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PARTE III – A PESQUISA

9. Delineamentos gerais da pesquisa

Para a realização desta pesquisa, foram escolhidas quatro cooperativas de catadores de materiais recicláveis do Distrito Federal. Essas quatro cooperativas foram escolhidas a partir de um quadro geral de cooperativas existentes no DF, com base no cadastro realiza- do pela Central de Cooperativas de Materiais Recicláveis do Distrito Federal e Entorno. As escolhas partiram da preocupação da pesquisa de se abordar, comparativamente, como as relações reciprocitárias se apresentam e influenciam nos resultados econômicos dos Empreendimentos de Economia Solidária. A partir dessa preocupação inicial, foi feito um levantamento geral de como estão as cooperativas do DF. O objetivo desse levantamento foi localizar aqueles empreendimentos que possuem similaridades no que tange à situação fundiária e legal, à infra-estrutura, nível de organização, materiais coletados, número de parceiros, quantidade de trabalhadores, tempo de operação, entre outros. Como foram en- contradas cooperativas em situações completamente diferentes (vide quadro abaixo), ja- mais uma igual à outra, foi feita uma pesquisa prévia de quais seriam os elementos, dentro de uma cooperativa, que realmente causam impacto e tornam extremamente difícil, quan- do não impossível, uma comparação.

Variável Cooperativa

Local Número de trabalhadores

Situação fundiária Situação legal Infra-estrutura Cortrap Estrutural 110 Local cedido em co-

modato (construindo galpão)

Cooperativa legalizada

Céu aberto

Fundamental Planaltina 30 Local emprestado (foi cedido terreno, mas não começaram as o- bras)

Cooperativa legalizada

Céu aberto (pe- quena cobertu- ra)

Coopativa SIA 150 Local cedido em co-

modato

Trabalho e moradia

(até pouco tempo mo- ravam em invasão)

Cooperativa legalizada

Galpão

Reciclo Pistão Sul 57 Invasão

Trabalho e moradia

Cooperativa em processo de legalização

Céu aberto

Ambiente Estrutural 1200 Lixão – Local cedido em comodato (constru- indo galpão)

Associação le- galizada

Astradasm Santa Maria 450 Invasão

Trabalho e moradia (só

1)

(foi cedido terreno, mas não começaram as o- bras)

Associação le- galizada

Céu aberto

Ageplan Vila Planal-

to 200 Trabalho e moradia em residência própria Cooperativa em processo de legalização Céu aberto 100 Dimensão Riacho Fundo

250 Local próprio Cooperativa

legalizada

Galpão

Cataguar Ceilândia 79 Local emprestado (re-

cém retirados de inva- são no Guará) Associação le- galizada e Coo- perativa legali- zada Galpão

Superação Recanto das

Emas 70 Trabalho e moradia em residência própria Cooperativa legalizada Céu aberto

Apcorb L4 Sul 230 Local emprestado Associação le-

galizada

Galpão

Copernov Varjão 24 Local emprestado Grupo Informal Céu aberto

Coopernoes Estrutural 35 Invasão Grupo Informal Céu aberto

Apcorp Ceilândia 30 Local emprestado Associação le-

galizada

Galpão

Quadro 1. Situação geral das cooperativas de reciclagem do DF

Nessa análise, dois elementos saltaram aos olhos, a situação fundiária e a infra- estrutura produtiva. A situação fundiária de algumas cooperativas se mostra extremamente complicada: ocupação ilegal de área pública. Quando a essa característica se junta a infra- estrutura precária, para não falar inexistente, encontramos uma situação dificílima para a cooperativa. E, como se não bastasse, quando unimos tudo isso a uma moradia extrema- mente precária, sem saneamento básico, segurança e energia, percebemos que o grupo de catadores, e seus filhos e cônjuges, se tornam heróis, simplesmente por sobreviver.

Dito tudo isso, elegi como prioridade a análise de cooperativas que estivessem nu- ma situação de precariedade como acima descrevi. No entanto, encontrei apenas uma coo- perativa que respondesse a todos os requisitos, a Reciclo, de Taguatinga. Procurei outras

cooperativas com situação parecida. A única que conjugava o trabalho e moradia no mes- mo local foi a Coopativa, no entanto essa cooperativa já possuía um galpão, apesar de a habitação ainda ser em invasão próxima ao local de trabalho. Foi outra cooperativa esco- lhida. Quase desisti de fazer a pesquisa nessa cooperativa quando, alguns dias antes da visita, “agentes do GDF retiram invasão de catadores do Setor de Inflamáveis” (manchete nos principais jornais da cidade – jan/fev 2007). Não desisti de realizar a visita na Coopa- tiva e tal fato se mostrou extremamente interessante, pois (infelizmente para Cooperativa e felizmente para o pesquisador) tem engendrado mudanças significativas nas relações soci- ais dos cooperados. Os resultados dessas mudanças, todavia, só poderão ser analisados a médio prazo.

Outras duas cooperativas cuja situação eram similares, ou possuíam, no meu modo de ver, elementos que as aproximavam eram a Cortrap e a Coopernoes. A primeira, apesar de ter um galpão em construção, vinha trabalhando no terreno em frente a céu aberto. E a segunda, além de ser uma espécie de dissidência da Cortrap, também realizava sua ativi- dade em um terreno ocupado irregularmente. A grande diferença das duas para as demais é que seus cooperados moravam em casas e não em barracos de lona. E mais uma caracterís- tica os aproximavam todos – mas esta, só vim a descobrir posteriormente –, a maior parte dos catadores que fazem parte dessas cooperativas são ou foram moradores de rua.

Uma vez escolhidas as cooperativas foi realizada uma pesquisa exploratória em cada uma delas, em que foram entrevistados alguns membros, entre cooperados, diretores e presidente. Em uma segunda visita foram feitas entrevistas em grupo de cinco a seis pes- soas, a fim de perceber algumas manifestações coletivas e, posteriormente, foram aplica- dos questionários de avaliação de dados objetivos da cooperativa como um todo e feitas entrevistas individuais para captação de dados mais subjetivos. Em cada cooperativa fo- ram feitas seis entrevistas individuais.

Além desses dados diretamente coletados nos empreendimentos, foram utilizados documentos da CentCoop que possuem informações extremamente valiosas.

Os dados coletados foram referentes às seguintes áreas:

1. Dados gerais (breve histórico do grupo, início das atividades, situação legal e fun- diária, infra-estrutura, equipamentos, parcerias, quantidade de material coletado, renda auferida)

2. Planejamento (se possuem plano de negócios, se fazem algum planejamento das a- tividades)

3. Controle financeiro (fluxo de caixa, capital disponível, dívidas)

4. Organização do trabalho (se o trabalho é individual ou em grupo, divisão do traba- lho e dos ganhos)

5. Autogestão e democracia (funcionamento das instâncias democráticas, se fazem reuniões, se possuem conselhos e diretoria, como funcionam)

6. Liderança (relação dos cooperados com a liderança, no campo das relações inter- pessoais e não institucionais)

7. Reciprocidade interna (relações reciprocitárias, confiança, relações de grupo, con- flitos, amizades, atividades coletivas)

8. Reciprocidade externa (relação com parceiros e apoiadores)

9. Aspectos subjetivos (como a situação de trabalho, as relações no interior do grupo e a organização do trabalho influenciam na mobilização subjetiva para a coopera- ção)

Esses foram os aspectos levantados e analisados nessa pesquisa e que, depois da descrição detalhada das características de cada grupo, serão comparados e analisados glo- balmente sob o ponto de vista da abordagem descrita e defendida nos capítulos anteriores.