• Nenhum resultado encontrado

4 A Bacia de Sergipe-Alagoas, com ênfase no estágio rifte da porção alagoana

4.4 Diferentes critérios para posicionamento do início do rifte na Bacia de Sergipe-Alagoas

O início do rifteamento nas bacias da margem continental brasileira tem sido motivo de debate há pelo menos 30 anos (Ponte & Asmus, 1976; Chang et al., 1992; Magnavita & Cupertino, 1987; Matos, 1999; Chagas et al., 1993; Bueno, 2004; Jardim de Sá et al., 2006; Campos Neto et al. 2007). As diferentes opiniões devem- se principalmente aos critérios utilizados (Tabela 4.2). Uma discussão desses critérios, utilizados de forma isolada ou combinados, é apresentada nos parágrafos seguintes.

Geométricos (padrões estratais)

Numa seção transversal, um hemi-graben preenchido apresenta uma forma aproximadamente triangular, sendo um dos “lados” a falha de borda, o “lado inferior” a discordância inicial do rifte, e o “lado superior” a discordância final do rifte (Figura 2.2). Em seção longitudinal, a bacia apresenta um aspecto sinformal (1989; Schlische, 1991; Schlische & Withjack, 1999). Enquanto os estratos pré-rifte e pós-

rifte apresentam um padrão plano-paralelo, os depósitos sin-rifte apresentam padrão divergente, devido à subsidência diferencial, assentados em onlap sobre os depósitos pré-rifte. Com este critério, o início do rifte é então posicionado na

Discordância Inicial do Rifte, onde os estratos passam de plano-paralelos para

divergentes.

Em algumas bacias, como na Bacia do Recôncavo, essa geometria é bem caracterizada. Na Bacia de Sergipe-Alagoas, a primeira discordância angular importante (Discordância Pré-Aratu, identificada por Galm e Santos, 1994), ocorre na base da Formação Barra de Itiúba (Sequência K34-K36). Este critério foi utilizado por Feijó (1994) para marcar o início do rifte.

Estruturais / Cinemáticos

A identificação de falhas sin-sedimentares em afloramentos e testemunhos também tem sido utilizada como um indicador de atividade tectônica no estágio sin- rifte.

Na Bacia do Recôncavo, existe um conhecido afloramento onde a Formação Sergi (correlata à Formação Serraria) encontra-se afetada por falhas de crescimento. Na Bacia de Sergipe-Alagoas, evidências de falhas sin-sedimentares, como as bandas de deformação pré-compactação em arenitos da Formação Serraria (Sequência J20-K5) observadas em afloramentos de Sergipe por Jardim de Sá et al. (2006) levaram os autores a considerar o início do rifte na base dessa formação. Segundo os autores, essas falhas também foram rotacionadas por deformações posteriores. Outras deformações sin-sedimentares, como dobras convolutas e escorregamentos, também são indicativos do aumento da intensidade do tectonismo.

Recentemente Mbina Mounguengui & Guiraud (2008) reportaram estruturas semelhantes na Formação N’Dombo, correlata da Formação Serraria na Bacia do Norte do Gabão, que os autores consideram como os depósitos iniciais do rifte naquela bacia.

Litológicos (deposicionais)

A presença de conglomerados de borda já foi muito utilizada como marcador do início da atividade tectônica nas bacias (desde Davis, 1899 in Blair & Bilodeau, 1988). Um exemplo são os conglomerados da Formação Salvador (critério utilizado

por Dias, 1991), junto à falha de borda da Bacia do Recôncavo, ou da Formação Rio Pitanga, na Bacia de Sergipe-Alagoas, equivalente proximal das formações Penedo e Barra de Itiúba na porção sergipana da bacia.

Contudo, nos depocentros associados à margem ativa o incremento do tectonismo pode resultar na deposição de finos, e não de conglomerados (Blair & Bilodeau, 1988; Embry, 1995). Neste caso, o registro sedimentar de um pulso tectônico é posicionado numa superfície transgressiva. Isto está ligado à mudança do padrão de drenagem, que passa a ser divergente, já que as ombreiras do rifte bloqueiam o aporte de clásticos para a bacia, levando ao atraso na chegada de sedimentos grossos. Para Miall (1996), o tectonismo produzindo sedimentação inicial fina ou grossa é uma questão complexa, requerendo uma análise caso a caso. Na margem flexural, especialmente em contexto proximal, o tectonismo pode gerar sedimentação aluvial inicial (Frostik & Reid, 1990; Chiossi, 1997).

Amparado neste critério, folhelhos espessos relacionados à formação de bacia faminta foram utilizados para marcar o início do rifte no Membro Tauá da Formação Candeias, na Bacia do Recôncavo (Caixeta et al., 1994).

Utilizando este mesmo critério, para a Bacia de Sergipe-Alagoas, o início do rifte pode ser alternativamente marcado na base da Sequência K10-K20, considerando a passagem brusca dos arenitos fluviais da Formação Serraria para os depósitos lacustres da Formação Feliz Deserto, resultado da aceleração na subsidência. Este foi o critério preponderante na última revisão da carta estratigráfica da bacia (Campos Neto et al., 2007).

Geodinâmicos

A primeira evidência de estiramento da crosta, que precede a ruptura, também pode ser considerada para a demarcação do início da fase rifte. Matos (1999) demarcou o início do rifte na base da Sequência J20-K5, baseado no formato alongado da Depressão Afro-Brasileira, que já delineava o futuro rifte. Chang et al. (1992), Destro (1994) e Zalán (2004) também consideram a Sequência J20-K5 como os depósitos do rifteamento inicial da bacia, ainda com tectonismo bastante brando.

Nesta linha, o estiramento inicial resulta nos depósitos fluviais iniciais do rifteamento, como os descritos no modelo de preenchimento de Lambiase (1990) e de Schlische (1991).

Ao tratar a Discordância Pré-Aratu como um registro da propagação diácrona do Rifte do Atlântico Sul, Bueno (2001, 2004) posicionou o início do rifte nos depósitos imediatamente acima da discordância, ou seja, na Formação Barra de Itiúba (Sequência K34-K36), mais tarde do que nos riftes situados mais ao sul, como o do Recôncavo.

Tabela 4.2 - Posicionamento do início do rifte da Bacia de Sergipe-Alagoas Autor Idade aproximada

(Ma)

Posição Chang et al. (1992), Matos

(1999), Zalán (2004), Jardim de Sá et al. (2006)

146,9 Base da Sequência J20-K5

(Formação Serraria) Hamsi (1998), Campos Neto

et al. (2007), Destro (1994)

145,5 Base da Sequência K10

(Formação Feliz Deserto) Chagas et al. (1993), Feijó

(1994), Bueno (2001, 2004)

137,8 Base da Sequência K34

5 Aspectos estruturais do Campo de Furado

O Campo de Furado encontra-se no compartimento denominado Plataforma de São Miguel dos Campos, formada por degraus separados por falhas de direção nordeste próximas à atual borda da bacia (Figura 4.4). O modelo estrutural foi elaborado por Góes et al. (1986), amparado principalmente em dados de poços. Com a aquisição sísmica 3D e a perfuração de poços adicionais, o modelo aqui apresentado, foi aprimorado e expandido para áreas adjacentes, e pode ser resumido no mapa da Figura 5.1 e na seção sísmica arbitrária das Figuras 5.2 e 5.3. As falhas produziram fechamentos que resultaram nas acumulações petrolíferas de Furado, Cidade de São Miguel dos Campos e São Miguel dos Campos. Furado, o degrau mais próximo da borda atual da bacia é dividido em dois blocos principais (Figura 5.1): a Área Central, uma estrutura dômica relacionada ao

drag reverso da falha de borda; e a área de Fazenda Tomada, um horst

intermediário entre a Área Central e o adjacente Campo de Cidade de São Miguel dos Campos. Toda a área é cortada por um grande número de falhas conjugadas de direção norte-nordeste e baixo ângulo de mergulho (35º), formando um padrão em “X” que se propaga em todas as escalas, e por falhas de transferência subverticais, de direção noroeste (Figura 5.4). A grande maioria das falhas é de Idade Alagoas (Aptiano/Eo-Albiano). O baixo ângulo de mergulho, fugindo da mecânica

andersoniana, é provavelmente devido à profundidade original dessas falhas, onde

atualmente os segmentos devem corresponder à sua porção mais basal. A cobertura de sedimentos no bloco soerguido teria sido removida pela erosão no evento de soerguimento associados ao breakup.

A F19 é a principal falha do sistema da borda atual da bacia, com pelo menos 3000m de rejeito e direção N60ºE. Provavelmente não se trata de uma falha de borda ativa na época da deposição das sequências K10 a K36, quando o limite da bacia deveria se situar muito além desta região (Chagas et al., 1993), e sim formada em pulsos mais tardios e intensos do rifte, no Andar Alagoas. Esta interpretação é reforçada principalmente pela ausência de conglomerados e de espessamentos expressivos, em relação ao grande rejeito, junto à falha de borda.

As falhas F2 e F52 também apresentam rejeitos expressivos (até 500m), dispostas em padrão de revezamento, com direção N30ºE e mergulho de cerca de

35º para sudeste. A Falha F1 é conjugada às falhas acima citadas, e com elas delineia o Alto de Fazenda Tomada, uma área de relevo positivo que se comportou como zona de acomodação desde o Andar Rio da Serra, conforme será discutido nos capítulos seguintes.

O graben limitado pelas falhas F19 e F1, chamado aqui de Depocentro Furado, é uma área que apresenta nítido espessamento dos estratos desde o final do Andar Rio da Serra, sugerindo tectonismo interferindo na sedimentação. A atuação desse tectonismo local na sedimentação também será tratada com mais detalhe nos capítulos seguintes.

Figura 5.1 – Mapa estrutural do Campo de Furado, no nível da base da Sequência K34/10 (Discordância Pré-Aratu). A Falha F19 é a atual falha de borda da bacia, e as falhas F1 e F2 e F52 delimitam o horst do Alto de Fazenda Tomada. A linha azul localiza a seção sísmica arbitrária da Figura 5.2 e a seção estratigráfica da Figura 6.3.

Figura 5.2 – Seção sísmica arbitrária do Campo de Furado. Notar a descontinuidade dos estratos devido à grande quantidade de falhas.

Figura 5.3 – Seção sísmica arbitrária do Campo de Furado, com os principais limites de sequência e as falhas mais importantes assinaladas.

Figura 5.4 – Estereograma dos planos de falha mapeados na área. Nota-se um conjunto principal de falhas NNE mergulhando para ESE e falhas conjugadas mergulhando para NNW. A falha de borda apresenta direção ENE. Ocorrem também falhas de transferência subverticais, de direção NW.