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Os trechos de discursos nativos reproduzidos abaixo proporcionam uma compreensão mais clara sobre como esse processo de midiatização e alargamento do campo de ação do Banco

Palmas é significado. Aqui as opiniões se dividem entre diferentes interpretações, configurando

um conflito de idéias expresso nas posições assumidas por lideranças comunitárias locais. Por um

lado, ressalta-se a importância estratégica do recurso midiático na divulgação e legitimação da

experiência local no âmbito da comunidade e no contexto externo. Por outro lado, critica-se a

ênfase que é dada à esfera midiática e o conseqüente processo de expansão do campo de ação do

Banco Palmas para além do território local, configurando-se também uma visão analítica segundo

a qual a ASMOCONP estaria distanciando-se do conjunto das reivindicações sociais demandadas

pela realidade do bairro, ao centralizar suas atividades no eixo temático da economia solidária.

[...] desde o começo, assim, a gente sempre tentou aproveitar, né, muito bem o poder da mídia pra divulgar o que a gente tava fazendo aqui dentro. Por quê? Existe, na verdade, um senso comum de... e que... e que assim nos... nos incomoda, eu posso te dizer assim, eu acho que é... é generalizado, que é assim: a favela, ela sempre aparece nas páginas policiais ou nos programas policiais. Então, nós fazemos um esforço grande pra mostrar que não é só isso, que tem muita gente fazendo muita coisa muito boa, né? Então, é... é... é importante que a comunidade testemunhe isso, porque muitas vezes, de tanto se falar nos meios de comunicação de que o Palmeiras só... só tem problemas, o Palmeiras só tem violência, que as pessoas passam a não enxergar o que existe dentro da própria comunidade. Então nós fazemos um esforço grande pra que as pessoas percebam o que é que tem de bom aqui dentro, né? Por isso, esse trabalho todo com o Projeto de Arte-Educação, com essa coisa toda, tem nos ajudado muito, né, a... a falar disso de uma outra forma. E nós temos um programa de rádio, que é uma hora toda quinta feira, onde a gente tá... chama Banco Palmas Informa. Tem o jornal que tá saindo a cada mês, né? Mas aí a gente tá sempre procurando outras formas de mostrar pras pessoas isso. E nas solenidades, no... nos momentos onde a gente tá comemorando... Porque quando você vai inaugurar alguma coisa aqui dentro, isso foi resultado de muito trabalho, de muita luta, de ir atrás e conseguir. Então, é importante que a comunidade veja e reconheça isso, né, e incorpore e se aproprie disso, senão ele... não faz sentido. E é importante também a gente mostrar pra cidade que na periferia, né, existem outras coisas e que... e pra outras periferias de que é possível fazer as coisas diferentes, né, que nem tudo tá perdido, né, que nós

podemos mudar as coisas, que nós não temo que ficar só esperando pelo governo e reclamando que... que o posto de saúde não funciona, que... enfim, temos que continuar dizendo isso também. Mas nós podemo fazer muita coisa, com a nossa força, com a nossa organização, né? Eu acho que tem essa coisa de mostrar pra dentro, mostrar pra fora e mostrar pros iguais, pros nossos pares, pros nossos companheiros da... das outras associações, dos outros... né, dos outros bairros que é possível a gente fazer as coisas (Entrevista com Sandra Magalhães, Coordenadora de Projetos do Sistema ASMOCONP/Banco Palmas, gravada durante a pesquisa de campo, em 06/11/2007).

[...]. Eu defendo a Associação dos Moradores, também pelo trabalho da economia, mas critico por que fastou-se das reivindicações sociais. [...]. Então o Banco Palmas é visto lá fora como uma entidade que ajuda em todos os setores o Palmeiras. E ele não ajuda. Nós, por acauso, já chamamos o Banco Palmas quatro vez pra fazer parceria com a ABVV e nunca foi aceitado. A gente não queria... é... ter o porte que o Banco Palmas tem assim, no momento. Mas o Banco... o Banco Palma podia trabalhar numa parceria também pra ajudar a desenvolver as outras associações que têm um trabalho bom na comunidade. Nós temos trabalho com criança, com jovens, com adolescente e tudo e ele também podia fazer essa parceria. Nós a... gostamo e defende o Banco Palmas. Mas era pra ele fazer um trabalho muito melhor em parceria com as pessoas que apóia ele, com os movimentos que apóiam o Banco Palmas. [...]. Sempre alertamos com a questão da fantasia. E muita gente que vem de fora começa a observar: “Ai, por que que o Augusto falou na questão da fantasia?”. Porque a fantasia às vezes atrapalha bastante. Às vezes atrapalha. [...]. É a divulgação acima do limite. É... muitas vezes a pessoa vai atrás de você porque você aumentou a sua fantasia tão grande que o povo tá acreditando mais no projeto do que na... tá... tá acreditando mais na fantasia do que no projeto. Se expandiu através da fantasia, mas em termo de projeto não é tudo aquilo que a fantasia mostra. Então alguém vai em busca mais é da fantasia, por ali. A fantasia chama muito a atenção. E quando chega lá, a questão da prática é menos do que a fantasia, então... [...]. Eu sou a favor que o Banco Palmas apareça mais na comunidade do que internacionalmente. Eu sou a favor disso. [...] (Entrevista com o líder comunitário Augusto Barros Filho, gravada durante a pesquisa de campo, em 02/11/2007).

[...]. A memória, nós temos isso muito forte. A memória faz parte do sucesso, da luta. Quando cê perde a memória, cê perde a identidade, você se acaba. Então o nosso maior orgulho aqui é que nós éramos uma favela e nos urbanizamos, criamos um Banco e agora somos um bairro, né? E agora somo até bairro. Então quando cê perde sua memória desse passado, cê se enfraquece completamente no seu processo de luta. Então registrar tudo o que faz é muito importante pra registrar a memória. É... se eu penso na... na linha tecnológica, na nossa tecnologia, vamos chamar assim, a tecnologia do Banco Palmas, nós criamos tecnologias, é fundamental também registrar. Por dois motivos é fundamental registrar. Primeiro, pra poder ser difundido. Se eu não registro isso, não permito que outra pessoa possa replicar. Segundo, pra ser respeitado. A gente acha que o conhecimento é coletivo. O conhecimento não tem dono. O conhecimento é pra ser... não pode ser apropriado, né? Por que nunca o conhecimento é só... só seu. Quem criou esse pen drive, criou por que alguém um dia criou o plástico, o outro criou não sei o que, até que ele criou o pen drive. Então o conhecimento é pra ser socializado. Mas tem que ser reconhecido. Quando eu digo assim que o Banco Palmas criou uma tecnologia social e isso tá escrito... E não é pra poder ficar como proprietário. É pra ser disseminado. Mas tem que ser reconhecido. Eu não acho que nós somos donos. Senão vem um picareta por aí e diz que ele que fez e deforma a tecnologia. Temos que registrar, isso é importante, por dois motivos. Outra coisa é a mídia. Outro lado é... é a comunicação, explorar a mídia, jornal, rádio, televisão. Isso é fundamental também. Isso a gente aconselha que os movimentos façam isso. Nós tentamos fazer isso de forma... melhor possível. Por quê a mídia? Por que, primeiro, por que divulga, legitima, abre portas, é... dá credibilidade. A gente tem certeza que a... muitas coisas a gente consegue porque nós tamos na mídia. Os próprios editais hoje em dia, é... pedem isso, recorte de jornal, televisão e tal. Então a gente não pode dispensar

isso enquanto uma ferramenta de luta, enquanto uma ferramenta que abre porta. Tem toda uma ciência pra isso, né? Tem todo um cuidado, toda uma estratégia que a gente utiliza pra ter uma forte presença de mídia. Claro, eu digo sempre que mídia é muito bom e deve ter. Só não basta. Não basta ter mídia, porque você não fica. [...]. Ninguém fica na mídia por mais de dois, três anos sem ter nada pra mostrar. Porque aquilo se acaba, isso vai embora. Então nós tamos com dez anos na mídia. E mídia boa, mídia... boa que eu falo é assim, mídia grande, né, de grandes veículo de comunicação. Ninguém enrola a mídia durante dez anos. Então alguma coisa tá acontecendo. Pode ser até pouco, mas alguma coisa tá acontecendo. [...]. Esse jogo... o pessoal diz que o Palmeira mente na mídia. Não... não tem... não tem uma mentira lá dentro. Agora, nós capitalizamos, mostramos e reforçamos o lado bom da coisa, né, com muito mais proporção do que o lado ruim. Eu digo sempre que no Palmeira vai pra televisão por dois motivos. Ou vai pra mostrar desgraça ou vai ao Banco Palmas. É impressionante! E não é nem verdade que temos só nós de bom aqui. Tem trabalho belíssimo no Centro de Nutrição. A igreja faz trabalho interessante com as mulheres, as escolas têm horta, mas só se relaciona com a imprensa pra mostrar desgraça. Ou é o Banco Palmas ou é desgraça. Pode pegar a história da mídia nesse bairro, né. Porque as pessoas têm uma relação ruim com a... com a mídia e eu acho que tem que... é possível evoluir nesse sentido (Entrevista com Joaquim de Melo, Coordenador do Banco Palmas e Coordenador Geral do Instituto Banco Palmas, gravada durante a pesquisa de campo, em 05/11/2007).

Pelo que pude perceber durante a pesquisa de campo e considerando também os dois