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O Estado violou os direitos às garantias judiciais e à proteção judicial (arts 8 e 25 c/c 1.1 da CADH) em prejuízo das comunidades Chupanky e La Loma

1. DOS FATOS

3.6. O Estado violou os direitos às garantias judiciais e à proteção judicial (arts 8 e 25 c/c 1.1 da CADH) em prejuízo das comunidades Chupanky e La Loma

Em dezembro de 2008, ambas as comunidades denunciaram: a discriminação contra a mulher no processo de consulta, o trabalho forçado, e os danos ambientais e sociais que não foram contemplados pelo Estado no EISA. Realizaram esta denúncia perante a CED e o MARN, órgãos do governo, que nada fizeram. Desta forma, o Estado: i) desde 2008, tem conhecimento destas violações e manteve-se inerte; ii) decidiu de forma arbitrária e imotivada; e iii) considerou inapropriado remeter denúncias às autoridades competentes. Ao receber às denúncias, o Estado tem o dever de atuar com a devida diligência para evitar que violações de direitos humanos, como o trabalho forçado e a discriminação, continuem acontecendo, e de prevenir a ocorrência de danos ambientais, frente ao seu risco real e imediato.107 Ao não remeter as denúncias às autoridades competentes, o Estado não garantiu a devida proteção de direitos a grupos especialmente vulneráveis,108 não cumprindo o dever de prevenir, investigar, sancionar e reparar violações de direitos humanos.109 O Estado, ao dizer que se as denúncias fossem apropriadas seriam remetidas às autoridades, decidiu de forma arbitrária e não motivada, em desacordo com o devido processo,110 protegido pelo art. 8 da CADH.111

107

CORTE IDH. González y otras (“Campo Algodonero”) vs. México. Op.Cit. par. 283.

O devido processo legal deve ser respeitado em qualquer procedimento cuja

108

CORTE IDH. Comunidad Indígena Yakye Axa vs. Paraguay. Op.Cit. par. 63; CIDH. Yanomami, par. 8; Informe La situación de derechos humanos de los pueblos indígenas en las Américas, págs. 21-25; Informe

sobre la Situación de Derechos Humanos en Ecuador, 1997, Capítulo IX. 109

CORTE IDH. Velásquez Rodríguez vs.. Honduras. Op.Cit. par. 174; Anzualdo Castro vs. Perú. Sentença de 22 de abril de 2009, par. 62; González y otras (“Campo Algodonero”) vs. México. Op.Cit. par. 236.

110

CORTE IDH. “Cinco Pensionistas” vs. Perú. Sentença de 28 de fevereiro de 2003, par. 126; Tribunal

Constitucional. Op.Cit. par. 89; Godínez Cruz. Sentença de 20 de janeiro de 1989, par. 174; Velásquez Rodríguez. Op.Cit. par. 165; Baena Ricardo vs. Panamá. Op.Cit. par. 126.

111

decisão possa afetar os direitos de pessoas, enquadrando-se, portanto, nesta decisão do Estado.112 Os membros das comunidades não tiveram assegurado o direito de obter todas as garantias que permitam alcançar decisões justas e não arbitrárias, contrariando o entendimento da Corte IDH nesse sentido.113

Por fim, ao considerar não ser apropriado remeter as denúncias às autoridades competentes, o Estado descumpriu sua obrigação de tomar todo tipo de providência para que nada seja subtraído da proteção judicial e do exercício do direito a um recurso adequado e eficaz.

114

Assim, o Estado não outorgou uma proteção efetiva aos povos tradicionais que levasse em consideração a sua especial vulnerabilidade.115 A inexistência de recursos internos efetivos deixou as comunidades em estado de desproteção que justifica a proteção internacional.116 Especificamente em relação à comunidade Chupanky, o Estado violou os arts. 8 e 25, pois: i) o recurso administrativo interposto pela comunidade em janeiro de 2009 não foi analisado segundo o juízo de convencionalidade que deve ser aplicado ex officio, estando em desacordo com o devido processo legal; ii) o caso foi submetido em abril de 2009 ao Tribunal Contencioso Administrativo que também não realizou efetivamente o controle de convencionalidade.

112

CORTE IDH. Yakye Axa v. Paraguai. Op.Cit. par. 62; Baena Ricardo vs. Panamá. Sentença de 2 de fevereiro de 2001, par. 127; Caso del Tribunal Constitucional, supra nota 8, párr. 69; OC-9/87 de 6 de outubro de 1987, par. 27.

O Estado, ao ratificar os principais tratados de direitos humanos, vincula o poder judiciário, como parte de sua estrutura, à realização do controle de convencionalidade ex officio, o que estabelece requisitos necessários para o devido processo interno. Assim, as irregularidades no processo de consulta e execução apontadas pela comunidade no recurso administrativo e no

113

CORTE IDH. Baena Ricardo vs. Panamá. Op.Cit. par. 127.

114

CORTE IDH. Barrios Altos vs. Perú. Sentença de 14 de março de 2001, par. 43; CIDH. Martín Pelicó Coxic

v.s Guatemala. Decisão de 15 de outubro de 2007, par. 145. 115

CORTE IDH. Comunidad Indígena Yakye Axa vs. Paraguay. Sentença de 17 de junho de 2005, par. 63;

Comunidad Indígena Sawhoyamaxa vs. Paraguay. Sentença de 29 de março de 2006, par. 83; Pueblo Saramaka. vs. Suriname. Sentença de 28 de novembro de 2007, par. 178; Tiu Tojín vs. Guatemala. Sentença de

Tribunal Contencioso Administrativo deveriam passar pelo controle de convencionalidade, ou seja, serem analisadas conforme os tratados e jurisprudência interamericana.117 Todavia, quanto ao recurso administrativo, o Estado ignorou as irregularidades apontadas, sem realizar a devida investigação e proteção de direitos, tornando o recurso inadequado na reparação das violações, por não ter assegurado a proteção jurídica que buscavam os peticionários dentro da jurisdição interna.118 Quanto à decisão do Tribunal Administrativo, o Estado tampouco realizou o controle de convencionalidade, mas sim uma análise descontextualizada de casos internacionais. A saber, ao considerar que a consulta cumpriu com as condições estabelecidas na norma, citando o caso Saramaka vs. Suriname como fundamento, ignorou que neste mesmo caso, a Corte IDH expressa que os membros da comunidade devem ter conhecimento dos possíveis riscos, inclusive ambientais, antes de aceitarem o plano de desenvolvimento proposto.119 Assim, através da utilização descontextualizada deste precedente, o Estado, não realizou o controle de convencionalidade efetivo, não respeitou o devido processo e não garantiu um recurso eficaz e adequado, violando os arts. 8 e 25 c/c 1.1 da CADH em prejuízo da comunidade Chupanky.

Considerando presentes os requisitos do art. 63.2 da CADH e do art. 27 do Regulamento dessa Corte, deve-se adotar medidas provisórias para a proteção de ambas comunidades, uma vez que: i) o caso é de extrema gravidade e urgência; e ii) há danos irreparáveis a serem evitados.

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