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DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E SUSTENTABILIDADE

ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE AGRICULTURA SUSTENTÁVEL

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E SUSTENTABILIDADE

O conceito sustentabilidade da relação homem-natureza é uma ideia recente, uma vez que, nos países desenvolvidos, o ambienta- lismo somente tomou corpo dentre os anos de 1945 a 1950, o pós- guerra. O termo sustentabilidade despontou na década de 80, insti- tucionalizado em 1987, pela Comissão Mundial do Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) de Brundtland, quando foi elaborado o relatório conhecido como Nosso Futuro Comum, e considerado como base para a definição dos princípios da biodiversidade e do futuro da geração vindoura. Nas décadas mais recentes, conferência Rio-92 e Rio+20, a discussão sobre sustentabilidade foi reforçada com defini- ções de que todas as nações devem ajustar o desenvolvimento sob a luz de segurança alimentar e de sustentabilidade.

Porém, os debates afloraram bem antes das discussões interna- cionais realizadas no pós-Segunda Guerra Mundial sobre fragilidades e limitações do conceito de desenvolvimento como simplesmente crescimento econômico. Tratava-se, na verdade, de um reexame do conceito de desenvolvimento, predominantemente ligado à ideia de progresso econômico. A palavra sustentabilidade tem sua origem do latim sus-tenere (EHLERS, 2008), que significa sustentar ou manter. Contudo, o conceito de sustentabilidade apresentado na literatura tem inúmeras definições. Observa-se, no relatório de Fournex – do- cumento que serviu como uma preparação para a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano de 1972 –, a existência de dois caminhos antagônicos a respeito da construção conceitual de sustentabilidade. O primeiro caminho, de cunho pessimista, focado no esgotamento dos recursos naturais e na incapacidade do progres- so técnico-científico de resolver essa questão; já o segundo, otimista, apontado pelas inovações tecnológicas e pelo conhecimento cientí- fico, considerando ser possível solucionar os problemas ambientais que se apresentem.

Com a inclusão do desenvolvimento sustentável nos debates dos fóruns mundiais da década de 1970 sobre desenvolvimento, a temáti- ca era abordada mediante as dimensões econômica, social e ambien- tal. Até então, ao se estudar o desenvolvimento, a preocupação estava

relacionada aos recursos eram utilizados, transformados e como os ganhos eram distribuídos. Com a contribuição de Sachs (2005) nesse debate, ocorre a inserção nele de mais duas dimensões do desenvolvi- mento: a espacial e a cultural. Para o autor, o desenvolvimento perde- ria o sentido se ocorresse o crescimento em detrimento da cultura da sociedade.

Essa discussão surgiu também devido a inquietações sobre os ca- minhos que vinham sendo tomados pelo crescimento econômico, na medida em que, havendo a preocupação com o desempenho quanto à satisfação das necessidades humanas, em muitos territórios, enquanto aos recursos naturais eram comprometidos pelo esgotamento e pela degradação ambiental.

Dessa forma, a justaposição de sustentabilidade e desenvolvimen- to sustentável foi apontada pela Comissão Mundial sobre o Meio Am- biente e Desenvolvimento (CMMAD, 1987), presidida por Gro Harlem Brundtland, à época primeira-ministra da Noruega, com a incumbência de reexaminar as questões críticas do meio ambiente e do desenvolvi- mento, tendo como objetivo elaborar uma nova compreensão do pro- blema, além de defender propostas de desenvolvimento sustentável de abordagens local.

Nesse cenário, o termo sustentabilidade passou a ser mundial- mente conhecido e utilizado, tendo-se em vista o desenvolvimento per- mitir satisfazer as necessidades presentes sem comprometer a capaci- dade das gerações futuras de satisfazerem suas próprias necessidades (WCED, 1987). Com essa perspectiva, o desenvolvimento econômico e a utilização racional dos recursos naturais estão inexoravelmente ligados no tempo e no espaço.

As recomendações da Conferência em Brundtland, 1987, constitu- íram-se em uma base para a Conferência sobre Meio Ambiente Rio-92, que teve como objetivo geral avaliar como o tema ambiental estava atrelado às políticas e ao planejamento dos países, desde a Conferên- cia de Estocolmo de 1972. A importância dessas duas conferências – Brundtland, 1987, e Estocolmo, 1972 – para a elaboração conceitual sobre o desenvolvimento sustentável veio consolidar, ainda mais, as discussões na Conferência Rio-92, na qual se firmou a ideia de que o desenvolvimento sustentável passava a ser um compromisso de cada pessoa, uma vez que, além de usuários dos recursos naturais, todos são também provedores de informações e conhecimentos sociais, am- bientais e político-institucionais (BRASIL, 1992).

Esse enfoque foi trazido, também, para a pauta da Conferência Rio+20 e, por meio do relatório, o futuro que queremos sobre susten- tabilidade, em que a diversidade, cultura e étnica, consideradas vitais para tal proposta, trazendo na essência o reconhecimento das dife- renças, em que essa tríade deve-se convergir a caminhos sustentá- veis. Para isso, colocou-se em pauta o papel da ciência e da inovação tecnológica, interdisciplinar, na transição para a economia verde e a erradicação da pobreza socioambiental (ONU, 2012).

O caminhar juntos, interdisciplinar, significa chegar à essência da vida planetária através do conhecimento e de informações sobre a manutenção dos recursos naturais e da vida das pessoas, as quais cla- mam por existir. Isso é legitimado no referido relatório, na seção Ma- nutenção da Agricultura/Floresta, por meio de dez recomendações, dentre as quais se destacam a redução em 150 milhões de ha, do des- matamento até 2020 e a necessidade de investir em ciência, tecnolo- gia, inovação e conhecimento local. Essas estratégias visam contribuir para se enfrentar um dos principais desafios do binômio agricultura/ floresta: torná-lo produtivo sem destruí-lo e torná-lo sustentável.

Tratando da segurança alimentar, tema debatido na Rio+20, me- rece destaque o posicionameto de Vanda Shiva, sobre a necessidade de fazer prevalecer direitos e acesso dos produtores rurais, tradicio- nais às tecnologias, as quais devem permitir a utilização de maquiná- rios de baixo consumo energético, elevando a produtividade e a sus- tentabilidade desejável. Esse entendimento fica claro quando a ONU afirma que, para “lograr un justo equilibrio entre las necesidades eco- nómicas, sociales y ambientales de las generaciones presentes y futu- ras, es necesario promover la armonía con la naturaleza” (ONU, 2012, p.8). A relação homem-natureza clama-se pela necessidade de infor- mações nas diversas escalas geográficas e temporais, uma vez que os indicadores comumente utilizados, como renda per capita, produto nacional bruto, estimativas dos fluxos individuais de poluição ou de recursos não fornecem indicação suficiente sobre a sustentabilidade local por corresponder abordagens generalizadas.

Assim, os instrumentos de avaliação de diferentes parâmetros ambientais e de desenvolvimento sustentável, muitas vezes, não re- presentam a realidade in loco, uma vez que o ideal do desenvolvi- mento sustentável emerge na tentativa de harmonizar crescimento econômico, equidade social e preservação ambiental. Por essa lógica, a discussão conceitual sobre desenvolvimento sustentável da agricul-

tura moderna encontra barreiras na prática, prevalecendo a lógica de mercado em vez da lógica das necessidades humanas. Isto é, os pa- drões de consumo e de acumulação da sociedade contrastam com a finitude dos recursos naturais e com os limites de assimilação e su- porte impostos pela natureza.

No entender de Christen (1996), os sistemas de produção agrí- colas devem ser observados nas pesquisas de avaliação da susten- tabilidade por meio de dimensões, indicadores locais, combinando escalas temporais específicas. Além disso, compreende-se que, sendo a sustentabilidade mensurável a partir de indicadores, o conceito de sustentabilidade terá, eventualmente, consequências esperadas para a gestão da agricultura. Assim como existem inúmeros conceitos de sutentabilidade, também há, no universo das pesquisas, inúmeros modelos de mensurá-la.

Para a consolidação da sustentabilidade local, devem-se consi- derar as dimensões ambiental, social, ecológica, econômica, cultural, política e psicológica (SACHS, 2004). Por sua vez, o desenvolvimento para ser sustentável, a situação desejável é de que se sustente por aproximadamente 25 anos, considerando que os processos sociais e naturais são dinâmicos.

Nesse intuito, defende-se que a sociedade sustentável deva per- mitir e sustentar as modificações partindo do local para escala pla- netária. Caso contrário, desenvolvimento sustentável permeia pela conceituação científica, de cunho desafiador, mas irrelevante. A ava- liação de sustentabilidade da agricultura e o modo como a sociedade se apropia dos recursos naturais podem indicar formas de reverter tendências insustentáveis. Por essa leitura, um conceito de sustenta- bilidade aplicado a qualquer atividade desenvolvida pelo homem, ru- ral ou urbano, deve considerar as contingências do local e do tempo. De acordo com Conway (1993), a sustentabilidade deve ser perce- bida pela visão genérica, por isso mesmo adaptável às diversas ativi- dades antrópicas sem perder a referência da escala local ao longo do tempo. Esse autor define sustentabilidade como a habilidade de um sistema em manter sua produtividade quando está sujeito a intenso esforço ou a alterações. Isto é, sustentabilidade seria a capacidade de um sistema agrícola em manter ou melhorar sua produtividade atrelada aos recursos naturais e com a aptidão socioeconômica local.

Os autores Hammond et al. (1995), Sachs (2004), Sepúlveda (2008) e Cotrim (2008) conceituam sustentabilidade como sendo um proces-

so multidimensional e intertemporal, devendo ser praticada na escala local e tendo como eixos dinamizadores as dimensões ambiental (re- siliência), econômica (produtividade) e social (equidade e autonomia).

No contexto da agricultura sustentável a capacidade de manu- tenção da produção através do tempo, média de 20 anos, por meio de propriedades: resiliência, sendo a capacidade das propriedade agríco- las de manter a produtividade diante das flutuações cambiais, climáti- cas ou de agressões externas; produtividade, abrangendo o resultado da produtividade agrícola; equidade, focando o grau de igualdade de distribuição da produtividade do sistema agrícola entre os represen- tantes e trabalhadores – beneficiários humanos; e a autonomia, per- mitindo a materialização do conhecimento em nível de gestão, mane- jo e empoderamento das pessoas.

Por fim, os caminhos percorridos pela FAO (2011) sinalizam que o acesso mundial à alimentação, face à dinâmica natural, às mudanças climáticas, é também um dos desafios para sustentabilidade agrícola, ao afirmar que aproximadamente 850 milhões de pessoas passam fome no mundo – dentre estas, 820 milhões vivem em países em de- senvolvimento –, e possivelmente serão afetadas pelas mudanças climáticas, debatidas por inúmeros estudos, além de problemas so- cioeconômicos.

ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE AGRICULTURA SUSTENTÁVEL