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3.3 A experiência docente e a escola como espaço de formação

3.3.2 Dificuldades na docência hoje

Para a maioria dos professores as dificuldades iniciais foram ou estão sendo superadas, porém na trajetória docente outras foram anunciadas.

P1A comenta que com relação à física e química

“eu acho que nós temos dificuldades até hoje né. Eu acho que tenho ainda porque o básico de física e química, os conceitos, tudo bem, mas se o aluno me faz uma pergunta, por exemplo, de uma questão do ensino médio que é mais específica, mesmo de química, acho que todos os professores tem dificuldades. A parte da biologia, ecologia, saúde é mais tranqüilo, apesar que eles confundem muito a gente com médico né. Então acham que você tem que responder a todas as perguntas”. ( P1A )

No que diz respeito aos conhecimentos básicos de física / química que são ensinados na 8ª série, P1A não apresenta dificuldade em ensiná-los como observamos em seu relato, porém o “aprofundamento” desses conhecimentos é que poderá gerar uma certa dificuldade.

Entende ainda que, se o professor de Ciências não tiver o conhecimento matemático, poderá enfrentar dificuldade maior quando ministrar o conteúdo de 8ª série – física e química, atendo-se, nesse caso, ao ensino da física. Segundo P1A o problema dos alunos não entenderem física, não é tanto – a parte conceitual – mas a dificuldade que eles têm em matemática, inviabilizando a resolução dos problemas de física como aponta o relato abaixo:

“Eu estava me esquecendo de Física e Química. Mesmo porque eles (os alunos) tem dificuldade em matemática o problema não é nem tanto o conteúdo, a parte conceitual de física é que eles têm dificuldade em

matemática prá resolver os problemas de física, e se você não sabe bem matemática, você não consegue passar pra eles”. ( P1A )

Outra dificuldade observada por P1A é a questão da falta de atualização para o ensino de Ciências.

Apesar de toda a sofisticação das novas tecnologias em fornecer às pessoas informações cada vez mais rápidas e globalizantes, a dificuldade ao acesso e a falta de tempo são adversárias de P1A impossibilitando-a de atualizar-se.

“Eu acho que a gente acaba se desatualizando um pouco porque as coisas mudam né, e não tem muito tempo da gente tá indo atrás. A gente ouve assim, notícia aqui, outra ali e a gente não consegue... eu pelo menos não consigo estudar mais por falta de tempo, por falta de concentração, cansaço. Por exemplo, vou falar sobre transgênicos, eu sei o que eu ouço na TV, o que eu leio, a gente não consegue mais se aprofundar, então tem essa questão, principalmente Ciências, História e Geografia que a coisa muda muito, acho que a gente peca um pouco por não estar tão atualizada. Aquele conteúdo básico de sempre. Acho que Meio Ambiente dá conta direito, Saúde, mas técnicas novas né, a tecnologia e tal, isso eu já tenho mais dificuldade mesmo, porque eu não tô dando direito pelo cansaço e tal”.

( P1A )

O enfoque dado por P1A a essa falta de “atualização” diz respeito aos avanços da ciência, da tecnologia, aos conhecimentos científicos desenvolvidos recentemente e que P1A ou não consegue aprofundá-los ou então acaba desconhecendo.

Entendemos que essa questão, além de ser uma dificuldade também é uma necessidade concreta para P1A enquanto professora de Ciências.

Outra dificuldade apontada por P1A diz respeito a falta de material (livros didáticos), biblioteca e superlotação de alunos nas salas de aula, inviabilizando o cumprimento de todo o conteúdo programático daquela série, naquele ano letivo. Para resolver o problema a professora P1A e outros colegas ministram o conteúdo não dado ensinando-o na série seguinte.

O problema que nós tínhamos era o seguinte: era falta de material. Acho que não que o livro didático, ele vá substituir qualquer coisa, mesmo porque você tem que completar com outros textos, as vezes até corrigir né, algumas coisas né, mas ajuda muito no sentido de você não ter que tá passando. Você está questionando, explicando, fazendo exercícios.

Então a partir do ano passado (2001) boa parte do conteúdo a agente conseguiu colocar, mas como a gente, eu falo a gente porque é o grupo né, eu pelo menos, eu a S., acho que faz isso também, tenta pegar na 5ª série e acompanha até a 8ª. Então alguma coisa que a gente acha importante que não conseguiu numa série atingir, na série seguinte a gente coloca e aí vai acompanhando. Mas eu acho que o que mais é o problema da superlotação. Os alunos não tem o hábito de estudo, o que atrasa muito, e porque, como eles não estudam muito fora e trabalham as vezes eu dou espaço na aula para fazer, porque eles não podem pesquisar. Muitos não podem ir pro centro (realizar consultas em bibliotecas), então tudo tem que ser feito em sala de aula. Não tem biblioteca a escola, tem todos esses problemas”. ( P1A )

P2A considera que a sua maior dificuldade é com relação à indisciplina dos alunos. Faz um desabafo:

“Hoje a dificuldade é o domínio da sala de aula. E o conteúdo, as estratégias e as avaliações ficam até no segundo plano... se você conseguiu dominar a sala pra ouvir você, já é uma conquista”. ( P2A )

P2A nos explica porque considera isso tudo uma conquista:

“...porque as salas são muito diversas, heterogêneas, tem bons alunos mas também tem piores alunos, tem que conciliar o ótimo com o pior, é difícil”.

( P2A )

E vai além no seu desabafo,

“... hoje o professor não tem o apoio do pai, da autoridade educacional, você é o professor e você tem que resolver a situação. Não. Isso não tá resolvendo. A maneira dele ser aprovado hoje, né, mesmo não sabendo ele é aprovado, isso vem tornando muito difícil a educação hoje, atual”. ( P2A ) .

É sugestivo pelos relatos de P2A o desencantamento com as questões ligadas à profissão, à carreira, marcados por um questionamento seguido de lamentações de todo o contexto escolar.

Outras dificuldades, desta vez com relação a conteúdos de ensino, são comentadas por P3B:

“Por exemplo, na 5ª série, em Ciências, falar de densidade pra mim é difícil... falar de vasos comunicantes, pressão, tem determinados assuntos na 5ª série que eu tenho dificuldade pra transmitir, ta”. ( P3B )

“8ª série eu não dou aula! Eu já tive uma experiência, uns 2 anos atrás, pra eu explicar átomo, molécula, pra mim é tudo muito abstrato e tudo o que é muito abstrato pra mim é muito difícil de passar”. ( P3B )

“8ª série por causa do conteúdo (física/ química) eu não dou aula! Já criou essa barreira comigo. É isso que acontece comigo é a dificuldade mesmo. Não saber, eu não sei como passar isso..”. ( P3B )

“... eu tenho dificuldade em dar botânica, tem uma parte da botânica que não vai, eu não gosto e muitas vezes a aula não sai muito legal, sabe... parece que eu não consigo me soltar falando sobre aquele conteúdo”. (P3B) “Esse conteúdo é um tanto quanto difícil de ser transmitido, por exemplo: síntese de proteína, código genético, então você primeiro tem que saber muito bem e quando você não sabe muito bem, você cria barreiras, obstáculos, eu tenho dificuldade de explicar síntese de proteína”. ( P3B )

P3B culpa a sua formação inicial comentando:

“É se tá criando essas barreiras hoje é porque eu não tô preparada, não é?” ( P3B )

P4B menciona dificuldades semelhantes sempre envolvendo conteúdos de ensino, no caso genética e botânica.

“Tirando genética que eu tenho dificuldade com genética né, eu nem dou aula de genética no cursinho. Apesar de botânica eu não ter aprendido

muito na universidade – eu preciso preparar – quando eu vou dar aula de botânica eu preciso preparar bem antes...” ( P3B )

O relato de P3B aponta para a superação / aprendizagem de um conteúdo de ensino que representa uma dificuldade:

“Eu tenho que superar é como se fosse um obstáculo mesmo! Mas o que eu fiz esse ano? Esse ano eu peguei e montei um teatrinho com os alunos. Estudei síntese de proteínas e montei um teatrinho com eles, cada 3 alunos sendo um nucleotídeo, formando códons e um sendo o ribossomo e o outro sendo... sabe? Pra tornar esse conteúdo mais fácil e agradável pra eles entenderem. Então, quer dizer, de que maneira eu tento superar essas dificuldades?”( P3B )

Ela mesma responde:

“Me envolvendo mais com o conteúdo e tentando criar alguma coisa diferente e deixar esse conteúdo um pouco mais fácil pra eles e até pra você, né? E tornar isso um pouco mais agradável pra mim também. Então eu tento mudar as estratégias. Se eu colocar um monte de transparências na cabeça deles, expor né, ficar lá falando meia hora de síntese de proteínas eles não vão entender tão facilmente quanto uma coisa mais... Até mesmo sobre a forma de um teatro, vai ficar mais fácil. Eu preciso achar alguma estratégia prá tornar isso mais agradável, prazeroso pra mim e pra eles”. ( P3B )

O exposto nos dá a indicação de que para esse conteúdo P3B encontrou uma forma agradável e prazerosa como ela mesmo disse de ensinar. Conseguiu reunir, combinar o conhecimento da matéria e o conhecimento do modo de ensinar, como citado por Shulman ( apud Garcia, 1995

).