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3 DESAFIOS ECOLÓGICOS ATUAIS E SEUS EFEITOS FUTUROS

3.4 Dificuldades para o enfrentamento do problema ecológico

A complexidade sobre a discussão acerca da responsabilidade ecológica dos diversos atores envolvidos no problema abarca elementos como globalização, economia e sistemas políticos; fatores que contribuem para a análise das dificuldades inerentes para o enfrentamento da questão.

15 "[...] é claro que [...] as nações ricas não podem justificar a sua contínua alta produção de gases de efeito estufa.

É impossível pensar em um princípio ético plausível pelo qual elas poderiam justificá-la. Podemos, portanto, concluir que elas estão fazendo algo errado" (tradução nossa).

Nesse sentido, podemos constatar, por exemplo, que até a primeira metade do século XX,

[...] o planeta absorvia todas as atividades humanas e seus efeitos distribuíam- se em compartimentos dentro das nações. A energia, a agricultura, o comércio, o meio ambiente, a economia, os problemas sociais eram questões nacionais. A compartimentalização dessas atividades, nos últimos decênios, desapareceu progressivamente, dando lugar a problemas de alcance e interesses de todo o conjunto das nações (SIQUEIRA, 1998. p. 52).

A globalização do problema ecológico, elemento nunca antes visto na história humana, é patente e porta grande desafio em seu manejo. A poluição atmosférica é emblemática quanto a isso: “There can be no clearer illustration of the need for human beings to act globally than the issues raised by the impact of human activity on our atmosphere” 16 (SINGER, 2004, p. 14).

Já quanto ao aspecto econômico envolvido no assunto, sua lógica tem se demonstrado insuficiente e, até, por ter sua importância superestimada, extremamente prejudicial ao futuro da vida na Terra:

[...] a contabilidade econômica utilizada pelos países superestima o progresso técnico e desconsidera a degeneração ambiental, o que acaba incentivando políticas econômicas prejudiciais ao equilíbrio ecológico. O sistema de contabilidade biológica conhecido é bastante precário e sequer se tem ideia do número de espécies de plantas e animais que se extinguem a cada ano. A consequência natural de uma economia em expansão baseada em contabilidade tão distorcida é a de que pouco a pouco se esvai a vida do planeta (SIQUEIRA, 1998, p. 48).

Há, inclusive, quem negue, sob a lógica econômica, a realidade das mudanças climáticas. “Not everyone accepts that global warming is happening, and many people deny that climate change is down to us. About 47% of Americans, 37% of Chinese and 26% of Britons believe it is a conspiracy on the part of the green lobby to halt or reduce global development […]” 17 (TALBOT, 2012, p. 425).

Outros, até concordam que o aquecimento global está acontecendo, mas negam que somos responsáveis por ele. Existem líderes nacionais, por exemplo, que afirmam que a

16 "Não pode haver uma ilustração mais clara da necessidade de os seres humanos agirem globalmente do que as

questões levantadas pelo impacto da atividade humana na nossa atmosfera" (tradução nossa).

17 "Nem todo mundo aceita que o aquecimento global está acontecendo e muitas pessoas negam que a mudança

climática recaia sobre nós. Cerca de 47% dos americanos, 37% dos chineses e 26% dos britânicos acreditam que se trata de uma conspiração por parte do lobby verde para deter ou reduzir o desenvolvimento global [...]" (tradução nossa).

mudança climática é causada não pelo comportamento humano, mas por vários processos naturais exógenos e endógenos, como a flutuação da atividade solar (TALBOT, 2012, p. 426). No entanto, ainda que tais resistências insistam em perdurar, sobretudo por motivos socioeconômicos, a ciência já possui provas suficientes acerca de nossa responsabilidade sobre mudanças climáticas.

Um estudo recente realizado por cientistas de alto nível da Met Office Hadley Centre, das universidades de Edimburgo e Melbourne e da Vitoria University, no Canadá, concluiu que há apenas 5% de chance de que as variações naturais do clima sejam responsáveis pelas mudanças que estão causando o aquecimento global. Em 2007, o Intergovernmental Panel on

Climate Change (IPCC) avaliou mais de 100 trabalhos científicos recentes. Descobriu-se que a esmagadora maioria deles demonstrou clara evidência da influência humana sobre o clima (TALBOT, 2012, p. 426).

Além das já demonstradas influências econômicas, o elemento político também constitui uma grande dificuldade para o enfrentamento real do problema ambiental. Apesar de termos uma grave situação de dimensões globais, em termos políticos o planeta é quase totalmente dividido em estados nacionais soberanos, com líderes que trabalham para seus interesses.

There is no world political community, and as long as that situation prevails, we must have nation-states, and the leaders of those nation-states must give preference to the interests of their citizens. Otherwise, unless electors were suddenly to turn into altruists of a kind never before seen on a large scale, democracy could not function 18 (SINGER, 2004, p. 4).

Ora, por mais que na maioria dos países ocidentais defendamos sistemas políticos democráticos, parece claro que a democracia enfrenta embaraços ao lidar com a questão ambiental. A existência de estados nacionais soberanos e a prevalência de formas democráticas de governo infelizmente parecem configurar uma situação de impotência para tratar do problema, o que parece agravar ainda mais o drama que estamos por enfrentar. Exemplo disso pode ser sinalizado quando o assunto é a necessidade de redução de emissão de gases estufa:

It is, of course, not possible for industrialized nations like Germany and United States to make such dramatic reductions in the short term, or at least not without devastating economic consequences that would be likely, in a

18 “Não existe uma comunidade política mundial e, enquanto essa situação prevalecer, devemos ter estados-nação;

e os líderes desses estados-nação devem dar preferência aos interesses de seus cidadãos. De outro modo, a não ser que os eleitores se transformassem repentinamente em altruístas de uma espécie nunca antes vista em larga escala, a democracia não poderia funcionar” (tradução nossa).

democracy, to lead to a change of government and a reversal of the policy 19

(SINGER, 2011, p. 224).

Ora, diante de tamanho impasse na política internacional e da gravidade da situação ilustrada, como a Filosofia pode se pronunciar no sentido de contribuir para a elucidação do problema?