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Uma análise da ação administrativa pode ser fundamental para o conhecimento nas relações de trabalho na medida em que há interesse em se delimitar, de uma forma mais específica, tanto a organização quanto o espaço existencial do indivíduo na organização. Além disso, dois outros assuntos abrangem a área de interesse neste tipo de análise: o fato de haver necessidade de se avaliar, de forma mais apurada, o papel dos fatores éticos para a eficiência e produtividade; e, por fim, quando há interesse em tratar da inclusão do ambiente externo como um elemento da organização (RAMOS, 1983).

A razão da ação administrativa não é a razão entendida como faculdade humana transcendente. É simplesmente a eficácia, a operação produtiva de uma combinação de recursos e meios, tendo em vista alcançar objetivos predeterminados, contingentes (RAMOS, 1983, p. 48).

Conceitua-se ação administrativa como uma “modalidade de ação social,

dotada de racionalidade funcional, e que supõe estejam os seus agentes, enquanto

a exercem, sob a vigência predominante da ética da responsabilidade” (RAMOS,

1983, p. 47, grifo do autor).

Exposta a definição acima, convêm reiterar alguns pontos importantes que envolvem a ação administrativa: no contexto da organização corresponde mais especificamente à racionalidade funcional e à ética da responsabilidade (diferentes, respectivamente, da racionalidade substantiva e da ética da convicção); o conhecimento de preceitos como ética da responsabilidade, ética da convicção e dualidade existenciais dos espaços humanos; o interesse de estudiosos pelas tensões das éticas na organização; o fenômeno da alienação (que envolve a relação entre o indivíduo e a organização); a necessidade de se dar mais atenção ao ambiente externo a que se relaciona (tornando-se mais sensível às pressões deste tipo de ambiente); um fluxo de informações correto passa a ser imprescindível para o processo organizacional (este é um requesito para que a organização seja considerada sadia) (RAMOS, 1983).

Pertinente é a comparação feita por Salm e Menegasso (2010), envolvendo algumas peculiaridades da ação administrativa em organizações substantivas e em organizações burocráticas (ou instrumental) na esfera pública. Dentre algumas questões relacionadas pelos autores, têm-se, por exemplo, no caso da ação administrativa em uma organização burocrática: doenças psíquicas; a motivação é extremamente singela; degradação humana; submissão do indivíduo ao espaço organizacional; alienação, superconformidade e reificação. E, no que tange a ação administrativa em organizações substantivas os autores relacionam, por exemplo: a motivação do indivíduo (que é intrínseca ao objetivo da organização); as condições de alienação que aparecem em menor grau (há um maior comprometimento como forma de motivação); a presença de aspectos associados com a prática da liberdade, próprios das isonomias; a promoção da participação e do envolvimento da comunidade.

Uma ação administrativa, de forma alguma, se apresentará semelhante ou exatamente igual em todas as organizações, há uma nuança em função do tipo de organização: “em organizações mais participativas com algumas características substantivas, a ação administrativa se diferencia daquelas em que há maior coercitividade, alienação e reificação” (SALM; MENEGASSO, 2010, p. 10).

4 O INSTITUTO DAS OUVIDORIAS

É fato que a ação administrativa é praticada tanto nas organizações do setor público quanto do setor privado. O que as diferencia é o propósito a que se destinam (SALM; MENEGASSO, 2010): enquanto as organizações do setor privado visam principalmente questões econômicas, as do setor público têm foco no bem público, objetivando a prestação de serviços à sociedade.

Ao tratar da administração pública, Leão (2007) comenta que é indispensável que a gestão pública tenha o intuito de melhorar a administração através, não só da redução de custos, mas também da melhoria na qualidade dos serviços prestados.

E é justamente a busca desta melhoria nos serviços prestados que se pode remeter ao instituto das ouvidorias, muito em voga na atualidade. De acordo com Perez, Barreiro e Passone (2011, p. 19) a ouvidoria, que vive um momento importante de consolidação no contexto da administração pública brasileira, é apontada mundialmente, como um “baluarte da democracia moderna”.

O entendimento de ouvidoria origina-se com o que se conhece por

ombudsman4. Os primeiros registros de uma figura controladora aparecem desde a

Grécia Antiga (com os chamados Euthynoi, em Atenas, e Efhorat, em Esparta) e também no Império Chinês (com o Yan) – em todos os casos essas figuras eram legitimadas a exercer o controle sobre a administração (LEÃO, 2007; LIMA, 2009).

Não obstante, o grande marco inicial ocorre na Suécia quando, no século XVI, surge a figura do “grande semescal” que, ligado ao poder público, era um funcionário do rei que tinha a função de controlar as atividades dos juízes (LEÃO, 2007, p. 27, grifo do autor). Após um período de evolução do Estado e promulgação da Constituição de 1809, o ombudsman passa a controlar a administração pública, viabilizando-se um canal entre o governo e a população.

Embora estivesse ligado ao papel daquele que protege os direitos individuais, que fiscaliza as ações do governo e da administração, o ombudsman, apresentava um perfil fiscalizador (LIMA, 2009).

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O termo Ombudsman quando desmembrado apresenta o seguinte sentindo: ombud significa representante, agente, advogado, solicitador, substituto, procurador, delegado e man significa homem. No Brasil, o termo ombudsman é mais comumente usado no setor privado, enquanto que os termos ouvidor e ouvidoria são empregados no setor público (LEÃO, 2007).

No decorrer do século XX diversos países se inspiram no exemplo da Suécia, principalmente com as reformas administrativas deste país em 1915 e 1967, que culminam em três diferentes tipos de ombudsmen, cada um deles dirigido para questões específicas: bem-estar administrativo; assuntos judiciários e militares; e matérias cíveis (CARDOSO, 2010). Eles visavam principalmente eficácia em solucionar problemas que fossem apresentados pelos cidadãos (LIMA, 2009).

No Brasil, os primeiros registros de um ouvidor datam da época do Império, que, não obstante representava exclusivamente o poder. De acordo com o comentário de Lima (2009, p. 716) “antigamente o ouvidor era o interlocutor no reinado e representava o rei, diferentemente de hoje que representa a sociedade”.

Esta diferença aporta-se justamente na questão democrática. Giddens (1984) ao tratar da obra de Durkheim, menciona que uma sociedade pode ser mais ou menos democrática a depender do grau de comunicação estabelecida entre o Estado e os diversos níveis de uma sociedade. Para Mannheim (1972, p. 67) a democracia quer dizer uma teoria do poder que visa a “definição de formas de distribuição e de controle do poder coletivo, de modo a alcançar o máximo de segurança, eficiência e liberdade”.

Em oposição ao contexto acima, observa-se que no Brasil, durante o período da ditadura militar, experimentou-se uma fase em que a voz da sociedade esteve fortemente silenciada, sendo consequentemente uma época de total quietude para as ouvidorias (LIMA, 2009). Nesta fase, que também se caracterizou pela falta de controle social e forte censura, os direitos e garantias fundamentais estiveram absolutamente coibidos, sem que houvesse um efetivo exercício da cidadania (VISMONA, 2011).

Mannheim (1972) reforça que, como característica básica, é primordial admitir-se que em uma democracia exista tanto a liberdade de opinião quanto a apreciação de uma maior quantidade possível de pensamento. Por democracia pode-se entender eleições, divisão de poderes, mas fundamentalmente a existência de liberdade de pensamento e expressão (CHAUI, 2010).

Ainda que ao longo da década de 1970 já existissem manifestações doutrinárias defendendo a criação e a efetiva implantação do instituto, o cenário político brasileiro não permitia o seu desenvolvimento, uma vez que nada mais avesso a um regime de exceção do que um canal de participação e controle social da administração pública pelos cidadãos (CARDOSO, 2010, p. 8).

Chaui (2010, p. 503) afirma que questões como igualdade e liberdade voltadas como direitos civis dos indivíduos estão além da regulamentação jurídica. Para a autora, os indivíduos representam os sujeitos de direito e, caso inexista a garantia desses direitos, deve-se lutar e exigi-los, sendo este “[...] o cerne da democracia”. Para Bobbio (1992, p. 13) “[...] o estado democrático [...] é o tipo ideal de estado [para] quem se coloca do ponto de vista do direito”.

Observa-se, portanto, que a ouvidoria só é implantada na America Latina após o continente ser redemocratizado, e não poderia ser de outra maneira já que a ouvidoria presume a totalidade de direitos civis e políticos em um local democrático (CARDOSO, 2010). Portanto, conforme expresso por Bobbio (1992), uma democracia moderna existe na medida em os direitos de liberdade são reconhecidos constitucionalmente.