• Nenhum resultado encontrado

Direito Subjetivo versus Direito Objetivo e as novas concepções sobre as Teorias

2 O CRÉDITO COMO DIREITO FUNDAMENTAL: EM BUSCA DE UM

2.2 Crédito: Bem Jurídico Difuso e Interesses Metaindividuais

2.2.1 Direito Subjetivo versus Direito Objetivo e as novas concepções sobre as Teorias

À vista desta evolução contextual, não há que prevalecer, ou melhor, unicamente prevalecer os interesses individuais, em prejuízo aos coletivos. O sistema jurídico coeso indica que o interesse jurídico não se volta somente à satisfação dos interesses individuais de seu titular. Não. Deve atender as necessidades da coletividade.

Neste cotejo, a efetivação dos direitos fundamentais deve se dar na integralidade de suas esferas. Então, inicialmente, faz-se imperioso ressaltar a dessemelhança conceitual de direito objetivo e o direito subjetivo.

Os adeptos da corrente jusnaturalista, abonada até mesmo por sua concepção natural do homem, posicionam-se no sentido de que o direito subjetivo antecede ao direito objetivo, sendo imune ao ordenamento jurídico positivo; entendem que a norma de direito objetivo tem por fim blindar os direitos subjetivos pela repressão. E não poderia ser diferente: segundo os jusnaturalistas, para quem os fundamentos do direito suplantam o ordenamento estatal, em verdade, seu substrato é o ideário de justiça, a ser atendido como ato contínuo à consonância do direito positivo ao direito natural.71

Em contraponto, os juspositivistas defendem que os direitos subjetivos são gerados, criados, pelo direito objetivo. Até porque, para a concepção juspositivista (ou positivismo jurídico), somente existe o direito posto estabelecido pelo Estado: o direito positivo. De forma que, somente o proposto no ordenamento jurídico estatal é direito e, por conseguinte, a idealização do justo vincula-se ao preceito jurídico. Trata-se de uma visão monista do direito, enquanto o jusnaturalismo é, pois, dualista.

Após lutas sociais, na contemporaneidade, marcada pela Revolução Francesa e o paradigma da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, passou-se a positivar os ideais do direito natural - em destaque, os anseios de igualdade e liberdade -, desencadeando nesta senda, a consagração dos direitos fundamentais. Diante desta constatação, firme-se que,

71 Para Roberto Lyra Filho:“Vimos que as duas palavras-chaves, definidoras do positivismo e do

iurisnaturalismo, são, para o primeiro, ordem, e, para o segundo, Justiça. Isto se esclarece bem nas duas proposições latinas que simbolizam o dilema ( aparentemente insolúvel) entre ambas as posições: iustum quia iussum ( justo, porque ordenado), que define o positivismo, enquanto este não vê maneira de inserir, na sua teoria do Direito, a crítica à injustiça das normas, limitando-se ou a proclamar que estas contêm toda justiça possível ou dizer que o problema da injustiça ¨não é jurídico`; e iussum quia iustum (ordenado porque justo), que representa o iurisnaturalismo, para o qual as normas devem obediência a algum padrão superior, sob pena de não serem corretamente jurídicas. Este padrão tende, por sua vez, a apresentar-se, já dissemos, como fixo, inalterável e superior a toda legislação, mesmo quando se fala num `direito natural de conteúdo variável”. LYRA FILHO, Roberto. O que é direito. São Paulo: Brasiliense, 2009. p. 28-29.

inicialmente, os direitos naturais foram declarados e, a posteriori, positivados, com nítida passagem de direito natural a direito estatal.

O direito objetivo de Léon Duguit deriva da coletividade. O notável filósofo pregou a tríade tipologia das normas sociais: as econômicas, as morais e as jurídicas. Maria Helena Diniz demonstra que, para o mestre francês, somente se facultaria a variação das normas econômicas e morais em normas jurídicas quando “[...] exigida pelos valores em apreço na consciência coletiva, que são os sentimentos coletivos de solidariedade social, fundada na divisão do trabalho, e de justiça ou autonomia recíproca das vontades individuais, das quais nenhuma é considerada superior às outras”.72

Outrossim, Diniz, ao mencionar Goffredo Telles Jr. esclarece que “o direito subjetivo é a permissão, dada por meio da norma jurídica válida, para fazer ou não fazer alguma coisa, para ter ou não ter algo, [...]¨. Acrescenta, ainda, também corresponder à autorização para exigir “por meio dos órgãos competentes do poder público ou através dos processos legais, em caso de prejuízo causado por violação da norma, o cumprimento da norma infringida ou a reparação do mal sofrido.”73 E, conclui a autora as duas espécies de direito subjetivo: o

comum da existência e o de defender direitos.

A espécie de direito subjetivo, nominada pela autora de “o comum da existência”, corresponde à “permissão de fazer ou não fazer, de ter ou não ter alguma coisa, sem violação de preceito normativo, p.ex. o direito de ter um nome, de domicílio [...]”.74

Por sua vez, a característica “de defender direitos ou de proteger o direito comum da existência” dos direitos subjetivos, é colocada por Diniz, com referência ao pensamento de Goffredo Telles Jr., como “a autorização de assegurar o uso do direito subjetivo, de modo que o lesado pela violação da norma está autorizado, por ela, a resistir contra a ilegalidade, a fazer cessar o ato ilícito, [...]”. Ainda, adiciona o caráter permissivo “a reclamar reparação pelo dano e a processar criminosos, impondo-lhes pena. Essas autorizações são permissões concedidas pela coletividade, por meio de normas de garantia, que são as normas jurídicas”.75

Pois bem. Irrefutável a importância ao estudo do direito subjetivo, em sentido amplo, tido como direito do sujeito, ou mesmo facultas agendi76, conforme elucidado por Diniz, ao

72 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 104-105. 73 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 2012, p. 246.

74 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 2012, p. 247. 75 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 2012, p. 248.

76 Para Maria Helena Diniz é comum “dizer-se que o direito subjetivo é facultas agendi”. Contudo, a autora faz

a ressalva de que, se assim compreendido, as “faculdades humanas não são direitos, e sim qualidades próprias do ser humano que independem de norma jurídica para sua existência.” DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 2012, p. 248.

flamejar a precedência da faculdade humana ao direito subjetivo. Esclarece a autora que, assim entendido, o direito subjetivo como faculdade humana, por conseguinte, é decifrada a alçada da norma de preceituar referidas facultas agendi, e, em um de seus exemplos, usa como referência a propriedade ao estabelecer que, qualquer indivíduo pode ser proprietário e, por isso, salienta que, contudo esta faculdade não é o direito de propriedade, de modo que, o direito subjetivo, neste aspecto, corresponde à “permissão para o uso das faculdades humanas”.77 Nesta senda, entendido o direito objetivo como a norma agendi e o direito

subjetivo como facultas agendi, conclui-se que o segundo corresponde à faculdade de seu titular em aplicá-lo ou não como guarida dos interesses e bem jurídicos assegurados pela norma agendi.

Entretanto, a contrario sensu, revela-se esta percepção do direito subjetivo aos entendimentos traçados pelas três teorias carreadas pela doutrina tradicional, que aludem à essência do direito subjetivo: as teorias da vontade, do interesse, e mista. Isto porque, apesar da importância de estudo destas correntes de pensamento, com efeito, atualmente, encontra-se superada a contenda de axiomas entre os partidários da teoria da vontade e os da teoria do interesse, no que condiz à definição de direito subjetivo, até porque, apropriadamente lembra Roberto Senise Lisboa, o incapaz, absoluta ou relativamente, pode ser titular de direitos subjetivos, apesar da carência de discernimento e, ainda, como titular de interesses, será representado ou assistido por pessoas legitimadas.78

Dito isso, pode-se concluir que o direito subjetivo deu nova dimensão ao direito objetivo, transcendendo a facultatividade, nesta esteira, de modo a atingir uma percepção de um direito objetivamente subjetivo, com vistas a um sistema jurídico que se volta para um subjetivismo existencial (por exemplo, o direito de personalidade o qual assumiu contornos de ordem pública), e um subjetivismo patrimonial voltado ao direito econômico, com majoração da alteridade, no sentido de que a norma de direito implica intersubjetividade, ou, mais, com destaque à relação entre duas ou mais pessoas.

Por fim, com vistas a uma harmonia conceitual, lembra Roberto Senise Lisboa: “interesse e vontade são noções que não se contrapõem, necessariamente, como se pode observar, procedendo-se ao estudo, com a devida atenção das obras que visam estabelecer as balizas do direito subjetivo.¨ E acrescenta, ¨[...] assim, Windescheid e Jhering buscam, na

77 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 2012, p. 248.

78 LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e coletivos: a função social do contrato. São Paulo: Saraiva,

realidade, não tornar os vocábulos interesse, poder e vontade antagônicos, mas apenas elegem um ou outro como elemento essencial nuclear do conceito de direito subjetivo”.79