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Capítulo 2 - Revisão Bibliográfica

2.6 Degradação de corantes e efluentes têxteis por enzimas de fungos

Uma vez que os fungos ligninolíticos têm sido apontados como os mais eficientes degradadores de corantes sintéticos devido, principalmente, às suas enzimas ligninolíticas extracelulares, vários estudos têm sido desenvolvidos para otimizar a produção das mesmas e aplicá- las na degradação/descoloração de corantes (WESENBERG et al., 2003).

As principais enzimas ligninolíticas produzidas pelos fungos são oxiredutases, ou seja, dois tipos de peroxidases, lignina peroxidase (LiP) e manganês peroxidase (MnP), e uma fenoloxidase, a lacase. Alguns fungos produzem todas estas enzimas enquanto outros produzem apenas uma ou duas delas. O interesse pelas lacases tem aumentado nos últimos anos devido ao seu grande potencial de aplicação na degradação de vários corantes industriais (WESEMBERG et al., 2003; ZILLY et al., 2002; SOUZA etal., 2002).

A lacase (benzenodiol oxigênio redutase [EC 1.10.32]) pertence a um grupo de enzimas chamado cobre azul oxidase capaz de oxidar fenóis e aminas aromáticas a partir da redução de oxigênio molecular da água. A lacase está espalhada na natureza e tem sido encontrada em plantas, fungos, bactérias e insetos. Esta enzima é a mais encontrada em sistemas de fungos ligninolíticos envolvidos na degradação de lignina (HOU et al., 2003). Em basidiomicetos, as lacases extracelulares são formadas em metabolismos secundários e são geralmente produzidas em pequenas quantidades, por isso é ainda importante aumentar a habilidade dos microrganismos em produzir lacases para aplicação industrial. A produção de lacase pode ser estimulada por compostos aromáticos ou fenólicos, como ABTS, ácido ferulicos, 2-5-xilidina, ou álcool veratrílico. Além disso, a produção de lacase pode ainda ser influenciada por diferentes condições de cultivo (HOU et al., 2003).

Estudos recentes indicaram que as lacases têm especificidade de substrato, sendo que esta especificidade pode ser estendida a sub- unidades não- fenólicas usando mediadores, representando um papel importante no ciclo global do carbono e podendo ajudar na degradação de uma grande variedade de xenobióticos como corantes têxteis (HOU et al., 2003).

HOU et al. (2003) verificaram que a produção de lacase a partir de Pleurotus ostreatus 32 foi influenciada pelas condições de cultivo. Os autores observaram que o crescimento e a produção de lacase sob cultivo estático foi superior ao cultivo sob agitação, tanto para meio rico ou limitado de nitrogênio. Também verificaram que a produção de lacase também pode ser influenciada pela concentração de nitrogênio no meio de cultivo. A atividade observada em meio com 5 g/L de uréia foi cerca de 80% a da observada utilizando meio com 0,5 g/L, o que sugere que uma alta concentração de Nitrogênio pode inibir a produção de lacase.

De acordo com WONG & YU (1999), T. versicolor libera lacase como sua

principal enzima extracelular, a qual catalisa a oxidação de compostos fenólicos e a redução de uma molécula de oxigênio para duas moléculas de água. O mecanismo de descoloração de corantes por lacase catalisadora não é muito claro ainda. Comparada à lignina peroxidase de P. chrysosporium, no entanto, lacase pode ser produzida por T. versicolor sob condições associadas ao crescimento na presença de carbono e/ou nitrogênio como nutrientes. O mais importante é que lacase é uma oxidase com um potencial redox de 780 mV e pode catalisar a oxidação de poluentes orgânicos por redução de oxigênio molecular diretamente a água na ausência de peróxido de hidrogênio ou ainda outros metabólitos secundários. Esta simplicidade de descoloração enzimática de corantes pode ser valiosa para tratamento de águas residuárias reais se o mecanismo e versatilidade da descoloração de corantes sintéticos por lacase puder ser entendida.

Pesquisadores têm relatado diversos dados relacionados à degradação de diversos corantes reativos por lacase, estudados pelo processo de descoloração (grupo cromóforo de degradação) ou pelo desaparecimento do produto por metodologia espectrofotométrica ou

cromatográfica. Como exemplo, PERALTA-ZAMORA et al. (2003) citam a

desintoxicação de derivados de metil, metoxi, cloro e nitro substituintes de

4(4’-sulfofenil-azo)-fenol a partir da utilização de um lacase de Pirycularia oryzae disponível

comercialmente. Estes autores relatam, ainda, que a lacase de Coriolopisis gallica foi imobilizada em agarose ativada e testada para descoloração repetida de corantes industriais. A lacase imobilizada reteve 85% da atividade inicial depois de 10 ciclos e 70% após 3 meses de uso intermitente na descoloração do corante reativo Azul 198. Além disso, os autores reportam que corantes antraquinones representaram substratos que foram diretamente oxidados pela lacase, enquanto que a descoloração de corantes azo e índigo exigiu a utilização de pequenas moléculas metabólicas (mediadores, como HOBT).

Segundo os estudos realizados por WONG & YU (1999), a descoloração de corantes por lacases mostrou-se limitada muito mais pela concentração de compostos mediadores do que pela atividade da enzima na solução.

Corantes têxteis industriais como triarilmetano, antraquinones e índigos foram eficientemente descoloridos por enzimas preparadas de diferentes fungos. A na tureza dos substituintes nos anéis benzênicos do corante influenciou a atividade enzimática, e grupos amino e hidroxil aumentaram a descoloração (ABADULLA et al., 2000).

Muitas iso-enzimas da lacase de Pleurotus ostreatus têm sido purificadas e

caracterizadas: POXC, a mais abundantemente produzida sob todas as condições de crescimento examinadas, etos, POXA1b, POXA3a, e POXA3b. Remazol Brilliant Blue R (RBBR) foi degradado pelas isoenzimas de lacase POXC, POXA3a e POXA3b na ausência de mediadores redox. O nível final de descoloração do corante e a taxa final de reação foram as mesmas usando POXA3a ou POXA3b, apesar da eficiência do processo

aumentar usando misturas das isoenzimas POXC e POXA3a/b (PALMIERI et al., 2005).

O potencial da polpa de coco como matéria-prima para a produção de lacase extracelular pelo fungo da podridão branca Trametes hirsuta foi investigado por COUTO & SANROMÁN (2004), assim como a aplicação do líquido extracelular na descoloração do corante Lissamine Green B. Uma máxima atividade de lacase de 333,280 nkat/L foi produzida, a qual foi aumentada quase 3 vezes quando sulfato de cobre (2mM) foi adicionado no meio de cultura. A descoloração do corante têxtil Lissamine Green B foi testada tanto in vitro com in vivo. In vitro foi investigado o efeito de diferentes tempos de cultivo (14, 21 e 32 dias). Os autores observaram que o líquido extracelular de 14 dias apresentou o menor percentual de descoloração. O maior percentual correspondeu ao líquido extracelular de 21 dias. In vivo foi observada uma descoloração superior a 96 % em 2,5 horas.

A habilidade de descolorir corante antraquinonas pela enzima lacase de Pleurotus ostreatus 32 foi estudada por HOU et al. (2003). Os autores testaram lacase bruta na descoloração do corante Remazol Brilliant Blue SN4R e após 2, 4, 6, e 8 h de incubação e verificaram percentagens de descoloração de 8,8, 18,4, 27,1, 48,3 e 66,3%, respectivamente. Ou autores também testaram a descoloração do corante utilizando pequenas adições do mediador ABTS e uma ótima taxa de descoloração foi observada quando adicionado 0.16% do mediador. Após uma incubação de 1, 2, 3, 4 e 5 horas a taxa de descoloração foi de 9,7, 31,8, 57,5, 76,9 e 90%, respectivamente.

PERALTA-ZAMORA et al. (2003) estudaram a descoloração de corantes reativos (Remazol brilliant blue R, Remazol Black B, Reactive orange 122 e Reactive Red 25) utilizando enzima livre e imobilizada de Trametes versicolor. Para todos os corantes a descoloração mostrou-se maior usando enzima imobilizada quando comparada com a enzima livre. Os autores também estudaram o efeito da utilização de HOBT como mediador da lacase e não verificaram diferença significativa nas descolorações para os corantes RBBR, preto remazol B and vermelho reativo 25. No entanto, para o corante alaranjado reativo 122 foi observada uma pequena diferença na descoloração. Neste caso, um aumento de aproximadamente 10 pontos foi observado quando a enzima imobilizada foi usada na presença de HOBT, atingindo uma descoloração de aproximadamente 55%, a maior dentre os testes realizados.

ABADULLA et al. (2000) testaram a descoloração de sete corantes têxteis (azul reativo 221, preto reativo 5, azul direto 71, vermelho básico 9, azul reativo 19, azul ácido 225, azul ácido 74) por Trametes hirsusta e pela lacase purificada do mesmo fungo. Exceto para o preto reativo 5 e para o vermelho básico 9, uma tendência similar foi observada para degradação microbiológica e enzimática, sugerindo que a lacase extracelular seria a principal responsável pela degradação dos corantes. Corantes antraquinônicos e índigo carmim (azul ácido 74) foram degradados duas vezes mais rapidamente que os outros corantes, por ambos T. hirsuta e a enzima purificada. A adsorção dos corantes no micélio não contribuiram na descoloração microbiológica uma vez que um máximo de 1,5% do corante adicionado foi encontrado junto ao micélio, exceto para vermelho básico 9 para o qual 7% do corante foi encontrado no micélio após 6 dias de incubação.

Os autores também testaram a desintoxicação dos corantes pela lacase imobilizada de T. hirsusta. Vários dos corantes têxteis foram descoloridos pela lacase imobilizada, e a toxicidade dos produtos degradados foi determinada. O grau das descolorações foi padronizado em 80% para todos os corantes. Sob estas condições, os corantes antraquinônicoss foram degradados em aproximadamente 80%, enquanto a toxicidade dos corantes azo preto reativo 5 e azul direto 71 reduziu 13% e 40%, respectivamente. O corante que contém cobre, azul reativo 221, foi levemente degradado pelo tratamento enzimático (4,1%).

Quatro espécies de basidiomicetes ligninolíticos, Trametes modesta, Trametes hirsuta, Trametes versicolor e Sclerotium rolfsii, foram comparados pela habilidade em produzir lacases. A lacase dos fungos foi testada em sua habilidade de descolorir oito corantes sintéticos (antraquinonicos, azo, índigo e triarilmetano). A taxa de descoloração

dependeu tanto da fonte da enzima preparada como da estrutura do corante. Baseado na produção de lacase e capacidade de descoloração do corante, T. modesta foi selecionado para estudos subseqüentes. Todos os corantes testados foram descoloridos pela lacase de T. modesta mais eficientemente sob condições de pH ácido (pH 3-6), mas o pH ótimo para descoloração de cada corante variou. A taxa de descoloração usando esta lacase aumentou

na faixa de temperatura de 50-60ºC. A eficiência da descoloração pela lacase de T.

modesta foi aumentada extraordinariamente na presença de mediadores como HBT e MPT

(NYANHONGO et al., 2002).

SOARES et al. (2001) estudaram a descoloração do corante RBBR por uma

formulação comercial de lacase (CLF), contendo lacase, um mediador redox e um surfactante não iônico. Componentes de baixo peso molecular foram removidos da CLF por filtração a gel, o que tornou possível a comparação da utilização da lacase isolada. Exceto por uma termoestabilidade ligeiramente melhor da CLF quando comparada com a da enzima isolada, os perfis do pH e da temperatura foram similares apesar da presença dos compostos de baixo peso molecular. A lacase isolada não descoloriu o corante RBBR. Um mediador redox de baixo peso molecular (HBT) foi necessário para a descoloração ocorrer. A descoloração utilizando CLF também foi testada. As descolorações utilizando a lacase isolada adicionada de HBT e utilizando a CLF foram comparadas e apresentaram resultados semelhantes, chegando a 100 % após 2 horas.

Uma mistura preparada de lacase bruta de culturas de Pleurotus ostreatus

suplementada com cobre e ácido felúrico foi usada por PALMIERI et al. (2005) para

descolorir o corante antraquinonico Remazol Brilliant Blue R (RBBR). A performance deste sistema enzimático foi testada e uma descoloração máxima de 70 % foi alcançada sob condições ótimas. A mistura bruta da enzima foi imobilizada por encapsulamento em gotas de alginato de cobre alcançando 65 % de rendimento da atividade enzimática. A estabilidade da lacase imobilizada foi extraordinariamente aumentada em comparação com enzima livre. A eficiência do sistema com enzima imobilizada foi avaliada durante adições sucessivas de corantes em operações em batelada. Sob as condições ótimas, 70 % de descoloração do RBBR foi alcançada depois de 20 ciclos, apesar do tempo de descoloração aumentar exponencialmente após o décimo ciclo.

Com relação ao gênero Pleurotus, muitas espécies têm sido descritas como

produtoras de lacase. Apesar do uso potencial de P. pulmonarius em processos de

biorremediação já ter sido descrito, muitos aspectos relacionados com a produção e caracterização da enzima lacase continuam inexplorados (SOUZA et al., 2002).

SOUZA et al. (2002) estudaram a produção de lacase por P. pulmonarius em fermentação no estado sólido usando grãos de trigo. Dentre as enzimas oxidativas e hidrolíticas avaliadas (lacase, álcool arílico oxidase, lignina peroxidase, manganês

peroxidase, xilanase e celulase), lacase foi a principal enzima produzida por P.

pulmonarius. O pH e temperaturas ótimos para atividade de lacase foram obtidos como sendo 6.5 e 50ºC. A enzima mostrou-se altamente estável em pH alcalino, mas o mesmo não ocorreu em pH ácido. Além disso, as autoras constataram que a atividade de lacase parece estar correlacionada com a habilidade do extrato bruto em descolorir vários corantes industriais.

ZILLY et al. (2002) avaliaram a habilidade de Pleurotus pulmonarius em

descolorir corantes sintéticos de diferentes estruturas em estado sólido e em culturas submersas. As autoras também avaliaram a produção de quatro enzimas nas culturas filtradas (lacase, álcool arílico oxidase, lignina peroxidase e manganês peroxidase) e verificaram que somente a lacase foi produzida pelo fungo. As autoras avaliaram, então, a descoloração in vitro de três corantes (Remazol Brilliant Blue R, Trypan Blue e Methyl green) e verificaram que todos os corantes foram descoloridos pelos extratos extracelulares brutos. A lacase pode, portanto, ser considerada a principal enzima envolvida na habilidade do P. pulmonarius em descolorir corantes industriais

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