• Nenhum resultado encontrado

A cultura, que está armazenada no capital cognitivo dos indivíduos, de alguma forma institui normativas e regras que auxiliam na organização ou desorganização da sociedade a partir de processos sociais que potencializam a complexidade das relações entre os sujeitos. Nessa perspectiva podemos inferir que a cultura e a sociedade estão em uma relação geradora mútua (MORIN, 2002). Sendo assim, a cultura é “o conjunto de hábitos, costumes, práticas,

savoir-faire, saberes, regras, normas, interdições, estratégias, crenças, ideias, valores, mitos,

ritos”, que acabam sendo passados de forma geracional, formando e retomando a complexidade social ao longo de gerações (MORIN, 2003d, p.61).

Geertz (1989) entende cultura como “redes de significação” que parecem evidenciar essa ação de influências que ocorrem entre sujeito e cultura, onde ambos transformam e são transformados, ou seja, ao tecer a cultura/imaginário, preso às teias de significação,

[...] o sujeito enreda-se/é tecido por eles [...] recebe prescrições e proscrições sobre o que deve pensar e como deve agir no grupo e frente aos demais grupos socioculturais, para ser positivamente sancionado. Isto é, a cultura, o imaginário e os paradigmas procuram orientar/‘determinar’ o lugar que o sujeito pode/deve assumir na estrutura sociocultural. No entanto, quer parecer que ele tende a dialogar, disputar, usurpar, apropriar-se, criar e recriar esses lugares. Porém, não significa que faça isso apenas para resistir à ordem posta, ou como forma de enfrentamento, mas também para atualizar (consciente/inconscientemente) o saber-fazer, a possibilidade de exercício de criação; pode apropriar-se dela e inventar novas formas de consumi-la e/ou, mesmo, de subvertê-la (BALDISSERA, 2004, p. 273).

O sujeito exerce a função de um elemento de desordem/desorganização, para além de ser impactado pela cultura e pelo imaginário surgidos nesse (re)tecer da cultura. Essa desorganização não pode ser encarada como algo negativo, mas sim, como uma oportunidade de fomentar o diálogo e que, conscientemente ou não, na medida em que tenta converter a cultura e o imaginário em algo compreensível para si mesmo, assimilando-os.

Quando abordamos as diversidades no ambiente organizacional, é evidente a necessidade da construção de sentidos para que os interlocutores possam compreender com

clareza os objetivos organizacionais. Esses sentidos acabam sendo compartilhados com os empregados, especialmente através dos seus líderes (SCHEIN, 2009). Mesmo que as afirmações de Schein necessitem de flexibilização (dentre outras coisas, cabe ressaltarmos que o poder dos líderes, nesses processos, não é de determinação da cultura), é preciso admitirmos que os líderes exercem grande força na constituição da cultura, pois que, dentre outras coisas, têm o poder de tomar decisões e implementar ações.

De acordo com Schein (2009, p.79), a cultura traduz questões que são evidenciadas por membros de um determinado grupo sobre algumas situações específicas, tais como: forma de agir em relação ao ambiente externo e como fazer a gestão das ações de integração interna. Essas atividades podem contribuir na revelação sobre quais são os níveis de realidade aceitos pelo grupo, a padronização enquanto ao tempo e espaço de trabalho. Essas informações muitas vezes são reflexo da atuação de líderes que contribuem para o compartilhamento dos principais interesses e propósitos organizacionais.

Quando pensamos em cultura de um grupo, Schein (2009, p.16) indica que isso consiste em

um padrão de suposições básicas compartilhadas, que foi aprendido por um grupo à medida que solucionava seus problemas de adaptação externa e de integração interna. Esse padrão tem funcionado bem o suficiente para ser considerado válido, e por conseguinte, para ser ensinado aos novos membros como o modo correto de perceber, pensar e sentir-se em relação a esses problemas.

Um dos principais processos para que essas suposições básicas sejam compartilhadas pelo grupo é o da comunicação e, assim, os significados que constituem a cultura organizacional são postos em circulação, disputados, construídos e transformados para, novamente, experimentarem certa estabilidade como significados organizados ou organizadores (BALDISSERA, 2014). A partir das práticas de comunicação e das interações e relações entre os empregados é que emergem as tensões, relações de poder, subjetividades e o conjunto de significados que cada indivíduo traz para o grupo e para a organização da qual faz parte. Dessa forma os sujeitos “percebem-se construindo e disputando sentidos, realizando interpretações de modo a, sob formas e prismas diversos e em variados níveis de tensão, nem sempre conscientes, interpelarem a cultura/cultura organizacional e são por ela interpelados” (BALDISSERA, 2010a, p.69). Essa relação entre cultura/cultura organizacional é que acaba contribuindo para o tensionamento entre os sentidos e, posterior conformação da cultura organizacional de um determinado espaço.

mentores intelectuais ou gestores/as que defendem as diversidades nas organizações acaba por incomodar e/ou criar ambientes desconfortáveis para parcela dos trabalhadores e das trabalhadoras. Uma das variáveis implicadas é a cultura organizacional. Sabemos que sua constituição se deu, dentre outras coisas, pelas decisões tomadas pelo grupo em relação aos problemas que se apresentaram ao longo do tempo e, nesse sentido, muitas vezes suportadas em valores de exclusão, ou seja, em direção diametralmente oposta aos fundamentos das noções de diversidades, como os de respeito e equidade. Ressaltamos que apenas recentemente essas noções passaram a ser pauta da agenda das organizações no Brasil, pelo menos da maior parte delas e de modo mais presente. Assim, assumir as diversidades como valores organizacionais pressupõe, em algum grau e de alguma forma, a reestruturação da cultura organizacional, e isso, por si, tem potência para gerar desconforto, resistências, violência simbólica e, em casos mais extremos, violência física.

Ao identificarmos a temática das diversidades sendo incorporada nos assuntos organizacionais, independente dos canais ou ações utilizadas pelas organizações, percebemos que o tensionamento entre esses sentidos e as suas relações contribuem para que a temática em questão possa ser estabilizada na cultura organizacional. Com isso, na medida em que essas iniciativas de diálogo e movimento interno para as diversidades acabam sendo visibilizadas em premiações, essas atividades acabam por ser legitimadas e compreendidas como referencialidade para as demais organizações. E isso, de alguma forma pode contribuir para que haja uma reflexão nesses outros espaços e um consequente tensionamento de sentidos e conformação de culturas em outras organizações.