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O registro de informações relativas às decisões é considerado de significativa impor- tância, pois soluções analisadas e adotadas em projetos passados podem ser úteis para situa- ções vivenciadas no presente, uma vez que erros cometidos podem ser evitados e soluções adotadas podem ser aprofundadas (SOUZA et al., 1998).

Souza et al. (1998) conceituam o conjunto de informações relacionadas às decisões e também às alternativas consideradas, juntamente com suas justificativas (sejam elas para o descarte ou adoção) como Design Rationale (DR), por se referir às representações explícitas de conhecimentos, de experiências e lições aprendidas, que permitem descrever os espaços de

decisões e avaliações. Ou seja, DR corresponde à documentação das decisões do projeto, jun- tamente com as alternativas consideradas, as avaliações, argumentações e justificativas que conduziram a escolha de uma solução.

Burge e Brown (2000) ressaltam que a documentação existente em processos de de- senvolvimento de software é muito importante para o resultado do produto gerado, porém elas acabam registrando apenas as últimas decisões de cada fase. Isso ocorre devido ao esforço, considerado oneroso, para registrar todas as alternativas investigadas.

De forma geral, uma “rationale” é uma justificação por trás de uma decisão (DU- TOIT, 2006). Aplicando a um projeto, “design rationale” é a razão pela qual um produto está. Esta técnica corresponde ao coproduto de design ao longo da produção de um artefato, captu- rando as decisões e dificuldades encontradas em determinado momento de um projeto.

Intrinsecamente, pode-se valorar a elaboração de um DR de acordo com a melhora de performance da gestão por processos ou mesmo de projetos, fornecendo uma forma unificada de documentar decisões e proporcionar o amadurecimento de soluções.

Esse valor favorece a comunicação entre os diversos envolvidos em projetos, sejam eles participantes de diferentes equipes e funções. A comunicação estabelecida por essa técni- ca subsidia o processo de manutenção, pois promove o entendimento da estratégia de um arte- fato, podendo apresentar restrições e impactos relacionados à sua mudança.

2.3.1 História do Design Rationale

Toulmin (1958) pode ser considerado o precursor de esquemas de representação gráfi- ca semiformal para visualização de argumentos baseados em DR. Nessa representação, um argumento é composto por um fato ou observação; um passo lógico e uma assertiva. A justifi- cativa era apoiada ou por um material de apoio ou por uma explicação.

Conklin (1989) enxergou no DR a importância para o processo de manutenção. De acordo com o autor, as atividades de manutenção podem ser influenciadas pelas decisões to- madas no projeto. Dessa forma, as suposições efetuadas, alternativas rejeitadas, critérios e requisitos considerados influenciariam no grau de qualidade, confiança e tempo na execução de demandas de manutenção.

No entanto, de acordo com Lee e Lai (1991), o trabalho de Toulmin (1958) ainda apresenta algumas deficiências no que se referem ao DR. Lee e Lai (1991) elaboraram uma análise expressando a ausência de noção de alternativas ou medidas de avaliação (a situação das alternativas, tais como rejeitado e aceito), pois o escopo apresentado era limitado apenas

pela representação de argumentos.

Além disso, Carroll e Moran (1991) concluíram que o design rationale, quando apli- cado em problemas reais, demonstra não apenas a solução de problemas difíceis, ou mesmo uma reflexão sobre a melhor solução, mas ilustra os mais variados tipos de resoluções do pro- blema, considerando características distintivas, sem a intenção de apresentar soluções singu- larmente corretas. Dessa forma, de acordo com os autores, dependendo do aspecto a ser con- siderado, um problema possui potencial de conter soluções ilimitadas, considerando efeitos colaterais e diferentes contextos de aplicação.

Em 1996, DR foi referido por Gruber e Russel como explicações sobre o raciocínio do projeto, correspondendo à representação do Como e do Porque um artefato, ou componente foi construído ou projetado, ou mesmo como uma solução de projeto foi definida.

Hu (2000) definiu o DR como a justificativa da decisão tomada para a elaboração de um artefato do projeto ou parte dele, incluindo a representação de suas razões, alterações e de todas as demais decisões intermediárias.

Francisco (2004) entendeu que a limitação da memória humana pode ser considerada um importante motivador para a preservação do DR. Com o passar do tempo, os seres huma- nos não preservam de forma completa e fiel algumas informações. O autor considerou o DR como solução para essa problemática, proporcionando a lembrança de toda a razão por detrás da solução, diminuindo as ocorrências de perpetuação de erros já cometidos ou mesmo de soluções ineficientes.

No decorrer dos anos, diferentes abordagens foram criadas para o DR. A sua represen- tação pode seguir três perspectivas: a argumentação, a comunicação e a documentação (SHIPMAN e McCALL, 1997). Dessa forma, a argumentação e a documentação têm seu foco voltado para as decisões do projeto e para a razão por detrás delas. O que as difere é que a primeira tem como objetivo adicional estruturar como o decisor abordou o problema; e a se- gunda tem como objetivo principal fornecer conhecimento sobre o projeto a pessoas externas. A perspectiva de comunicação é uma tentativa de preservar a comunicação do projeto (e- mails, minutas de reunião, etc) em tempo real (BURGE e BROWN, 2000).

Shipman e McCall (1997) consideram a comunicação como a perspectiva mais efetiva para a captura do DR envolvido em um projeto, porém atentam para a dificuldade de sua re- cuperação devido à dificuldade de sua indexação. Em contrapartida, Francisco (2004), acredi- ta na utilidade da recuperação da argumentação, porém ressalta a existência de problemas relacionados à captura dessa perspectiva. O Quadro 1 ilustra as principais diferenças entre as três perspectivas.

Quadro 1: Perspectivas de Representação o DR (FRANCISCO, 2004)

Perspectivas Características

da informação Argumentação Comunicação Documentação

Conteúdo Semiestruturado Não estruturado Estruturado

Nível de detalhamento da informa- ção armazenada em relação à pro- duzida durante as discussões

Médio (analítica e

sintetizada) Alto (Analítica) Baixa (Sintetizada)

Momento da Captura Durante a discussão Durante a discussão Após a discussão

Esforço/Atividade requerido(a) no

momento da discussão Classificar os nós e links Não possui Não possui

Esquemas de representação Nós e links Diversas mídias Linear

São muitas as notações para representar a argumentação, dentre elas são consideradas como destaque as seguintes (FRANCISCO, 2004):

 Issue Based Information System (IBIS): modelo baseado em questões, representando a argumentação por meio de questões (problemas), posições (respostas) e argumentos (prós e contras);

 Procedural Hierarchy of Issues (PHI): extensão do IBIS, representando a argumentação por meio de Questão, Subquestão, Resposta, Sub-Resposta, Argumento e Subargumen- to.

 Question Option Criteria (QOC): nesse modelo os nós são Questão, Opção e Critério. O destaque dessa notação em relação às demais está no nó Critério, que possibilita a cap- tura explícita dos critérios, que influenciaram na tomada da decisão.

 Decision Rationale Language (DRL): assim como PHI, também é uma extensão do IBIS, no entanto, envolve um número maior de abstrações e relacionamentos (Proble- ma, Decisão, Objetivo, Alternativa, Alegação, Questão, Procedimento e Grupo).

Além disso, de acordo com Burge (2005), a representação do DR pode ser implemen- tada seguindo uma abordagem formal (computador representando o dado sem necessariamen- te ser compreendido por uma pessoa), informal (facilmente compreendido por pessoas, mas sem utilização por máquina) ou semiformal (combinação entre a formal e informal).

2.3.2 Funcionamento do Design Rationale

O funcionamento do DR geralmente envolve três aspectos principais: captura, repre- sentação e uso. Normalmente, a abordagem prevista para a representação influencia de forma determinante para a definição dos métodos necessários para a captura (MEDEIROS, 2006).

O ponto forte do DR é que a sua captura garante a preservação de informações relaci- onadas a tomadas de decisões importantes em um projeto. Porém, para que isso seja possível se faz necessário o desenvolvimento de uma representação que contemple as seguintes ques- tões: O que é apropriado representar? Como poderia ser usada a representação? Que alternati- vas são pensadas para a resolução de uma questão? Porque determinada solução foi adotada? Que feedbacks foram oferecidos ao longo do tempo em que determinada solução foi utiliza- da?

Além disso, é de vital importância assegurar que os assuntos essenciais serão óbvios a outras pessoas, que possam vir a consultá-los posteriormente, pois promoveria a visibilidade de todas as ideias que auxiliaram na condução do projeto até o presente momento, facilitando a continuidade na mesma linha de raciocínio ou até mesmo a integração de novos participan- tes.

Dessa forma, a captura do DR auxilia: (i) a resolução de problemas de naturezas seme- lhantes; (ii) a compreensão do design de um produto; (iii) a manutenção de um produto, evi- tando o esquecimento do porquê da adoção de determinadas soluções; (iv) a avaliação de im- pacto de mudanças ou inclusão de novos requisitos; (iv) a comunicação entre equipes; (v) o acompanhamento e a descoberta de erros durante o processo; e (vi) a redução de arbitrarieda- de no processo de tomada de decisão, visto que é embasado por atributos que auxiliam a justi- ficativa de uma escolha em detrimento de outras (SOUZA et al., 1998).

O grande destaque desse paradigma é a preocupação na preservação das alternativas envolvidas em um processo decisório. Geralmente, durante esse processo, várias soluções são consideradas, porém apenas uma delas é adotada. Para o DR, a preservação das alternativas consideradas, mas não usadas, juntamente com a justificativa de descarte é considerada tão importante quanto à solução adotada e sua justificativa.

No entanto, a representação do DR nem sempre acontece conforme esperado. Horner e Attowood (2006) investigaram as barreiras para o uso do DR e as dividiram nas seguintes áreas:

 Cognitiva, envolvendo limitação de processamento humano de informações que torna impossível a captura exaustiva de um raciocínio;

 Captura, onde as barreiras envolvem dificuldades em elicitar o conhecimento tácito; a falta de incentivos para a captura; a dificuldade em perceber os prováveis benefícios; os custos envolvidos e o risco de expor um funcionário, caso sua decisão não tenha sido satisfatória;

ser armazenado e quais serão os métodos usados para recuperação;

 Uso, visto como as limitações envolvendo a aplicabilidade do reuso efetivo do raciocí- nio.

São as estratégias definidas para a representação do DR que determinam a forma como ocorrerá a recuperação (HU et al., 2000). Dessa forma, recuperações do DR podem ser classi- ficadas de acordo com sua iniciativa: usuário e sistema (LEE, 1997).

Um sistema com iniciativa do usuário depende do usuário para decidir o que do DR será preservado ou mesmo consultado (LEE, 1997).

Por outro lado, um sistema com iniciativa do sistema é caracterizado por atribuir ao próprio sistema a responsabilidade de decidir quando e como serão apresentadas as informa- ções (LEE, 1997).

Diante do exposto, o DR proporciona uma orientação para a representação de um pro- blema, no intuito de retratá-lo de forma íntegra e completa, proporcionando uma possível re- cuperação capaz de auxiliar tomadas de decisão.

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