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Sec¸˜ao de Choque de Espalhamento

2.1.4 Curvas de Rotac¸˜ao de gal´axias

Na d´ecada de 70, Ford e Rubin descobriram que as curvas de rotac¸˜ao de gal´axias eram planas ou crescentes, ou seja, as velocidades de rotac¸˜ao nas regi˜oes fora da regi˜ao vis´ıvel das gal´axias eram constantes ou crescentes [11]. Isto significa que objetos orbitando em torno do

centro das gal´axias fora da regi˜ao vis´ıvel, possuem uma velocidade que permanece constante com a distˆancia (em relac¸˜ao ao centro) em vez de diminuir, como esperar´ıamos a partir da mecˆanica Newtoniana.

Resultados similares foram observados para todas gal´axias observadas inclusive a nossa Via L´actea [12]. A explicac¸˜ao proposta foi que tais gal´axias continham uma grande quantidade de mat´eria invis´ıvel que residia em volta das gal´axias. Esta mat´eria forneceria uma maior forc¸a centr´ıpeta aos objetos em ´orbita de forma a explicar as observac¸˜oes. Esta distribuic¸˜ao de ME em volta das gal´axias ´e comumente chamada na literatura de halo de ME.

Abaixo veremos uma r´apida e simples explicac¸˜ao de como essa abundˆancia de ME pode ser inferida atrav´es dessas observac¸˜oes. De acordo com a segunda Lei de Newton, a velocidade de rotac¸˜ao (v) de um objeto em ´orbita est´avel, a um raio r distante do centro da gal´axia, pode ser derivada igualando a forca centr´ıpeta `a forca de atrac¸˜ao gravitacional conforme a seguir,

mv2r

r =

G M(r) m

r2 , (2.17)

onde M(r) ´e a massa dentro da esfera que tem como raio a distˆancia do centro da gal´axia ao objeto em rotac¸˜ao.

Observe que estamos supondo uma distribuic¸˜ao esf´erica e uniforme de mat´eria. Assim,

M(r) = 4πr 3ρ

3 , (2.18)

ondeρ ´e a densidade de mat´eria da gal´axia.

Substituindo as Eq.(2.18) em Eq.(2.17) encontramos,

Veja na Fig.(2.4), que mostra a curva de rotac¸˜ao da gal´axia M33 de raio r≃ 2 Kpc, que esse comportamento linear com a velocidade concorda exatamente com as observac¸˜oes. Entretanto para um objeto fora da regi˜ao vis´ıvel, ou seja, distante das estrelas e gases onde teoricamente nenhuma massa significante estaria presente, de forma que M(r) → M = constante, encon- trar´ıamos,

v ∝ 1 r12

. (2.20)

Este resultado est´a em total contradic¸˜ao com as observac¸˜oes na Fig.(2.4). Desta figura, vemos claramente que a velocidade varia aproximadamente com r1/2. Para que possamos reproduzir a Fig.(2.4) necessitamos que M ∝ r2comρ ∝ 1r.

Muitas gal´axias espirais apresentam um comportamento do tipo v ∝ r mesmo para a regi˜ao fora do vis´ıvel. De forma a reproduzir tais curvas de rotac¸˜ao inferimos que,

M ∝ r3, (2.21)

comρ sendo constante para uma distribuic¸˜ao esf´erica de ME.

Este ´ultimo caso ´e conhecido como o modelo isot´ermico, onde a ME possui uma distribuic¸˜ao esf´erica e isot´ermica. Mesmo que n˜ao tiv´essemos suposto uma distribuic¸˜ao esf´erica de ME con- clu´ıriamos que existe um halo de ME, que cerca tais gal´axias conforme ilustrado na Fig.(2.5). Uma discuss˜ao mais completa sobre a distribuic¸˜ao de ME ser´a dada no Apˆendice A.3. Al´em

das curvas de rotac¸˜ao de gal´axias que s˜ao da d´ecada de 70, existem evidˆencias bem mais recen- tes, que trata da colis˜ao entre aglomerados de gal´axias.

Figura 2.4: Curva de rotac¸˜ao observada da gal´axia espiral M33. Retirada de [13].

Figura 2.5: Halo da nossa gal´axia Via L´actea. Na figura est˜ao exibidos a posic¸˜ao do Sol na via l´actea (∼ 8 Kpc do centro da gal´axia).

2.1.5

Aglomerado da Bala e Seus Primos

Aqui discutiremos evidˆencias bastante recentes da existˆencia de ME e como as mesmas fornecem informac¸˜oes preciosas sobre este tipo de mat´eria. O observat´orio Chandra X-ray observou um evento conhecido como aglomerado da bala, que se trata da colis˜ao de dois aglo- merados de gal´axias.

O fato mais importante de todo este evento ´e que um estudo de lentes gravitacionais com- binado a observac¸˜oes de raios-X `a respeito do aglomerado da Bala afirmam a descoberta de

ME, e que com uma confianc¸a de 8σ descarta a possibilidade de uma modificac¸˜ao da gravidade Newtoniana explicar tal evento [14].

Vamos neste momento mencionar com um pouco mais de detalhe este evento para que possamos entender como esta observac¸˜ao pode ser considerada uma enorme evidˆencia de ME.

As principais componentes desses aglomerados de gal´axias s˜ao os gases, estrelas e ME. Estas trˆes componentes se comportam de forma completamente diferente, portanto, devem ser tratadas separadamente.

As estrelas das gal´axias, que emitem luz vis´ıvel, n˜ao foram afetadas durante a colis˜ao, e simplesmente passaram umas pelas outras apenas mais lentamente devido `a atrac˜ao gravitaci- onal. Os gases, que s˜ao compostos principalmente de Hidrogˆenio e H´elio comp˜oem a maior quantidade de massa vis´ıvel de um aglomerado de gal´axias, interagem eletromagneticamente emitindo raios-X. Assim, os raios-X nos informam a localizac¸˜ao dos gases (regi˜ao rosa) `a es- querda na Fig.(2.6).

A terceira componente, a ME, composta por part´ıculas fracamente interagentes, simples- mente atravessa o outro aglomerado. Sua localizac¸˜ao pode ser inferida por meio de lentes gravitacionais, que determina a posic¸˜ao do centro de massa conforme pode ser visto na foto do meio na Fig.(2.6).

Em suma, na Fig.(2.6) `a esquerda exibimos a emiss˜ao em raios-X observada pelo Chanda (em rosa), enquanto na imagem do meio vemos a localizac¸˜ao do centro de massa por meio de lentes gravitacionais e por ´ultimo (`a direita) a combinac¸˜ao das duas.

Nesta imagem `a direita podemos observar que o centro gravitacional est´a deslocado dos gases quentes observados via a emiss˜ao de raios x. Portanto, o aglomerado da bala nos ensina

que o centro de massa est´a bastante distante da localizac¸˜ao dos b´arions e que a ME, al´em de compor a maior componente de mat´eria nestes aglomerados, ´e de fato fracamente interagente.

Mais ainda, esta observac¸˜ao exclui teorias sem ME conhecidas como Dinˆamica Newtoni- ana Modificada (MOND), que predizem que o centro de massa estaria associado aos b´arions, em total contradic¸˜ao com a observac¸˜ao do Chandra [15]. ´E importante mencionar que exis-

Figura 2.6: Observac¸˜ao do aglomerado da bala pelo Chandra. A esquerda (em rosa) a` localizac¸˜ao dos b´arions via raios-X. No meio a localizac¸˜ao do centro de massa por meio de lentes gravitacionais. A direta a junc¸˜ao de ambas, demostrando a defasagem entre o cen-` tro de massa e localizac¸˜ao dos gases quentes em amarelo. Figura dispon´ıvel no enderec¸o: http://www.physics.monash.edu.au/assets/images/bullet-cluster-square.jpg.

tem observac¸˜oes recentes similares ao aglomerado da Bala conhecidas como MACS J0025.4- 1222 [16] e Pandora [17], que similarmente ao aglomerado da Bala fornecem uma fort´ıssima evidˆencia de ME.

2.1.6

Radiac¸˜ao C´osmica de Fundo

A Radiac¸˜ao C´osmica de Fundo (CMBR) ´e um sinal na faixa de micro-ondas do espectro eletromagn´etico (invis´ıvel a olho nu) que banha nosso Universo isotropicamente, e com um espectro de radiac¸˜ao de corpo negro a uma temperatura de T0= 2.725K.

Uma vez que nosso Universo est´a em expans˜ao, observar objetos distantes ´e o mesmo que olhar para o passado. Astrˆonomos, utilizando o telesc´opio Hubble, podem apenas observar gal´axias a um redshift da ordem de z ∼= 5, enquanto a CMB foi formada a um redshift de z = 1100 (T ∼ 3000K), ´epoca muito anterior `a formac¸˜ao de gal´axias. Assim, estudando as propriedades

f´ısicas da CMB, podemos extrair informac¸˜oes preciosas do Universo primordial.

Hoje sabemos que essa radiac¸˜ao n˜ao ´e perfeitamente isotr´opica e possui pequenas anisotro- pias da ordem de 10−5K, que possuem informac¸˜oes preciosas sobre a distribuic¸˜ao de mat´eria do Universo, quando a mesma foi produzida.

De acordo com a teoria do Big Bang, o espectro da CMB deveria ser do tipo corpo negro, como pode ser visto nas referˆencias [18]-[19]. A derivac¸˜ao desse resultado est´a muito al´em do foco desta tese e portanto recomendamos o leitor a consultar as referˆencias acima mencionadas, para maior detalhes.

O fato importante ´e que o chamado espectro de potˆencia da CMB, que exibe as flutuac¸˜oes de temperatura (∆T ) no c´eu em func¸˜ao do ˆangulo observado (θ ) depende fortemente da abundˆancia de ME no Universo.

Veremos adiante, de forma clara, como inferimos a abundˆancia de ME analisando o espectro de potˆencia da radiac¸˜ao c´osmica de fundo.

Observe, na Fig.(2.7), a diferenc¸a entre o espectro de potˆencia observado e o predito pelo modelo do Big Bang quando supomos um Universo dominado por ME com as seguintes abundˆancias: Ωb= 5% (b´arions), ΩME = 74% (mat´eria escura) e ΩEE = 22% (energia escura). Note que o espectro observado ´e completamente diferente do predito teoricamente (em verde). Agora ob- serve o perfeito acordo na Fig.(2.8) quando usamos Ωb≃ 5%, ΩME ≃ 22% e ΩEE ≃ 74%. Ou seja, a abundˆancia de ME ´e inferida quando tentamos reproduzir a curva observada da CMB. Em suma, a radiac¸˜ao c´osmica de fundo al´em de exigir a presenc¸a de ME no nosso Universo, requer que a mesma componha 22% da abundˆancia total. Portanto, similarmente as evidˆencias anteriores, a CMB afirma que a ME ´e a componente de mat´eria mais abundante do Universo

Figura 2.7: A curva vermelha ´e o espectro de potˆencia da CMB observado. A curva em verde ´e espectro de potˆencia da CMB para um universo com Ωb≃ 5%, ΩME≃ 0% e ΩEE ≃ 95%.

Figura 2.8: A curva vermelha ´e o espectro de potˆencia da CMB observado. A curva verde ´e espectro de potˆencia da CMB para um Universo com Ωb≃ 5%, ΩME≃ 22% e ΩEE ≃ 74%. com,

EEh2≃ 0.376, (2.22)

bh2≃ 0.02253, (2.23)

MEh2≃ 0.1103. (2.24)

At´e o momento vimos que a ME ´e a componente mais abundante de mat´eria do Universo. Veremos adiante esta mat´eria desempenha um papel fundamental no processo de formac¸˜ao de estruturas.