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PSICÓLOGO ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO

3.1 Múltiplos objetivos em uma única expressão “camuflam” aprendizagens a serem desenvolvidas em situações de ensino

3.1.1 Decorrências de formulações de expressões com múltiplas unidades de aprendizagem como um único objetivo de ensino

Os dados apresentados nas Tabelas 3.1, 3.2, 3.3, 3.4 e 3.4B evidenciam problemas com o conceito do que seja uma unidade de objetivo de ensino. Além de o conceito de objetivo ser um problema ainda em aberto, conforme a literatura registra desde a década de 1960, aquilo que é uma unidade é também um problema. Nesse sentido, há o risco de vários falsos objetivos de ensino (Botomé, 1981, 1985) serem usados como se fossem objetivos. No caso dos dados apresentados nas Tabelas 3.1, 3.2, 3.3, 3.4 e 3.4B, ainda antes de examinar a natureza do que é nomeado por objetivos de ensino, sejam gerais, como os que são apresentados na Tabela 3.1, sejam específicos, como aparecem nas Tabelas 3.2 e 3.3, e até mesmo sem especificação, como aparecem nas Tabelas 3.4 e 3.4B, surge o problema do que é considerado como uma unidade de objetivo. Assim, é necessário definir aquilo que é uma unidade de aprendizagem.

O objetivo geral é uma expressão abrangente que define a classe de aprendizagens amplas, e objetivo específico, como aponta o nome, refere-se a uma ou mais classes de aprendizagens intermediárias contidas na expressão ampla (no objetivo geral). Botomé (1981) explicita que um objetivo é um comportamento que a pessoa deve estar apta a realizar em seu meio profissional. Os objetivos identificados em cada unidade de objetivo proposta nos planos de ensino e apresentados em 3.1, 3.2, 3.3, 3.4 e 3.4B não explicitam um âmbito de abrangência mais geral, mas sim uma espécie de aglomerado de expressões nas quais podem ser identificados vários objetivos de ensino. Como estão apresentadas nos planos de ensino, estas não parecem ser úteis para orientar um plano ou programa de ensino nem para ajudar um aluno a identificar o que ele vai aprender ou o que vai desenvolver como aptidão como execução do plano de ensino.

Um objetivo precisa definir uma unidade de comportamento, ou seja, a ação do profissional que explicite uma relação que o sujeito estabelece com as características da situação com a qual a pessoa precisa estar apta a lidar. Porém, os dados das Tabelas 3.1, 3.2, 3.3, 3.4 e 3.4B indicam mais um conjunto de objetivos específicos reunidos em uma única expressão do que uma formulação de um objetivo geral. Nesses casos, parece que a multiplicidade de unidades de objetivo parece ter mais a função de impressionar os alunos sobre a complexidade daquilo que deverão aprender, como também, para impressionar os

alunos sobre a capacidade que o professor responsável pela formulação de tal objetivo tem em ensinar, do que efetivamente orientar acerca daquilo que vai ser ensinado pelo professor. O conjunto de expressões propostas como objetivos de ensino das Tabelas 3.4 e 3.4B evidenciam os problemas de expressões com múltiplos objetivos de maneira muito clara: o que é apresentado ou proposto como unidade contém, na verdade, muitas unidades do que o aluno precisará aprender. Como lidar com isso? De que forma apresentar objetivos gerais sem cair em uma justaposição de aprendizagens dos alunos? A distribuição de objetivos de natureza múltipla, presentes em expressão proposta como objetivo, indica que parece não haver uma atuação que atenda a exigência do conceito de unidade. Nos 49 objetivos de natureza múltipla propostos nos planos de ensino em cursos de psicologia, há 147 unidades de objetivos, considerando que uma unidade de objetivo deveria especificar um tipo de aprendizagem do aluno – o que também é outro conceito complexo e não muito homogêneo na literatura, como examinam Kubo e Botomé (2001).

As unidades 1, 3 e 13, apresentadas na Tabela 3.2 foram expressões formuladas como objetivos de ensino específicos em duas disciplinas distintas. O que isso significa? O aluno deverá aprender duas vezes a mesma coisa? Essa situação vai além dos problemas apresentados por expressões com múltiplos objetivos. Ela evidência a falta de diálogo entre os professores que integram o curso de graduação em psicologia organizacional e do trabalho na universidade “A”, que compromete a formação do psicólogo formado por essa instituição de ensino.

A formulação de objetivos de ensino não é somente uma questão que se reduz a um verbo e um complemento. Independentemente da correção da redação, o que é considerado uma unidade de ensino pelos professores é um aglomerado de unidades de objetivos, levando em conta que o que o aluno precisa ser capaz de fazer é a base do conceito de objetivos de ensino. Objetivos de natureza múltipla não oferecem visibilidade das características necessárias do comportamento a ser desenvolvido pelo trabalho de ensino, nem esclarecem a finalidade do programa de ensino proposto pelo professor. A quantidade de objetivos existentes em cada unidade proposta – variando de 2 a 16 unidades – mais parece um amontoado que obscurece o que efetivamente constitui os objetivos de ensino.

Botomé (1977) examina a necessidade de, para orientar de maneira eficaz os processos de ensinar e aprender, especificar objetivos que deixem claro e preciso o fazer do aluno em relação a seu meio. A literatura sobre objetivos de ensino é extensa e possibilita identificar que a definição clara dos comportamentos que o aluno deverá ser capaz de realizar após o

período de ensino é o núcleo definidor do conceito do objetivo de ensino. Dessa forma, a expressão de um objetivo de ensino deve explicitar os comportamentos a serem atingidos como decorrência do ensino e não se reduz a uma expressão gramatical com verbo e complemento, muito menos é uma justaposição de verbos que indiquem uma aprendizagem mais complexa que as demais.

Examinando os dados das Tabelas 3.1 a 3.4B, fica evidenciado que os objetivos propostos pelos professores não definem o que é preciso desenvolver como comportamentos que o aluno precisará apresentar em situações concretas de seu ambiente profissional após ter realizado o processo de aprendizagem. D'Agostini (2005) avalia que o grau de amplitude de um objetivo de ensino e a maneira de formulá-lo são dois problemas importantes a resolver. Se essa distinção não for feita e não ficar clara, pode ser muito alta a probabilidade de haver equívocos no que é proposto como aprendizagem dos alunos. Para a autora, expressões com múltiplos objetivos revelam um desconhecimento a respeito do conceito de objetivo e de sua função no contexto de educação, com reflexos importantes e marcantes nos processos de gestão das organizações de ensino ou de produção de aprendizagem na sociedade.

Objetivos de natureza múltipla dificultam a visibilidade das características necessárias do comportamento ser desenvolvido pelo ensino, dado que um objetivo de ensino é sempre um comportamento do aluno que indica aquilo que ele deve estar apto a realizar no seu futuro ambiente profissional. Os objetivos têm a função de esclarecer a qual aprendizagem um professor precisa chegar com seu aluno e ajudar a identificar por qual aprendizagem começar. Objetivos de ensino não podem ser um aglomerado de objetivos, pois não ajudam a orientar as decisões inerentes ao próprio processo de ensino coordenado pelo professor. Esse tipo de problema identificado nos objetivos de ensino caracteriza um processo de aglutinação de múltiplos objetivos em uma única expressão e está relacionado à estruturação da expressão final, que apresenta aquilo que dever ser o resultado do processo de ensinar: a aprendizagem efetiva do aluno. Que mais pode constituir problema na formulação de objetivos de ensino? Examinar a natureza dessas expressões pode revelar que muitas delas não têm coerência com o conceito de objetivo de ensino. A precisão do verbo e de seu complemento, assim como suas demais características, também precisa ser analisada, pois elas revelam muito mais que exame estrutural que identifica múltiplas unidades em uma expressão. Alguns desses objetivos propostos por professores de disciplinas de psicologia organizacional e do trabalho, por exemplo, sequer fazem referência ao processo de aprendizagem do aluno.