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3. PANORAMA SOCIOCULTURAL E SOCIOAMBIENTAL

3.2 MODERNIDADE E CONSUMO

3.2.1 Cultura do Consumo

Para alguns pensadores, a cultura do consumo está relacionada apenas a uma visão negativa como relações sociais mediadas por signos, manipulação, alienação do consumidor, superficialidade, entre outras questões. Outros pensadores, segundo Barbosa e Campbell (2006, p.11) partem do questionamento sobre "o significado e importância do consumo como um processo que media relações e práticas sociais", é a partir dessa perspectiva que será analisada a cultura do consumo nesta pesquisa. Para Barbosa e Campbell (2006, p.13) "todo e qualquer ato de consumo é essencialmente cultural", eles ainda afirmam que:

[...] através do consumo atos locais e mundanos são relacionados a forças globais de produção, circulação e inovação tecnológica e relações políticas que nos permite mapear e sentir na vida cotidiana aspectos que de outra forma nos parecem extremamente distanciados [...]

(BARBOSA, CAMPBELL, 2006, p.13)

Historicamente, além do desenvolvimento do comércio, algumas revoluções sociais contribuíram para o crescimento da cultura do consumo, fatos como a alfabetização da população, o surgimento de novas formas de lazer, a construção da subjetividade e do individualismo são alguns exemplos (BARBOSA e CAMPBELL, 2006). Essa visão do desenvolvimento da subjetividade e do individualismo para Campbell (2001, p.114) é fundamental

para a construção do consumo, caracterizado pelo hedonismo moderno que segundo o autor é "uma questão de conduta arrastada para a frente pelo desejo da antecipada qualidade de prazer que uma experiência promete dar", ou seja, a busca eterna do prazer que é estimulada através da imaginação.

[...] o prazer é procurado por meio de estimulação emocional e não meramente sensorial, enquanto, em segundo, as imagens que preenchem essa função são ora criadas imaginativamente, ora modificadas pelo individuo para o autoconsumo [...]

(CAMPBELL, 2001, p. 114)

A partir dessa perspectiva, podemos afirmar que as emoções são associadas a objetos, e o prazer começa na imaginação do sujeito, mas essa percepção só pode ser desenvolvida por conta da insatisfação com a realidade. O consumo moderno, portanto, é caracterizado pela busca por novidades que possam suprir essa procura por prazer que complete os "devaneios e fantasias" do ser (CAMPBELL, 2001). Barbosa e Campbell (2006, p. 53) completam esse pensamento dizendo que "se os consumidores desejassem somente a posse material dos bens [...] a tendência seria a acumulação dos objetos, e não o descarte rápido das mercadorias e a busca por algo novo [...]", os autores ainda afirmam que "[...] como sabemos que a realidade sempre fica aquém da imaginação, cada compra nos leva a uma nova desilusão [...]".

Lipovetsky e Serroy (2015) compartilham uma visão parecida com Campbell e Barbosa, e chamam de "consumo transestético", pautado também pelo hedonismo voltado para o sentir "emoções e experiências". Para Appadurai (2008, p.18) "o consumo está sujeito ao controle social e à redefinição política", ou seja, o consumo tem relação direta com o desenvolvimento e transformações que a sociedade está sujeita, e isso não pode ser feito de forma isolada, sendo necessária a participação de diversos atores. Certamente, essa percepção indica um caminho possível para explicar os motivos pelos quais o consumo é tão relevante em nossa cultura.

Podemos afirmar que o consumo tornou-se central na vida da sociedade moderna, todos somos consumidores. Segundo Bauman (2012) ser

consumidor é um direito e um dever. Apesar de Bauman (2012) ter uma visão pessimista em relação ao consumo o pensador faz importantes reflexões sobre o consumo nas redes de comunicação eletrônica, como ele mesmo denomina. Para ele, as redes online estão equipadas com um "dispositivo de segurança" que é a "possibilidade de desconexão instantânea", essa ferramenta segundo Bauman (2012, p.113) "num mundo assim, é o ato de se livrar do indesejado muito mais do que agarrar o que se deseja, que é o significado da liberdade individual".

É interessante perceber essa visão do pensador, no sentido de que, nas relações online, quando não se quer ver ou saber sobre algo, há a possibilidade de se desconectar. Pode-se afirmar, portanto, que pessoas que não se importam, por exemplo, com pautas socioambientais, quando em contato com essas questões, elas simplesmente poderiam se desligar ou trocar de rede. Há também que se considerar que, na atualidade, as próprias plataformas online possuem um sistema pautado por algoritmos10, que

acabam criando uma "bolha social" para o indivíduo. Por esses motivos, para Bauman (2012) as tecnologias atuais são "despolitizantes" e feitas para as táticas do mercado. Lipovetsky e Serroy (2015) fazem uma consideração que vai de encontro ao pensamento de Bauman (2012), sobre o uso do ciberespaço, que sustenta a visão de um consumidor hedonista. Segundo Lipovetsky e Serroy (2015, p.262) "as interações são feitas para se divertir e fazer passar o tempo, exprimir seus gostos, se pôr em cena, produzir uma imagem de si.".

Miller (2007) afirma que na atualidade é necessária uma perspectiva que realce a relação entre a produção e o consumo, para que haja uma discussão mais profunda sobre a cultura do consumo. Entender os processos por traz das transformações é essencial para compreender não somente como a sociedade se apresenta atualmente, mas como ela virá a ser. Miller (2007) ainda enfatiza:

10 É uma sequência lógica, finita e definida de instruções que devem ser seguidas para resolver um

problema ou executar uma tarefa. Na internet, é utilizado para identificar comportamentos e sugerir novas interações de acordo com os comportamentos previamente analisados.

Um apelo é feito para uma análise da cadeia de mercadoria na qual o objetivo é desfetichizar a mercadoria e mostrar as ligações humanas que são criadas através do capitalismo, não para valorizá-las, mas para reconhecê-las e entender as responsabilidades que surgem quando nos beneficiamos enquanto consumidores através de preços baixos para o prejuízo de outros.

(MILLER, 2007, p.53)

Barbosa e Campbell (2006, p.40) observam que "[...] não existe punição para o não consumo ou obrigatoriedade para fazê-lo", ainda assim, não podemos negar a materialidade que parece ser intrínseca ao ser humano enquanto sociedade. A cultura do consumo é uma realidade presente, que está em constante transformação e na atualidade, está cada vez mais em um processo de aceleração, como no exemplo da produção fast fashion.