• Nenhum resultado encontrado

Parte II – Trabalho de investigação

Capítulo 2 – Revisão da literatura

2.2 A Escola como impulsionadora da leitura

2.2.3 Da Educação Literária à Literatura de Tradição oral e de promoção

Ao longo dos tempos surgiram nas diversas regiões, histórias e lendas criadas pelos povos e que depois eram contadas e recontadas oralmente. Estas histórias anónimas fazem hoje parte da literatura oral popular e tradicional. Saraiva (1950, p.124) refere:

Depois de ouvir a história do santo da festa e dos milagres, contado pelos pregadores, o camponês das romarias ou peregrinações escutava muitas vezes ao

ar livre o jogral, que tocava, cantava e bailava, mostrava o macaco dançarino (…) recitava poemas ou cantava notícias de longínquas e extraordinárias terras.

Estes contos orais permitiram ao homem, ao longo dos séculos, transmitir conhecimentos, vivências e a partilha de memórias com as gerações seguintes.

A literatura de tradição oral faz parte do património imaterial e é indiscutível a sua importância ao nível literário, social e cultural de uma nação; por esse motivo, é fundamental incentivar as crianças e jovens a terem conhecimentos deste tipo de textos. Este tipo de textos perdura ao longo dos anos, passando de geração em geração, sem descurar uma missão socializadora, pedagógica e lúdica, pois permite o conhecer cultural e social de outrora. Contudo, sendo este texto transmitido de forma oral, as histórias são contadas de maneira diferente, dependendo da arte e do talento de quem as conta. Ou seja, cada narrador dá-lhe um toque pessoal esquecendo ou acrescentando pormenores, surgindo daí o ditado popular “quem conta um conto acrescenta-lhe um ponto”.

Muitos autores, como Perrault em França, Almeida Garrett, Teófilo Braga, José Leite de Vasconcelos, Michel Giacometti em Portugal e os Irmãos Grimm na Alemanha, reconheceram a importância e a riqueza cultural da literatura oral, e publicaram muitas histórias deste tipo literário de modo a evitar o esquecimento destas narrativas ao longo do tempo, como nos lembra.

Ribas (1997, p.5):

torna-se necessário conhecermos a nossa Cultura a Cultura do Povo Português: não apenas aquela cultura erudita, mas, na verdade, a Cultura que os Portugueses criaram ao longo dos séculos e, apoiada na tradição.

Assim, olhemos para a literatura de tradição oral como algo que pertence ao povo e, sendo transmitida ao longo das várias gerações, é alterada/renovada de acordo com as mudanças e gosto popular.

A literatura de tradição oral foi caindo em desuso e no esquecimento devido à alfabetização das classes sociais; se antes era muito valorizada, porque não eram todos os que sabiam escrever e ler, hoje já não verificamos isso.

Quantas vezes não verificamos alunos com dificuldades no cálculo mental ou na fixação de regras gramaticais, ou até na memorização da tabuada? E quantas vezes não vemos idosos, por vezes iletrados, a guardarem na memória as contas da vida, provérbios, lengalengas, contos? Pensando nestes aspetos, devemos olhar para a literatura de tradição oral como um meio de aprendizagem no processo de ensino- aprendizagem.

Além da necessidade de promover os hábitos de leitura, também é necessário fomentar hábitos de narração oral, envolvendo todas as faixas etárias, para que esta riqueza cultural se mantenha e se desenvolva.

É importante ter em consideração que a literatura de tradição oral é uma cultura coletiva e todos nós devemos ser capazes de a preservar, porque, enquanto cidadãos de uma comunidade, temos o dever, a obrigação de descobrir as memórias coletivas antigas que ainda hoje são transmitidas oralmente ou também por meio escrito.

Nos nossos dias, é sabido que vivemos numa cultura digital em que as novas tecnologias estão profundamente presentes e, consequentemente, alteram os comportamentos da população e das sociedades. Hoje temos facilidade em chegarmos à informação e ao conhecimento através da internet. Já se tem falado no risco da uniformização das sociedades e, deste modo, é urgente os países adotarem medidas que permitam a preservação e o respeito das caraterísticas específicasde cada cultura. Acreditamos que é importante fomentar contextos de aprendizagem que promovam a divulgação do património oral junto das crianças e jovens. Mello (2011, p.284, citado por Furtado, 2014, p.1) diz que a literatura de tradição oral traz muitas potencialidades, recordando que

os contos maravilhosos são, como efeito, um espelho mágico, no qual se refletem conflitos, ambivalências, situações ambíguas e algo desesperadas vividas por seres irreais em países perdidos no tempo e no espaço. Convidam a criança à reflexão, ao mergulho interior, à maturação psicológica, à compreensão de que a vida real não existe em conflitos, sem dores, sem problemas, mas intuindo que, por muito sombria, que se apresente a realidade, haverá sempre possibilidades de um desenlace feliz. Deste modo, os contos constituem um meio de evolução espiritual e intelectual pela tomada de consciência de que os problemas não se resolvem por milagre mas na continuidade de um esforço pessoal.

A literatura de tradição oral congrega um conjunto de fatores que a tornam muito rica, pois permite informar, estabelecer laços entre grupos, entre outros e, desta forma, ocupa um lugar privilegiado nas escolas. Moreira (2006) define um conjunto de pontos a ter em consideração, quando se é trabalhado um conto tradicional com crianças e jovens.

Em primeiro lugar, a seleção do conto deve ser feita de acordo com as caraterísticas da turma, isto é, adaptada à “realidade dos destinatários e as finalidades do trabalho a desenvolver” (p. 6). Posteriormente, segue-se o primeiro contacto com o texto e faz-se a leitura do mesmo, com a intervenção do docente dependendo da faixa etária dos alunos e do nível de desenvolvimento dos mesmos. Neste momento, são essenciais a comunicação e a interação oral, que consequentemente ocupa uma grande

parte deste processo. Através deste trabalho oral, descobre-se o significado do conteúdo do conto, a construção de conexões, os contributos orais, entre outros.

O académico, sugere que, num momento posterior, se reforce as aprendizagens com um conjunto variado de atividades, como por exemplo, dramatizações, jogos.

Em suma, é importante ressaltar a importância da literatura de potencial receção infantil, em geral, pois permite desenvolver as competências orais presentes nas MCP, promover o conhecimento da cultura de um povo e, sendo estes texto escritos, ajuda na promoção da leitura.