniciaria a distinção da espécie humana de outras espécies animais até a civilização tal como conhecia na Europa ocidental de então (SANTOS, 2006, p. 13-14).

Tais posições, no entanto, foram superadas e passamos a compreender que “As diferenças entre os homens, por tanto, não podem ser explicadas em termos das limitações que lhes são impostas pelo seu aparato biológico ou pelo seu meio ambiente” (LARAIA, 1999, p. 24). Porém, apesar de terem sido superadas essas ideias provocaram a hierarquização dos povos e servindo para legitimar as ações imperialistas europeias (SODRÉ, 1988), uma vez que essas ideias racistas acabaram se associando às imperialistas e “muitas vezes os povos não europeus foram considerados inferiores, e isso era usado como justificativa para seu domínio e exploração” (SANTOS, 2006, p. 15).

sociais e não à existência de uma diferença biológica nos aparece como pioneiro Fraz Boas (1858-1949), antropólogo alemão que dedicou seus estudos às observações particularistas de sociedades tradicionais. Segundo Silva e Silva (2006) Boas foi um dos precursores nessa discussão ao recorrer a História para explicar a diversidade cultural colocando em xeque a teoria de determinismo biológico. Nas palavras de Cuche (1999, p. 40) “Toda a obra de Boas é uma tentativa de pensar a diferença. Para ele, a diferença fundamental entre os grupos humanos é de ordem cultural e não racial” dessa forma “o conceito de cultura não funciona como eufemismo do conceito de ‘raça’, pois ele o construiu precisamente para opor-se a esta ideia” (Ide. Ibidem, p. 42).

Mesmo superada a ideia do determinismo biológico chega ao Brasil e terá solo fértil na recém proclamada República onde se aplica a política do branqueamento na tentativa de eliminar a população negra e tornar majoritária a população branca, uma vez que fazia parte do pensamento da elite brasileira a crença na necessidade de extinção de “elementos inferiores”. Nesse cenário destacamos o médico maranhense Nina Rodrigues (1862-1906) que entre o final do século XIX e início do século XX atua na classificação do povo brasileiro em raças, atribuindo aos negros a classificação de inferiores e aos brancos de superiores, relacionando a tendência à criminalidade às raças que ele classifica em seus estudos e colocando a mestiçagem como algo que não deveria ocorrer, pois a partir do que observava ela estava diluindo o sangue branco a ponto de fazê-lo desaparecer (NEVES, 2008). Observamos que Nina Rodrigues difundia a inferioridade biológica do negro trazendo sua “versão nacionalista do racismo cientificista” (GLEDDIL, 2012, p. 37).

Rompendo com o discurso do determinismo biológico, que vinha sofrendo críticas, Gilberto Freyre já no século XX traz o discurso da diferença cultural, denotando que o que difere a população brasileira em seus grupos sociais são fatores culturais e não biológicos. Traz em seus escritos a influência das pesquisas e da concepção de cultura de Fraz Boas (1858-1949) (SILVA; SILVA, 2006), porém no tocante ao abandono do determinismo biológico, pois Boas, segundo Cuche (1999), procurava romper com o etnocentrismo no momento em que ressaltava “a dignidade de cada cultura e exalta o respeito e a tolerância em relação a culturas diferentes” (p. 46). E, ao nosso entender Freyre, através de sua “interpretação do encontro das raças como substrato da tese de uma democracia racial brasileira e, por conseguinte, da manutenção do racismo à brasileira” (SANTOS, 2005, p. 17) propagou a inferioridade dos africanos e afro-brasileiros demonstrando suas culturas

como inferiores ao passo que reafirma “um suposto e controvertido atraso civilizatório das populações africadas com relação à portuguesa” (CUNHA Jr., 2013, p. 05).

Sendo essa uma discussão mais profunda e não sendo nosso foco nesse momento voltemos ao conceito de cultura, que já nos traz bastante polêmica, para colocarmos que este vem sendo construído e reconstruído ao longo da História a partir do contexto e das observações realizadas por cada teórico que se dedicou a estudar e a conceituar cultura.

Observamos que, como consequência da criatividade e inventividade do ser humano, a cultura é dinâmica e traz consigo, apesar da permanência e da essência, a característica da mudança, da atualização. Santos (2006) traz ênfase a essa característica porque “é comum que a cultura seja pensada como algo parado, estático. Vejam o caso de eventos tradicionais, que por serem tradicionais podem convidar a serem vistos como imutáveis”, porém devemos estar atentos uma vez que “o fato de que as tradições de uma cultura possam ser identificáveis não quer dizer que não se transformem, que não tenham sua dinâmica” e, nesse caso colocamos em evidência que “nada do que é cultural pode ser estanque, porque a cultura faz parte de uma realidade onde a mudança é um aspecto fundamental” (SANTOS, 2006, p. 47).

Assim, entendemos que a cultura está num contínuo processo de modificação que segundo Laraia (1999) ocorre devido a fatores internos, ou seja, das necessidades do próprio grupo social, e externos, influências de outros grupos e seus traços culturais. Em suas palavras coloca que:

Podemos agora afirmar que existem dois tipos de mudança cultural: uma que é interna, resultante da dinâmica do próprio sistema cultural, e uma segunda que é o resultado do contato de um sistema cultural com o outro (LARAIA, 1999, p. 45).

No primeiro caso, a mudança pode ser lenta, quase imperceptível para o observador que não tenha o suporte de bons dados diacrônicos. O ritmo, porém, pode ser alterado por eventos históricos tais como uma catástrofe, uma grande inovação tecnológica ou uma dramática situação de contato (LARAIA, 1999, p. 45).

O segundo caso [...] pode ser mais rápido e brusco. No caso dos índios brasileiros, representou uma verdadeira catástrofe. Mas, também pode ser um processo menos radical, onde a troca de padrões culturais ocorre sem grandes traumas (LARAIA, 1999, p. 45).

Assim, percebemos como a cultura tem sua dialética em relação ao próprio grupo que a abriga, mas também com outros grupos que trazem outras formas, ou padrões

contato com o outro a cultura traz em si uma essência, algo que permanece e que traz relação com o sentimento de pertencimento dos indivíduos e seu grupo social, assim como com o sentimento de identidade.

Entendemos identidade como um conjunto de características comuns entre os indivíduos de um mesmo grupo. Tais características podem estar relacionadas à língua/linguagem, às tradições do grupo, etc., e, certamente se relacionam com a memória e história do grupo, dessa forma têm suas ligações com a cultura. Dessa forma, percebemos que “a identidade individual e coletiva tem suas bases ou pontos de referência em conhecimentos vividos pessoalmente e em ensinamentos, na tradição de um grupo, etc. Esses itens são encontrados na memória” que entre as lembranças guarda também a cultura do grupo social a que o/s individuo/s pertence/em (OLIVEIRA, 2013, p. 61). Ainda nesse contexto destacamos que:

A construção da identidade a partir de saberes da cultura vivida se dá a partir dos antecedentes históricos de um indivíduo, ou seja, além de ser constituída por meio de negociação para adquirir a aceitação do outro a identidade tem como base o conteúdo da memória do indivíduo que lhe proporciona o sentimento de continuidade e de coerência. Dessa forma são as características adquiridas a partir da vivência que estão guardadas na memória e que marcam a identidade do indivíduo e são negociadas para aceitação do outro (OLIVEIRA, 2013, p. 61).

Cuche (1999) traz uma discussão acerca da relação entre cultura e identidade onde coloca que a “questão da identidade cultural remete, em um primeiro momento, à questão