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O Colégio, em que o módulo de ensino foi desenvolvido se encontra no centro de Florianópolis e recebe alunos de diferentes bairros da ilha e cidades como São José, Palhoça e Biguaçu, no estado de Santa Catarina. Ele é considerado o maior colégio público da América Latina e, segundo Projeto Político Pedagógico (PPP), pois circulam em seus corredores cerca de 8.500 pessoas entre alunos, funcionários, professores e comunidade – durante todo o dia (nos três turnos de funcionamento). O sistema de avaliação é Trimestral, na forma de nota de 01 a 10 (um a dez).

O objetivo geral do PPP da escola pressupõe “produzir condições materiais e objetivas de apropriação e produção de novos conhecimentos, a partir do conhecimento produzido e acumulado, cientificamente, pela humanidade” (PPP, 2010, p. 6). Nesse sentido,

a função da escola - enquanto espaço coletivo de produção/reflexão de conhecimentos é possibilitar que os alunos (todos os envolvidos no processo) utilizem os conhecimentos como instrumento de ampliação das suas capacidades, como elementos constituidores de si mesmo enquanto sujeitos históricos que participam ativamente do mundo em que estão inseridos (PPP, 2010, p.12).

O Colégio, com a devida aprovação do Conselho Deliberativo, definiu os critérios para as inscrições que visam o processo seletivo por meio de sorteio e/ou teste classificatório para a complementação das vagas existentes na instituição de Ensino (PPP, 2010). Se compararmos o desempenho na média das notas no ENEM de 2011, a escola possui uma nota pouco acima da média da maioria das escolas públicas de Florianópolis e abaixo da média da maioria das escolas particulares de Florianópolis.

O contato com a administração escolar procedeu-se com a apresentação do projeto de pesquisa e a proposta de trabalho a ser desenvolvido. Após o planejamento inicial do módulo de ensino, realizou-se uma conversa com uma professora contratada para substituir um professor que estava de licença. O afastamento do professor atrasou a execução das aulas na escola, bem como a possibilidade de acompanhar as turmas antes do desenvolvimento das aulas. Na conversa com a professora houve a exposição da proposta do módulo, com a apresentação das atividades e objetivos do estudo temático e da pesquisa de doutorado. Ela se mostrou receptiva e interessada com as atividades, contribuindo com sugestões. O pesquisador também buscou conhecer os conteúdos que os alunos haviam estudado e estavam estudando nas aulas para, de alguma forma, fazer articulações com os conhecimentos que estavam sendo trabalhados nas aulas e evitar explicações demasiado repetidas que poderiam desestimular os estudantes, ou propiciar discussões muito distantes às que os estudantes estavam desenvolvendo nas aulas de Química.

Como sugestão da direção da escola e da própria professora, houve a negociação das aulas relativas ao projeto do Ensino Médio Inovador26 (EMI), que integra a escola desde 2010. A professora concordou com a execução da proposta em duas de suas turmas (uma do 1º e outra do 2º ano do ensino médio) do EMI, que ocorre no turno inverso das aulas regulares, no 2º semestre de 2011. A professora destacou que estava com dificuldade em preparar as aulas para trabalhar no EMI, visto que fazia pouco tempo que atuava como professora na escola e ainda não tinha preparado os projetos a serem desenvolvidos com as duas turmas. O EMI configura-se como um espaço rico para desenvolver atividades que têm como proposição superar as limitações do ensino tradicional que se caracteriza como meramente conteudista, propedêutico, linear e fragmentado, e que vê a escola como um centro de informação e transferência de conhecimentos estabilizados. Assim, o estudo da temática “Ar Atmosférico: o Ar que respiramos” tem potencial de considerar aspectos interdisciplinares e contextuais defendidos que objetivam uma educação voltada para a cidadania (BRASIL, 2006).

Segundo PPP da escola, na esfera do Ensino Médio e do Ensino Médio Inovador:

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Os objetivos do Programa estão disponíveis em http://gestao2010.mec.gov.br/marcos_legais/decree_102.php.

o processo de apropriação do conhecimento perpassará pela substancialização dos conhecimentos já apropriados, pela maturidade e discernimento na produção de um pensamento próprio e original, na perspectiva da materialização do conhecimento acumulado, tornando-o apto à pesquisa, na elaboração de novos conceitos, produtor de sua história através da leitura e releitura dos diversos discursos e olhares produzidos pelo homem (p. 14).

Na opinião do diretor de Educação Básica da Secretaria, [...] o programa [EMI] se caracteriza como um avanço, uma vez que o currículo tradicional apresenta dificuldades em aliar o ensino à realidade.

‘O Ensino Médio Inovador busca integrar conhecimento, conteúdo e prática em estreita articulação com a realidade tornando o conhecimento mais vivo, mais próximo dos estudantes e fazendo com que os educadores se tornem articuladores entre currículo, aluno e realidade’ (CANÃS, 2010).27

No âmbito da pesquisa, considerou-se o projeto EMI uma oportunidade de trabalhar de modo diferenciado com os estudantes, sem que fosse preciso preocupar-se demasiado com o programa da escola, visto que o ensino regular mantém um plano de ensino para os professores da área de Química, com conteúdos indicados a serem trabalhados em cada série do ensino médio. A proposta de ensino poderia atravancar com o programa da disciplina de Química da escola pelo fato de a abordagem temática elencar conteúdos que, muitas vezes, vão além da lista que tradicionalmente se estabelece para um determinado ano do ensino médio.

O professor/pesquisador formou-se em Licenciatura em Química, em 2007, e Mestrado em Educação nas Ciências, em 2010. A atuação como docente na escola refere-se: aos Estágios Supervisionados (nas disciplinas de Ciências e Química) durante o Curso de Licenciatura que frequentou; ao planejamento e acompanhamento de Situações de Estudo em uma escola estadual (com um grupo e professores de diferentes áreas

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Disponível em http://www.sed.sc.gov.br/secretaria/noticias/2301-escola-de- sao-jose-realiza-aula-inaugural-do-programa-ensino-medio-inovador, acesso em 27 de novembro de 2011.

do conhecimento); e ao trabalho de professor substituto, onde atuou como orientador e supervisor de mais de 30 licenciandos em disciplinas de Prática de Ensino de Química e Estágios Supervisionados (onde houve acompanhamento de aproximadamente 50% das aulas dos licenciandos nas escolas). Trata-se de um professor e pesquisador em fase inicial de carreira.

A turma do 1º ano foi a primeira no estudo da temática. Ela é constituída por 30 alunos, idade de 15-16 anos e residentes em diferentes bairros de Florianópolis e São José. A turma é bastante participativa, com vários alunos que falam durante as aulas. Trata-se de uma turma muito receptiva e espontânea, o que permitiu o diálogo desde o primeiro dia de aula. Ainda que a turma participe, ela possui alunos desatentos e que se dispersam facilmente, o que dificulta a concentração dos mesmos nas discussões durante minutos consecutivos.

A turma do 2º ano iniciou o estudo da temática quase um mês após a do 1º ano. Ela é constituída por 23 alunos, idade entre 16 e 18 anos e residentes em diferentes bairros de Florianópolis e São José. A turma do 2º ano é menos participativa que a do 1º ano e tem poucos alunos que falam durante as aulas. Trata-se de uma turma mais agitada, que se dispersa rápido e é muito unida, pois quando decidem faltar aula, os mesmos são organizados e mobilizam todos os colegas, avisando, inclusive, o professor da disciplina e desafiando a direção da escola, como se pôde observar logo nas primeiras tentativas de encontro com a turma. Esta, num primeiro momento, foi receptiva, mas houve diversos momentos em que o trabalho de organização do espaço escolar como ambiente de estudo tornou-se difícil, pois se formavam grupos que dispersavam a turma como um todo. O diálogo e a atenção por parte dos alunos foi aumentando no decorrer das aulas e os mesmos pareceram mais interessados pelas discussões a partir do terceiro ou quarto encontro, quando um maior número de alunos já participava das aulas.

Ambas as turmas são agitadas, pois os alunos conversam bastante entre si, têm dificuldade em ficar sentados e atentos às explicações do professor, na execução de alguma atividade ou fala de algum colega. Como o professor/pesquisador teve a oportunidade de conhecer várias escolas e turmas do ensino médio em componentes curriculares de estágios supervisionados de licenciandos de Química, na condição de professor substituto na UFSC, pode-se dizer que as turmas possuem características semelhantes às encontradas em muitas escolas públicas de Florianópolis. Grande parte dos estudantes demonstra interesse em fazer vestibular, outra parte é indiferente. Há um número elevado de faltas durante as aulas, o que parece decorrer do fato de as atividades

desenvolvidas no EMI não serem avaliativas, não havendo o somatório na avaliação das notas dos estudantes e também por alguns estudantes trabalharem durante o período do contraturno. No entanto, durante as aulas no período normal, as faltas também são recorrentes, segundo observações e conversas com professores da escola.

Os estudantes aceitaram muito bem a ideia da pesquisa, a gravação das aulas e a análise de suas falas. Vários demonstraram preocupação e questionaram quanto ao uso da imagem que estaria sendo gravada. Uma aluna do 1º ano relatou que outra professora já havia feito registro em vídeo para pesquisa, na sua turma.

A câmera era instalada, sempre que possível, antes dos alunos entrarem na sala de aula e ficava, em quase todo o momento, com o foco no quadro ou onde o projetor focava os diapositivos. Optou-se por esse procedimento para evitar distrações por conta da câmera, como se observou nos poucos momentos em que a mesma se direcionava aos alunos. Essa opção gerou problemas como: a não identificação de alguns estudantes que falavam e a não captação dos gestos e suas expressões faciais. No entanto, a transcrição ou consideração de alguns desses aspectos foram realizados com base na memória do professor/pesquisador. Entende-se que essa perda de informação foi compensada pela maior espontaneidade dos alunos durante as aulas.

Optou-se também que o registro não fosse feito por outro sujeito, pois os estudantes poderiam prestar mais atenção em “aparecer” no vídeo do que participar nas discussões desenvolvidas em aula. Pesquisas destacam a importância de “iniciar as gravações algumas aulas antes das planejadas para a obtenção dos dados, de tal modo que os alunos e o professor já vejam essa função como parte da aula e toda a curiosidade já tenha sido acalmada” (CARVALHO, 2007, p. 31), não sendo o caso desta pesquisa. Nesse sentido, buscou-se manter uma “aula normal”, sem a interferência de outro sujeito que não fazia parte do contexto dos alunos.

Desde já, destaca-se que, apesar de as turmas serem de séries distintas e perfis diferentes, ambas as aulas têm potencial de análise quanto à mobilização de linguagens e pensamentos referentes a partículas submicroscópicas, e pode-se predizer que elas apresentam resultados que se corroboram mutuamente, podendo-se, inclusive, fazer considerações relativas a tempos escolares distintos. Ambas as turmas retratam problemas de coerência conceitual que merecem ser debatidos, especialmente quanto à linguagem química que é apropriada e que reflete no modo de promover explicações sobre fenômenos ou situações. Nesse sentido, o fato de analisar turmas distintas não prejudica a análise

realizada, mas incorpora elementos a serem debatidos na área de Ensino de Ciências/Química, em especial, sobre a elaboração de conhecimentos referentes ao emprego (uso e interpretação) de representações de partículas submicroscópicas.