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Capítulo 3 – O Sistema Geral de Seguridade Social em Saúde (SGSSS)

3.3. Desafios para a equidade

Mesmo que a cobertura se torne “universal”, ela não poderá ser analisada como uma fonte de equidade do acesso aos serviços de saúde primários, como visto anteriormente, muito menos em especialidades, como bem demonstra Martínez-Martín (2014), quando avalia a proporção dos diferentes regimes de financiamento quanto ao acesso às consultas médicas para controle da hipertensão e diabetes, realizadas em 2007. Enquanto 51% dos usuários do RE conseguiram, pelo menos, uma consulta médica para controle de hipertensão, a proporção cai para apenas 23% para os usuários do RS. O mesmo acontece quando são ponderadas as proporções para os usuários que conseguiram pelo menos uma consulta para o controle de diabetes. Novamente os usuários do RE são os que mais se utilizaram de serviços especializados, com 64%, frente aos apenas 28% de usuários do RS. Os Gráfico 6 e 7 apresentam estes dados.

Gráfico 6 Proporção de usuários que realizaram pelo menos uma consulta especializada para controle

de hipertensão arterial por regime contributivo em 2007

Gráfico 7 Proporção de usuários que realizaram pelo menos uma consulta especializada para controle

de diabetes, por regime contributivo em 2007

Fonte: Adaptado de Martínez-Martín, 2014, p.18.

Em trabalho realizado entre 2003 e 2007 na capital Bogotá, Martínez-Martín (2012), demonstra as desigualdades de acesso aos serviços de saúde por condições econômicas e geográficas. De acordo com o autor, ao somar as ofertas de consultas médicas, as regiões mais pobres e mais habitadas da Capital (Usme e Bosa) contam com pouca disponibilidade desses serviços, o que sugere que os habitantes devam realizar suas consultas em outras localidades, gastando-se assim tempo e dinheiro para se obter acesso à saúde. São também observadas diferenças quanto à distribuição de equipamentos especializados (diagnóstico, terapia, médico- hospitalar etc.). As regiões mais ricas e urbanizadas – Chapinero, Tesaquillo e Usaquén – apresentam a melhor cobertura frente as mais pobres e rurais.

Quanto às diferenças entre os regimes, o autor reforça em sua avaliação que os usuários do RS são amplamente prejudicados quanto ao acesso aos serviços de saúde, provando mais uma vez – assim como mencionado anteriormente em seu estudo para a Colômbia que a “cobertura universal” não garantiu por si só a equidade de acesso, muito menos diminuiu as barreiras econômicas e sociais do sistema de saúde colombiano. Sob uma perspectiva legal, o direito à saúde está mais acessível àqueles cidadãos que podem arcar com suas necessidades através do mercado privado.

Os resultados ficam ainda piores quando se leva em conta o acesso à rede hospitalar. Novamente as regiões mais desenvolvidas ganham destaque sobre as mais pobres. Duas regiões são destacadas neste quesito, Los Martíres e Barrios Unidos, que segundo Martínez-Martín

(2012), usufruem da infraestrutura herdada do antigo ISS e das demais instituições públicas anteriores à aprovação da Lei 100. Novamente, as regiões que possuem maior número de habitantes, são desfavorecidas perante as regiões mais ricas e desenvolvidas.

Avaliando a tendência das taxas de mortalidade infantil (em menores de 1 ano) e materna entre 2005 e 2011 e sua relação com os determinantes sociais, também para as regiões de Bogotá, Martínez-Martín e Hernández (2012) concluem que a Capital conseguiu alcançar as metas propostas no Plano Distrital de Desenvolvimento 2008-2012. Os Gráficos 8 e 9 demonstram, respectivamente, as taxas de mortalidade materna e infantil.

Gráfico 8 Taxa de mortalidade materna para 100.000 nascidos vivos em Bogotá de 2005a2010

Fonte: Adaptado de Martínez-Martín e Hernández (2012, p.302).

Gráfico 9 Taxa de mortalidade infantil (menores de 1 ano) para 100.000 nascidos vivos em Bogotá de

2005 a2010

Quando comparamos a taxa de mortalidade infantil por doenças respiratórias, a inequidade entre os regimes é gritante. De acordo com os autores, no ano de 2005, a taxa no RS era de 1,95 para mil nascidos vivos, enquanto para o RC era de 1,05. Após cinco anos, a taxa foi reduzida em ambos os regimes, contudo aprofundou-se a diferença. Enquanto no RC houve uma queda de 0,5 para cada mil nascidos vivos, no mesmo período o RS apresentou uma taxa de 1,55, ou seja, no primeiro caso houve uma redução para a metade, enquanto no RS, a redução foi de apenas 20%. Esses resultados refletem de maneira clara as diferenças e a inequidade entre os regimes de financiamento no SGSSS.

A inequidade também está presente nas localidades Ciudad Bolívar, Rafael Uribe Uribe, Suba e Usme são apontadas por Martínez-Martín e Hernández (2012), como as regiões com piores taxas de mortalidade infantil e materna para o ano de 2010. Essas regiões também apresentam os maiores números de pobres e miseráveis. Os autores concluem que existe ampla correlação entre a pobreza e as taxas de mortalidade materna e infantil, não por acaso, uma vez que os mais afetados são usuários do RS, em que a inequidade de acesso aos serviços de saúde se mostra pior quando comparada ao RC.

Os resultados auferidos pelos trabalhos de Martínez-Martín (2012 e 2014) e Martínez-Martín e Álvarez (2012) demonstram quão profunda se encontra a inequidade de acesso aos serviços de saúde na capital Bogotá. Posteriormente estes resultados podem ser elevados para toda a Colômbia. Entretanto, estas contribuições vão além de apresentar a inequidade do SGSSS, pois reforçam a incapacidade do mercado em promover políticas públicas de saúde e de ser autorregulado, o que deixa clara a responsabilidade do Estado colombiano em realizar reformas que contornem estas péssimas situações geradas pela crença neoliberal.