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didático ou de divulgação?

No documento Moluscos nos espaços expositivos (páginas 77-82)

A maciça presença de textos nos museus de ciência é inegável. Resta saber qual o tipo de discurso empregado pela ciência para se comunicar com a sociedade.

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Para JACOBI (1998) é senso comum perceber o texto científico enquanto discurso específico e por isso mesmo, seria por diferenciá-lo da linguagem comum que o público o reconheceria. No entanto, o autor entende como curiosa esta diferenciação baseada na intuição e questiona se todo discurso que tem por tema a ciência pode ser considerado científico.

Respondendo ele mesmo a esta pergunta, JACOBI (1998) define que existem três tipos de discurso de comunicação científica que variam de autoria, público-alvo, suporte, grau de difusão e objetivo: o discurso primário, ou seja, entre pares; o discurso de vocação didática, como o encontrado nos manuais de ensino; e o discurso de educação não formal ou de popularização. E, se o discurso científico primário é considerado como acessível apenas à comunidade científica, e o de vocação didática tem também um público-alvo restrito e pré- determinado (escolares e universitários), o discurso de divulgação ou educação não-formal teria por objetivo permitir ao público em geral adentrar a torre de marfim por meio de uma linguagem mais familiar.

Ainda para este autor, o discurso utilizado nas exposições seria o de educação não formal ou de popularização, também utilizado pela mídia em geral (JACOBI, 1998).

3. Discursos científicos: algumas características

GOUVÊA (2000, apud MARANDINO, 2002) indica que os textos podem ser classificados pela sua estrutura ou pelos seus variados papéis comunicacionais e sociais. Assim, a autora indica que o texto científico primário seria uma variante do texto argumentativo com estrutura composta por definição do problema, justificativa, solução e conclusão; partes necessárias a uma argumentação. Esta estrutura - mais comumente dividida em introdução, material e métodos, resultados, discussão e conclusão - é considerada por JACOBI (1998)

como padrão imutável do discurso primário. Nestes textos, o autor- pesquisador mostra, através da construção de suas frase, o que JACOBI

(1998) chama de prudência, evitando afirmações categóricas e generalizações.

Já o discurso de vocação didática, apresenta uma ciência bem diferente daquela do discurso primário. Aqui, ainda segundo JACOBI

(1998), a ciência seria dogmática e irrefutável, o que a torna distante da ciência dos laboratórios.

Também diferindo do discurso primário, o texto de divulgação, segundo GOUVÊA (2000 apud MARANDINO, 2002) teria por base o texto jornalístico cuja linguagem tenderia a se aproximar do cotidiano e privilegiaria o receptor. A autora explica que, em textos de divulgação científica, duas linguagens convivem: a da ciência e a do jornalismo. Seguindo a mesma linha, LEIBRUDER (2000) define o texto de

divulgação científica como a intersecção entre o discurso da ciência e o discurso do jornalismo.

Embora a diferença pareça a priori marcante, a linha entre discurso de vocação didática e discurso de educação não formal é muito tênue e textos híbridos são comumente encontrados como já destacado por KRASILCHIK & MARANDINO (2004).

O fato é que tanto o discurso de vocação didática, quanto o discurso de educação não formal podem ser considerados muito mais próximos da linguagem comum que o discurso primário. POLI (1992)

considera que duas operações dificilmente conciliáveis são necessárias no processo de redação dos conceitos para os textos de museus: resumir (o conhecimento) e traduzir (o jargão especializado). LEIBRUDER (2000), por sua vez, considera que o texto neste caso não

deve ser considerado apenas como uma reformulação ou simplificação de um texto científico. Ele deve ser considerado como resultante de um trabalho de “formulação de um novo discurso”, com características e finalidades próprias (ZAMBONI, 1997 apud LEIBRUDER, 2000).

MARANDINO (2002) expõe que existem diferenças entre textos científicos, textos de divulgação e textos de museus de ciências, dentre as quais cita o suporte de apresentação e a forma de interação que o público visitante estabelece com cada um deles. Ressalta ainda

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que, nas exposições, os textos estão, na sua maioria, associados aos objetos e devem levar em conta as especificidades do espaço e tempo do museu. No entanto, MARANDINO (2002) afirma que embora existam diferenças, muitas das questões e desafios na elaboração de cada um dos três tipos de textos são compartilhados. A autora destaca ainda dentre os pontos em comum, os que se referem as suas formas e estruturas.

Enquanto resultado da intersecção de dois discursos, o discurso de divulgação emprega ferramentas de ambas as fontes – o discurso científico, caracterizado pela busca da objetividade e impessoalidade, e o discurso jornalístico, mais subjetivo. Os recursos do discurso científico teriam a função de legitimar a informação transmitida enquanto os recursos jornalísticos devem facilitar o acesso de indivíduos leigos aos domínios da ciência e ir além, tornando mais interessante e atraente o assunto proposto.

LEIBRUDER (2000) define índices de objetividade (como a incorporação da voz do cientista no texto, o apagamento do sujeito), ou seja, relativos ao discurso científico, e utilizados na divulgação científica com finalidade de provar a veracidade e legitimidade da informação.

A autora explica ainda que o emprego de uma linguagem objetiva, concisa e formal representa mecanismo que camufla a subjetividade do texto, conferindo-lhe um caráter de neutralidade e, portanto, de inquestionabilidade (LEIBRUDER, 2000). O pesquisador-

autor, a exemplo dos textos de discurso primário, não aparece, escondendo-se atrás de um “nós” (sujeito universal) ou da voz passiva que permite às coisas agirem sozinhas (JACOBI, 1998). O discurso de vocação didática, embora menos rígido que o primário, pressupõe, segundo KRASILCHIK & MARANDINO (2004), certa objetividade com vistas à precisão conceitual. JACOBI (1998) adverte, no entanto, que a objetividade conseqüente desta neutralidade acaba por provocar um frio distanciamento, comum nos textos dos museus clássicos.

Neste sentido, POLI (1992) adverte que para guiar e informar, o

assumindo uma postura sedutora. A autora ressalta ainda que nos textos de museu de ciências, por tratar de temática aparentemente objetiva (a ciência), embora o redator privilegie o uso de sujeitos impessoais e o modo indicativo para camuflar sua presença, uma leitura atenciosa revela, em graus variados, a marca do autor em seu texto.

O discurso jornalístico, segundo prato na balança de construção do discurso de divulgação também se caracteriza, para LEIBRUDER

(2000), pela objetividade, clareza e concisão de linguagem. Aqui, ora se busca um relato impessoal que camufle a presença do autor e conceda voz às coisas e aos fatos, ora se incorpora a própria voz do cientista de forma a legitimar o conteúdo exposto (LEIBRUDER, 2000). A

autora comenta que a impessoalidade e o distanciamento aproximam o discurso jornalístico do discurso científico.

Vale relembrar que a divulgação científica busca uma proximidade com o público, e para tanto, tenta empregar uma linguagem que lhe seja familiar. Neste aspecto, MORTIMER & MACHADO

(1997 apud MARANDINO 2002) ressaltam que a linguagem cotidiana é linear, apresentando uma ordem estabelecida e mantida, possuindo um narrador sempre presente, diferentemente do discurso científico primário e de vocação didática que é estrutural, descentralizado e sem a perspectiva de um narrador. Assim, a impessoalidade buscada em muitos textos de divulgação estaria em contrafluxo com a busca de proximidade entre ciência e sociedade, objetivo primeiro da divulgação científica. No discurso de vocação didática, a opção muitas vezes, é pela hierarquização dos conceitos (KRASILCHIC & MARANDINO, 2004), que pode ser evidenciada pela estrutura em tópicos do texto.

Por outro lado, jornais e periódicos fazem uso de índices de subjetividade (como um léxico coloquial e o emprego de elementos que denotem juízo de valores – metáforas, comparações, adjetivos e advérbios) que teriam a função de aproximar o leitor do que está sendo dito e que acabam por revelar a presença de um autor por detrás da aparente neutralidade (LEIBRUDER, 2000). Este emprego de

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comparações, metáforas e paráfrases) é considerado pela autora como típico do discurso de divulgação científica, remetendo ao discurso jornalístico e a sua subjetividade. Elementos como estes também podem ser evidenciados nos textos de vocação didática (KRASILCHIC & MARANDINO, 2004). Como visto, a separação entre discurso de educação não formal e de vocação didática, não é fácil.

No entanto, no caso dos textos em museus, como comenta JACOBI (1998), o uso de elementos didatizantes não é tão freqüente quanto nos textos de vulgarização. Isto talvez se deva, ainda segundo o autor, ao fato de o museu ter por objetivo atender também um público especializado para o qual o uso de tais recursos lingüísticos poderia ser vexatório; ou ainda, e principalmente, pelo fato da estrutura destes textos ser reduzida, o uso de recursos didatizantes os deixaria mais densos e, portanto, menos atrativos.

Assim, um dos grandes desafios quando da concepção de textos de divulgação de ciência é o uso de léxico adequado. JACOBI (1989, 1998) aponta que conceitos científicos correspondem a termos especializados, considerados característicos do discurso primário e muito diferente daqueles usados pela maioria dos visitantes em suas conversas. Em 1998, o autor lembra ainda que não há equivalência direta entre o léxico especializado e a linguagem comum. A questão torna-se então: como, não podendo renunciar ao uso destes termos específicos, redigir um texto compreensível pelo visitante não especializado? JACOBI (1989) cita que as pesquisas indicam como

sendo três as soluções mais utilizadas: 1. a busca por co-referências a partir das propriedades semânticas do termo científico; 2. uso de recurso figurativo; 3. desenvolvimento de uma paráfrase com função de definição.

4. Redação de textos para museu:

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