• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO II – O Género

2.1. Diferenças de Género

No final do século XX, abriram-se novas perspectivas, num panorama teorético que passa a privilegiar uma efectiva parceria de género direccionada para o contexto da economia, da sociedade e das instituições políticas. E, uma vez que o género é algo socialmente “construído e moldado pelas relações assimétricas de poder entre homens e mulheres”, para o expormos teremos de considerar uma multiplicidade de categorias, que são inevitavelmente “resultantes do cruzamento com outras categorias sociais (raça, etnia e classe social) e características contextuais (circunstâncias políticas, históricas ou económicas)” (Barracho & Martins, 2010, p.111).

Segundo Louro (2000) “aquilo que se constitui, hoje, como formas normais de género e de sexualidade nem sempre foi assim concebido e é um arranjo circunstancial e passível de ser alterado” (p.40). Contudo, não podemos descurar que “as mulheres e os homens constituem e estruturam as sociedades em que vivem” (Silva, 1999, p.29).

A nível histórico, até à década de 70, os conceitos de género e sexo foram usados indiscriminadamente no que diz respeito à distinção do lado feminino e masculino da humanidade. No início dos anos 70, por influência dos movimentos feministas, o género era utilizado para evidenciar aspectos ligados ao sexo biológico e à forma como a sociedade; com base nesses mesmos aspectos, designava comportamentos, atitudes e competências fundamentais e adequadas aos homens e às mulheres. Hoje, embora ambos os conceitos assentem no lado biológico do ser humano, não podem ser considerados sinónimos uma vez que focam aspectos diferentes de uma mesma realidade (Correia, 2009, p.29).

Apelando às diferenças biológicas entre homens e mulheres, Gurian e Annis (2008), estudaram as desigualdades a nível cerebral de ambos os sexos, no instituto Gurian

39

(Estados Unidos da América - EUA). Os autores afirmam que estas diferenças ocorrem em todo o mundo, em todos os continentes e em todas as culturas (p.20). Os investigadores acrescentam que a neurociência desenvolveu novas formas de entender as diferenças entre mulheres e homens e conseguiu desvendar mais de cem diferenças biológicas entre os cérebros masculino e feminino:

Há mais 15% a 20% de fluxo sanguíneo no cérebro de uma mulher do que no de um homem, a qualquer momento. Nenhum dos cérebros é superior ou inferior, mas as diferenças no fluxo de sangue faz com que diferentes partes do cérebro feminino funcionem em simultâneo.

O cérebro masculino «desliga-se e reinicia» muitas vezes por dia, mas no cérebro feminino isto não ocorre da mesma forma. Como consequência, mulheres e homens reagem de forma diferente em relação à atenção dada nas diferentes situações, em completar uma tarefa, em «destressar»/ descomprimir, em ficar aborrecido e mesmo em relação às conversas básicas.

O cérebro feminino processa mais informação e experiencia diferentes partes do cérebro em diferentes momentos, em relação ao cérebro masculino. Ambos os sexos são igualmente inteligentes, mas de forma distinta. Geralmente vemos mulheres e homens focados em coisas, ideias, resultados e mesmo em produtos diferentes.

O hipocampo masculino (o maior centro de memória do cérebro) é geralmente menos activo que o feminino, durante as situações de relacionamento emocional no trabalho, em que há também menos linguagem. Há uma menor ligação entre este «centro de memória» e o «centro das palavras», que é razão pela qual os homens falam menos sobre as suas experiências emocionais e relacionamentos, que as mulheres.

Os lobos parietal e occipital das mulheres são mais activos que os dos homens. Esta diferença pode afectar, entre outros aspectos, a negociação de acordos, os conflitos diários e situações de comunicação. Homens e mulheres podem ser ambos bons em negociações, mas podem obter os resultados finais de formas muito diferentes.

O lobo temporal do masculino é geralmente menos activo que o feminino, o que significa que as mulheres têm uma maior habilidade para ouvir as palavras e passar o que ouviram, leram e viram para a escrita. Homens e mulheres usam as palavras para diferentes propósitos e por vezes

40 incrementar estas diferenças pode ser essencial para o sucesso da organização (Gurian & Annis, 2008, p.21).

Apesar das centenas de estudos efectuados, Vecchio (2003) e Powel e Graves (2003) afirmam que os investigadores não concordam sobre o âmbito, magnitude ou causas das diferenças de sexo. As diferenças de género influenciam a forma como as pessoas reagem aos comportamentos nos locais de trabalho. Algumas diferenças de género representam as crenças tidas por uma grande parte da população. Por exemplo, os homens são comummente associados a traços considerados masculinos, como a independência, agressividade e domínio, as mulheres por outro lado são reconhecidas, através de traços femininos como a docilidade/brandura, sensibilidade para com os sentimentos dos outros e delicadeza (Powel & Graves, 2003, p.37).

No entanto, importa esclarecer que as mulheres constituem, pelo menos, “metade da população de um dado território ou espaço político”; ainda é mais evidente, “quando se verificam fenómenos de guerra e emigração acentuada, as mulheres constituem mesmo uma ampla maioria” (Silva, 1999, p. 73). Por isso, não podemos olhar para “a problemática da igualdade entre mulheres e homens, na perspectiva dos direitos das minorias. As mulheres não são uma minoria, são a metade ou mais de toda uma população” (Ibid., Ibidem.). Powel e Graves (2003) sublinham o facto dos papéis sociais de género tradicionais enfatizarem as diferenças ao invés das semelhanças entre homens e mulheres. Acrescentam que os papéis tradicionais de género tiveram um profundo impacto nas relações entre homens e mulheres em todas as esferas da nossa sociedade, nomeadamente a família, o sistema educacional, o sistema legal e os locais de trabalho (p.13).

No entanto, são as pressões sociais externas aos indivíduos que geralmente favorecem a acção do género consistente com o seu papel em termos comportamentais, pois como Barracho e Martins (2010) argumentam “as pessoas internalizam expectativas culturais relativamente ao seu sexo e motivam-se intrinsecamente para agirem de forma consistente com os seus papéis de género” (p.116). Portanto, quando as expectativas de género, que estão associadas às mulheres líderes, são corrompidas, “poderão estar sujeitas a reacções discriminatórias, que podem originar avaliações de desempenho enviesadas e preconceitos negativos acerca do seu desempenho futuro” (Ibid., Ibidem.).

Por outro lado, importa enunciar, outra perspectiva, a das teorias feministas que, segundo Nogueira (2006), podem ser agregadas em três tipos: “teorias feministas humanistas,

41

teorias feministas centradas nas mulheres e teorias feministas desconstrucionistas” (p.59). As primeiras estão inseridas numa perspectiva “socioliberal, acreditam e lutam pela igualdade plena entre homens e mulheres (Ibid., Ibidem.). Assumem uma “subjectividade política igualitária, neutra, abstracta e universal, baseada na crença da racionalidade livre e universal de todos os seres humanos” (Ibid., p.60). As feministas centradas nas mulheres desafiam “o carácter abstracto de um sujeito universal neutro, assumem uma subjectividade política de base feminina, proclamando a necessidade de uma política de identidade” (Ibid., Ibidem.) Por fim, as feministas desconstrucionistas são frequentemente designadas de pós-modernas e substituem as “noções unitárias de mulher e de identidade de género feminino por concepções construídas, complexas e plurais de identidade social, trata o género como algo relevante e importante, entre outras coisas, atendendo também à etnicidade, à idade e à orientação sexual” (Ibid., p.61).

Como afirma Correia (2009), “a inscrição dos géneros – feminino e masculino – nos corpos é sempre feita no contexto de uma determinada cultura e carrega por isso as marcas dessa cultura”; a natureza dá a diferença, “mas essa diferença, em si mesma é insignificante: só tem sentido ao ser interpretada por cada sociedade e cada cultura” (p.30). Assim, concluímos que em cada sociedade tanto os homens como as mulheres aprendem a ser aquilo que a sociedade espera deles, ou seja, assumem uma identidade de género caracterizada por comportamentos, atitudes e práticas a que se dá o nome de papel de género.