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Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, do

CAPÍTULO 1 – AS ORIENTAÇÕES OFICIAIS PARA O ENSINO DE LÍNGUA

1.1 Orientações oficiais para o ensino de Língua Portuguesa

1.1.2 Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, do

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Conforme os PCNLP, atualmente há demandas sociais recorrentes, propiciadas por textos, jogos, conversas com amigos, sites de relacionamento, em ambientes virtuais ou fora deles, que requerem práticas letradas de leitura e escrita. Para atender a essas demandas, há a necessidade de uma “revisão substantiva dos métodos de ensino e a constituição de práticas que possibilitem ao aluno ampliar sua competência discursiva na interlocução” (BRASIL, 1998, p. 23). Para que essas questões sejam contempladas, ainda segundo esse documento, faz-se necessário trazer para o ensino

a diversidade de textos e gêneros, e não apenas em função de sua relevância social, mas também pelo fato de que textos pertencentes a diferentes gêneros são organizados de diferentes formas. A compreensão oral e escrita, bem como a produção oral e escrita de textos pertencentes a diversos gêneros, supõem o desenvolvimento de diversas capacidades que devem ser enfocadas nas situações de ensino. (BRASIL, 1998, p. 23-24, ênfase adicionada)

Ou seja, para os PCNLP, os gêneros discursivos devem tornar-se objetos de ensino nas aulas de Língua Portuguesa, preparando os alunos para interagirem com a variedade textual de forma ativa e produtiva. A proposta é que os conteúdos programáticos sejam organizados em torno de atividades de “práticas de escuta de textos orais e de leitura de textos escritos e produção de textos orais e escritos” (BRASIL, 1998, p. 53). Para a atividade de “escuta e leitura de textos” são sugeridos gêneros de algumas esferas da atividade humana como “da literária, de imprensa, de divulgação científica, de publicidade” (BRASIL, 1998, p. 54) e para a atividade de “prática de produção de textos orais e escritos” são sugeridos gêneros em torno das mesmas esferas, porém, com a supressão da esfera da publicidade.

Em detrimento dos problemas que possam figurar nesses documentos, a sua proposta parece ser um avanço quando sinaliza que o ensino da língua materna deve se desenvolver em torno dos gêneros em perspectiva enunciativa, discutindo o fato de que

todo texto se organiza dentro de determinado gênero em função das intenções comunicativas, como parte das condições de produção dos discursos, as quais geram usos sociais que

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os determinam. Os gêneros são, portanto, determinados historicamente, constituindo formas relativamente estáveis de enunciados, disponíveis na cultura (BRASIL, 1998, p. 21).

Ou seja, se os gêneros são constituídos por enunciados relativamente estáveis, fazem parte das práticas sociais de cada sujeito em seus momentos de interação com os seus interlocutores, seja por meio da modalidade escrita, seja por meio da modalidade falada da língua. Fato esse que favorece o desenvolvimento de letramentos, pois coaduna-se com a visão de letramentos como práticas sociais de criação e de significação.

É possível perceber outros conflitos teóricos entre os dois documentos oficiais. Enquanto os PCNLP defendem o ensino de gêneros, as Diretrizes Municipais, quando se trata do trabalho com a produção de textos, centram sua proposta em torno de tipologias textuais, tais como: descritivos, dissertativos, narrativos e injuntivos. Quando discorre sobre as atividades a serem realizadas com a leitura, o documento do município parte também da proposta tipológica de Travaglia (1991, p. 89) que, segundo o autor, possibilita que cada tipo de texto se caracterize como “um modo ou forma de ação, de interação, um tipo de interlocução”, sendo assim organizados: 1. descrição, dissertação, narração, injunção; 2. texto argumentativo stricto sensu e não-argumentativo; (discurso de transformação e discurso da cumplicidade) e 3. texto preditivo e não preditivo.

A meu ver, a diferença fundamental entre essas duas abordagens – PCNLP e Diretrizes Básicas Municipais – é que, enquanto naquela há uma proposta de reflexão sobre a recepção e produção de cada gênero estudado, nesta, o trabalho pode ser desenvolvido com o estudo de vários tipos textuais ao mesmo tempo, sem o aprofundamento de um especificamente. Além disso, o foco textual é sobre a normalização da forma textual (macro e superestruturas) e não sobre o uso e produção de significação. Embora seja descritivo e não prescritivo, ainda assim, o ensino de língua continua em uma perspectiva normatizadora e não favorece o desenvolvimento de práticas letradas. Um dos problemas dessa didática é que o aluno pode acabar por não se tornar

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proficiente na leitura e na produção do(s) gênero(s) estudado(s), pois não reflete, analisa e produz o seu objeto de aprendizagem, podendo, em uma unidade estudada, ser exposto a diversos gêneros sem, contudo, realmente aprender sobre um em especial.

Por isso, decidi eleger um único gênero para o trabalho a ser desenvolvido com os alunos, a autobiografia. Com essa escolha, pretendia aprofundar as reflexões e propor atividades que instrumentalizassem os alunos para se tornarem leitores e escritores do gênero estudado.

Em relação à utilização da tecnologia em sala de aula, os PCNLP esclarecem que não se trata de tomar as novas tecnologias da informação

como eventuais recursos didáticos para o trabalho pedagógico, mas de considerar as práticas sociais nas quais estejam inseridos para: conhecer a linguagem videotecnológica própria desse meio; analisar criticamente os conteúdos das mensagens, identificando valores e conotações que veiculam; fortalecer a capacidade crítica dos receptores, avaliando as mensagens e produzir mensagens próprias, interagindo com os meios. (BRASIL, 1998, p. 89, ênfase adicionada)

Nesse sentido, o uso da tecnologia tornar-se-ia significativo para os alunos não somente fora da escola, mas também no interior dela e nas salas de aula. Ao utilizar um ambiente virtual de aprendizagem, os alunos poderiam “conhecer a linguagem vídeotecnológica própria desse meio”, conforme preconizam os PCNLP (BRASIL, 1998, p. 89). Ou seja, na perspectiva dos multiletramentos e da multimodalidade.

Esses documentos trazem, ainda, algumas sugestões para se trabalhar mídias como o rádio, a televisão e o vídeo. Por outro lado, certamente devido à rapidez com que as mudanças ocorrem quando se trata de tecnologia, e por serem parâmetros e não diretrizes para o ensino, os PCNLP não apresentam discussões acerca de trabalhos com a língua materna que poderiam ser realizados utilizando: sites de relacionamento12, jogos online, plataformas

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Como Orkut, Facebook, Twitter, Tumbler, Pinterest, LinkedIn, Instagram, WordPress, Foursquare, dentre outros.

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interativas de ensino, blogs, webquests, podcasts, dentre outros, ficando a cargo do professor descobrir caminhos para a efetivação do trabalho com a tecnologia em sala de aula.

Se, por um lado, os PCNLP13 não trazem uma reflexão mais detalhada sobre o uso das tecnologias da informação e da comunicação nas aulas de Língua Portuguesa, por outro, nas Diretrizes Básicas Municipais, essa temática não é sequer abordada. Tenho observado em minha prática que essa lacuna no documento dificulta implementações práticas na sala de aula e nos laboratórios de informática, pois diretrizes gerais não são suficientes para orientar a construção de atividades que mudem a prática docente para novas direções. Muitas vezes, essas lacunas são usadas como justificativas pelos professores que têm dificuldade de promover mudanças em sua prática e, por isso, mantêm posturas tradicionais de ensino. Além disso, tais lacunas ainda tornam-se um argumento para o profissional se apoiar, caso seja questionado sobre o uso (ou a ausência dele) que faz dos laboratórios existentes nas escolas.

Refletindo mais detalhadamente sobre a proposta dos PCNLP, é possível perceber que de fato seria interessante um estudo que retomasse conceitos e sugestões básicas de modo a oferecer um suporte conceitual que facilitasse para o professor realizar, de forma autônoma, estudos futuros sobre essas questões teóricas. Conceitos abordados de forma geral e sintética nem sempre oferecem direções para a criação de atividades práticas ou mesmo para questionamentos teóricos mais aprofundados.

Essa breve revisão dos documentos oficiais foi motivada pela tentativa de entender como o ensino de gêneros pode promover mudança na natureza das práticas letradas (TICs, sociedade moderna, integração de linguagens) nas escolas. Assim, o que se propõe neste estudo não é um abandono do documento municipal que já existe e que, em certa medida, é um dos suportes teórico-metodológicos para a efetivação desta pesquisa, mas sim uma revisão

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Especialmente tendo em vista que, na época de escrita desse documento, ainda não eram tão amplamente divulgados os sites de relacionamento, as plataformas interativas, os jogos online, dentre outros, como ocorre nos dias atuais.

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das teorias e proposições didático-pedagógicas a serem utilizadas em sala de aula e um olhar diferente sobre as novas práticas sociais dos alunos, procurando incorporá-las ao cotidiano escolar.

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