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dA IndústRIA cultuRAl

No documento Moren Hsu / Unsplash. Volume 1 (páginas 64-67)

Jerem y J . Shapiro / Creativ e Commons

Theodor Adorno e Max Horkheimer.

As tendências representadas pela moda incluem com-portamentos, ideias, opiniões, vestimentas, gestos, linguagens e até doutrinas, que se encontram submetidas a pressões econômicas.

Devemos levar em consideração que, para Adorno e Horkheimer, indústria cultural não é um sinônimo para meios de comunicação. A indústria cultural se refere a um processo que transforma e vulgariza a cultura, representando o domínio técnico sobre a natureza. Paralelamente, a técnica passa a ter domínio do homem à medida em que ultrapassa a esfera econômica e chega ao âmbito da cultura e da subjetividade.

Nesse sentido, é importante nos atermos ao conceito de ideologia. Esse conceito é proveniente da escola marxista de pensamento e significa, para Marx, a maneira pela qual as ideias passam a ser percebidas como elemento fundador da realidade social. Notemos que a ideologia, como um conceito marxiano, retoma a concepção idealista da história e, por isso, é objeto de crítica por parte de Karl Marx. Para Marx, ideologia seria uma falsa consciência da realidade.

No entanto, outros pensadores influenciados pelo pensamento de Karl Marx, sobretudo Lênin, passaram a ter uma outra definição para o conceito de ideologia. Para Lênin e estes pensadores, ideologia constituía qualquer forma de pensamento que ocultasse os reais interesses de uma determinada classe social. No sistema capitalista, a ideologia se presta a produzir um imaginário social que faz com que todos os conflitos de classes sejam ocultados. Desse modo, os interesses das classes dominantes são entendidos como os interesses de toda a sociedade. É sob essa condição que a ideologia cumpre sua função de conservar a dominação de classes, pois naturaliza as desigualdades sociais ao não evidenciar as razões históricas que a formaram. Assim, a ideologia se refere a uma consciência falsa e parcial da realidade social.

Portanto, podemos dizer que a indústria cultural traz consigo todos os elementos característicos do mundo industrial moderno e nele exerce um papel específico: o de portadora da ideologia dominante, a qual outorga sentido a todo o sistema. Há uma forte presença ideológica nos meios de comunicação de massa e nos conteúdos que são veiculados por eles: os mass media se encontram a serviço das elites econômicas capitalistas, que se beneficiam da formação de um público consumidor massificado, passivo e alienado.

Nesse contexto, devemos atentar para uma particularidade do pensamento de Adorno e Horkheimer: para eles, tanto os meios de comunicação quanto a produção cultural – veiculada por tais meios – servem para manipular a audiência, aliená-la e mantê-la subjugada dentro do sistema capitalista. Segundo esses pensadores:

Filme e rádio se autodefinem como indústrias, e as cifras publicadas dos rendimentos de seus diretores gerais tiram qualquer dúvida sobre a necessidade social de seus produtos.

HORKHEIMER, Max; ADORNO, Theodor. A indústria cultural: o iluminismo como mistificação das massas. In: LIMA, Luiz Costa (Org.). Teoria da cultura de massa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990. p. 170. [Fragmento]

No ano de 1920, um grupo de pensadores das ciências humanas – Theodor Adorno, Max Horkheimer, Walter Benjamin e Herbert Marcuse – fundou o Instituto de Pesquisa Social vinculado à Universidade de Frankfurt, na Alemanha, com o intuito de produzir conhecimento sobre a nova realidade social que se construía, desde o final do século XIX, no contexto pós-Revolução Industrial e pós-revoluções burguesas.

O foco desse grupo se encontrava no estudo das sociedades advindas do capitalismo pós-industrial, fortemente marcadas pela presença dos meios de comunicação de massa e pelo prevalecimento da lógica do consumo. Em uma definição simples e direta, a indústria cultural consiste no processo capitalista de transformar a arte e a cultura em mercadorias. Logo, é também o termo utilizado para definir o modo de produzir cultura a partir da lógica de produção industrial. Dessa maneira, mediante a repetição de padrões, a indústria cultural visa à formação de uma estética, ou percepção comum, orientada para o consumismo. Portanto, o propósito de produção da arte passa a ser o lucro.

Adorno e Horkheimer, na obra Dialética do esclarecimento (1985), usaram o conceito “indústria cultural” para contrapor à noção de cultura de massas. Mas qual seria a diferença entre os dois termos? Para Adorno e Horkheimer, a chamada cultura de massa é pensada e produzida para o mercado – porém é apresentada como algo espontâneo –,

como se fosse uma versão contemporânea da cultura popular, ainda que também seja uma mercadoria capitalista. Ao ser orientado para o mercado, todo o processo criativo que envolve a produção de uma obra de arte, por exemplo, perde-se em prol de uma produção mecanizada que conforma o gosto das pessoas.

A arte, ao ser transformada em mercadoria, perde três características essenciais: em vez de ser expressiva, torna-se uma simples mercadoria; em vez de ser criativa, passa a ser repetitiva; e, em vez de ser inovadora, torna- se reprodutiva. Obedientes à lógica do mercado, a arte e a cultura são massificadas e dissipam grande parte de seu valor humano, existencial e social. O potencial revolucionário, inerente à cultura popular, cede espaço para a repetição e para a estagnação, que serão recorrentes no comportamento passivo e resignado que é construído pelos meios de comunicação de massa.

Por esse motivo, Adorno e Horkheimer identificaram o surgimento de uma pseudo-arte: o kitsch. Este corresponde ao produto artístico – criado pela indústria cultural – voltado para o público considerado de elite ou de classe média que almeja um status cultural superior. Porém, o kitsch também é uma mercadoria, tanto quanto os produtos culturais considerados “populares” ou “de massa” voltados para as classes com menor poder aquisitivo. Ou seja, a indústria cultural produz a ilusão de uma divisão de fruição artística, pelo poder econômico, e, com isso, consegue atingir um público amplo e reproduzir as distinções de status e poder vigentes na sociedade.

O mesmo processo de mercantilização das obras de arte é efetuado pela indústria cultural em relação à cultura popular, ao substituir os vínculos espontâneos e profundos da cultura popular por um ideal homogêneo, superficial e rotativo de cultura submetido à transitoriedade e à instantaneidade da moda.

É importante salientar que, para Adorno, o ser humano, nessa indústria cultural, não passa de mero instrumento de trabalho e de consumo. Isto é, o indivíduo não é um sujeito, mas um objeto, cuja capacidade crítica se encontra atrofiada. O indivíduo, ao se ver alijado de sua capacidade crítica, torna-se propenso à influência ideológica dos meios de comunicação. Por exemplo, segundo Adorno, o nazismo se valeu da fragilidade subjetiva dos indivíduos para, a partir de uma intensa propaganda nos meios de comunicação, angariar o apoio dos cidadãos alemães ao regime.

Nessas condições, o indivíduo é tão bem manipulado e submetido a ideologias que até o seu lazer se torna uma extensão do seu trabalho, favorecendo a lógica capitalista e atendendo aos interesses dos grupos dominantes. A indústria cultural, que tem como guia a racionalidade técnica esclarecida, prepara as mentes para um esquematismo oferecido pela indústria da cultura. Assim funciona o clichê: seja no cinema, na televisão, na moda, no jornalismo, há esquemas prontos e disponíveis que podem ser usados sem qualquer comedimento.

A obediência a padrões predeterminados é uma das características centrais da indústria cultural. Facilmente, pode-se observar nos roteiros cinematográficos e nas novelas que: as tramas refletem uma visão extremamente superficial dos conflitos humanos, normalmente acentuando a ação sobre a reflexão, envolvendo dicotomias simplistas e maniqueístas, como “bem” e “mal”, “herói” e “bandido”, e se resolvendo em finais felizes que vendem uma imagem falsa de felicidade.

A explosão dos reality shows, como a franquia Big Brother (em clara alusão à obra distópica 1984, do escritor indo-britânico George Orwell, que previa uma sociedade totalitária controlada por meio da técnica e da ideologia), consolida a noção de Sociedade do Espetáculo, criada pelo filósofo francês Guy Debord, em que a realidade ficcional veiculada pelos meios de comunicação passa a se sobrepor à realidade efetiva, organizando a vida psíquica dos indivíduos e a própria vida social em torno dos valores e da dinâmica ditados pela sociedade de consumo.

Contudo, para Adorno e Horkheimer, existe saída: a formação de indivíduos críticos e conscientes possuidores de ferramentas intelectuais para identificar e resistir à dominação. Isto é, pela educação e pela formação crítica, os indivíduos poderiam deixar de ser meros objetos do mercado e passar a assumir sua condição de sujeitos ativos na vida social. Todavia, os filósofos de Frankfurt sabiam que essa tarefa era, e ainda é, extremamente árdua, especialmente pelo fato dos meios de comunicação de massa responderem por grande parte do processo de socialização dos indivíduos nas sociedades contemporâneas.

Finalizando, a indústria cultural, então, seria uma espécie de sistema político e econômico com o intuito de produzir bens de cultura – filmes, livros, músicas – na qualidade de mercadorias e como estratégias de controle social. Logo, os filmes e músicas, por exemplo, são vendidos não como bens culturais ou artísticos, mas sim como produtos de consumo. Consequentemente, tais mercadorias manteriam os indivíduos alienados da realidade, em vez de auxiliarem na formação de cidadãos mais críticos.

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ubens Lima

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No documento Moren Hsu / Unsplash. Volume 1 (páginas 64-67)

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