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Desigualdades sociais no campo e na educação

3 REFERENCIAL TEÓRICO

3.3 Desigualdades sociais no campo e na educação

Durante séculos a exclusão se assentou de tal forma que até hoje há resquícios de prejuízos notórios quando se trata da educação rural, do campo.

Paralelamente, Silva (2005, p. 1) apresenta o mesmo problema, porém relacionado com a educação do campo e seu evidente descaso, marcado pela desigualdade e exclusão:

O modelo de desenvolvimento implementado no campo brasileiro foi tão excludente que marca até hoje o modelo de educação adotado no Brasil. A escola brasileira, de 1500 até o início do século XX, serviu e serve para atender as elites, sendo inacessível para grande parte da população rural. Para as elites do Brasil agrário, as mulheres, indígenas, negros e trabalhadores rurais não precisavam aprender a ler e escrever, visto que nessa concepção para desenvolver o trabalho agrícola não precisava de letramento.

Não raras vezes, nos deparamos com estudantes que apresentam condutas consideradas indisciplinadas, por causa disso perdemos paciência e pronunciamos palavras muitas vezes contundentes: “se não quer estudar, vai apanhar café” ou “se a escola não serve para você, tem uma enxada te esperando”. Esses dizeres parecem desmerecer o trabalho do campo. Sem perceber estamos reforçando o modelo de exclusão.

Para Calazans (1993) apud Silva (2015, p. 1), o modelo de educação rural ainda é muito jovem, visto que sua iniciativa data do século XIX, mas é nos anos de 1930 “que

começa a delinear-se um modelo de educação rural amarrado a projetos de ‘modernização do campo’, patrocinado por organismos de ‘cooperação’ norte-americana e difundido através do sistema de assistência técnica e extensão rural”.

As relações sociais mudam com o passar do tempo. O trabalho intelectual é visto como superior ao trabalho material há tempos, o que não é justo, mas deriva das relações sociais historicamente definidas em nossa sociedade, como apontam Frigotto e Ciavatta (2003).

Também Teixeira (2007, p. 430) afirma que “trata-se (...) de uma relação entre

sujeitos socioculturais, imersos em distintos universos de historicidade e cultura, implicados em enredos individuais e coletivos”.

No Brasil, embora sejamos considerados cidadãos, somos também uma sociedade marcada pela desigualdade, que segundo Frigotto e Ciavatta (2003), há diferentes níveis e situações quando se trata de cidadania, que são formados de acordo com as classes sociais. Isto obviamente significa o modo diferenciado de acesso aos bens de primeira necessidade, gerando riqueza de um lado e pobreza de outro.

Existem ainda posições simbólicas que diferenciam uns dos outros: a discriminação da pessoa negra, a mulher no mercado de trabalho, pessoa com sotaque ‘de roça’, o empregado que precisa obedecer. Por essa razão, consideramos que a desigualdade vai além da riqueza e da condição de compra.

As políticas públicas para a escolarização das populações rurais mostram seu fraco desempenho ou o desinteresse do Estado com respeito à educação rural, quando analisamos o analfabetismo no Brasil, que, ainda em 1991, continuava a ser mais elevado na área rural do que na área urbana. (Ferrari (1991:66) apud SILVA (2005, p. 1).

Ao se tratar do modelo de escola na área rural, podem-se observar três características, segundo Silva (2005, p. 2) quando cita Whitaker e Antuniassi (1992):

 Visão urbanocêntrica: os conteúdos de formação são voltados para a urbanização e industrialização, considerando a cidade um lugar de progresso, ao mesmo tempo que aniquila o mundo rural por se considerar esse ambiente inferior, onde não há oportunidade de vencer na vida.

 Visão sociocêntrica: voltada a privilegiar determinadas classes sociais, não levando em conta a diversidade de sujeitos do campo e da cidade, a cultura e a forma de organização do trabalho.

 Visão etnocêntrica: dá muita importância aos conhecimentos do mundo industrializado em detrimento dos valores e da cultura do campo, estereotipados como “atrasados”.

Considerando esses pontos de vista, percebe-se o preconceito ainda existente com as pessoas que residem no campo, embora possam ter recursos tecnológicos e outros aparatos que forneçam o modo de viver conforme o modelo dito moderno.

Em se tratando do nosso regime democrático, pudemos registrar algumas conquistas por meio de lutas que se dão com os trabalhadores urbanos e rurais. Temos notícias de reivindicações das classes trabalhadoras ligadas ao transporte, à segurança e à saúde, de

professores etc. No campo, temos as lutas constantes dos movimentos sociais, questionando o sistema capitalista.

Contudo, como foi dito antes, os pequenos proprietários de terra perderam seu espaço devido a dominação do empresariado, que explora mão de obra para obtenção de lucro. Por exemplo, a produção agrícola em grande escala, destruidora dos recursos naturais e facilitada pela mecanização, demanda o manejo de pragas. Consequentemente, as empresas fabricantes de agrotóxicos aproveitam-se para a vender seus produtos, ampliando seu mercado. Resulta disso o desenvolvimento pedagógico, voltado para o conhecimento técnico, que induz as pessoas ao mercado com finalidade de satisfazer a lucratividade das grandes empresas.

Assim, a organização do trabalho pedagógico tornou-se padronizado e direcionado para esse fim. Para os reformadores empresariais da educação, o bom resultado nas avaliações externas está centrado na cognição, levando-se em conta as avaliações em português e matemática revelando se a escola é considerada boa ou não.

Tal fato se comprova pela pressão cada vez mais crescente das avaliações externas aplicadas nas escolas, onde os objetivos das disciplinas, em especial português e matemática, são orientados e determinados a padronizar o processo pedagógico nas escolas, conforme Freitas (2014, p. 1093), que prossegue afirmando:

Na atual disputa pela escola, os reformadores empresariais da educação ampliaram a função da avaliação externa e deram a ela um papel central na indução da padronização como forma de permitir o fortalecimento do controle não só sobre a cultura escolar, mas sobre as outras categorias do processo pedagógico, pelas quais se irradiam os efeitos da avaliação, definindo o dia-a-dia da escola.

Por isso, a mudança na cultura escolar vai se ampliando rumo aos princípios empresariais, resultando em avaliações e seus resultados convertidos em números que expressam somente alguns aspectos, são limitados, e muitas vezes, não condizem com a realidade.

O Índice de Avaliação da Educação Básica (Ideb) mede, ou tenta medir, somente capacidades básicas em matemática e português. Isso leva a um estreitamente curricular. Muitos outros desenvolvimentos humanos que fazem parte do papel da escola não estão entre os objetivos desse exame. Mesmo na matemática, são testes que buscam verificar o básico. Não há possibilidade de tratar com uma matemática crítica. O mesmo acontece com o português. O Ideb se propõe a verificar o básico e por isso, é preciso entender que existem aspectos críticos, mesmo dentro dos temas da língua, que não são testados nesses exames.

Podemos entender que medem, quando muito, parte das habilidades cognitivas, e só em matemática e português. Isso não é suficiente. A escola tem múltiplas dimensões a se considerar, pois trabalha com pessoas capazes de se desenvolver em muitas direções e dimensões.