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1. Ação histórica: um desafio no Brasil após a Segunda

1.2 O despertar de inspiração libertária

Dentre os Movimentos da ACB, a JOC não fora muito dinâmica durante os anos de 1935 a 1948. Os líderes da ACB não acreditavam na necessidade de despender maiores envolvimentos, articulações e forças em um movimento constituído de operários, mesmo sabendo que o pensamento marxista possuía força neste meio e oferecia resposta às inquietações da época. Durante este período, a JOC sobreviveria graças a esforços isolados de alguns sacerdotes e bispos, que se preocupavam com a classe operária.

Mesmo com dificuldade, a estrutura da JOC no contexto nacional foi adquirindo, com o passar do tempo, uma forma organizacional valiosa à medida que conhecia seus próprios limites e problemas de várias ordens. Esta experiência fê-la reconhecer, num breve prazo, sua real missão e compromisso com o trabalhador urbano. Sua estrutura tornou-se composta de Seções Locais, Federações, Confederações, Comitê Nacional; oferecendo Serviços Jocistas e Campanhas de acordo com os Estatutos. Cada Seção Local tinha por finalidade resgatar os jovens operários afastados da Igreja, fazendo-os participar das atividades recreativas, da discussão dos problemas trabalhistas, dos cursos de alfabetização e dos “Círculos de Estudos”. A Seção se compunha de uma equipe de militantes que recebia instruções e orientações

74 Significado de algumas siglas ainda não descritas: JEC (Juventude Estudantil Católica); JECF (Juventude Estudantil Católica Feminina); JICF (Juventude Independente Católica Feminina); JOCF (Juventude Operária Católica Feminina); LIC (Liga Independente Católica); LOC (Liga Operária Católica); ACI (Ação Católica Independente); ACO (Ação Católica Operária).

através do “Boletim do Militante”, com uma agenda de reuniões programadas pela Equipe Nacional da JOC.

Do conjunto de seções de uma determinada diocese, formava-se a Federação, que era organizada como um comitê composto por três dirigentes e um assistente eclesiástico. Os dirigentes também eram intermediários entre as seções e o Comitê Nacional. Já as muitas Federações reunidas, formavam o Conselho Nacional, que elaborava o caminho (Programa Nacional) a ser palmilhado pelo Movimento. Devido à extensão do território brasileiro, criaram- se as Confederações ou Regiões Jocistas, o que facilitou o conhecimento dos problemas regionais.

Na composição do quadro de pessoal, foi importante o trabalho dos primeiros jovens com dedicação exclusiva, os chamados “propagandistas”, que tinham a missão de difundir o Movimento por toda a região. Não tardou para que surgisse também o “Encontro Anual Nacional” dos dirigentes das confederações, visando uniformizar as atividades e adotar ideias comuns por todo o país. Outro elemento importante foi a criação do jornal a “Juventude Trabalhadora”, de tiragem mensal, que pretendia ser um veículo de formação e informação.

De certa forma, todas estas articulações foram muito importantes no sentido de fortalecer a presença do Movimento em muitas regiões do Brasil, pois se constatou que “em 1956 funcionavam 424 Seções, dez mil membros eram atuantes, atingindo mais de cem mil jovens operários. Era inegável a eficiência organizacional jocista, considerando que a JOC fora oficializada há alguns anos apenas” (Muraro, 1985, p.43).

Reconhecida oficialmente pelo clero brasileiro em 1948, a JOC encontrou o terreno propício para seu desenvolvimento graças ao novo ambiente industrial do pós-guerra, da injeção de capital estrangeiro no país, do número crescente de operários e dos sonhos libertários da juventude. Para isso, os militantes jocistas esforçaram-se muito em que a JOC se tornasse conhecida. Empreenderam grandes concentrações pelo Brasil, através de passeatas, de peregrinações, como a dirigida a Aparecida do Norte em 1953, e a participação no congresso Eucarístico no Rio de Janeiro em 1955. Através desses eventos, despertaram jovens para a vocação cristã, para a importância

da família, para o lazer e a cultura. Nestes primeiros anos como Movimento oficial, pode se afirmar que “a JOC era caracterizada mais como um movimento religioso do que como uma organização de trabalhadores. A harmonia com o Estado e com a hierarquia eclesiástica também era evidente” (Muraro, 1985, p.50).

Entre os anos de 1956 a 1961, o Brasil vivia em um clima de euforia durante o governo de Juscelino Kubitschek, com um crescimento econômico real. Seu slogan “cinquenta anos de progresso em cinco de governo” parecia realizar-se. Brasília tomava forma em concreto armado, a autosuficiência de bens de consumo, o “Programa das Metas”, os grandes investimentos, as pesquisas encorajadas pelo governo, no que se refere aos problemas de desenvolvimento do Brasil, através do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) 75, despertavam otimismo e um nacionalismo ímpar.

Somente em 1958, a JOC parece ter compreendido o porquê de sua existência. A partir daí, voltou-se para o jovem operário, o abandonado, quando transpassou os núcleos paroquiais e chegou até as fábricas, às oficinas, adentrou os ambientes dos sindicatos, dos clubes e dos bairros. Foi a partir do início da década de 1960 que os jocistas se envolveram concretamente na defesa dos direitos econômicos, sociais, culturais e políticos do mundo operário. Isso, muito se deve, à aproximação com os militantes mais radicais de esquerda, a chamada “esquerda católica” constituída inicialmente por membros da JUC e da JEC e, posteriormente, formando uma importante tríade, a própria JOC.

75 Criado como órgão do Ministério da Educação e Cultura (MEC) em 14/07/1955, o ISEB tinha por meta elaborar uma ideologia com o intuito de compreender a realidade brasileira e promover o desenvolvimento nacional, que ficou conhecida como “nacional desenvolvimen- tismo”. Apesar de criado no governo de Café Filho, inicia suas atividades quando Juscelino Kubitschek assumiu a presidência do país. O ISEB reuniu nomes reconhecidos no meio intelectual, como Sérgio Buarque de Holanda, Miguel Reale, Hélio Jaguaribe, Roland Corbisier, Cândido Mendes, Alberto Guerreiro Ramos, Nelson Werneck Sodré, Álvaro Vieira Pinto, dentre outros. Em 1958, uma crise interna divide o Instituto. De um lado, o grupo de Hélio Jaguaribe se opõe à corrente de que fazia parte Guerreiro Ramos e Corbisier, que exigia uma atuação mais compromissada e menos acadêmica. Com o “golpe militar de 31 de março de 1964”; o presidente da república João Goulard foi deposto, em 13 de abril de 1964 o ISEB foi extinto e instaurado um inquérito policial-militar (IPM) para apurar as atividades dos isebianos. Muitos foram exilados (Cf. Fundação Getúlio Vargas - Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil - FGV-CPDOC).

Da mesma forma que a JOC, a JUC levou também certo tempo para entrar em sua fase mais produtiva. Como movimento especializado, nasce oficialmente e adquire relevância a partir de 1950. Após esta data, houve uma aproximação com as esquerdas políticas do país. É este o período em que se inicia o envolvimento dos jovens universitários não só com as preocupações de ordem religiosa, doutrinária e cultural, mas também as ultrapassando no sentido de críticas e lutas por reformas do sistema educativo e envolvimentos com os problemas sociais, políticos e econômicos.76

Ciente da diversidade regional do Brasil, a Coordenação Nacional, em 1950, decide realizar anualmente o congresso do Conselho Nacional da JUC, com o intuito de reunir dirigentes jucistas de todo o país para debates e decisões. Passagem crucial na vida da JUC foi a da insatisfação entre os grupos de liderança do movimento a partir de 1956, quando se percebeu a grande quantidade de debates, em especial nos conselhos nacionais, e que muito pouco se fazia para o movimento em si: “A causa da ineficácia da JUC foi encontrada na ‘falta de vida do movimento’, em suas discussões e orientações teóricas excessivamente abstratas, na falta de engajamento na realidade concreta” (Kadt, 2007, p.85).

Algumas alterações começam a surgir. A JUC de Pernambuco adota uma orientação mais prática e compromissada socialmente seguindo a JUC de Recife, que nos anos de 1957 e 1958, focou temas como universidade e sociedade, saúde, miséria, fome. Já no ano de 1958, estes jucistas agiam nas favelas seguindo suas idéias e descobriam a realidade brasileira.

No IX Conselho Nacional, em julho de 1959, vários temas foram abordados, e exigências apontadas para uma nova consciência, como a “Missão da Igreja”, “A Igreja e o Temporal”, “Condições do engajamento cristão no Temporal”, além de seminários para preparar os assistentes da JUC. Muitos destes assuntos foram tratados pelas comissões. É neste evento que se inicia uma nova etapa da JUC, aquela que se preocupa com a educação, com o

76 Beozzo (Cf. 1984, p.35) opta por uma certa divisão quanto à história da JUC. Divide-a em três etapas: Etapa preparatória (1943-1950); Etapa de organização, expansão e consolidação (1950-1960); Etapa de engajamento no temporal e crise com a hierarquia (1960- 1967).

engajamento temporal e que tem por forte marca, o início da crise com a Hierarquia.

A JUC na época (1959-1964) torna-se o mais proeminente movimento especializado dos setores da Igreja. No decurso da década de 1950, o Movimento foi aos poucos se sensibilizando com os problemas nacionais e, a cada Conselho, os debates tornavam-se mais tensos e exigentes quanto à ação. Por isso, ao assumir posições inovadoras e muito questionadoras, logo suscitou preocupações e fortes reações:

os jovens da JUC passaram a questionar aspectos das ideias dominantes na Igreja, como a passividade política diante da ordem estabelecida, num contexto de convivência universitária com outras correntes de pensamento, especialmente as socialistas e comunistas, às quais precisavam fazer frente. Eles eram influenciados pela discussão teórica no interior da própria Igreja, em particular pelas obras de Jacques Maritain, Emmanuel Mounier e Pierre Teilhard de Chardin; ficaram marcados pelo pontificado progressista do Papa João XXIII a partir de 1958; além de confrontar-se com as desigualdades gritantes da sociedade brasileira e com o ascenso na mobilização política de trabalhadores urbanos e rurais, numa dada evolução da conjuntura política nacional – nos anos liberais do governo de Juscelino Kubitschek (1956-1960) – e internacional, notadamente com a vitória da Revolução Cubana de 1959 (Ridenti, 2002, p.213,282).

De uma forma ampla, o mundo vivia um novo contexto histórico, permeado por revoluções de libertação nacional amparados por ideais socialistas, como a revolução de Cuba, a da Argélia, as lutas anticolônias na África, na Ásia, entre outras. O modelo soviético de socialismo passou a ser contestado, considerado burocrático, conformado e acomodado à ordem internacional estabelecida pela guerra fria. Por isso, surgiam novas referências na esquerda constituída na maioria de católicos, bem como de protestantes.

Em 1960 a JUC estava presente em 52 cidades brasileiras, em locais nos quais funcionavam universidades ou faculdades, em especial Faculdades de Filosofia. Importa lembrar que, até 1959 em São Paulo, havia um grupo que ocupava a posição de liderança nacional constituída por alguns dirigentes como Luiz Eduardo Wanderley, Plínio Arruda Sampaio, Paulo Gaudêncio, Celso Lamparelli, Francisco Withacker Ferreira e o assistente Monsenhor Enzo

Gusso. Nos anos seguintes (1959-1964), será o grupo de Belo Horizonte - MG que irá assumir o centro de maior representatividade do Movimento nacional.

2. Exigências de um novo pensamento humanista para o contexto

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