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Xica da Silva, filme que despertou uma polêmica ferrenha no âmbito da direção das produções culturais brasileiras, tem duração de 114 minutos e foi produzido e lançado entre 1975 e 1976 A história é a seguinte: no

I – CHÃO HISTÓRICO-SOCIAL DE BYE BYE BRASIL

33 Xica da Silva, filme que despertou uma polêmica ferrenha no âmbito da direção das produções culturais brasileiras, tem duração de 114 minutos e foi produzido e lançado entre 1975 e 1976 A história é a seguinte: no

século XVIII o português João Fernandes de Oliveira é enviado a Arraial do Tijuco no Brasil para assumir a função de contratador e organizar a exploração de diamantes. É recebido pelo intendente e pelo sargento-mor, dono da escrava Xica da Silva por quem se apaixona perdidamente e com quem vive uma conturbada história de amor. Cf. <http://www.cinemateca.com.br/>, acessado em 28 fev. 2010.

Lucy Barreto que, associada à produtora Lucíola Vilella, aceitou produzir o que estava naquela folha. O passo seguinte foi viajar pelo Brasil, junto com seu amigo roteirista Leopoldo Serran34, pesquisando a história, a composição dos personagens do filme, visitando os lugares onde ele deveria se passar. A produção de Bye bye Brasil se prolongou até o final do ano subsequente (DIEGUES, 2004, p. 49).

A repercussão de Bye bye Brasil possibilitou uma visibilidade que rendeu a Carlos Diegues uma série de convites para dirigir filmes no exterior, que não foram aceitos por considerar sua matéria-prima o povo brasileiro, fonte inesgotável de assuntos a serem tratados (Autor desconhecido, 1980).

Em 1981, Diegues foi convidado para ser membro do júri no Festival de Cannes – honra que, antes dele, só outro brasileiro havia experimentado, o poeta Vinícius de Moraes (depois desta data, também Jorge Amado, Sonia Braga e Hector Babenco participaram como jurados neste festival)35.

Em 1984, concretizou o épico Quilombo, uma produção internacional comandada pela Gaumont francesa, um velho sonho de seu realizador. O diretor em pauta lembra que, nessa época, as discussões acerca da produção cinematográfica brasileira giravam em torno da viabilidade da Embrafilme. Diegues reconhecia seu papel histórico positivo, mas defendia uma mudança de modelo imediata, que fosse capaz de acompanhar a abertura da economia brasileira e o fim da ditadura militar. Mais uma vez, o diretor se encontrava no centro de uma polêmica que desaguaria, segundo ele, na verdadeira catástrofe que foi o governo de Fernando Collor de Mello para a cultura e, especialmente, para o cinema brasileiro. Antes da ascensão de Collor, mas já na fase crítica da economia cinematográfica do país, ele realizou dois filmes baratos, de transição e crise, respectivamente, Um trem para as estrelas (1987) e Dias melhores virão (1989).

Essa ―catástrofe‖ no governo Collor, assinalada pelo diretor, decorre do fato de a produção anual de cinema no Brasil ter caído de cerca de 100 filmes (no final dos anos 1970) para três ou quatro (no começo dos anos 1990). Em tempos difíceis, Diegues realizou, em parceria com a TV Cultura, Veja essa canção (1994), além de trabalhar com comerciais, documentários, videoclipes.

34 Leopoldo Serran, nascido em 1942, iniciou a carreira de roteirista em 1963, com o filme Ganga Zumba, de Carlos Diegues. Os dois ainda trabalharam juntos em A grande cidade e Bye bye Brasil. Escreveu roteiros de Bruno Barreto, Arnaldo Jabor, Miguel Faria Jr., Murilo Salles e Sérgio Rezende, entre outros. De seus muitos trabalhos realizados para a TV, destacamos Carga pesada, da Rede Globo. Cf. Diegues (apud CAMARGO, 2004, p. 31).

35 Informação disponível no sítio oficial do diretor de Bye bye Brasil na rede mundial de computadores, pelo vínculo:<http:// www.carlosdiegues.com.br>, acessado em 10 mar. 2010.

Promulgada a nova Lei do Audiovisual36, o cinema brasileiro viveu a fase de ―retomada‖ da produção, propiciada pela viabilidade dessa lei. Assim, Tieta do Agreste (1996), Orfeu (1999) e Deus é brasileiro (2003), adaptações de grandes obras da literatura e do teatro nacionais, figuram entre os filmes brasileiros de maior público desse momento. Em 2006, fez O maior amor do mundo, com roteiro original escrito apenas por ele. Nesse mesmo ano lançou o show e o documentário Nenhum motivo explica a guerra, que conta a história do grupo cultural AfroReggae (o documentário foi dirigido em parceria com Rafael Dragaud).

Em 2009-10, Carlos Diegues trabalhou no projeto 5x favela –agora por nós mesmos, que retoma o início de sua carreira, quando, como vimos, em 1961, cinco jovens cineastas de classe média, oriundos do movimento estudantil universitário, realizaram o filme Cinco vezes favela, produzido pelo CPC da UNE, um dos filmes fundadores do movimento cinematográfico que conquistaria o Brasil e o mundo, o Cinema Novo.

Assim, após 48 anos, a Luz Mágica Produções, produtora de Carlos Diegues e de sua atual esposa, Renata de Almeida Magalhães, produziu o filme (composto por cinco curtas- metragens) 5x favela, agora por nós mesmos, que foi escrito, dirigido e realizado por jovens cineastas moradores de favelas do Rio de Janeiro37, treinados e capacitados a partir de oficinas profissionalizantes de audiovisual, ministradas por grandes nomes do cinema brasileiro, como Nelson Pereira dos Santos, Ruy Guerra, Walter Lima Jr., Daniel Filho, Walter Salles, Fernando Meirelles e João Moreira Salles, entre outros38.

Esse filme tem como principal objetivo ―tornar esses jovens porta-vozes deles mesmos, testemunhando através do cinema suas próprias vidas e intervir com ideias novas e novos modos de fazer na evolução do cinema brasileiro‖39

. Nosso diretor acredita que o ineditismo do projeto, tendo em vista a projeção de imagens incomuns nas nossas telas, possibilitaria um ―novo e inevitável ponto de referência para o cinema brasileiro contemporâneo‖ 40. No projeto de elaboração do referido filme, Carlos Diegues frisa que não

36 A Lei do Audiovisual (Lei 8.685, de 20 jun. 1993) é um instrumento legal brasileiro de investimento na produção e co-produção de obras cinematográficas e audiovisuais e infraestrutura de produção e exibição. Para saber mais, ver: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/Leis/L8666cons.htm>.

37 As cinco organizações e comunidades são a Cufa (em Cidade de Deus), o Nós do Morro (no Vidigal), o Observatório de Favelas (no Complexo da Maré), o AfroReggae (em Parada de Lucas) e o Cidadela/Cinemaneiro (com sede na Lapa, reunindo moradores de várias comunidades da Linha Amarela). Cf.: <http://www.5xfavela.com.br/>, acessado em 9 mar. 2010.

38 A Luz Mágica e Carlos Diegues organizaram oficinas de roteiro, direção, produção, fotografia, arte, edição, finalização e interpretação, com o objetivo de preparar tecnicamente aqueles jovens cineastas para a realização dos filmes. As oficinas de roteiro foram realizadas em cada uma daquelas comunidades citadas, com a frequência de cerca de 50 alunos por oficina. As outras oficinas foram realizadas durante sete semanas, antes do início das filmagens, e foram frequentadas conjuntamente por alunos de todas as favelas cariocas, sem distinção. 39 Cf.: <http://www.5xfavela.com.br/>, acessado em 9 mar. 2010.

se trata de programa social, mas de uma ―invasão do centro do sistema pela sua margem, uma real intervenção na economia e na cultura do entretenimento e da arte cinematográfica brasileira‖. Completa, ainda, que esses jovens cineastas ―não desejam elogios por serem pobres, mas pela qualidade de seu trabalho‖ 41.

Observa-se, assim, a continuação de uma prática que vem de longa data: uma posição ativa de inserção na vida cultural e artística do país, marcando posição nos debates acerca dos caminhos do cinema nacional, do qual Bye bye Brasil, nossa fonte de análise, é uma de suas expressões.

Passemos, agora, às contendas do momento de sua produção.

1.2 - Diário de uma Produção42

Nas colunas ondulentas que cercam Piranhas, no sertão alagoano, e empurra a cidade contra o rio São Francisco, existe um obelisco, monumento erigido pela população local na passagem do século. Ali, em seu pedestal, está escrito: “Ao século XX, oferece o povo de Piranhas do século XIX”. É nesta cidade que começa a história de Bye bye Brasil, um filme dedicado ao povo brasileiro do século XXI.

Carlos Diegues

Para que o público pudesse conhecer a história da Caravana Rolidei que chegava à feira de Piranhas, nas primeiras cenas de Bye bye Brasil, muito trabalho foi realizado. É bem sabido que o gênero de road movies (filmes de estrada) traz consigo a necessidade de deslocar toda a estrutura necessária para as filmagens pelas rodovias. Deste modo, para que os 15 mil quilômetros previstos – pelo roteiro – fossem percorridos, foram formadas duas equipes. Uma delas, responsável pela execução do filme, e a outra, menor, atuando como vanguarda organizadora.

Na liderança dessas duas equipes estavam os produtores-executivos Marcos Altberg e Mair Tavares. As duas equipes percorreram as diferentes cidades por onde o filme foi rodado: Altamira, Belomonte e Belém, no Pará; Piranhas, Entremontes, Maceió e Murici, em Alagoas; Caruaru, em Pernambuco; Brasília e Rio de Janeiro. Além das excursões previstas em

41 Cf.: <http://www.5xfavela.com.br/>, acessado em 9 mar. 2010.

42 As informações contidas nesse texto foram retiradas das anotações de viagem da equipe responsável pela