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58 59 Foto 58 e 59: Detalhe da bandeira e cena de louvor a bandeira na Reiada Evento Revelando São Paulo, 2006 e

2007. Fonte: Acervo pessoal de Ivanildo Piccoli. Foto: Ivanildo Piccoli.

A bandeira, historicamente, simboliza a solidariedade do grupo ligado a uma causa, uma idéia ou, mais concretamente no caso a um santo. Essa tradição provém da bandeira das corporações de ofício, instituídas na Idade Média, cada uma sob a proteção de um santo padroeiro. Ter a bandeira, no regime corporativo medieval, significava o reconhecimento e/ou a oficialização da associação profissional. (GAUDITANO e TIRAPELI, 2003, p. 95-96).

A bandeira deve estar sempre virada para o lado em que a folia deve seguir. Ela caracteriza a crença dos devotos, que lhes acrescentam, com alfinetes, fotografias, bilhetes e dinheiro, em cumprimento aos votos e promessas alcançadas. Esta comitiva se desloca de casa em casa realizando visitas breves aos moradores e ao presépio da casa. Algumas visitas são mais longas, quando são oferecidos jantares, almoços ou lanches. No interior, é costume algumas folias partirem e andarem por fazendas ou chácaras dia após dia. Assim, ao anoitecer, uma casa lhes oferece o pernoite para que a jornada prossiga no dia seguinte. Algumas folias tradicionais ficam doze dias em peregrinação constante e, como forma de penitência, nem mesmo tomam banho.

Individualmente, podemos identificar claramente que existem dois tipos de Festa de Reis: as festas de encerramento de cada grupo e de “confraternização coletiva”, onde diversos grupos se apresentam publicamente “fora de sua base ritualística de ampla significação (BRANDÃO, apud SILVA, 2006, pág.174), assinalando uma nova perspectiva: maior intercâmbio entre os grupos locais e regionais, apresentações fora do período tradicional e, conseqüentemente, maior participação dos moradores. Essas Festas de confraternização

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coletiva recebem diferentes denominações: Encontro de Folia de Reis, Festival de Folias de Reis, Festa de Santos Reis, Chegada das Bandeiras, entre outros, e costumam reunir um grande público. Os grupos participantes ganham troféus, certificados, visibilidade social e, algumas vezes, dinheiro. Alguns pesquisadores admitem que essas festas sejam um dos principais instrumentos de preservação da tradição e onde “(...) essas relações [comunitárias e associativas] atingem o auge” (PEREIRA, 1997).

As canções partem sempre de temas católicos. Os “versos giram em torno destes temas: anunciação, permissão, nascimento, estrela-guia, Reis Magos, adoração, ofertório, agradecimento e despedida” (ARAÚJO, 1965, p. 402). Em alguns grupos ou regiões as canções de Reis são ininteligíveis, dado ao caos sonoro produzido. Isso se deve também a influência africana com fortes batidas e com um clímax de entonação vocal.

As bandeiras caminham no ritmo das “Marchas de Rua”. Elas seguem um percurso chamado de “giro” ou “jornada”. Este nome é dado pelo fato de coincidir o ponto de partida com o de regresso. Muitas vezes, o percurso segue também o trajeto do leste (Oriente) e termina a oeste (Belém) do caminho. Cantam defronte às casas o “Pedido de Abrição” de porta, fazem a “Saudação” ao dono da casa. Assim que a entrada é permitida, cantam “Jornadas dos Reis Magos” ou passagens da vida de Cristo, entrecortada sempre por rezas e ladainhas, como é tradicional ocorrer nas novenas. Os participantes ficam sempre em pé e mantêm o ar de louvor e consagração litúrgica. Finaliza a estadia com o “Agradecimento” e as “Despedidas”. Após a saída “se a porta não foi aberta então saem cantando em desagravo” (CASCUDO, 2001, p. 675).

Em todas as paradas são realizadas cantorias e animada festas, onde aparecem a moda de viola, catira e cateretê. Esta sequência é prevista antecipadamente, ou tradicionalmente repetida por anos seguidos, e sempre terminam o percusso de sua jornada na casa onde iniciaram ou na casa do “festeiro” do ano, que é geralmente, responsável pela manutenção da companhia e da oferta da festa final de Reis.

Algumas folias carregam a “Caixinha”, geralmente feitas de madeira, medindo mais ou menos 10x15x10cm, recoberta por papel prateado, vermelho ou verde. No fundo uma imagem de São Benedito, toda recoberta por uma toalha branca de filó ou crochê” (ARAÚJO, 1965, p.406-407). Dentro da caixinha há uma imagem do menino Jesus, feita de escultura popular, geralmente de barro cru, nu, deitado sobre um berço também de barro, colorido de verde escuro. No dia 24 de dezembro, o menino Jesus permanece deitado; após 6 de janeiro, é substituído por outra imagem em pé, tendo em uma mão uma bola azul, representando o globo terrestre. Muitas pessoas fazem promessas para carregar a “caixinha” de casa em casa. A função da “caixinha”, em parte, se assemelha ao estandarte ou bandeira e, carregando, implica em receber bênçãos especiais.

As Folias de Reis são estruturadas em:

Embaixador (em outras companhias recebe também o nome de Mestre, Capitão, Gerente ou Chefe) – é quem puxa as cantorias (muitas vezes de sua autoria), e lidera o grupo. O embaixador deve conhecer as tradições e toadas de Folias de Reis. Existem ocasiões que exigem do embaixador esses conhecimentos. É quem determina o percurso a ser traçado e a disciplina do grupo. Ele segue rigorosamente os passos da bandeira, cumprindo rituais tradicionais, é ainda encarregado de prover as necessidades materiais da corporação (uniformes, instrumentos e a própria bandeira). Compete a ele a leitura do regimento do grupo. Ao iniciar as andanças, o regimento recebe, às vezes, o nome de “Fundamentos de Reis”, um conjunto de regras internas ao grupo, referentes não só a hierarquia e estruturas, mas às próprias leis existentes dentro do processo ritual religioso, uma espécie de dogma que deve ser seguido e respeitado. Muitas vezes, antes da aprovação do grupo, passa pela aprovação do padre ou bispo local. Ele é o vigilante para que os integrantes não consumam bebidas alcoólicas (geralmente cachaça), comumente oferecida pelos anfitriões.

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Contra-mestre – é a segunda voz, e segunda posição dentro da hierarquia da Folia acompanhando a do Embaixador. Tem a função de auxiliar do Mestre, uma espécie de assistente ou gerente, como também é chamado. A ele cabe recolher os donativos e complementar a cantoria, sempre com uma terça a baixo ou acima. Substitui o mestre quando este tem de se ausentar. Sua indumentária é caracterizada por fitas ou fachas cruzadas no peito, capa de rendas e ombreiras.

Bandeireira – também conhecida por bandeirista, alferes da bandeira ou folião do ano (nomeado no encerramento da festa anterior). É o responsável por conduzir a bandeira dos Santos Reis à frente da Folia: é o guia da Companhia. Costuma ser escolhido por cumprimento de promessas alcançadas. Pode ser tanto um membro da Folia como uma pessoa de fora;

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Foto 60: cena de louvor as bandeira na Reiada do evento Revelando São Paulo, 2007. Fonte: Acervo pessoal de