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A definição de deficiência mental envolve um leque bastante grande de perspectivas quer ao nível do conhecimento da problemática, quer ao nível do enquadramento no que diz respeito a fórmulas classificatórias que a subdividem. Assim, a deficiência mental é definida fundamentalmente por três correntes, a corrente psicológica ou psicométrica, a corrente sociológica ou social e a corrente médica ou biológica.

A corrente psicológica ou psicométrica defende que deficiente mental é todo o indivíduo que apresente um défice ou diminuição das suas capacidades intelectuais, sendo estas medidas através de testes e expressa em termos de QI (Quociente Intelectual). Podemos referir como principais impulsionadores desta corrente Binet e Simon.

A corrente sociológica ou social afirma que deficiente mental é aquele que demonstra dificuldade em se adaptar ao meio social em que vive e em fazer uma vida autónoma. A defender esta teoria surgem Doll, Kanner e Tredgold.

Finalmente, segundo a terceira corrente, a médica ou biológica, a deficiência mental tem origem biológica, anatómica ou fisiológica e vai manifestar-se durante o desenvolvimento, até aos dezoito anos. Para Lafon in Pacheco e Valencia (1997:210) “A debilidade mental é a deficiência congénita ou precocemente adquirida da inteligência.”

A Associação Americana para a Deficiência Mental (A.A.M.D.) e a Organização Mundial de Saúde (O.M.S.) reuniram as definições dadas pelas três correntes e apresentaram as suas próprias definições que são muito semelhantes e passaram a ser as mais aceites pelos diversos autores. Assim, a A.A.M.D. (1983) afirma que “ a deficiência mental refere-se a um funcionamento intelectual geral significativamente inferior à média, surgido durante o período de desenvolvimento e associado a um défice no comportamento adaptativo.” Para a O.M.S. (1968) define os deficientes mentais como “indivíduos com uma capacidade intelectual sensivelmente inferior à média, que se manifesta ao longo do desenvolvimento e está associada a uma clara alteração dos comportamentos adaptativos.”

Estas definições têm presente os três conceitos fundamentais que caracterizam a deficiência mental. O funcionamento cognitivo é inferior à média; revelam défice no comportamento adaptativo, ou seja, não têm independência pessoal nem responsabilidade esperados para a sua idade e grupo cultural e, manifesta-se durante o período de desenvolvimento antes dos dezoito anos.

Ao falarmos de deficiência mental temos que ter presente os diversos graus da mesma. Estes são determinados através de técnicas psicométricas, utilizando o QI para a classificação do grau.

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Tendo em conta o QI existem cinco graus de deficiência mental propostos pela A.A.M.D. e pela O.M.S. Temos a Deficiência Mental Limite ou bordeline (QI situa-se entre os 68 e os 85) que foi introduzida recentemente mas que ainda não obteve consenso entre todos os autores, uma vez que, não se podem considerar deficientes mentais as crianças que revelam apenas um atraso nas aprendizagens ou algumas dificuldades concretas. Muitos dos indivíduos pertencentes a meios socioculturais desfavorecidos estão inseridos neste grupo. De seguida temos a Deficiência Mental Ligeiro (QI situa-se entre 52 e os 68), neste grupo podemos encontrar tal como referimos no grupo anterior pessoas com problemas de origem familiar ou social, que não podem ser consideradas, objectivamente, como deficientes mentais. Apresentam um pequeno atraso nas áreas perceptivas e motoras mas podem desenvolver aprendizagens sociais e de comunicação e conseguir adaptar-se na sociedade inclusive trabalhar. Na Deficiência Mental Moderada ou Média (QI entre 36 e 51) os indivíduos podem adquirir hábitos de autonomia pessoal e social e também comunicar pela linguagem verbal embora apresentem dificuldades na expressão oral e compreensão. Em relação à Deficiência Mental Grave (QI entre 20 e 35) podemos referir que os indivíduos precisam, geralmente, de ajuda e protecção devido à falta de autonomia pessoal e social assim como revelam grandes problemas psicomotores. A sua linguagem verbal é deficitária e será útil a introdução de um sistema alternativo de comunicação. Podem ser treinados em rotinas básicas da vida activa. Finalmente, podemos falar em Deficiência Mental Profunda quando o QI for inferior a 20. Normalmente, os indivíduos apresentam graves problemas sensoriomotores e de comunicação, são dependentes dos outros em quase tudo devido a handicaps físicos e intelectuais graves.

Nos últimos anos, a definição de deficiência mental tem vindo a ser revista, e surge a definição dada pela Associação Americana de Psiquiatria (DSM – IV, 1994) - a Deficiência Mental corresponde à associação de um défice cognitivo (funcionamento cognitivo ou intelectual abaixo do esperado para a idade) a limitações no comportamento adaptativo.

Esta definição é a que vigora actualmente, tendo em conta perspectivas que se baseiam não só em pressupostos cognitivos mas, sobretudo em teorias adaptativas do comportamento, que têm em atenção a satisfação das necessidades básicas do indivíduo quer a nível social quer a nível pessoal, de forma autónoma. Assim, neste ponto de vista, é primordial promover a funcionalidade do deficiente mental de forma a poder desempenhar actividades que lhe permitam a independência e autonomia.

4.2. – Linguagem

A patologia da linguagem nos deficientes mentais é de difícil diagnóstico devido ao facto de poderem estar presentes vários quadros clínicos. A este respeito, Brauner (1986: 139) escreve que “todas as alterações da linguagem conhecidas se observam nas crianças deficientes mentais, mas nenhuma lhes é característica.” Na verdade estas crianças

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apresentam défices de linguagem mas nenhum está exclusivamente relacionado com a deficiência mental uma vez que, nem todos os deficientes mentais apresentam problemas específicos de linguagem expressiva ou linguagem falada.

As crianças com deficiência mental revelam uma linguagem bastante deficitária e, em alguns casos, ausente devido ao baixo nível de compreensão de signos verbais, condição necessária para um desempenho linguístico capaz. A ausência da cognição necessária para a existência da linguagem é um dos grandes entraves à inadaptação social dos deficientes mentais. A linguagem nestas crianças tende a surgir de acordo com o contexto. Para Lima (2000:253) “as primeiras palavras surgem em contextos de forte carga emocional ( «Não!», «Quero»,«Dá») e tendem a generalizar-se sob forma de emissões ecolálias.” Quando a criança consegue ultrapassar esta limitação da comunicação, adquiriu grandes capacidades cognitivas, entre as quais a capacidade de compreender as perguntas, a tomada de consciência dela própria e o seu controlo emocional.

O aparecimento da linguagem nas crianças com deficiência mental surge muito tarde e, por vezes, não conseguem ultrapassar a fase do estádio precoce da comunicação gestual. A linguagem verbal surge, normalmente, depois dos três anos de idade e restringe-se a funções de expressão emocional, petição ou recusa. Contudo em alguns casos, uma forte estimulação precoce pode resultar em grandes ganhos para a criança.

É de todo importante, no desenvolvimento da linguagem e fala destas crianças, distinguir a percepção dos sons, a sua projecção ou pronunciação. Por norma, as crianças passam por várias etapas até chegarem ao reconhecimento dos sons da fala. Primeiro têm que diferenciar os sons da voz humana dos outros, depois é necessário que identifiquem os sons do seu meio e, finalmente, descobrirem as regras que os regem. A grande dificuldade que os deficientes mentais encontram na aprendizagem da linguagem falada, devido ao carácter abstracto, é o domínio das regras de combinação entre fonemas, palavras e frases.

O deficiente mental revela normalmente falta de controlo psicomotor ao nível do aparelho fonatório o que provoca alterações no timbre, altura e intensidade, superiores às das crianças normais. A falta de coordenação fonatória e respiratória provocam cortes nas frases e até mesmo nas palavras, pelo que, por vezes, estas crianças no meio de uma conversa ficam com “bloqueios” e não conseguem falar, utilizando para isso gestos.

Devemos ter presente que os problemas de fala nas crianças com défice mental moderado ou severo estão relacionados com factores orgânicos, ambientais e educacionais, que estão interligados entre si. Ao nível da influência dos factores orgânicos podemos considerar a dificuldade do controlo salivar, problemas relacionados com a localização da faringe (acima do seu nível normal), malformações a nível das cavidades e órgãos do estrato supra-laríngeo, problemas de surdez, entre outras. O meio em que vive, social, cultural e familiar, são de extrema importância para a aquisição ou não da linguagem assim como a estimulação realizada pelos técnicos envolvidos no processo.

Resumindo, podemos referir de forma generalizada que, a linguagem verbal segue um caminho de desenvolvimento muito vagaroso. O desenvolvimento do vocabulário é muito

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parecido ao das crianças normais apesar de mais lento e incompleto. O atraso no desenvolvimento lexical pode ser consequência de um défice de atenção auditiva, défice na representação mental dos objectos, entre outras. No que diz respeito à morfossintaxe revelam problemas, em particular, na aquisição e uso dos morfemas gramaticais (concordância em género e número, verbos auxiliares e flexões gramaticais). Em relação à pragmática, adequação da comunicação oral demonstram não ser bons comunicadores devido ao facto de terem muitas dificuldades na descrição de situações, na organização e sequencialização das ideias e omissão de palavras-chave da informação. Finalmente, a compreensão de frases também é inferior à das crianças normais com a mesma idade.

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Capítulo II