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CAPÍTULO I – Conceito(s) de Liderança

1.2. Liderança versus Gestão

Após a exploração do acto de liderar e da relação extrínseca e intrínseca de reciprocidade que o mesmo implica entre líder e liderado, tomemos o conceito de liderança sob uma nova abordagem, a partir da seguinte questão: «Existem diferenças entre líderes e gestores?». Da investigação desenvolvida em torno da referida questão, foi possível verificar, na literatura revista, que esta distinção é uma realidade (Afonso, 2009, 2011; Cunha et al, 2007; Hooper & Potter, 2010; Fonseca (2000); Rego & Cunha, 2007, 2009). É consensual a distinção entre liderança e gestão, “embora o campo de aplicação destes dois conceitos suscite alguma discordância, com especialistas de cada uma das áreas a defenderem um carácter mais geral do respectivo conceito” (Afonso, 2011, p.71).

Sob a óptica de Rego e Cunha (2007) a liderança e a gestão podem ser consideradas como processos ou funções distintas. “A liderança é mais emocional, inovadora, criativa, inspiradora, visionária, relacional-pessoal, original, proactiva, assente em valores” (p.184). Em contrapartida, a “gestão é mais racional, „fria‟, calculista, eficiente, procedimental, imitadora, reactiva, assente em cálculos e transacções” (Ibid., Ibidem.). Os autores acrescentam que “os gestores são mais conservadores e mais analíticos, reagem e adaptam- se aos factos mais do que tentam transformá-los” (Ibid., Ibidem.). Relativamente aos líderes “são mais criativos, têm estilos mais imprevisíveis, são mais intuitivos do que racionais. Em vez de se adaptarem, tentam transformar o estado das coisas” (Ibid., Ibidem.).

Por outro lado, Afonso (2009) faz referência às concepções defendidas por Bass (1990), Hickman (1990) e Kotter (1998) e afirma que “embora definindo a liderança e gestão como processos distintos, podem efectivamente ser integrados e desenvolvidos pela mesma pessoa” (p.64).

Costa (2000), por sua vez, menciona que, se do ponto de vista das expectativas somos tentados a identificar o gestor com o líder, não estamos “perante uma situação de causalidade linear, nem perante conceitos sinónimos”; são muitos os líderes “em contexto escolar que não exercem funções de gestão organizacional, bem como inúmeros serão os gestores escolares (…) que „não fazem ideia‟ do que significa liderar” (p.30). Nesta linha de pensamento, o autor inclusive enumera uma série de questões, que escolhemos referenciar face à pertinência das mesmas na abordagem da presente temática: a liderança

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estratégica; a importância do projecto de escola; os valores e a dimensão ética na liderança; o apelo à liderança transformacional; o papel do género (especialmente o desempenho no feminino) nas práticas dos líderes; a questão nevrálgica das lideranças intermédias e, por fim, a formação especializada dos líderes (Ibid., Ibidem.).

Numa perspectiva teórica, igualmente arguta, Fonseca (2000) refere que “idealmente, um gestor devia ser líder” (p.147). Ao líder não deve faltar “dinamismo equilibrado, humor e capacidades de crítica e de decisão” (Ibid., Ibidem.), pois para o mesmo “os líderes funcionam em acção, os gestores quase sempre em reacção” (Ibid., Ibidem.). Os objectivos dos gestores são definidos pela “necessidade de fazer executar normas” e “procuram a convergência do máximo de interesses possível, actuando em „conformidade‟” (Ibid). Os objectivos dos líderes regem-se pelo “desejo de novas abordagens e novas opções” (Ibid., p.147). Estes, quando são “autoconfiantes, agem de forma quase sempre solitária, mas pelo carisma conquistado através, também, da sua capacidade de comunicação entusiasmante arrastam consigo os outros actores” (Ibid., Ibidem.).

Fora do âmbito das pesquisas efectuadas, a liderança é comummente considerada como um processo mais emocional do que a gestão. Os líderes são considerados como indivíduos criativos, que sabem lidar com a mudança, e visionários, “enquanto os gestores são mais racionais, trabalham mais com a „cabeça‟ do que com o „coração‟, lidam com a eficiência, o planeamento, os procedimentos, o controlo e os regulamentos” (Cunha et al, 2007, p.333). Os gestores criam estratégias que os levam às decisões, alicerçados “em acções articuladas e envolvendo na sua execução outras pessoas interligadas pelos motivos objectivados antagónicos” (Fonseca, 2000, p.147). No Quadro 3 encontramos sintetizados os principais motivos pelos quais a gestão e a liderança são consideradas funções distintas ou até mesmo antagónicas:

Quadro 3 - Gestão e liderança como dois processos separados3

Gestão Liderança

Que devemos fazer?

Planear e Orçamentar – estabelecer

passos detalhados para atingir os resultados necessários; alocar os recursos necessários para que isso aconteça.

Estabelecer a direcção – através de uma

visão do futuro; desenvolver estratégias para produzir as mudanças necessárias ao alcance dessa visão.

3 Adaptado de Hooper e Potter (2010), p.72, com base na ideia de John Kotier expressa em A Force For

19 Como encorajamos os nossos colaboradores a produzir os resultados necessários?

Organizar e gerir o pessoal - estabelecer

estruturas para cumprir as exigências planeadas; delegar responsabilidades e dar autoridade para executar o plano, dando as políticas e os procedimentos; monitorizar a implementação.

Alinhar as pessoas comunicando

através de palavras e acções incentivar todos cuja cooperação possa ser necessária; influenciar a criação de equipas e coligações que compreendam a visão e que aceitem a validade das estratégias utilizadas.

Tornar realidade

Controlar e resolver problemas – monitorizar detalhadamente resultados face ao planeado com algum pormenor; identificar os desvios; planear e organizar de forma a resolver esses problemas.

Motivar e inspirar – incentivar as pessoas a ultrapassar os grandes obstáculos à mudança; satisfação das necessidades humanas básicas, mas não realizadas.

Resultados

Produz um determinado nível de previsibilidade e ordem – tem o potencial de produzir, consistentemente, resultados- chave esperados pelas partes interessadas.

Produz mudanças – por vezes até a um nível drástico, tem o potencial de produzir mudanças extremamente úteis; apoiam o desenvolvimento da organização.

(Adaptado de Hooper & Potter, 2010, p.72)

Em relação ao quadro anterior, Hooper e Potter (2010) indicam que a gestão debruça-se sobre o planeamento, a organização e o controlo (trabalha com recursos financeiros), por outro lado, a liderança prende-se com o estabelecimento de direcções, motivação e inspiração das pessoas (trabalha com as pessoas) (p. 71).

Quadro 4 - O Gestor e o Líder O Gestor

 Administra  É uma cópia  Mantém

 Centra-se nos sistemas  Baseia-se no controlo  Visão de curto alcance  Pergunta como e quando  Desperto para a base  Imita

 Aceita o status quo

 Obedece às ordens sem questionar  Faz as coisas correctamente  Recebe formação

 Os gestores operam dentro da cultura

O líder

 Inova  É original  Desenvolve

 Centra-se nas pessoas  Inspira confiança  Visão de longo alcance  Pergunta o quê e porquê  Desperta para o horizonte  Origina

 Desafia o status quo

 Obedece quando deve, mas pensa  Faz as coisas certas

 Aprende

 Os líderes criam a cultura

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Este quadro é baseado no trabalho de Warren Bennis. “A lista da esquerda é sobre controlo da gestão, previsibilidade e resultados de curto prazo” (Hooper & Potter, 2010, p.73). Já a lista do lado direito “é mais emocional; é sobre desbloquear o potencial humano e trabalhar no sentido de um futuro mais visionário” (Ibid., Ibidem.). São duas perspectivas que, não obstante as diferenças notórias que sublinham sobre os dois conceitos, são também o testemunho da dimensão pluridimensional que a temática suscita.