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Da análise do Superior Tribunal de Justiça

CAPÍTULO III A EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ENTRE PARTICULARES

3.1 DA ACEITAÇÃO DA EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ENTRE PARTICULARES NA

3.2.2 Dos Tribunais Superiores

3.2.2.2 Da análise do Superior Tribunal de Justiça

São raros os julgados encontrados no âmbito do Superior Tribunal de Justiça em relação à aplicabilidade dos direitos fundamentais sobre o Direito Privado e seus sujeitos, mesmo em face do fato de as questões constitucionais serem de competência eminentemente do Supremo Tribunal Federal.215

Ainda assim, encontram-se exemplos citados na doutrina em relação a este assunto neste Tribunal Superior.

Em julgado do dia 1º de dezembro de 1999, no Resp 235.678/SP216, julgado pela 4ª turma do STJ, em que se discutia a aplicação da Convenção de Varsóvia para a fixação de dano moral, como se pode observar a seguir:

215

Não obstante tal fato, para a autora Jane Reis Gonçalves Pereira, no Superior Tribunal de Justiça a questão tem sido abordada de forma bem mais explícita. PEREIRA, 2006, p. 485.

216

Ementa

TRANSPORTE AÉREO. Atraso. Viagem internacional. Convenção de Varsóvia. Dano moral. Código de Defesa do Consumidor. O dano moral decorrente de atraso em viagem internacional tem sua indenização calculada de acordo com o CDC. Demais questões não conhecidas. Recurso dos autores conhecido em parte, e, nessa parte, parcialmente provido. Recurso da ré não conhecido.

Acordão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso de Tower Air Incorporation e conhecer em parte do recurso de José Roberto Pernomian Rodrigues e outros e, nessa parte, dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, BARROS MONTEIRO e CESAR ASFOR ROCHA. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR,

Resumo Estruturado

APLICAÇÃO, CDC, FIXAÇÃO, INDENIZAÇÃO, DANO MORAL, AFASTAMENTO, CONVENÇÃO DE VARSOVIA, HIPOTESE, ATRASO, VOO INTERNACIONAL, EXTRAVIO, DEMORA, DEVOLUÇÃO, BAGAGEM, NULIDADE, CLAUSULA, RESTRIÇÃO, DIREITO, PASSAGEIRO, CULPA PRESUMIDA, TRANSPORTADOR, NECESSIDADE, DECLARAÇÃO,

VALOR, BAGAGEM, OBJETIVO, FIXAÇÃO, LIMITE,

RESPONSABILIDADE, EMPRESA, TRANSPORTE AEREO.217

O Ministro Relator Ruy Rosado de Aguiar decidiu pela aplicação do Código de Defesa do Consumidor, afirmando que o princípio da igualdade serve de parâmetro interpretativo dos dispositivos legais, incluindo cláusulas que estabeleçam nítida desigualdade entre as partes, criando situações de verdadeira exoneração da responsabilidade em favor do transportador.218

A aplicabilidade direta do direito fundamental de igualdade como parâmetro de interpretação no caso mencionado demonstra uma aplicabilidade incidental dos direitos fundamentais em relação a legislação consumeirista como se pode observar.

Além da proteção ao consumidor prevista na Constituição, que culminou no microssistema de defesa do consumidor, a turma julgadora do Recurso Especial decidiu por aplicar como vetor de interpretação o princípio insculpido no direito fundamental.

217

O inteiro teor do Acórdão pode ser observado no site:

http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/375718/recurso-especial-resp-235678-sp-1999-0096670-8- stj.

218

Isso porque a parte vulnerável, ou seja, o consumidor, deverá ser protegida do desequilíbrio que tem em relação ao fornecedor. Se os instrumentos legais forem insuficientes ou conflitantes, utiliza-se de tais parâmetros de interpretação e julgamento para a configuração da justiça.

Em junho de 2000, mais uma vez a 4ª Turma do STJ proferiu decisão em HC nº 12.547-DF219

, debatendo especificamente a questão da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais.

A questão tratava de prisão civil em contrato de alienação fiduciária em razão de aumento absurdo do valor contratado, violando o princípio da dignidade da pessoa humana, em face da possibilidade da imposição de prisão do devedor em face do inadimplemento do contrato. Isto considerando os juros e a inflação à época. Assim visto na ementa in verbis:

HABEAS CORPUS. Prisão Civil. Alienação fiduciária em garantia. Princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Direitos fundamentais da igualdade e liberdade. Cláusula geral dos bons costumes e regra de interpretação da lei segundo os seus fins sociais, decreto de prisão civil da devedora que deixou de pagar dívida bancária assumida com a compra de um automóvel-taxi, que se elevou, em menos de 24 meses, de R$ 18.700,00 para R$ 86.858,24, a exigir que o total da remuneração da devedora, pelo resto do tempo provável de vida, seja consumido com o pagamento dos juros. Ofensa ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, aos direitos de liberdade de locomoção e de igualdade contratual e aos dispositivos da LICC sobre o fim social da lei e obediência aos bons costumes.

Arts. 1º, III, 3º e 5º, caput, da CR. Arts. 5º e 17 da LICC. DL 911/67. Ordem deferida.

Em julgado publicado em 2001, nos autos do Resp 249.321220, mais uma vez o STJ voltou a tratar da incidência da dignidade da pessoa humana e da igualdade dentro da incidência do direito do consumidor, quando da análise de cláusula de indenização tarifada em caso de responsabilidade civil do transportador aéreo:

Ementa

RESPONSABILIDADE CIVIL. Transporte aéreo doméstico. Extravio de mercadoria. A indenização deve ser calculada pela legislação comum. Primeiro recurso conhecido e provido, e não conhecido o segundo.

CABIMENTO, EMPRESA, TRANSPORTE AÉREO, INDENIZAÇÃO, INTEGRALIDADE, PASSAGEIRO, DANO MATERIAL, HIPÓTESE, EXTRAVIO, DANO, OBRA ARTÍSTICA, APLICAÇÃO, CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, OBSERVÂNCIA, RELAÇÃO DE CONSUMO, AFASTAMENTO, CLÁUSULA ABUSIVA, CONVENÇÃO INTERNACIONAL,

219

Julgado citado por SARMENTO, 2006b, p. 253-254 e por LENZA, 2009, p. 677.

220

PREVISÃO, LIMITE, RESPONSABILIDADE TARIFADA,

IMPOSSIBILIDADE, PRIVILÉGIO, TRANSPORTADOR,

CARACTERIZAÇÃO, VIOLAÇÃO, PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL, IGUALDADE.

Em 2004, o Superior Tribunal de Justiça mais uma vez enfrentou questão envolvendo o princípio básico da dignidade da pessoa humana, mais especificadamente em relação ao direito fundamental à moradia, no REsp 450.989/RJ.

No caso, deu-se uma interpretação ao art. 1º da Lei nº 8.009/90, Lei da impenhorabilidade do bem de família, consoante a interpretação a partir da constituição, estendendo o conceito de bem de família para uma pessoa apenas, que seja solteira e more sozinha, possuindo direito a impenhorabilidade de seu imóvel.

O fundamento da lei, assim, sua ratio, seria a proteção da dignidade da pessoa humana em seu direito à moradia, e não à família em si. Assim, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça reformou a decisão do Tribunal carioca, que considerava o dispositivo restritivamente, como assim se pode observar:

"PROCESSUAL -EXECUÇÃO - IMPENHORABILIDADE -IMÓVEL - RESIDÊNCIA -DEVEDOR SOLTEIRO E SOLITÁRIO -LEI 8.009/90. - A interpretação teleológica do Art. 1º, da Lei 8.009/90, revela que a norma não se limita ao resguardo da família. Seu escopo definitivo é a proteção de um direito fundamental da pessoa humana: o direito à moradia. Se assim ocorre, não faz sentido proteger quem vive em grupo e abandonar o indivíduo que sofre o mais doloroso dos sentimentos: a solidão. - É impenhorável, por efeito do preceito contido no Art. 1º da Lei 8.009/90, o imóvel em que reside, sozinho, o devedor celibatário."(EREsp 182.223- SP, Corte Especial, DJ de 07/04/2003).

IMPENHORABILIDADE, IMÓVEL RESIDENCIAL, DEVEDOR, PESSOA SOLTEIRA, APLICAÇÃO, INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA, ARTIGO, LEI FEDERAL, 1990, NECESSIDADE, GARANTIA, DIREITO FUNDAMENTAL, DIREITO A MORADIA, AFASTAMENTO, INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA.221

Recentemente, em março de 2007, o Superior Tribunal de Justiça analisou o sopesamento dos princípios da liberdade e os direitos da personalidade, pelos quais

221

O Acórdão pode ser lido, na íntegra, no site

ensejaram indenização por danos morais, no bojo do Recurso Especial nº 818.764/ES, assim trazido à baila:

RECURSO ESPECIAL - RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO MORAL - DIREITO DE INFORMAÇÃO - ANIMUS NARRANDI - DIREITO À HONRA - DISCUSSÃO VEDADA NESTA SEARA - REEXAME DE PROVA - INADMISSIBILIDADE - SÚMULA 07/STJ - DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL - QUANTUM INDENIZATÓRIO - POSSIBILIDADE DE REVISÃO PELO STJ - VALOR QUE EXTRAPOLA OS LIMITES DO RAZOÁVEL - INEXISTÊNCIA - MANUTENÇÃO DO MONTANTE FIXADO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS - RECURSO NÃO CONHECIDO.

1. A responsabilidade civil decorrente de abusos perpetrados por meio da imprensa abrange a colisão de dois direitos fundamentais: a liberdade de informação e a tutela dos direitos da personalidade (honra, imagem e vida privada). A atividade jornalística deve ser livre para informar a sociedade acerca de fatos cotidianos de interesse público, em observância ao princípio constitucional do Estado Democrático de Direito; contudo, o direito de informação não é absoluto, vedando-se a divulgação de notícias falaciosas, que exponham indevidamente a intimidade ou acarretem danos à honra e à imagem dos indivíduos, em ofensa ao fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana.

2. No que pertine à responsabilidade pelo dano cometido através da imprensa, o Tribunal a quo, ao apreciar as circunstâncias fático-probatórias, entendeu pela caracterização do dano moral, assentando que o recorrente abusou do direito de transmitir informações através da imprensa. Maiores digressões sobre o tema implicariam o reexame da matéria probatória, medida absolutamente vedada na via estreita do recurso especial, a teor da Súmula 07 desta Corte. Precedentes.

3. No que se refere à reparação por danos morais, tem-se que o valor arbitrado judicialmente não escapa ao controle do STJ, conforme remansosa jurisprudência desta Corte. Precedentes.

4. A lesão a direitos de natureza moral merece ser rechaçada mediante a fixação de indenização que repare efetivamente o dano sofrido, notadamente quando se trate de autoridade pública ocupante de cargo relevante na estrutura do Poder Judiciário Estadual, de modo que o patamar mantido pelo Tribunal a quo merece ser prestigiado. Precedentes.

5. Recurso especial não conhecido