• Nenhum resultado encontrado

A ESPERANÇA EM MOLTMANN

3.3 Diálogo, esperança e educação

A esperança ativa, mobilizadora de ações de lutas pela superação da opressão necessita do diálogo, pois é através dele que em comunhão as pessoas se organizam para se libertarem dos exílios e dos arames farpados em que foram colocadas. E o diálogo, por sua vez, necessita da esperança, pois, se não há a esperança, por que dialogar? “O diálogo não pode existir sem esperança. A esperança está na raiz da inconclusão dos homens, a partir da qual eles se movem em permanente busca. Busca em comunhão com os outros. (1979, p.43). E a inconclusão, por sua vez, está na raiz da educação a qual, para Freire, deve ser dialógica.

E que é o diálogo? É uma relação horizontal de A com B. Nasce de uma matriz crítica e gera criticidade (Jaspers). Nutre -se de amor, de humanidade, de esperança, de fé, de confiança. Por isso, somente o diálogo comunica. E quando os dois polos do

75 diálogo se ligam assim, com amor, com esperança, com fé no próximo, se fazem críticos na procura de algo e se produz uma relação de “empatia” entre ambos. Só ali há comunicação. “O diálogo é, portanto, o caminho indispensável”, diz Jaspers, “não somente nas questões vitais para nossa ordem política, mas em todos os sentidos da nossa existência. (FREIRE, 1979, p.39).

O diálogo é parte integrante e fundamental no processo que promove a missão e a libertação, tanto em Freire, quanto em Moltmann, que passaram pela experiência de prisão e de sofrimento, do totalitarismo e do sentimento do “não ser”. Porém, ambos conseguiram ver o sofrimento como ponte, e não como ponto final. Foram resilientes e, em diálogo solidário com os com que com eles sofriam, com os oprimidos e oprimidas, conseguiram recuperar a esperança, mais do que isso, conseguiram transformá-la em esperança ativa, exercendo o papel profético de anúncio e de denúncia.

Adriani Milli Rodrigues (2009, p. 30-31) no artigo “O diálogo das

religiões mundiais em Jürgen Moltmann: uma teologia não relativista das religiões” diz que Moltmann (1990, p. 153) indica alguns requisitos

para o diálogo honesto: (1) considerar seriamente os pontos fortes dos parceiros, privando-se da “ladainha” do criticismo de suas deficiências e erros; (2) perceber que não se perde a identidade própria no diálogo, mas se alcança um entendimento mais profundo dela, pois não se pode mais ver a si mesmo numa autoimagem romantizada, mas com os olhos críticos dos outros; (3) discutir a natureza do diálogo.

Freire subscreveria essas exigências, pois, para ele o diálogo tem em vista a construção coletiva de entendimentos a respeito de algo, numa relação horizontal, ou seja, de iguais, na busca da verdade.

Algumas de suas falas mostram isso. Com relação ao “considerar seriamente os pontos fortes dos parceiros”, diz Freire: “como posso dialogar se me fecho à contribuição dos outros, que jamais reconheço e até me sinto ofendido com ela? ” (1987, p. 81). Com relação ao papel do diálogo para um melhor conhecimento de si mesmo vindo da colaboração dos outros participantes do mesmo e da necessidade de, para isso, se aceitar a análise crítica desses outros, Freire diz, complementando a afirmação acima citada:

76 “Como posso dialogar se temo a superação e, se só em pensar nela, sofro e definho? ” (Ibidem). A superação de que ele fala é a da nova maneira de pensar resultante do embate amoroso (diálogo) de posições a partir do qual todos se superam melhorando, corrigindo, revendo, ampliando seus saberes. Não há o objetivo de se chegar a consensos, pois não é este o objetivo do diálogo, visto que ele se faz na busca de se saber mais a respeito do mundo que está sempre em mudança. O que se quer, quando se dialoga autenticamente, é a busca compartilhada por repostas possíveis para a perguntas que todos têm em relação ao seu mundo e a si mesmos. As perguntas, ou a problematização, são os desencadeadores do diálogo que, a cada nova conquista ilumina os caminhos da busca esperançosa pelo ser mais de todos. Aproximando-se dessas ideias, diz Moltmann (2004, p. 29):

O diálogo deve girar em torno da pergunta pela verdade, mesmo que não seja possível chegar a um consenso em relação a ela. Pois o consenso não é o objetivo do diálogo. Se u m do s pa rce iro s fo r con ve ncid o p e lo outro , a ca ba o d iá logo . Quand o dois dizem a mesma coisa, um deles está sobrando.

É necessário que haja uma fé nas possibilidades humanas de acertos conjuntos e correções, também conjuntas, dos enganos de percursos. Com relação a esta fé afirma Freire:

Não há também diálogo, se não há uma intensa fé nos homens. Fé no seu poder de fazer de refazer. De criar e recriar. Fé na sua vocação de ser mais, que não é privilégio de alguns eleitos, mas direito dos homens. (1987, p. 81. Itálico do autor)

Esta fé ou convicção na exigência e na possibilidade do ser mais do ser humano é o que se traduz na esperança como já apontado anteriormente em Freire e Moltmann. Para Freire esta ideia da esperança como móvel do existir e, dentro dele, do diálogo, é muito forte. Diz ele: “Não existe, tampouco, diálogo sem esperança” (1987, p. 82) e mais, na mesma obra e página:

77 Se o diálogo é o encontro dos homens para ser mais, não pode fazer-se na desesperança. Se os sujeitos do diálogo nada esperam do seu quefazer, já não pode haver diálogo. O seu encontro é vazio e estéril. É burocrático e fastidioso (ibid., ibidem).

A partir dessas ideias toda a proposta de uma educação dialógica presente em toda a obra de Freire. Especialmente pode -se ver isso nos seus dois livros: Extensão ou comunicaç ão? (1983) e Pedagogia do oprimido (1987) nos quais os caminhos do diálogo são propostos como caminhos áureos para uma educação que tem fé nos seres humanos carregando a partir dessa fé a esperança de que todos juntos podem sim seguir na direção da busca e da realização do seu ser mais.