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CAPÍTULO 2 – MARCO TEÓRICO

2.2. O INSTITUCIONALISMO DISCURSIVO: A IMPORTÂNCIA DAS IDÉIAS PARA A

2.2.1. Das idéias para a ação

Seguindo o raciocínio de Schmidt (2008;2011) e Blyth (1997) para o ID é tão importante conhecer o conteúdo das ideias quanto o processo através do qual essas ideias são transportadas, adotadas e, por vezes, até adaptadas para se chegar a um resultado institucional de mudança ou continuidade. Como já mencionado, para se compreender as ideias em ação (ou seja, o discurso segundo Schmidt[2008]) e entender como algumas delas tem sucesso em operar mudanças ou a continuidade, é imperativo ao pesquisador olhar para quem as elabora e transporta e como, onde e porque o fazem.

O mais novo dos institucionalismos – o Discursivo - tem avançado na compreensão da dinâmica dos discursos em operar a mudança ou a continuidade. Schmidt (2008; 2011) é uma das autoras mais preocupadas com a questão da agência dentro do campo institucionalista, daí seu esforço em desenvolver como as ideias são operadas pelos agentes. Para ela, para se traçar

o caminho causal de uma ideia na promoção da mudança ou a continuidade institucional é necessário compreender o processo de construção do discurso e de comunicação política nas duas sub-esferas da “esfera pública”, conceito esse que ela empresta de Habermas (apud Schmidt, 2008;2011). A primeira esfera é onde impera o discurso coordenativo. Essa esfera discursiva consiste nos indivíduos e grupos que estão no centro da construção de uma política pública, ou seja, na criação e elaboração de justificativas que provem a importância e conveniência de uma política. É composta pelos atores – como movimentos sociais, organizações da sociedade civil, especialistas, burocratas, agentes políticos eleitos – que buscam construir um consenso acerca das ideias que irão defender. Assim, a esfera do discurso coordenativo é uma esfera de pessoas e grupos que estão conectadas – de forma mais o menos forte - pelo fato de compartilharem ideias comuns acerca de um problema social e das soluções para ele. A esfera do discurso coordenativo também conta com empreendedores ou mediadores, atores capazes de articular os outros agentes e grupos e suas idéias, servindo como catalizadores de mudanças.

Já a esfera do discurso comunicativo consiste em indivíduos e grupos envolvidos na apresentação, deliberação e legitimação das idéias para o público em geral. No processo de comunicação para a sociedade como um todo, líderes políticos, porta-vozes do governo, líderes partidários, especialistas em comunicação e marketing político e outros comunicam e difundem para o público mais amplo as ideias desenvolvidas na esfera coordenativa. As ideias são, então, lançadas para o mundo para discussão. A esfera comunicativa, além dos atores encarregados de difundir as ideias é composta por atores que irão discutir e se posicionar sobre o conteúdo delas. Tratam-se dos membros dos partidos que estejam na oposição, as organizações da mídia, intelectuais, think thanks e movimentos sociais que não participaram da elaboração das ideias na esfera coordenativa. Pode-se dizer que toda a sociedade participa da esfera coordenativa, pois qualquer cidadão pode expressar sua opinião acerca das idéias apresentadas. Os cidadãos comuns podem se organizar contra o estabelecimento de uma ideia nessa esfera ou ainda se expressar por meio de espaços participativos, pesquisas de opinião e, enquanto membros do eleitorado, votar ou deixar de votar em um candidato que defenda a referida ideia. Assim, ao estudar a esfera comunicativa, os institucionalistas discursivos enfatizam o uso das idéias no processo de convencimento das massas.

Schmidt (2008) relata que a produção e comunicação de discursos frequentemente acontece de forma top-down, ou seja, as elites políticas geram idéias que são comunicadas massivamente ao público, entrelaçando as esferas coordenativa e comunicativa. No entanto, o

processo também pode ser de maneira botton-up. Por vezes, pode não haver nenhuma ligação entre as duas esferas. A esfera do discurso coordenativo pode permanencer restrita e nem chegar ao publico mais amplo, ou seja, alguns assuntos podem ficar restritos a essa primeira esfera.

Mark Blyth (2001) também tem trazido elementos para pensar como as ideias se tornam ação social, em especial no campo da economia política. Em seu estudo acerca da emergência e transformação do modelo econômico sueco, o autor, sem deixar de lado os fatores estruturais que concorreram para mudança de paradigma, enfatiza o papel causal que algumas ideias tiveram na conformação desse modelo. O autor mostra que as ideias contestando e deslegitimando instituições existentes começaram o processo de mudança do modelo sueco, antes da ocorrência de fatores estruturais e choques externos.

Respondendo às abordagens preocupadas exclusivamente com os fatores materiais da mudança, Blyth (2001) traz importantes conceituações para pensarmos como as idéias podem atuar na mudança e na continuidade. Assim, examina papel das ideias como operadoras do desenho institucional (institutional design), contestação institucional (institutional contestation) e reforço institucional (institutional reinforcement). Para tal, a idéias são conceitualizadas por ele de três maneiras: enquanto “institutional blueprints” durante períodos de incerteza, “armas” em disputas por recursos e “cognitive locks”.

Ao falar de ideias como institutional blueprints, Blyth (2001) considera que a referência à estrutura, sozinha, não é capaz de predizer o porquê um determinado tipo de instituição ganha força em resposta a uma crise. As ideias são importantes pois são capazes de reduzir as incertezas em tempos de crises de paradigmas e tornar a construção institucional possível. Para o autor, em circunstâncias de grande incerteza, como em épocas de crises estruturais na economia, as ideas se tornam extremente importantes. Ao definir e promulgar ideais acerca de como deve operar o sistema econômico, as ideias econômicas reduzem as incertezas ao explicar o fenômeno e projetar as formas institucionais que darão conta de resolver a crise. Visto dessa perspectiva, o fato dos grupos de interesse gestarem e promoverem ideias se tornam um recurso de poder crucial para promover suas mudanças em período de instabilidades.

Relacionada à noção de blueprints, está a afirmação do autor de ideias enquanto armas na disputa entre os grupos de interesse. Em seu raciocício, se as instituições existentes são resultado de ideas econômicas do passado acerca de como a economia funciona e deve funcionar, então, o desenvolvimento de ideias alternativas é um pré-requisito para mudança institucional. Ao oferecer uma crítica científica e normativa às instituições econômicas

existentes, as ideias enquanto armas na disputa política permitem aos agentes desafiarem os arranjos existentes.

Por fim, a ideias entendidas como cognitive locks, ou “cadeados cognitivos”, aproximam o papel importante das ideias do acarbouço já construído pelo Institucionalismo Histórico. O que Blyth (2001) sugere é que se o path dependency ocorre, conforme defendem os institucionalistas históricos, isso é função também das ideias, que uma vez institucionalizadas, produzem efeitos independentemente das circunstâncias ou atores que as patrocinaram inicialmente. Neste caso, as ideias podem condicionar a trajetória dos arranjos institucionais. Há certas ideias, movidas por think tanks e empreendedores, que tornam os atores sociais “prisioneiros” de esquemas mentais pré-concebidos e tidos como certos.

Todos os autores aqui mecionados levantam a importância das ideias na construção, mudança e continuidade institucional. Schmidt (2008; 2011) enfatiza a contribuição das ideias para os três institucionalismos, apontando o ID como estratégia complementar a eles para explicar a mudança nas instituições. Já Blyth (1997), aponta, de forma mais radical, que as ideias são pré-requisitos para a mudança institucional, enfatizando as grandes rupturas. No caso dos períodos de mudanças radicais nas instituições econômicas estudadas por Blyth (1997), esses estiveram ligados a ideias econômicas críticas que disputavam espaço no cenário da política econômica. Uma vantagem do ID é que ele tem permitido dar maior ênfase à disputa por recursos entre coalizões políticas com desigual distribuição de poder bem como vem sendo utilizado em estudos de agenda setting, elucidando processo de issue definition (Schmidt, 2008; Metha, 2011). Para Schmidt (2008) e Blyth (1997;2001), as idéias também proveem as condições necessárias para ação coletiva dos atores interessados na mudança do status quo. As idéias são capazes de construir pontes entre atores que poderiam estar isolados, mobilizar atores para uma questão e ainda modificar interesses.

Esse autores reforçam que ao pesquisador da mudança institucional mais do que a origem de determinada ideia, importa saber como elas se proliferam e determinam as agendas políticas.

2.3. Modelo do Equilíbrio Pontuado e o Institucionalismo Discursivo: crítica e diálogo