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CAPÍTULO III – REDE CARITAS E EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA

2. ESCRITORIO REGIONAL E ECONOMIA SOLIDÁRIA

2.3 Desenvolvimento Solidário Sustentável

Com a consolidação da Rede pelo estabelecimento do escritório regional na década de 90, a rearticulação das ações em torno dos programas prioritários foram orientados de acordo com linhas ou diretrizes para a ação. Essas linhas ou diretrizes estão definidas em três tópicos: defesa e promoção dos direitos humanos, incidência em

políticas públicas e controle social, fomento do desenvolvimento solidário sustentável113. Dentre estes, o projeto trienal da Rede Caritas no NE 2, ano 2010-2013, destaca o desenvolvimento territorial solidário sustentável como linha prioritária114. Por desenvolvimento solidário sustentável, a Rede entende:

Um processo endógeno de mobilização das forças sociais e das potencialidades econômicas locais com a finalidade de implementação de mudanças que proporcionem a elevação das condições de vida da população local, em harmonia com o meio ambiente e com a participação ativa e solidária da sociedade na autogestão do seu desenvolvimento. (CARITAS BRASILEIRA. Marco Referencial da Caritas Brasileira: políticas, prioridades e ações. Brasília, 2011, p. 14).

Ao definir o desenvolvimento como processo endógeno, a ES aparece como escolha política e institucional. De acordo com essa linha de ação, organizam-se os programas sociais de catadores de material reciclável, de convivência com o semiárido e demais programas. Os sujeitos que participam dos programas voltados aos catadores de recicláveis e à convivência com o semiárido - catadores e agricultores - são acompanhados pelos agentes caritas nos locais onde produzem (galpões e sítios), nos fóruns de ES, conselhos da sociedade civil e nos encontros de formação da Rede. A Caritas privilegia as ações de proximidade. Relações personalizadas que se efetivam no acompanhamento direto, às pessoas em situação de exclusão.

Este acompanhamento consiste em um conjunto de ações sociais (projetos para aquisição de galpões, material de trabalho, construção de cisternas, plantio de quintais agroecológicos e sementes nativas, organização de feiras orgânicas, encontro de formação técnica e política) que incidem localmente, como alternativas de trabalho, renda, cidadania e qualidade de vida. Estas ações sociais enquanto projetos sociais, são as formas nas quais encontramos o sentido e os valores que os agentes conferem à relação dinheiro-valor. É necessário, portanto, antes de continuarmos a análise sobre a ação social da Caritas, definir o conceito de ação social do qual partimos.

Explicar um fenômeno social é explicar a causa que lhe dá origem; esta causa pode ser única ou múltipla, mais ou menos complexa, dependendo dos fundamentos sólidos sobre os quais repousa. Quer trate-se de um fenômeno macroscópico ou

113

Conferir documento interno: CARITAS. Marco Referencial da Caritas Brasileira: políticas, prioridades e ações. Brasília, 2011, p. 05.

114

Conferir Ações em Redes de Economia popular Solidária, Agroecologia e Desenvolvimento Territorial Solidário e Sustentável. Projeto trienal 2010-2103. Recife, outubro 2009, p. 15.

microscópico, explicar é clarificar proposições que são afirmações, sobre os motivos que levaram o agente, consciente ou não, a produzir o fenômeno analisado. A tradição da sociologia que estuda a ação social a partir destes princípios é conhecida como sociologia da ação. Weber foi quem melhor entre os sociólogos, definiu as categorias que envolvem as análises sobre a ação social: sentido, valores, relação social. Para ele, a sociologia deve ser conduzida metodologicamente de maneira individualista (tal qual a economia); considerando o indivíduo, sua atividade e seu contexto como uma unidade.

Weber possui como principio de método ao explicar a sociologia das religiões, por exemplo, que as causas das crenças religiosas dos agentes sociais reside no sentido que eles conferem às suas ações. As razões dos agentes podem ser as causas das crenças e das ações sociais. Mas esta ação, nem sempre é resultado de motivações racionais. Elas podem ser resultados da tradição, dos afetos. É desta forma que Weber em Economia e Sociedade categoriza as ações em tradicionais ou afetivas, depois de tê-las categorizado em racionais com relação a fins e aos valores. Este paradigma metodológico e heurístico baseado na compreensão, está em oposição direta ao paradigma positivista, derivado sobretudo da interpretação das Regras do Método Sociológico de Durkheim, na qual o social deve ser explicado pelo social; rejeitando de antemão, qualquer possibilidade de que as causas de um fenômeno social estejam na subjetividade do indivíduo.

Desta forma, concluímos que o individualismo é próprio das sociedades modernas, nas quais figuram como um de seus símbolos, o dinheiro e sua circulação, como explica Simmel. É apenas nestas sociedades que o indivíduo é considerado de forma autônoma e como objeto de análise sociológica. Mas o valor que se atribui ao indivíduo, modifica de acordo com o tipo de sociedade; isto não quer dizer, no entanto, que não interessam as razões e as crenças dos indivíduos enquanto causas das ações sociais. Mas que o grau de individualismo é variável. Nos EES, sobretudo daqueles marcados por dinâmicas comunitárias ainda fortes – espaços rurais, grupos de gênero ou étnicos – os níveis de individualismo são menores ou menos densos se comparados a dinâmicas urbanas. A abordagem da ação social que tratamos considera o indivíduo, suas crenças, sentidos, valores como causas das ações sociais, na qual o individualismo metodológico é uma racionalidade entre outras, que não reduz todas as explicações à relação custo-benefício. Assim, recuperamos de Weber a relação do sentido na ação social e na relação social, percebendo de forma intencional os sentidos e os valores

atribuídos ao dinheiro e sua circulação, segundo o modelo forma e conteúdo simmeliano; proposta que perseguimos deste o inicio deste estudo.

Tomamos ainda a categoria de ação social da Rede Caritas da maneira como contextualizou Sheliga (2010), ao analisar as práticas assistenciais de evangélicos brasileiros. Segundo a antropóloga a ação social no campo da assistência,

[...] remete a um campo semântico no qual as ideias de movimento e mudança são fundamentais e supõe que não só quem promove a ação, mas também aquele para quem a ação foi dirigida, é ator e sujeito desta ação. A opção pelo termo ação social indica, portanto, a adesão a um projeto que, por princípio, rejeita a assistência e a caridade, por considerá-las inadequadas: ao invés de primar pela autonomia do sujeito, transformando-o em protagonista da ação, elas perpetuariam uma relação de tutela. A ação social, pelo contrário, por orientar-se por princípios de uma gestão racional e eficiente dos recursos humanos e financeiros, teria mais condições de emancipar os sujeitos envolvidos em uma relação de assistência - seja o beneficiário final em relação à organização que lhe presta algum tipo de auxílio, seja a própria organização social que promove a assistência em relação às agências de cooperação e financiamento. (SHELIGA, 2010, p.83).

Assim delimitamos a problemática desta pesquisa à relação entre valores e dinheiro nas ações sociais de acompanhamento da Rede aos EES, cuja finalidade não é recuperar a história da assistência social no âmbito do catolicismo115, ou da ES na Rede116, mas estabelecer um recorte histórico e temporal que inicia pela organização dos segmentos de catadores de material reciclável e de agricultores da agricultra familiar no NE 2, analisando a relação das práticas econômicas solidárias com os valores da Rede, a partir dos sujeitos envolvidos: agentes caritas e empreendimentos. Que sentidos conferem aos conteúdos que circulam em suas ações e relações sociais. Antes de discutir as práticas econômicas dos EES, os conteúdos e as formas de sociabilidade que estabelecem, situamos brevemente o debate atual sobre ES, a percepção e a crítica de seus principais autores.

115

Sobre o tema, pode-se ler: LANDIM, Leilah. A invenção das ONG´s: do serviço invisível à profissão impossível. Tese de doutorado antropologia social, UFRJ, 1993.

116

Sobre o tema: BERTUCCI, Ademar de Andrade e SILVA, Roberto Marinho da (Orgs.). 20 Anos de Economia Popular Solidária: trajetória da Caritas Brasileira dos PAC´s à EPS. Caritas Brasileira, Brasília, 2003. CARITAS BRASILEIRA. Economia Popular Solidária. Caderno 2. Caritas Brasileira, Outubro 2001.

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