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Detecção de citocinas, quimiocinas e mediadores inflamatórios em

IV- RESULTADOS

4.8. Detecção de citocinas, quimiocinas e mediadores inflamatórios em

O perfil de citocinas pró-inflamatórias se caracterizou principalmente pela expressão de TNF-α (Fig. 4.8.1B), achado característico da infecção por

52 DENV em crianças e na progressão da severidade da mesma, a partir de um estímulo constante a inflamação e da quimiocina RANTES, também conhecida como CCL5, que possui relação com a alteração da permeabilidade vascular. Esta quimiocina foi expressa por macrófagos e células mesangiais da região cortical (Fig. 4.8.1E) e macrófagos e células endoteliais na região medular (Fig. 4.8.1F). Conjuntamente, foi detectada a expressão de VEGRF-2, mediador inflamatório também relacionado com um aumento de permeabilidade vascular (Fig. 4.8.2H). Essas alterações renais não foram observadas de maneira expressiva no tecido renal controle (Figs. 4.8.1A, C, D, G).

53 Figura 4.8.1 – Detecção de citocinas, quimiocinas e mediadores inflamatórios no rim dos casos fatais: (B) Detecção da expressão de TNF-α nos macrófagos circulantes na região medular; (E) Expressão de RANTES nas células mesangiais e monócitos na região cortical; (F) Expressão de RANTES nas células endoteliais e monócitos na região medular; (H) VEGFR-2 nas células endoteliais dos capilares sanguíneos na região medular; (A/C/D/G) Tecido controle não apresentou detecção expressiva destes marcadores. CM – Células mesangiais; Mø – Macrófago; CE – Células endoteliais.

Houve a detecção de Metaloproteinase-9 (MMP-9) (Fig. 4.7.2.B) enzima que participa na degradação da matriz extracelular, nos monócitos dos capilares sanguíneos da região medular, assim corroborando e auxiliando na interpretação dos achados oriundos das colorações de

54 Tricrômico de Masson e Picro-Sirius (Fig. 4.7.2B). Por fim, constatamos a expressão de Caspase-3, importante componente do processo de apoptose, expresso ao redor dos ductos coletores da região medular (Fig. 4.7.2D). Como esperado, tais alterações renais não foram observadas de maneira expressiva no tecido renal controle (Figs. 4.7.2A e C).

Figura 4.8.2 – Detecção de MMP-9 e Caspase-3 no rim dos casos fatais: (B) Expressão de MMP-9 ao redor dos vasos sanguíneos na região medular; (D) Detecção de Caspase-3 ao redor dos túbulos coletores na região cortical; (A/C) Tecido controle não apresentou detecção expressiva destes marcadores. Vs – Vasos sanguíneos; Mo – Monócitos; TC – Túbulos coletores.

55 5 DISCUSSÃO

Como já visto, o vírus da dengue pode acometer diversos órgãos, dentre eles os rins. A disseminação do DENV ocorre quando a resposta imune do indivíduo não é capaz de controlar infecção, e ocorre um descontrole no recrutamento de células imune e produção de diversas citocinas e mediadores pró-inflamatórios. Isso gera um intenso quadro inflamatório, e leva consequentemente ao aparecimento de lesões e ao mau funcionamento dos tecidos. Na literatura há poucos trabalhos sobre o acometimento do tecido renal em crianças, com isso a importância de se ter mais informações sobre a patogênese desse órgão.

Inicialmente, observamos os dados dos níveis séricos de creatinina e ureia no prontuário dos pacientes (Fig. 4.1), a fim de avaliar a função renal dos três casos, já que ambas as substâncias são eliminadas do organismo pelos rins. Elas podem refletir a taxa de filtração glomerular em diversas ocasiões, podendo assim ser encontradas em níveis séricos baixos em indivíduos saudáveis, o que pode indicar a possibilidade de a lesão renal resultar na necessidade de diálise por parte do paciente (Dalton, 2011; Chang et al., 2019). Desse modo, níveis séricos altos de ureia e creatinina podem indicar baixa taxa de filtração glomerular renal; e quanto mais baixa essa taxa, maior será o risco de progressão de injúria renal. Além disso, a ureia é um metabólito nitrogenado resultante da degradação de proteínas que possui aproximadamente 90% de sua quantidade excretada pelos rins, enquanto a creatinina é um metabólito da creatina-quinase, filtrada no glomérulo e secretada ativamente em parte por essa estrutura (Sodre,Costa & Lima., 2007). Para facilitar a visualização, os dados foram plotados em gráficos, nos quais é foi possível perceber que os níveis séricos desses marcadores se encontram acima dos limites de referência no caso 1, enquanto os casos 2 e 3 se encontram dentro da faixa esperada. Isso pode indicar que a infecção por DENV agrediu de forma mais severa o tecido renal no caso 1, podendo a falha desse órgão ter sido mais fatal para o desfecho da infecção nesse paciente, em relação aos outros casos. Essa característica já havia sido observada em estudos anteriores que investigavam as características do acometimento renal na infecção por DENV (Diptyanusa et al., 2019: [Mallhi et al., 2015). Além

56 disso, o paciente do caso 1 apresentou hemocultura positiva para a bactéria Pseudomonas aeruginosa no terceiro dia de internação. A infecção secundária bacteriana no quadro de dengue, embora rara, pode acontecer e devido à fragilidade do estado do paciente, podendo levar uma infecção sistêmica grave, capaz de causar pneumonia e/ou problemas nas válvulas do coração, assim possivelmente contribuindo com o desfecho da infecção no caso (Premaratna et al., 2015; Samarasekara et al., 2018; Berube et al., 2016; Gurtler et al., 2019), sendo essa característica mais incidente em pacientes com febre prolongada e/ou manifestações mais severas da dengue (Premaratna et al., 2015; Trunfio et al., 2017). Um estudo realizado por Macedo e colaboradores, em 2012, identificou um caso de um paciente adulto inicialmente diagnosticado clinicamente com pneumonia, que evoluiu de forma grave até a morte. Após a morte, foi reportado um caso de coinfecção viral e bacteriana. Foi isolado Burkholderia pseudomallei (agente causador da melioidose aguda ou crônica) a partir do fluido ascítico; e coinfecção entre DENV-1 foi detectado no fluido cerebroespinhal por PCR, que foi reportado como causa da morte. Uma das hipóteses ressaltadas pelo autor foi de que a piora do quadro clínico e a morte do paciente tenha ocorrido devido ao paciente já apresentar uma comorbidade, que teve piora com o estabelecimento da infecção viral (Macedo et al., 2012). Assim, é de suma importância que haja o diagnóstico diferencial entre dengue e infecções bacterianas, principalmente em regiões endêmicas para ambas, uma vez que os sinais de alerta da dengue podem ser semelhantes aos de infecção por bactérias. Essa questão explicita uma problemática dupla envolvendo a comorbidade bacteriana na dengue, pois além de possivelmente contribuir para a progressão de severidade por infecção, pode dificultar o diagnóstico inicial e por consequência impedir que o tratamento adequado ao paciente seja adotado de forma inicial.

Em trabalhos anteriores do grupo, utilizando quatro casos fatais de DENV em adultos, o tecido renal exibiu intensa degeneração na região do glomérulo e nos túbulos contorcidos proximais e distais. Na região medular, foram observadas áreas de infiltrado de células mononucleares, hemorragia e edema perivascular (Póvoa et al., 2014).. Em cortes semifinos do tecido renal foi possível observar trombo em capilares do glomérulo renal e células necróticas no lúmen de túbulos contorcido proximal. Enquanto que nos cortes ultrafinos

57 foram identificadas células necróticas com núcleo picnótico e alongamento do retículo endoplasmático rugoso (Póvoa et al., 2014). Esses achados podem servir como parâmetro das alterações observadas no tecido renal de adultos durante a infecção por DENV e são extremamente úteis para fins de comparação com os resultados obtidos no presente trabalho, que também tem como foco o tecido renal infectado pelo vírus da dengue, mas aborda casos ocorridos em indivíduos de menor faixa etária (crianças). Nos achados histopatológicos dos casos de fatais de dengue em criança neste trabalho (Fig. 4.2.1) foi possível observar alterações semelhantes entre os casos, como congestão vascular, necrose tissular e infiltrado inflamatório. Com isso, sugerimos que também possa haver acometimento do tecido renal provocado pela infecção por DENV em crianças. No caso 1 foi observado desnudamento epitelial nos túbulos contorcidos e principalmente, um processo de crescimento/proliferação do epitélio parietal da cápsula de Bowman, possibilitando assim a formação de uma nova camada do epitélio e podendo ter como consequência uma diminuição na taxa de filtração glomerular, a partir do momento que aumenta o tamanho da cápsula como um tudo e diminui o espaço entre a Cápsula de Bowman e o glomérulo. A alteração dessa distância pode representar um indício inicial de lesão glomerular (Sasaki et al., 2017), explicando em parte o aumento dos níveis séricos de creatinina e ureia no paciente, características também associadas a problemas na função renal de excreção e o risco de progressão de severidade da injúria no órgão (Chang et al., 2019) e indicando um quadro de infecção glomerular aguda (glomerulite renal) que pode ter tido um papel relevante no desfecho da infecção. No caso 2, chama atenção a expressividade dos focos de congestão vascular nos vasos sanguíneos, que associados à ectasia (dilatação) e degeneração dos túbulos contorcidos, apontam para a possibilidade de alguma disfunção do órgão renal. Já o caso 3 apresentou focos de degeneração vacuolar, que é um indicativo inicial da maioria das formas de dano celular (Robbins & Cotran, 2015), sendo essa alteração observada no tecido renal de pacientes adultos com quadro de outros tipos de virose, como a Covid-19 (Su et al., 2020) e em crianças com quadro de síndrome nefrótica primária, observando-se que a presença de degeneração hidrópica (vacuolar) foi significantemente maior nos pacientes que tiveram deposição de imunocomplexos nos túbulos renais (Wang et al.,

58 2018). Esses achados anteriores concretizam a ideia de acometimento do órgão no presente estudo. Outro parâmetro também avaliado, a partir de quantificação, foi a presença de infiltrado inflamatório observado nos três casos com intensidades semelhantes. Isto se dá pelo recrutamento de células do sistema imunológico para o local da infecção, como já constatado por trabalhos anteriores, que detectaram diferentes subpopulações celulares nos casos de dengue, principalmente células CD68+ (Prestwood et al., 2012; Nunes et al., 2019).

Após a análise das alterações histopatológicas, foi realizada a análise da quantidade de colágeno do tecido renal das áreas de colágeno (Fig. 4.3.1) e as suas respectivas quantificações (Fig.4.3.2), para assim possivelmente relacioná-las com um processo de degradação de matriz extracelular, algo já relatado previamente em pacientes adultos infectados pelo vírus da dengue (Zuo et al., 2014: Afroz et al., 2016). Essa degradação costuma ocorrer através de enzimas proteolíticas denominadas de metaloproteinases, que desorganizam os componentes da matriz, alterando sua composição e possivelmente incitando a deposição componentes como o colágeno em estruturas adjacentes, sendo o depósito de colágenos tipo I e III já relatados em estágios iniciais da fibrose intersticial em casos de nefropatia obstrutiva (Sharma et al., 1993). Com isso em mente, foi possível constatar um depósito de colágeno tecidual mais intenso no caso 1, em comparação aos outros dois casos (que tiveram áreas de colágeno de menor expressividade observadas). Essa área focal esteve presente no caso 1 ao redor dos vasos arqueados, na região cortical, sugerindo que esse pode ser um mecanismo utilizado pelo vírus para realizar a quebra de homeostase celular, a partir de seu potencial de virulência, sendo importante ressaltar que o paciente em questão já se apresentava acometido por outra comorbidade (infecção bacteriana por Pseudomonas aeruginosa). Ademais, a observação de áreas focais de colágeno presente no caso 1 e até mesmo a ausência de áreas focais expressivas nos casos 2 e 3 se configuraram como um indicativo de marcadores de infecção a serem pesquisados no decorrer do trabalho.

Em seguida, a partir da técnica de imunohistoquímica, foi feita a detecção de antígeno viral, a proteína NS3 (proteína não estrutural-3) (Fig. 4.4). Essa proteína foi detectada em células mesangiais da região cortical e em células

59 endoteliais, monócitos/macrófagos na região medular dos casos analisados. É importante ressaltar que a presença desta proteína ocorre somente quando há replicação viral. Desse modo, é possível afirmar que após a infecção, o vírus foi capaz de infectar e se replicar no tecido renal, levando direta ou indiretamente ao aparecimento das alterações histopatológicas. Antígenos virais de dengue também já foram detectados na região medular de tecido renal adulto em células inflamatórias (Basílio de Oliveira et al., 2005), e em macrófagos no espaço peritubular e perivascular (Póvoa et al., 2014; Nunes et al., 2019). A fim de caracterizar o infiltrado inflamatório observado na histopatologia, foi feita a detecção e quantificação de algumas células. Foi observada a expressão de células CD68+ (Fig 4.5B), evidenciando a presença de macrófagos com morfologia característica de células hiperplásicas. Os macrófagos são um dos principais alvos de replicação do DENV em estudos envolvendo diversos órgãos (rim, coração, timo, trato gastrointestinal) de camundongos (Prestwood et al., 2012, Póvoa et al., 2014; Nunes et al., 2019). Além disso, também foram detectadas células CD8+ (Fig. 4.5D), que apresentou aumento estatisticamente significativo nos casos 1 e 3, em comparação aos controles (Fig. 4.7). Nossos resultados indicam que a resposta citotóxica foi de fato o principal mecanismo utilizado para a tentativa de contenção da infecção, se configurando como principal modulador da reação do organismo ao vírus, em detrimento da resposta auxiliar, caracterizada pela produção de anticorpos e expressão células CD4+, que não foram encontradas em níveis significativos nos três casos observados (dados não apresentados). As células T CD8+ se configuram como um dos possíveis responsáveis pela modulação do perfil de citocinas, quimiocinas e mediadores inflamatórios, como uma forma de tentar conter o avanço da infecção provocado pela continuação da replicação viral. Evidências sugerem que as células T citotóxicas podem ser suficientes para provocar a ocorrência de sinais severos de dengue, além de estimular a expressão de citocinas inflamatórias, como o Fator de Necrose Tumoral (TNF) (Talarico et al., 2017). Em 2016, Póvoa e colaboradores investigaram a resposta imune celular de casos de fatais de DENV em adultos, e observaram aumento de células CD8+, que foram detectadas principalmente no interior dos glomérulos renais e na zona medular (Póvoa et al., 2016). Em estudos anteriores envolvendo casos de glomerulonefrite crescente em humanos adultos, foi detectada a presença

60 de células TCD8+, sugerindo assim que a citotoxicidade mediada por células T como mecanismo efetivo de injúria no tecido renal (Chen et al., 2020). Além disso, elas são capazes de reconhecer as moléculas de MHC de classe I e com isso induzirem lesões através de moléculas secretoras que impulsionam a citotoxicidade celular (Chen et al., 2020).

A detecção de células CD56+ (Natural Killer - NK) nos casos analisados (Fig. 4.5F) indica ativação da resposta imune inata, já que as células NK são capazes de reconhecer complexos formados entre os anticorpos e os antígenos do vírus expressos na superfície de células infectadas, assim iniciando o combate a estas (Sun & Kochel; 2013).

Na dengue grave, apesar do extravasamento de plasma geralmente ocorrer no fim da fase aguda, as reações patológicas e fisiológicas se iniciam nos primeiros momentos da infecção, havendo a produção de citocinas inflamatórias pelas células expostas ao vírus (Srikiatkachorn, Mathew, Rothman; 2017), destacando-se nesse contexto o aumento na expressão de IFN-γ, TNF-α, RANTES/CCL5, MCP1/CCL2 e VEGF-R2. A presença e a replicação do vírus já foram constatadas em órgãos como fígado, pulmão, baço, cérebro, placenta (Nunes et al., 2019) e coração (Shivanthan et al., 2015). Diversos sinais relacionados ao rim frente a uma infecção pelo DENV já foram identificados, proteinúria, glomerulonefrite, necrose tubular (Lizarraga; Nayer. 2014; Mohsin et al., 2009), entretanto, o papel desse órgão na persistência da infecção não está ainda plenamente elucidado (Begum et al., 2019).

Desse modo, no presente trabalho, o perfil de citocinas inflamatórias foi caracterizado pela expressão de TNF-α (Fig.4.8.1B), o que corrobora com os achados de estudos anteriores de DENV no tecido renal (Nunes et al., 2019) ou somente o processo inflamatório no órgão (Stenvinkel et al., 2005) que vem sendo associada a fase aguda da doença. O aumento dos níveis plasmáticos dessa citocina foi relatado em outros órgãos, como o fígado, em estudos envolvendo casos fatais dessa arbovirose em crianças, podendo estar relacionado com a progressão da severidade da infecção (Ferreira et al., 2015). Nos casos analisados, a quimiocina RANTES foi detectada nas células mesangiais da região cortical (Fig. 4.8.1E); e em células do endotélio da região medular (Fig. 4.8.1F), e em macrófagos de ambas as regiões. Estudos

61 anteriores sugerem que a quebra de homeostase do tecido renal provoca alterações estruturais nas células mesangiais, ativando e liberando cada vez mais citocinas e contribuindo para a patogênese do tecido renal em lesões glomerulares e túbulos intersticiais (Taal et al., 2000). Essa quimiocina está bastante envolvida na alteração de permeabilidade vascular, e no estímulo do processo de angiogênese e expressão do fator de crescimento vascular endotelial (VEGF) (Wang et al., 2015). Diversos fatores levam a crer que a angiogênese é antecedida e/ou acompanhada por permeabilidade vascular em outros órgãos, como o coração (Isner. Angiogenesis,1998: Topol EJ,1998), o que pode resultar no extravasamento de plasma característico em infecções graves pelo vírus da dengue, levando a perda de proteínas plasmáticas, formação de edema, algo que está possivelmente relacionado com a disfunção do órgão renal. Outro fato que corroborou com essa tese foi o achado de expressão de VEGFR-2 (Receptor de fator de crescimento vascular endotelial) nas células endoteliais dos capilares sanguíneos na região medular (Fig.4.8.1H). O VEGFR-2 e seu fator estão ligados ao aumento de permeabilidade vascular e a inflamação causada pelo DENV em adultos (Seet et al., 2009), estimulando também a angiogênese, em órgãos como o coração. Esse fator leva à proliferação e à migração das células endoteliais (responsáveis pelo revestimento vascular) nesse processo (Lourier, Tourino, Kalil. 2011) e a constante exposição de um órgão ao fator de crescimento vascular endotelial e seus receptores pode estar associada à cronicidade da permeabilidade vascular observada em doenças como tumores e doenças inflamatórias crônicas (Nagy et al., 2008). Em 2015, Kalita e seus colaboradores apontaram que o VEGFR-2 está relacionado diretamente com distúrbios de coagulação sanguínea e aumento de níveis de creatina-quinase (CK), sugerindo assim a sua participação no processo de extravasamento plasmático e consequentemente com a progressão da severidade da dengue, em comparação ao receptor de fator de crescimento endotelial vascular 1 (VEGFR-1) (Kalita et al., 2015). Um aumento do VEGFR-2 já foi relatado em macrófagos peritubulares na região medular do tecido renal em casos de dengue em adultos (Nunes et al., 2019).

As metaloproteinases-9, detectadas nos monócitos dos capilares sanguíneos da região medular dos casos (Fig. 4.8.2B) são enzimas com função de

62 degradação de matriz extracelular (Behredtsen et al., 1992). A metaloproteinase-9 (MMP-9) também parece estar envolvida no aumento da permeabilidade vascular e severidade da infecção, como constatado em um experimento que analisou o aumento da expressão dessa enzima em células endoteliais de mamíferos (Leaungwutiwong et al., 2016). Outro estudo inicial recente elucidou que, na infecção por DENV, a MMP-9 também pode atuar diretamente sobre as células endoteliais (fundamentais para a formação e estabilidade da matriz extracelular), ao dificultar a adesão celular e comprometer as junções de oclusão dessas células, causando uma situação de hiperpermeabilidade e podendo estar assim envolvida com a hipovolemia e extravasamento de plasma observado em casos severos de dengue (Li et al., 2020). Sua função também vem sendo relacionada com a destruição de proteínas e no remodelamento do tecido em outros órgãos, como o coração, a partir da ativação de citocinas e quimiocinas (Yabluchanskiy et al., 2013), achado que pode vir a sinalizar uma similaridade de comportamento no tecido renal.

A Caspase-3 é uma protease de mamíferos bastante difundida e esclarecida quanto ao seu papel no processo de apoptose, estando envolvida em diferentes vias de morte celular que apresentam resultados em comum, como encolhimento celular, formação de bolhas citoplasmáticas e fragmentação de DNA (Porter & Janicke; 1999). Nos casos analisados, ela foi detectada nos túbulos coletores na região cortical (Fig.4.8.2D), o que sugere que estas células estejam sofrem um processo de apoptose frente à infecção pelo DENV. Estudos anteriores puderam detectar essa protease em monócitos (Torrentes-Carvalho et al., 2009) de pacientes infectados pelo vírus da DENV, todavia, a sua expressão não havia sido relacionada com os danos causados no tecido renal pela infecção por DENV até então.

Com isso, os nossos achados evidenciam que o DENV foi capaz de infectar e replicar no tecido renal, levando a uma resposta inflamatória local, que acarretou em alterações histopatológicas. É importante lembrar que no caso 1 havia outro patógeno associado, o que pode ter contribuído ainda mais para uma desregulação da resposta imune, e consequentemente a morte da criança. Todavia, a histopatologia, a caracterização das subpopulações

63 celulares e expressão de citocinas e quimiocinas locais propiciam um maior esclarecimento quanto à imunopatologia da dengue no tecido renal de casos fatais em crianças. Além disso, contribui a respeito de biomarcadores de gravidade associados à infecção pelo DENV em crianças, auxiliando em seu prognóstico e tratamento.

6. CONCLUSÕES

• As alterações histopatológicas encontradas no tecido renal de caso fatal de dengue em criança foram congestão vascular, desnudamento de células epiteliais do túbulo contorcido proximal, infiltrado inflamatório, necrose tissular, vindo a confirmar um quadro de glomerulite renal no paciente infectado por DENV;

• Foi possível caracterizar o perfil de células que faziam parte dos infiltrados inflamatórios, como macrófagos e linfócitos TCD8+, tendo este um perfil citotóxico da infecção, pela detecção das células NK (CD56+) observados no tecido renal de casos fatais de dengue em crianças;

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