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CAPÍTULO II – SOBRE A EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ENTRE

2.2 POSICIONAMENTO

Os direitos fundamentais, por sua fundamentalidade ao ser humano, ou seja, pelo seu fundo humanitário, não pode ter condicionamento, dentro de um ordenamento garantista, pela plenitude dos direitos humanos, dando plenitude ao aforisma de que o direito deve servir ao homem, e não o homem ao direito.

163 Nesse sentido, o autor afirma que não se pode simplesmente trocar os destinatários dos direitos

fundamentais, uma vez que ambos são seus titulares. ALEXY, ibid., p. 520.

164

ALEXY, ibid., p. 522, em relação a objeção de que todo efeito imediato em terceiros conduz a uma eliminação ou limitação da autonomia privada, afirma que a própria autonomia, não só sua limitação, é objeto de garantias jusfundamentais e, portanto, do efeito em terceiros.

165

Voltando-se à questão do garantismo do ordenamento, como ocorre no ordenamento brasileiro, o pensamento da doutrina de Luigi Ferrajoli amolda-se perfeitamente. Não apenas em relação ao Direito penal, como é conhecido o ilustre autor criminal, como na teoria geral do Direito, incluindo-se o direito privado.166

Esta função de “garantia” dentro do Estado Democrático de Direito é de tamanha importância dentro da complexidade da estrutura formal na Constituição, que no ordenamento de uma Constituição rígida é duplamente protegido por normas procedimentais e normas substanciais, estabelecendo como o dever ser da sociedade poderá tornar-se efetivo.

Garantia, na visão de Luigi Ferrajoli, nada mais é do que as técnicas previstas pelo ordenamento para reduzir o abismo estrutural entre a normatividade (o dever- ser) e a efetividade (o ser), e, portanto, para possibilitar a máxima eficácia dos direitos fundamentais em coerência com sua estipulação constitucional.167

Assim, pondera o mencionado autor, que o sistema garantista (aqui aplicado não somente no âmbito penal, mas sim espraiado em todo os ramos do Direito, considerando os bens constitucionalmente tutelados em sua integralidade), consubstancia-se em um sistema de legalidade que esta dupla finalidade confere um papel de garantia em relação ao Direito ilegítimo.

Desta forma, o sistema de um ordenamento jurídico garantista vincula-se normativamente aos princípios e aos valores substanciais insculpidos em sua Constituição, tais como o destaque aos valores éticos e ao fundamento maior da humanidade: a dignidade da pessoa humana168.

Assim, ressalta-se, por oportuno, o pensamento do referido autor, que o paradigma do Estado Constitucional de Direito, ou seja, o modelo garantista ora exposto, não é outra coisa do que esta dupla sujeição do direito ao direito, que afeta ambas as dimensões de todo o fenômeno normativo: a vigência e a validade, a forma e a substância, a legitimação formal e a legitimação substancial169

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166

FERRAJOLI, Luigi. Derechos Y Garantias: la lei del más débil. 2. ed. Madrid: Trotta, 2001. p. 19.

167

FERRAJOLI, op. cit. p. 25.

168

FERRAJOLI, 2005, p. 19-20. Cabe gizar que o garantismo penal adquiriu repercussões maiores devido à doutrina eminentemente penalista de Ferrajoli, bem como os bens jurídicos tutelados serem os direitos mais fundamentais atingidos em seu mais alto grau, o que não obsta, em uma análise, por exemplo, no processo civil, que a liberdade de um indivíduo seja maculada, diminiuindo sua plenitude: o que irá variar é o grau de vilipêndio a que estará relegada em caso de descumprimento do processo de base garantista.

169

O Direito privado não fugiria a esta regra. Estaria subordinado ao sujeito maior, que seriam os direitos e garantias fundamentais constantes da Carta Magna do Estado. Garantias e direitos estes que vinculariam ao Estado e a todos, como forma de efetividade de tais garantias.

Desta forma, considerando a pessoa humana como destinatária de todos os direitos fundamentais, o sistema garantista visa a assegurar, com veemência, a todos que seus direitos fundamentais sejam preservados, criando vínculos de substância, e não apenas de forma com a Constituição.

Desta forma, pode-se deduzir que, uma vez em não configurando realmente os ditames constitucionais como verdadeiros sistemas garantidores dos enunciados constitucionais, não haverá Direito propriamente dito. Isso porque Ferrajoli ressalta que um direito não garantido não é um verdadeiro Direito.170

A garantia, desta forma, deve advir não apenas do Estado, como consubstanciar norma de conduta. O condicionamento da liberdade é necessário por questão da própria segurança jurídica, de forma a realizar o fim último do direito que é a harmonização social, e acima de tudo, garantir a dignidade de todos os seus integrantes.

A eficácia direta e imediata, assim, é vital a um Estado Democrático de Direito, bem como condição de asseguração de seu status de Estado garantista, como propõe a Constituição Federal do Brasil de 1988.

Nas palavras de Daniel Sarmento171, a teoria da eficácia imediata, além de necessária, não é incompatível com os efeitos decorrentes das demais teorias, mas apenas agrega a elas um relevo prático.

170

FERRAJOLI, ibid., p. 59.

171

Ora, na teoria poderia parecer plausíveis todas as objeções172 a eficácia direta e imediata dos direitos fundamentais em face de particulares. Porém, nos casos concretos, ou “casos difíceis” nas palavras de Dworkin, as teorias opositoras da eficácia direta seriam insuficientes para a concretização dos ideais de justiça e eficácia da dignidade da pessoa humana.

Desta forma, as demais teorias poderiam servir como um plus, como uma forma de auxiliar a concreção dos direitos fundamentais, mas não a única, de forma a ter de se admitir que, principalmente em países de modernidade tardia como o Brasil, a inclinação favorável a esta teoria faz-se necessária.

Obviamente tal eficácia direta não pode imperar soberanamente, de modo a desequilibrar o princípio republicano da separação dos poderes, tampouco pôr a lei infraconstitucional em segundo plano.

A aplicabilidade direta dos direitos fundamentais deve ser realizada com determinados critérios de razoabilidade e proporcionalidade.

A teoria da eficácia imediata dos direitos fundamentais no Brasil, em face de sua premente necessidade, vem ganhando adeptos, inclusive no âmbito dos tribunais superiores, como se poderá observar no próximo capítulo.

172

SARMENTO, op. cit. p. 239-244. O autor citou as principais objeções feitas contra a teoria da eficácia imediata, as quais analisa serem todas improcedentes. A saber: a) a vinculação direta comprometeria em demasia a autonomia privada; b) ela é antidemocrática, pois confere poderes excessivos ao juiz; c) gera insegurança jurídica, pela aplicação de princípios vagos; d) pondo em risco a autonomia privada, estaria também arriscada a identidade do Direito Privado. Basicamente, as objeções se centram na questão da autonomia privada, tida como um dos pilares do Direito Privado, e a questão da segurança jurídica por conceder uma margem de interpretação maior ao julgador. Basicamente, o autor mencionado refuta tais críticas à teoria da eficácia direta e imediata afirmando que a questão da restrição da autonomia privada, como qualquer direito fundamental, como o da liberdade, é um problema de ponderação, considerando que não são direitos absolutos, principalmente porque “só existe efetivamente autonomia privada quando o agente desfrutar de mínimas condições materiais de liberdade”. Ademais, quanto à possível “antidemocracia”, Sarmento aduz, em linhas gerais, que “o respeito aos direitos fundamentais, como demonstra a teoria do discurso, é um pressuposto material da própria democracia”. Óbvio, a possibilidade do debate, opinião e adequação ao caso concreto conforme parâmetros sociais consubstancia o princípio democrático, e não o aniquila. Em relação à perda da identidade e autonomia do direito privado, destaca o fenômeno da constitucionalização do Direito Privado, alegando que no Brasil esse fenômeno não é sequer uma escolha do intérprete, pois a Constituição dedicou-se a disciplinar em linhas gerais inúmeros institutos de direito privado, como a personalidade, a família e a propriedade.

CAPÍTULO III - A EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ENTRE