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CAPÍTULO 3 COORDENADAS METODOLÓGICAS

3.2 Desvendando o processo de coleta

Sabe-se que, a partir dos novos desafios entre os setores sociais e diante dos efeitos da globalização da economia e das informações, é importante uma produção de conhecimentos científicos em patamares que contemplem a democracia e a ampliação e consolidação dos direitos sociais. Na contemporaneidade, a vinculação entre trabalho e pesquisa tem-se demonstrado como indispensável, pois todos os profissionais que executam e refletem sobre suas atividades, lidam diretamente com a interpretação da realidade e, para tal, devem ter noções de procedimentos de investigação.

Nesse sentido,

[...] é muito importante colocar-se com muita clareza que discutir a prática social passa, fundamentalmente, pela questão da pesquisa. Através da pesquisa torna-se possível vislumbrar outros horizontes de conhecimento, desvelar outros fluxos de força política, permitindo às profissões as atualizações e contemporaneizações necessárias para fazerem frente às múltiplas questões de ordem social, com as quais se comprometem e que a atravessam em seu fazer (CASSAB, 2007, p.56).

Portanto, pesquisar se configura no ato de desenvolver uma atividade, semelhante a um processo, cuja preocupação maior é com o produto inacabado, que possibilita ampliar e verificar o conhecimento existente.

Ainda podemos dizer que pesquisar não é uma simples coleta de dados, mas uma proposta de um projeto de conhecimento que conduz o pesquisador à observação, á verificação e á explanação dos fatos, a partir de um procedimento formal, com método de pensamento reflexivo, requisitando um tratamento científico ao caminho percorrido.

Compreende-se, pois, que o processo de construção do conhecimento científico demanda um rigoroso delineamento dos procedimentos de ordem teórico- metodológica que devem ser adotados no decurso da prática investigativa.

[...] pode-se considerar a metodologia como uma forma de discurso que apresenta o método escolhido como lente para o encaminhamento da pesquisa. O primeiro passo se caracteriza pela escolha de determinada narrativa teórica que veiculará a concepção de mundo e de homem responsável pela forma como o pesquisador irá apreender as condições de interação possíveis entre o homem e a realidade. Significa que existem diferentes modos de entender a realidade, como também há diferentes posições metodológicas que explicitam a construção do objeto de estudo, a postura e a dinâmica que envolvem a pesquisa, dando visibilidade aos movimentos empreendidos pelo pesquisador nessa direção.

Nesta pesquisa, um dos pontos norteadores é a escolha pela perspectiva dialética no trato metodológico, já que essa leva em consideração a noção de totalidade, o contraditório e a dimensão sóciohistórica que envolve o objeto de estudo. Ou seja, consideramos que os fatos não podem ser apreciados fora de um contexto social, político e econômico.

A perspectiva dialética nos permitiu a realização de uma revisão crítica e totalizante de toda a interpretação pré-existente sobre o objeto de estudo (LIMA; MIOTO, 2007). O objetivo foi chegar à essência das relações, dos processos e das estruturas, aprofundando um estudo sobre a produção do conhecimento. Para Ianni (1988 apud LIMA; MIOTO, 2007), essa perspectiva escolhida se caracteriza por ser uma análise revolucionária e concreta do objeto, aderindo a ele destrutivamente.

De tal modo,

[...] esse desenvolvimento do real e apreensão da sua essência consistem em aproximações sucessivas que não são lineares porque o que prevalece são os elementos produzidos social e historicamente. Assim, para se apreender essa realidade como uma totalidade complexa e em movimento faz-se necessária a construção de mediações, de um sistema de mediações [...] Portanto, realizar uma pesquisa entendendo a realidade social dinâmica, contraditória, histórica e ontológica implica na utilização de procedimentos metodológicos que consigam engendrar todos esses pressupostos com a mesma intensidade como se apresentam quando estão em relação (LIMA; MIOTO, 2007, p. 40).

Para pesquisar a intersetorialidade nas políticas de álcool e outras drogas, foi utilizado uma pesquisa de caráter descritivo, exploratório e de abordagem quanti- qualitativa, utilizando - conforme sinalizado - o método histórico-dialético de investigação. A escolha desse tipo de pesquisa foi motivada por se tratar de um estudo de objetos/pessoas, considerando também o ambiente em que se inserem,

levando a um entendimento mais acurado dos objetos estudados, com o objetivo de contemplar as suas peculiaridades. Quanto ao método utilizado, teve como objetivo conhecer a materialidade dos fenômenos estudados, diante das formações socioeconômicas e históricas.

No planejamento inicial, fizemos um levantamento bibliográfico, permitindo a utilização ordenada de dados dispersos em inúmeros periódicos. Essa etapa consistiu no levantamento, seleção, fichamento e arquivamento de informações relacionadas ao objeto a ser pesquisado.

Após essa etapa de seleção do material bibliográfico, usamos o instrumento da leitura com o objetivo de levantarmos as informações relevantes para o estudo. Em seguida, com os dados obtidos, por meio dessas leituras, conforme a metodologia proposta e baseando-se no referencial teórico construído, expomos uma síntese integradora de todo o material investigado. Esse desenho metodológico permitiu um amplo mapeamento bibliográfico que garantiu a apreensão constante dos elementos que caracterizaram o nosso estudo (LIMA; MIOTO, 2007).

Realizada essa discussão teórica, iniciamos o trabalho de campo a partir das observações sistemáticas e da realização do grupo focal. Antes da entrada em campo, nos asseguramos da confidencialidade e privacidade dos indivíduos que iriam ser pesquisados, garantindo com isso, a proteção de sua imagem, a sua não estigmatização e a não utilização das informações em prejuízos individuais e/ou coletivos.

Vale salientar que, nesse sentido, a partir das determinações da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), a presente pesquisa atendeu aos referenciais da bioética, tais como autonomia, não maleficência, beneficência, justiça e equidade, dentre outros.

Ante a essa resolução, foi elaborado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o qual foi lido e explicado, em todos os seus itens, para que os participantes pudessem se manifestar de forma autônoma, consciente, livre e esclarecida (conforme Apêndice A).

O projeto de pesquisa foi submetido à Plataforma Brasil da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) em março de 2014. Em abril do mesmo ano, o Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Lauro Wanderley (CEP-HULW) emitiu pelo colegiado, em reunião ordinária realizada no dia 29 de abril

de 2014, parecer favorável, de nº 660.132, para a realização da pesquisa proposta (conforme Apêndice C).

No mês subsequente, deu-se a inserção no cenário da coleta dos dados primários. Isso foi feito por meio de algumas visitas ao CAPS AD Primavera, no período de maio a julho, observando à dinâmica e a sistemática desse CAPS.

Essa inserção no campo foi facilitada pelo conhecimento prévio da rotina do serviço por nossa parte, visto que coordenamos esse CAPS AD por 03 anos (2009 a 2012), possibilitando uma facilidade de circulação e diálogo com a equipe técnica.

Nesse período da coleta, foi anotada, no caderno do diário de campo23, a

dinâmica de funcionamento do serviço, registrando as práticas desenvolvidas pela equipe técnica no seu processo de trabalho. O objetivo era observar e mapear as ações profissionais que os sujeitos pesquisados construíam na sua rotina diária, bem como identificar o acesso e a articulação a outras políticas sociais na tentativa de garantir a resolubilidade das demandas de atendimento. Descreveram-se ainda nessas observações, quais as demandas atendidas que mais impõem os arranjos intersetoriais na concepção dos seus trabalhadores.

Após essas observações, foi realizado um convite para os profissionais participarem de um grupo focal sobre o tema pesquisado. Esse grupo foi realizado no dia 24 de julho de 2014 nas dependências do CAPS AD. Utilizamos uma sala confortável, climatizada e longe de interferências de quaisquer ordens. Aconteceu intencionalmente numa quinta-feira à tarde, para envolver o máximo de profissionais, já que, semanalmente, o horário é reservado para a reunião técnica-administrativa, tendo a presença da maioria da equipe técnica. Esse grupo durou pouco mais de 40 minutos, obedecendo aos critérios de confidencialidade e anonimato e seguindo um roteiro de questões elaboradas por este pesquisador (conforme Apêndice B).

Nessa direção, para assegurar esse anonimato, todas as transcrições das falas dos participantes foram representadas pela letra P (profissional) seguida do numeral sequencial da ordem de apresentação no próprio grupo. Essa técnica teve

23 Esse possibilita o registro das observações do cotidiano e consiste em espaço propício para realização das reflexões e análises acerca das apreensões realizadas, contribuindo para a chamada sistematização da prática do pesquisador. Nesse, anotam-se todas as observações de fatos concretos, fenômenos sociais, acontecimentos, relações verificadas, experiências pessoais do investigador, suas reflexões e comentários. O diário facilita criar o hábito de escrever e observar com atenção, descrever com precisão e refletir sobre os acontecimentos (FALKEMBACH, 1987).

por objetivo identificar percepções e atitudes diante das ideias dos participantes acerca do objeto de pesquisa (DIAS, 2000), no intuito de gerar novas ideias ou hipóteses que estimulassem o pensamento do pesquisador sobre o tema proposto.

Além disso, o grupo focal permitiu que o processo de interação grupal se desenvolvesse, favorecendo trocas, descobertas e participações comprometidas. Nesse grupo, houve a exploração de como os fatos são articulados, censurados e alterados no próprio ambiente.

Na sequência à coleta do material, realizamos a transcrição do conteúdo, resgatando os momentos de expressão das opiniões (conhecimento), dos gestos e da própria subjetividade presente nos conteúdos em torno das questões propostas. Bardin (1977) ressalta a importância do rigor na utilização da análise de conteúdo, tendo a necessidade de ultrapassar as incertezas e descobrir o que é questionado.

Tendo em vista tamanha diversidade, optamos por tomar como balizador as etapas da técnica proposta por Bardin (1977). Essas etapas são organizadas em três fases:

a) Pré-análise: consiste na leitura de cada transcrição, destacando as partes que correspondem às perguntas guias no roteiro da discussão. Devem-se observar tendências e opiniões que solidamente são mantidas ou frequentemente expressas pelos participantes.

b) Exploração do material: são feitas marcações em comentários que possam ser usados no relatório final de pesquisa e destacadas as partes que correspondem às perguntas guias da discussão.

c) Tratamento dos resultados: nessa fase, deve-se considerar o significado das palavras utilizadas pelos participantes, permitindo ao pesquisador, inferir analiticamente sobre a definição das ideias preponderantes em relação aos objetivos que se propõe a pesquisa. Por fim, deve-se construir o relatório de pesquisa, localizando esses discursos de forma estruturada.

Os conteúdos obtidos foram agrupados nos 04 subitens que compõem o capítulo 4 e foram tratados seguindo a lógica dos objetivos propostos no início da dissertação. Ressalta-se ainda que foram tratados à luz do corpo teórico posto pela produção do conhecimento relativa ao objeto pesquisado.

CAPÍTULO 4 - A CONSTRUÇÃO DE POLÍTICAS INTERSETORIAIS SEGUNDO A