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2.2 O TRATAMENTO DA INCAPACIDADE NO DIREITO BRASILEIRO

2.2.2 O S INSTITUTOS DE PROTEÇÃO DOS INCAPAZES

2.2.2.2 A DISCIPLINA JURÍDICA DA CURATELA

2.2.2.2.1 D A AUSÊNCIA

Há de se comentar, neste trabalho, a morte presumida, uma vez que tange o instituto da curatela. A morte presumida é o estágio final da ausência, que, nas palavras de Orlando Gomes, seria:

[...] o estado de quem desapareceu do seu último domicílio, sem ter deixado representante. Ausente, a pessoa de quem se desconhece o paradeiro, de quem não

se sabe se está vivo ou morto. O conceito jurídico não coincide, assim, com o sentido vulgar da palavra.59

No Direito brasileiro, a declaração de morte do ausente obedece a certos requisitos legais, os quais estipulam um prazo para esse reconhecimento. São reconhecidos três períodos que se sucedem: o primeiro, o de ausência presumida, no qual a presunção de existência é mais forte do que a suspeita de morte; o segundo, o de ausência declarada, no qual as presunções de contrabalanceiam; o terceiro, o de morte presumida, no qual a presunção de morte supera a de existência.

Aqueles períodos são importante devido ao fato de que a disciplina legal varia em conformidade a eles. No primeiro período, a gama de interesses do ausente, bem como a das pessoas a ele relacionadas, determinam que se nomeie curador provisório. No segundo, a ausência é declarada judicialmente, abrindo-se a sucessão provisória. Por fim, no terceiro, é iniciada a declaração de morte presumida e a abertura da sucessão definitiva.

A proteção do ausente passa pelos seguintes requisitos: o desaparecimento da pessoa do seu domicílio ou residência sem que se saiba onde está; a necessidade de regência de seus bens; o requerimento de qualquer interessado ao juiz para nomeação de curador; a verificação judicial, de caráter sumário, da existência dos dois primeiros requisitos já citados; a nomeação de curador provisório. Esse é o teor do art. 22, do Código Civil, in verbis:

Art. 22. Desaparecendo uma pessoa do seu domicílio sem dela haver notícia, se não houver deixado representante ou procurador a quem caiba administrar-lhe os bens, o juiz, a requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Público, declarará a ausência, e nomear-lhe-á curador.

Também será declarada a ausência, e será nomeado curador, quando o ausente deixar mandatário que não queira ou não possa exercer ou continuar o mandato, ou se os seus poderes forem insuficientes – art. 23, do Código Civil60.

A curadoria provisória é deferida, preferencialmente, ao cônjuge, e, na sua falta, sucessivamente, aos ascendentes (pais) e descendentes, os mais próximos precedendo os mais remotos, nos termos do art. 25, §§ 1º e 2º, do Código Civil, ipsis litteris:

Art. 25. O cônjuge do ausente, sempre que não esteja separado judicialmente, ou de fato por mais de dois anos antes da declaração da ausência, será o seu legítimo curador.

§ 1º Em falta do cônjuge, a curadoria dos bens do ausente incumbe aos pais ou aos descendentes, nesta ordem, não havendo impedimento que os iniba de exercer o cargo.

59 GOMES, Orlando. Op. cit., p. 130.

60 Art. 23. Também se declarará a ausência, e se nomeará curador, quando o ausente deixar mandatário que não

§ 2º Entre os descendentes, os mais próximos precedem os mais remotos.

Caso não existam, o curador será indicado pelo juiz, quando, então será chamado de curador dativo – art. 25, § 3º, do Código Civil61 –, em contraposição, ao curador legítimo, ambos com os mesmo poderes e deveres. Deve o curador (dativo ou legítimo) representar o ausente judicial e/ou extrajudicialmente, além, é claro, de prestar contas de seu múnus.

Perdurando o estado de incerteza e decorrido 01 (um) ano da arrecadação dos bens do ausente, ou, se deixou representante ou procurador, em se passando 03 (três) anos, poderão os interessados requerer que se declare a ausência e se abra provisoriamente a sucessão – art. 26, do Código Civil62. O próprio Código Civil estabelece o rol de interessados, in verbis:

Art. 27. Para o efeito previsto no artigo anterior, somente se consideram interessados:

I - o cônjuge não separado judicialmente;

II - os herdeiros presumidos, legítimos ou testamentários;

III - os que tiverem sobre os bens do ausente direito dependente de sua morte; IV - os credores de obrigações vencidas e não pagas.

Orlando Gomes leciona:

[...] A declaração judicial de ausência pressupõe duração contínua do período inicial em que é presumida. Emite-a o juiz, em sentença que não faz coisa julgada e, de regra, somente se torna eficaz algum tempo após a publicação.

Os efeitos da declaração alcançam tanto a esfera patrimonial como pessoal do ausente, atingindo profundamente sua condição jurídica. Produzem-se alguns automaticamente, enquanto outros demandam provocação do interessado.63

Esse “algum tempo após a publicação” da sentença, mencionado por Orlando

Gomes, é de 180 (cento e oitenta) dias, nos termos do art. 28, caput, do Código Civil, abaixo colacionado:

Art. 28. A sentença que determinar a abertura da sucessão provisória só

produzirá efeito cento e oitenta dias depois de publicada pela imprensa; mas,

logo que passe em julgado, proceder-se-á à abertura do testamento, se houver, e ao inventário e partilha dos bens, como se o ausente fosse falecido.

§ 1º Findo o prazo a que se refere o art. 26, e não havendo interessados na sucessão provisória, cumpre ao Ministério Público requerê-la ao juízo competente.

§ 2º Não comparecendo herdeiro ou interessado para requerer o inventário até trinta dias depois de passar em julgado a sentença que mandar abrir a sucessão provisória, proceder-se-á à arrecadação dos bens do ausente pela forma estabelecida nos arts. 1.819 a 1.823.

61 Art. 25. [...]

§ 3o Na falta das pessoas mencionadas, compete ao juiz a escolha do curador.

62 Art. 26. Decorrido um ano da arrecadação dos bens do ausente, ou, se ele deixou representante ou procurador,

em se passando três anos, poderão os interessados requerer que se declare a ausência e se abra provisoriamente a sucessão.

Da leitura do art. 28, do Código Civil, nota-se que o principal efeito patrimonial da declaração da ausência é abertura da sucessão provisória. É de se reparar que, porque a sucessão é provisória, os herdeiros, excetuando-se os ascendente, descendente e o cônjuge, devem dar garantias para se imitirem na posse dos bens do ausente, conforme preleciona o art. 30, do Código Civil:

Art. 30. Os herdeiros, para se imitirem na posse dos bens do ausente, darão

garantias da restituição deles, mediante penhores ou hipotecas equivalentes aos quinhões respectivos.

§ 1º Aquele que tiver direito à posse provisória, mas não puder prestar a garantia exigida neste artigo, será excluído, mantendo-se os bens que lhe deviam caber sob a administração do curador, ou de outro herdeiro designado pelo juiz, e que preste essa garantia.

§ 2º Os ascendentes, os descendentes e o cônjuge, uma vez provada a sua qualidade de herdeiros, poderão, independentemente de garantia, entrar na posse dos bens do ausente.

Dessa forma, reaparecendo o ausente, ou apresentando-se prova de sua existência, cessam todas as vantagens dos herdeiros, devendo estes restituir àquele os bens em cuja posse provisória se achavam imitidos. Trata-se, portanto, de sucessão resolúvel. Esse é o teor do art. 36, do Código Civil, in verbis:

Art. 36. Se o ausente aparecer, ou se lhe provar a existência, depois de estabelecida a posse provisória, cessarão para logo as vantagens dos sucessores nela imitidos, ficando, todavia, obrigados a tomar as medidas assecuratórias precisas, até a entrega dos bens a seu dono.

Enfim, tem-se a declaração de morte presumida, com a consequente abertura da

sucessão definitiva. Ela só ocorrerá “dez anos depois de passada em julgado a sentença que concede a abertura da sucessão provisória”64

, podendo, então, os interessados requerer a sucessão definitiva e o levantamento das cauções prestadas. A declaração judicial de morte presumida substitui a prova de óbito. Também poder-se-á requerer a sucessão definitiva

“provando-se que o ausente conta oitenta anos de idade, e que de cinco datam as últimas notícias dele”65

.

Quanto ao retorno do ausente após a abertura da sucessão definitiva, estabelece o art. 39, do Código Civil:

Art. 39. Regressando o ausente nos dez anos seguintes à abertura da sucessão

definitiva, ou algum de seus descendentes ou ascendentes, aquele ou estes haverão só os bens existentes no estado em que se acharem, os sub-rogados em seu lugar, ou o preço que os herdeiros e demais interessados houverem recebido pelos bens alienados depois daquele tempo.

64 Art. 37, da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil). 65 Art. 38, da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).

Parágrafo único. Se, nos dez anos a que se refere este artigo, o ausente não regressar, e nenhum interessado promover a sucessão definitiva, os bens arrecadados passarão ao domínio do Município ou do Distrito Federal, se localizados nas respectivas circunscrições, incorporando-se ao domínio da União, quando situados em território federal.

No que tange à esfera pessoal do ausente, os efeitos da declaração de morte presumida se fazem sentir mormente no campo do direito de família, podendo ser citados: a dissolução da sociedade conjugal, a partilha de bens comuns, a possibilidade de adoção de eventuais filhos, a extinção do vínculo matrimonial.

3MUDANÇA DE PARADIGMANO TRATAMENTO DA INCAPACIDADEE SUA

INFLUÊNCIANOINSTITUTODACURATELA

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