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Descentralização e sistemas municipais de ensino: trajetória histórica

No âmbito educacional, a questão dos sistemas tem merecido uma série de estudos, seja a partir da análise de sua existência em termos nacionais, seja em relação aos processos de criação ou instituição, ou, ainda, sobre o uso do termo. Dos estudos realizados, destaca-se

7 capacidade máxima de absorção – “índice que representa o número de alunos que determinado município pode

absorver apenas com seus próprios recursos, isto é, os recursos da educação oriundos da sua receita local, sob a qual o Fundo não incidiu, e a sua quota-parte do Fundo”. (GUIMARÃES, J. L., 1998, p. 93)

o trabalho de Saviani, D. (1996) “Educação Brasileira – Estrutura e Sistema”, cuja versão inicial data de 1973.

Tal trabalho apresentou um estudo acerca da verificação da existência de um sistema educacional brasileiro, a partir da análise do entendimento dado ao artigo 5º, inciso XV, letra d, da Constituição Federal de 1946 – que concedia à União competência para legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional -, e do processo de tramitação do projeto que deu origem a Lei nº 4024/61.

Os objetivos propostos pelo autor enfatizavam a análise da existência de um sistema educacional brasileiro, contudo foi contemplada a idéia de sistema de ensino. O que se pode depreender dos estudos realizados por SAVIANI é que o termo sistema havia sido utilizado de maneira imprópria, tanto em função da confusão que se fazia – e se faz – entre sistema educacional, sistema de ensino e sistema escolar, quanto em relação ao caráter legítimo do uso de sistema educacional brasileiro para caracterizar como estava organizada a educação nacional, a luz do que determinava o projeto da LDB – em tramitação naquele momento. Pelos estudos apresentados, a LDB não pôde ser considerada como uma lei que sistematizava a educação, por não preencher “as condições necessárias8 à atividade sistematizadora”. (p. 107)

A Lei nº 4024/61 - artigo 8º - determinou que a União, Estados e Distrito Federal organizariam seus sistemas de ensino, observando o disposto na presente Lei. Contudo, ao município, naquele momento, não era concedido tal direito.

Tal situação permaneceu enquanto a legislação que a amparava vigorou, ou seja, os municípios não eram titulares dos sistemas de ensino, podendo sê-lo, somente, a partir de delegação dos Estados (Parecer CNE/CEB nº 30/2000).

8 Para uma análise mais detalhada a respeito das condições necessárias à atividade sistematizadora, consultar

A Constituição Federal de 1988 - artigos 30 e 211 – evidenciou a maior participação dos municípios na oferta da educação, especialmente o ensino fundamental, e, pela primeira vez, reconheceu os sistemas municipais. (OLIVEIRA; TEIXEIRA 2001, p. 138).

A exemplo do que determinou a Carta Magna, a Lei 9394/96 deu aos municípios a opção de criar sistema de ensino próprio, integrar-se ao sistema estadual, ou, ainda, compor com ele um sistema único.

No que se refere à existência de um Sistema Nacional de Educação, a legislação em vigor não contemplou tal organização, mas definiu que União, Estados, Distrito Federal e Municípios possuiriam seus respectivos sistemas de ensino “todos autônomos entre si e responsáveis por campos específicos de atuação” (Parecer CNE/CEB nº 30/200).

Sobre a existência dos diversos sistemas de ensino, o Parecer CNE/CEB nº 30/200 complementa: “... o modelo descentralizado de sistemas de ensino atende ao princípio federativo, permite maior flexibilidade, pode valer-se da colaboração recíproca a ser, inclusive, definida legalmente e não obsta a constituição de um sistema estadual e/ou municipal de educação”.

Diante da nova possibilidade que se apresentava, os municípios, por uma série de questões próprias, posicionaram-se a respeito da forma de organização da educação municipal, e alguns optaram por criar sistemas “autônomos”, desvinculando-se, assim, da esfera estadual, no que tange a gestão e organização da educação9.

Ao considerarmos a criação de sistemas municipais de ensino como uma opção no contexto das recentes políticas educacionais, não seria de todo descabido concebê-la como desejável ou, ainda, mais coerente. Os municípios já vinham se responsabilizando pela execução das tarefas relacionadas à educação, sendo assim, responsabilizar-se pela gestão seria o caminho natural a perseguir.

9 Entende-se, a partir da análise da Lei 9394/96 – LDB -, que a criação de sistemas municipais de ensino não se

confunde com a criação de redes municipais de ensino, principalmente se considerarmos o artigo 11, inciso III, que incumbe os municípios de baixarem normas complementares para seus sistemas de ensino.

Como vimos até aqui, as políticas de transferência de responsabilidades para a área educacional se efetivaram com o “apoio” de uma série de instrumentos de indução. Não obstante a oposição e defesa dos municípios – principais sujeitos das políticas –, o processo de descentralização foi se concretizando e assumindo, ao longo de sua trajetória – ainda em curso – diferentes facetas e modalidades. A municipalização, a criação de sistemas de ensino municipais, a criação de redes de ensino fundamental nos municípios são exemplos de ações descentralistas que, embora possuíssem singularidade, obedeceram a um mesmo objetivo.

Contudo, é nessa singularidade que os municípios se apoiaram para exercer uma certa autonomia, mesmo que esta se resumisse na escolha entre uma ou outra forma de assumir a tarefa imposta. Diga-se a propósito que autonomia, assim como democracia e participação, sempre foi lembrada e associada a esses processos e ações, ainda que ressignificada e relativizada.

Veremos, na próxima sessão, a relação que se buscou estabelecer entre descentralização e autonomia, descentralização e municipalização, autonomia e democratização, bem como algumas especulações sobre outras relações possíveis. Para tanto, buscaremos precisar determinados conceitos freqüentemente utilizados nos estudos sobre a temática. Os conceitos de descentralização, municipalização, sistema e autonomia, bem como outros, subjacentes à análise dos primeiros, merecerão, a seguir, análise pautada em documentos e citações de autores diversos, no intuito de, além de explicitar seus significados, contextualizá-los na pesquisa.