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Diretrizes Básicas Municipais Para o Ensino De Língua

CAPÍTULO 1 – AS ORIENTAÇÕES OFICIAIS PARA O ENSINO DE LÍNGUA

1.1 Orientações oficiais para o ensino de Língua Portuguesa

1.1.1 Diretrizes Básicas Municipais Para o Ensino De Língua

O ensino de Língua Portuguesa no município de Uberlândia/MG é parametrizado por documentos que oferecem uma proposta curricular para as modalidades de Fundamental I e II. A elaboração dessa proposta teve início em 1997, sendo concluída em 2003. Partindo da concepção de linguagem como um processo de interação para a produção de sentidos entre interlocutores, as diretrizes adotam a categorização de Halliday, McInttosh e Strevens (1974, p. 257–287) que organizam o ensino de línguas em três tipos: o prescritivo, o descritivo e o produtivo, sendo os dois últimos considerados, pelos profissionais que elaboraram o documento, os mais adequados para

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Conforme Rojo (2005), há algumas diferenças entre os gêneros discursivos e os gêneros textuais que são originárias de releituras diferenciadas da teoria bakhtiniana. A teoria dos gêneros do discurso tem como cerne os estudos realizados sobre os aspectos sócio- históricos e as situações de produção dos enunciados ou textos. Para o trabalho de descrição do gênero, essa vertente usualmente tende a selecionar os “aspectos da materialidade linguística determinados pelos parâmetros da situação de enunciação – sem a pretensão de esgotar a descrição dos aspectos linguísticos ou textuais, mas apenas ressaltando as ‘marcas linguísticas’ que decorrem de/produzem significações e temas relevantes no discurso” (ROJO, 2005, p. 185-6). Os principais autores de referência dessa vertente são: Bakhtin, Holquist, Silvestre e Blank, Brait, Faraco, Tezza, Castro, dentre outros. Já a teoria dos gêneros de texto centra-se na descrição da materialidade linguística nos textos. No trabalho de descrição dos gêneros, essa vertente tem a tendência a recorrer a um “plano descritivo intermediário – equivalente à estrutura ou forma composicional – que trabalha com noções herdadas da linguística textual (tipos, protótipos, sequências típicas etc.) e que integrariam a composição dos textos do gênero” (ROJO, 2005, p. 185-6). Os autores de referência dessa vertente são: Bronckart e Adam.

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Encontra-se anexado a esse trabalho o Índice desse documento para uma melhor visualização de todos os aspectos ali abordados.

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nortearem o trabalho em sala de aula. Por outro lado, embora as diretrizes preconizem o ensino com maior ênfase na proposta produtiva e descritiva, é bastante comum encontrar professores que centram o seu trabalho no ensino prescritivo.

Os conteúdos disciplinares selecionados para o trabalho em sala de aula são: produção de texto, leitura, leitura e produção de texto, léxico, vocabulário e gramática.

Chama a atenção a vinculação da proposta curricular à perspectiva funcionalista de ensino de língua, para a qual o fenômeno linguístico é, quase sempre, entendido como produto e processo da interação humana. O cerne do trabalho em sala de aula são as funções e noções de linguagem e de contexto, com atividades que priorizam a forma e a função da linguagem. Além disso, na visão funcional a linguagem é utilizada para a expressão de sentidos e instrumento para a comunicação e, em uma perspectiva semântica, há uma grande preocupação com a morfologia e com a fonologia. Por outro lado, o documento, e, por conseguinte, o trabalho com o aluno em sala de aula, não discutem nem apontam diretrizes para o ensino na perspectiva dos gêneros discursivos, limitando-se a discorrer sobre a noção teórica de textos.

No âmbito da produção textual, o documento discute, dentre outros assuntos, aspectos como: a produção das modalidades oral e escrita (embora se restrinja a apresentar sugestões apenas para o ensino da modalidade escrita); a busca por processos de interação social por meio da produção escrita; a importância da leitura para essa produção, dentre outros. Em relação à leitura, a partir de uma “atitude produtiva de leitura”, a proposta é que essa seja vista como “um instrumento de transformação social, meio de transformar a realidade e práticas sociais” (UBERLÂNDIA, 1997, p.21).

Partindo, então, dessa reflexão, os textos mais adequados e indicados para serem lidos pelos alunos, a partir de uma classificação tipológica proposta por Travaglia (1991, p. 89) são: descrição, dissertação, narração, injunção; texto argumentativo stricto sensu e não-argumentativo (discurso de transformação e

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discurso da cumplicidade); texto preditivo e não preditivo. Na proposta percebe- se a tendência ao trabalho com a noção de tipos textuais em detrimento ao trabalho com a noção dos gêneros discursivos.

Propus, assim, a leitura de “textos variados”, que são organizados e classificados em: textos reveladores da função social da leitura (cartazes, bilhetes, avisos, recados, receitas, bulas, nomes de estabelecimentos de ensino, comerciais, repartições etc.); textos informativos; textos formativos; textos literários (contos de fadas, contos modernos, fábulas, teatro, texto poético, historias em quadrinhos, textos de jornal e propaganda). Essa proposta organizacional para os estudos e a recepção do texto está, como dito anteriormente, fundada na perspectiva funcional em que os enunciados e os textos estão relacionados à função social que desempenham em um processo de comunicação. Nessa perspectiva, o estudo está centrado no texto e não no sujeito sócio-histórico que os produz.

A proposta para o trabalho, concomitante com a leitura e a produção textuais, chama a atenção do professor para, em primeiro lugar, dar relevo à macroestrutura e à superestrutura textuais; em segundo lugar, ao estudo e à compreensão dos fatores de coerência (conforme KOCH, 1995, p. 59-81) e, por fim, à leitura e produção de diferentes tipos textuais. Ao propor, então, o trabalho conjunto da recepção com a produção de texto, observei novamente a vinculação da proposta a uma perspectiva funcionalista com base no trabalho com o texto e não a uma perspectiva discursivo-enunciativa.

Os trabalhos pedagógicos com a leitura e a produção de textos das Diretrizes convergem para as propostas teórico-metodológicas da década de 1980 – cujas contribuições passaram a vigorar após a chamada virada comunicativa e pragmática da década de 1970 – e apontam estratégias cognitivas e metacognitivas de processamento do texto escrito, responsáveis pela compreensão da atividade de leitura, continuando vinculada a uma abordagem textual para as atividades de produção e recepção de textos.

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Quanto ao trabalho com o léxico e com o vocabulário, fica evidenciada a preocupação com essa abordagem. Essa proposta vai ao encontro das pesquisas mais recentes que discutem o fato de esses estudos ficarem relegados a segundo plano em sala de aula, ganhando apenas um “espaço diminuto, quase uma concessão” (ANTUNES, 2012, p. 21). Conforme Antunes (2012, p.20-21), a realidade na maioria das aulas de Língua Portuguesa é que

o estudo do léxico fica reduzido a um capítulo [na maioria dos livros didáticos] em que são abordados os processos de ‘formação de palavras’, com a especificação de cada um desses processos, acrescida de exemplos e de exercícios finais de análises de palavras.

A proposta é que o trabalho em sala de aula considere a teoria de ensino produtivo de Halliday, tendo como pilar estruturante o “universo vocabular do aluno” (UBERLÂNDIA, 1997, p. 34). O argumento, ainda, é que se parta de uma concepção de léxico como um conjunto de itens lexicais que a língua possui e o vocabulário como “o lexema em prática num determinado ato de comunicação” (UBERLÂNDIA, 1997, p. 33).

Em relação ao estudo da gramática, esse também deve ser visto a partir de uma perspectiva de ensino produtivo, que proporcione uma oportunidade de “aprender novas habilidades linguísticas, ampliando seu universo de uso de maneira mais eficiente” (p. 37), não se restringindo o trabalho ao ensino da norma culta, mas considerando-a como uma variedade dentre outras.

Tendo descrito as diretrizes municipais em linhas gerais, é importante ressaltar que esse documento – que teve os seus trabalhos de discussão e escrita iniciados em 1993, passando, em seguida, por um momento de estagnação até 2000, e, finalmente, um processo de revitalização em 2001, que se estendeu até 2003, ano de sua conclusão – não oferece subsídios para refletirmos sobre as demandas e necessidades da contemporaneidade que apresenta, cada vez mais, textos multimodais, multissemióticos e híbridos. Essa realidade requer que o professor promova em seus alunos letramentos múltiplos, a fim de prepará-los para a interação com produções textuais caracterizadas pelas diversidades que as constituem.

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As Diretrizes também não enfocam questões mais recentes sobre texto, como, por exemplo, a teoria de gêneros, que já fora incorporada aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Essa questão adquire maior visibilidade quando analisamos as datas de publicação dos dois documentos, Os Parâmetros Curriculares Nacionais e a Diretrizes Básicas do Ensino de Língua Portuguesa 1ª a 8ª séries. Sendo os PCNs publicados em 1997 e as Diretrizes finalizadas em 2003, o caminho mais provável a ser seguido seria aquele apontado pelos PCNs, que já traziam em seu bojo as discussões acerca do ensino permeado pelo estudo dos gêneros discursivos e pela sua circulação e valoração sociais. Outra lacuna que posso apontar em relação às Diretrizes de Ensino do município é a ausência de referência ao uso das novas tecnologias em práticas de ensino. Isso gera um descompasso tanto ao se considerar as necessidades da sociedade contemporânea, no que diz respeito ao uso dessas tecnologias, quanto a necessidade dos alunos-adolescentes que fazem parte da escola contemporânea.

Explicitando melhor essa questão, existem alguns aspectos em que as Diretrizes de Língua Portuguesa do município divergem e outros em que elas convergem em relação ao que trazem os PCNs. Um dos aspectos convergentes está relacionado à discussão sobre a relevância de se estudar as variedades da língua, debatendo sobre os valores sociais atrelados a elas. Outros aspectos divergentes, que interessam mais diretamente à nossa investigação, são, como mencionado, a ênfase dada pelos PCNs aos estudos enunciativo-discursivos sobre os gêneros, a decorrente revisão discursiva da perspectiva cognitiva sobre leitura e produção de textos e ao uso da tecnologia nas aulas de língua materna – último aspecto este que, especificamente, atenderia às necessidades dos alunos inseridos em uma sociedade tecnológica contemporânea.

1.1.2 Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, do Ensino