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Capítulo 2 Cultura Organizacional e Gestão da Qualidade revisão da literatura

2.1. Cultura Organizacional

2.1.4. Cultura dominante, sub-culturas e contra-culturas

Poderemos afirmar que na organização típica existe, tendencialmente, uma cultura dominante, que expressa os valores centrais partilhados pela maioria dos membros dessa organização. Schein (1996) chama-lhes um conjunto de linhas de orientação ideológica, que requerem um mínimo de consenso e consistência, vitais para o funcionamento da própria organização. Tal não é sinónimo de uma cultura única. Na generalidade das organizações e, especialmente, nas que possuem uma estrutura mais complexa (por dimensão, caracterização ou contexto), existem subculturas (Bellou 2008; Mannion et al 2008; Martin 2002; Robbins 2003; Detert et al

2000; Hofstede 1998b; Deshpandé et al 1993; Smircich 1983), que tendem a desenvolver-se reflectindo problemas, situações e experiências comuns a um determinado conjunto de indivíduos.

Estas incluem não só os valores únicos (distintivos) dos seus membros, como também um conjunto maior ou menor de elementos da cultura dominante, tais como valores centrais, práticas e comportamentos (Bellou 2008; Robbins 2003). Na prática, enquanto alguns atributos culturais existirão em toda a organização, outros podem apenas ter relevância em algumas unidades desta. Assim, diferentes culturas podem surgir associadas a diferentes grupos profissionais, que podem explicitamente diferenciar-se de outros pelos seus valores ou artefactos, em associação ou não com diferentes níveis de poder e influência na organização (Mannion et al 2008). Na área hospitalar, tal poderá ser exemplificado com a dominância tradicional da “cultura médica” e o recente desenvolvimento de uma “cultura de gestão”.

Porém, a existência de grupos não implica que, no seu interior, os comportamentos e práticas sejam necessariamente comuns a todos os indivíduos nestes (Bellou 2008).

As culturas ditas como “dominantes”, estão muitas vezes ligadas aos seus próprios fundadores (Hewlett-Packard, IBM, General Motors, …) e ao legado que estes deixam ao nível de comportamento organizacional (Schneider et al 1996, Dellana e Hauser 1999). Encontramos assim como sujeito fundamental o líder da organização e o seu papel determinante para a criação da cultura dominante nesta. A sua importância prende-se não só com o seu perfil de personalidade e com as suas qualidades e atributos pessoais mas, principalmente, com os processos de interacção entre o fundador/líder e os seus seguidores, que permitem desenvolver, de forma sustentada, a visão, o propósito das acções e o empenhamento individual na organização (Pettigrew 1979).

As diferentes culturas numa organização não são habitualmente associáveis aos diferentes níveis funcionais do seu respectivo organigrama, reflectindo-se mais de uma forma vertical e dispersa do que linear / transversal, se bem que a típica especialização das organizações sugere que os colaboradores com qualificações semelhantes tendem a ser colocados em proximidade, face a uma determinada actividade, o que tem elevada probabilidade de reforçar

No entanto, é importante considerar que existem diferenças genéricas entre as crenças e valores fundamentais da gestão de topo e aqueles que estão nos níveis mais baixos da organização - o desejo da gestão sobre como as coisas deveriam ser versus a realidade operacional da organização (O’Reilly 1989), sendo a análise de ambas fundamental para uma visão efectiva do construto “cultura organizacional”. A cultura da gestão de topo não é então,

per si, garantia de que a cultura dominante – ainda menos, a generalidade da cultura

organizacional – partilhe essas normas, valores ou crenças.

Um outro factor crítico na abordagem da cultura dominante e de sub-grupos nas organizações revela-se na intensidade ou consistência das normas. O’Reilly (1989) refere-nos dois conceitos de enquadramento: intensidade e consenso. De facto, a compreensão generalizada de uma determinada norma ou valor não implica, necessariamente, a sua aprovação pelo grupo, do mesmo modo que esta pode assumir claramente um valor, mas diferente para grupos igualmente distintos. De facto, é neste contexto simultâneo de intensidade e consenso que devemos procurar a razão de existir uma cultura dominante numa organização.

Uma empresa pode, e normalmente tem, várias culturas presentes, embora uma seja de facto a dominante e existam fenómenos mais ou menos evidentes e a níveis diferentes de intensidade de conflito entre a cultura dominante e as sub-culturas (Deshpandé et al 1993). Neste contexto, e segundo Smircich (1983), surge entre as sub-culturas uma competição pela própria definição da natureza das situações no interior da organização, assim como um potencial conflito entre estas, originário nas (eventualmente) diferentes prioridades e objectivos que cada grupo pretende atingir (Schein 1996).

Como tem sido evidenciado por um grupo crescente de investigadores, algumas empresas tem tentado ultrapassar os constrangimentos da coexistência dos diferentes grupos culturais, tentando a sua integração numa única vertente cultural (Schein 1996) - estas organizações são uma excepção e existe pouco conhecimento sobre a forma como o conseguiram realizar com sucesso.

O próprio reconhecimento da existência de sub-culturas organizacionais é associável a uma cultura mais ou menos “forte”, devendo entender-se por esta adjectivação uma cultura em que os valores centrais da organização são partilhados com abrangência e elevada intensidade.

Assim, quanto maior o número de elementos que aceitem os valores centrais (da cultura dominante), maior a influência e controlo comportamental.

Num estudo empírico realizado (Hofstede 1998b) foram identificadas três sub-culturas específicas:

1. profissional: mais pragmática, não muito orientada para os resultados, menos orientada para os colaboradores e com maior controlo;

2. administrativa: orientação por processos, altamente paroquial, a mais normativa; não existe um controlo forte, as relações são bastante informais;

3. "serviço ao cliente": respeito pelas normas, mais informalidade, mas menor abertura interpessoal.

Mais importante do que o enunciar de resultados, é afirmar a necessidade de desenvolver uma gestão "culturalmente consciente", em especial nas denominadas organizações complexas. Tal significa estar atento à variedade cultural no interior da sua própria organização, sem esquecer que, complementarmente, também as decisões da gestão reflectem a subcultura do grupo a que pertencem.

A importância de providenciar aos gestores, a diferentes níveis, mapas das sub-culturas organizacionais, conduzirá a discussões sobre a variedade cultural presente e qual será a desejável (Hofstede 1998b). Isto poderá contribuir para que partes da organização sejam inadvertidamente prejudicadas devido à existência de soluções globais e generalistas, que possam entrar em conflito com as suas necessidades culturais específicas.

A importância de subculturas deve ser alvo de maior investigação futura, pois tem existido reduzida atenção, a este nível, à realidade pluralista das organizações actuais, assim como às próprias contra-culturas, aquelas que se opõem activamente (Smircich 1983; Detert et al 2000). A investigação da importância das subculturas poderá ser relevante na implementação do SGQ em contexto hospitalar, dados os tradicionais grupos profissionais que neste convivem, podendo mesmo ser uma forma de compreender porque determinadas iniciativas de mudança têm sucesso enquanto outras falham (Detert et al 2000).

2.1.5 - Factores externos, internos e papel do indivíduo no desenvolvimento