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O objetivo dos itens subsequentes é trazer discussões teórico- reflexivas sobre a natureza do conhecimento científico, em especial sobre as imagens representativas de partículas submicroscópicas como um tipo de linguagem utilizada na compreensão e interpretação de fatos/fenômenos que permeiam, principalmente, o ensino das Ciências/Química.

Parte-se do pressuposto da importância das reflexões epistemológicas sobre a relação entre conhecimento e realidade, entre sujeito e objeto cognoscente no tocante ao conhecimento produzido e aquele a ser ensinado. Tal aspecto, todavia, foi pouco explorado em estudos anteriores (SANGIOGO, 2010) nos quais se problematizaram as representações de partículas submicroscópicas em aspecto pedagógico do ensino de CNT. Nesse sentido, para uma melhor compreensão acerca de tais representações (que são um dos mais importantes instrumentos linguísticos que compõem a Ciência e o ensino de CNT), tomamos algumas categorias e reflexões sobre a natureza do conhecimento

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Uma versão, posteriormente, ampliada e revisada foi publicada nos Anais do VIII Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências – VIII ENPEC e I Encuentro Iberoamericano de Investigación en Didáctica de las Ciencias – I EIPEC, que se realizou entre 05 a 09 de dezembro de 2011, em Campinas/SP, cujo título é “Compreensões sobre Representações de Estruturas Submicroscópicas à luz da Epistemologia de Hessen e Bachelard”, na autoria de Fábio André Sangiogo e Carlos Alberto Marques.

desenvolvidas por Hessen (2003), Bachelard (1978a, 1978b, 1983, 1996) e Fleck (1986, 2010). O primeiro por discutir sobre distintas posturas (visão ou concepção) filosóficas ou epistemológicas que demarcam: a possibilidade, a origem (ou gênese) e a essência do conhecimento. O segundo pelos aspectos que permeiam o conhecimento científico e suas representações, a partir de escritos sobre a recorrência histórica e o racionalismo aplicado relacionados à perspectiva da produção do conhecimento. E o terceiro ao ampliar a perspectiva da compreensão do conhecimento como uma construção histórica e social, ao incluir um terceiro fator - o estilo de pensamento (EP) – para fazer a mediação entre sujeito e objeto do conhecimento, além de ampliar a discussão sobre a disseminação de conhecimentos e práticas (DELIZOICOV, 2007).

Uma das implicações decorrentes da relevância de se considerar aspectos da natureza da Ciência no ensino de Química deve-se à compreensão de que “o reconhecimento dos limites de cada teoria, de cada modelo, de cada avanço, é fundamental para se construir uma cultura sobre ciência contextualizada na cultura científica deste final de século [XX].” (MORTIMER, 2000, p. 118).

Por conseguinte, tanto o processo de produção do conhecimento científico quanto o conhecimento escolar (que se trata do conhecimento ensinado e apreendido no contexto da escola) são objetos de reflexões por parte de distintos pesquisadores da área de Ensino de Ciências, a exemplo das pesquisas que consideram aspectos de estudos sobre história e filosofia das Ciências (LOPES, 1999; MALDANER, 2003; MORTIMER, 2000; EL-HANI, 2007; PEDUZZI, 2007). Com base em Lopes (1999, 2007), entende-se que reflexões sobre tais campos do conhecimento são importantes na compreensão e na interpretação de fatos/fenômenos, pois cada vez se tornam mais perceptíveis algumas das implicações, na sociedade, do conhecimento produzido, seja por parte da comunidade científica ou da comunidade escolar.

O avanço do conhecimento científico e tecnológico tem se tornado cada vez mais visível, transformando o cotidiano da sociedade, a exemplo da medicina que avança ao desenvolver tratamentos cada vez mais especializados e das tecnologias de comunicação e de armazenamento de dados. No cenário da educação em CNT, apesar de tímidas, são perceptíveis também algumas mudanças na abordagem didática desenvolvida em sala de aula, como as propostas de ensino por Temas, as diferentes metodologias de ensino, as abordagens mais contextualizadas e interdisciplinares envolvendo a ciência, tecnologia e sociedade, tais como propõem as Orientações Curriculares Nacionais

para o Ensino Médio (BRASIL, 2006). Nesse cenário é importante que tais mudanças sejam merecedoras de contínuas reflexões, para as quais o olhar epistemológico (que não exclui o conhecimento pedagógico e específico do conhecimento científico/químico) é fundamental, visto que os reflexos de como se compreende o processo de produção do conhecimento científico influenciam, direta ou indiretamente, as visões de ciência e/ou de ensino de CNT (MALDANER, 2003; CACHAPUZ; PRAIA; JORGE, 2004). Visões que, nas relações intersubjetivas da sala de aula, constituem a produção do conhecimento escolar por parte dos estudantes, além da produção de saberes docentes diversificados por professores (TARDIF, 2007). Logo, reflexões de caráter epistemológico são essenciais na formação de professores (e de pesquisadores) da área, de modo a possibilitar melhorias na visão de seus modelos teóricos e no ensino de CNT (GIL PÉREZ et al., 2001; MALDANER, 2003).

Uma forma de linguagem que pode funcionar como ferramenta para melhor compreensão de modelos teóricos são as imagens representativas de entidades químicas (de partículas submicroscópicas). Atualmente, o avanço da tecnologia tem possibilitado um reforço nessas representações, aprimorando os significados dessa linguagem imagética, a exemplo dos microscópios de força atômica, em que “a imagem é gerada pela interação entre a ponta de prova de um microscópio de força atômica e a molécula” que está sendo “observada” e “as medições dessas interações são interpretadas pelo software do microscópio, que produz uma imagem do relevo da molécula”10

. Já no cenário da educação em CNT, as imagens representativas de entidades químicas também permeiam, cada vez mais, as explicações desenvolvidas no contexto escolar, como as mudanças na abordagem de conteúdos/conceitos ao longo dos capítulos de livros didáticos da área das CNT, com um crescente aumento do uso de representações de entidades químicas, esquemas, fotografias e outras que alteram suas formas de apresentação visual.

Ainda que se considere que as reflexões sobre as imagens representativas de entidades químicas se inscrevam no processo de produção do conhecimento científico, as discussões focalizam-se nas imagens porque elas consistem numa forma de expressão da linguagem que integra e constitui importantes funções na Ciência e no ensino de

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Redação do Site Inovação Tecnológica. Molécula individual é "fotografada" pela primeira vez. 28/08/2009. Disponível em: <http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=molecula- individual-fotografada&id=010165090828>. Acesso: 17/09/2010.

CNT, de modo a ajudar nas explicações que envolvem o nível submicroscópico, a exemplo de propriedades e transformações químicas, modelos atômicos, substâncias, membranas celulares, micelas, enzimas e etc.

Conforme já explicitado no item anterior, com base em Vigotski (2001), entende-se que tais representações se constituem mediante o pensamento, pelo uso de simbologias específicas, de signos provenientes da cultura, especialmente a científica e a escolar; sem desconsiderar, no entanto, que tais construções são provenientes da relação com sujeitos (social e histórico, possuidores de um EP) e um objeto que se pretende conhecer. Nesse sentido, tais imagens são oriundas da relação dialética entre os sujeitos e o objeto do conhecimento, com o homem carregando marcas do seu contexto social, cultural e historicamente situado. Algo que, se usado em situações de representação de entidades químicas na escola, induz à importância da apropriação de palavras e sentidos específicos da ciência Química, ou seja, coerente com pensamentos e abstrações aceitas e expressas por linguagens e conceitos (históricos) bastante específicos. Obviamente, isso deve ser feito se se considera necessário propiciar, aos sujeitos da aprendizagem, o acesso a compreensões e explicações sobre o mundo, superando conhecimentos oriundos da experiência primeira (BACHELARD, 1996), por processos dialógicos de ensino (FREIRE, 2001), por meio da consciência das complicações, ao compreender que seus conhecimentos não são suficientes para a resolução de um determinado problema (FLECK, 2010).

2.3 As distintas posições epistemológicas para a compreensão da