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DISCUSSÃO Os animais de laboratório possuem um papel crucial nas descobertas científicas

e nos avanços tecnológicos, fornecendo informações relevantes para o mundo da Ciência e para a vida dos seres humanos e dos animais. Embora o estudo básico experimental em animais apresente algumas limitações quanto à sua aplicabilidade clínica, é ainda o melhor análogo para se estudar as condições encontradas em humanos (Stables et al, 2003).

Nesse contexto, torna-se de grande importância a adoção de modelos animais em experimentos, por exemplo, de restrição de sono, considerado um problema de saúde pública na sociedade atual (Sigurdson e Ayas, 2007; Alghanim et al, 2008; Tufik et al, 2009). Desta forma, torna-se relevante avaliar as consequências de diversos fatores que possam afetar o sono através do uso de modelos animais e sua validação, permitindo também a realização de avaliações bioquímicas, farmacológicas, neuronatômicas, comportamentais, entre outras associadas à supressão do sono. O uso de ratos no estudo de neuroendocrinologia comportamental também é bastante difundido. Isso se deve principalmente ao padrão de comportamento desses animais, incluindo o ato sexual, caracterizado por comportamentos estereotipados que são facilmente identificáveis e facilmente manipulados por hormônios. Existem inúmeros estudos que demonstram a influência dos fatores hormonais que determinam a expressão global da atividade copulatória, de modo que as alterações nas concentrações hormonais circulantes podem acarretar mudanças neste comportamento.

O sono inadequado é um problema presente na população como um todo. Diversos estudos mostraram que a diminuição do tempo de sono, assim como a ocorrência de alguns distúrbios, afeta mais as mulheres do que os homens (Hublin et

al, 2001; Ohayon e Lemoine, 2004; Bittencourt et al, 2009). Considerando que, se a falta de sono afeta principalmente as mulheres, inevitavelmente afetará o período gestacional, o presente projeto se propôs a avaliar as consequências da restrição crônica de sono durante a gravidez para o desenvolvimento da prole.

Nossos experimentos demonstraram que a falta de sono durante a gravidez pode prejudicar não só o comportamento sexual dos descendentes na vida adulta, mas também alguns parâmetros do desenvolvimento físico e sensório-motor. Neste último, critérios de avaliação do desenvolvimento físico do infante, como o tempo para abertura dos olhos e o tempo para ocorrência do desdobramento das orelhas, foram significativamente aumentados nos filhotes de mães que foram restritas de sono durante a gestação. Além disso, o reflexo de sobressalto auditivo, parâmetro de avaliação do desenvolvimento sensório-motor, também se mostrou significativamente prejudicado nos animais provenientes de mães RS.

A avaliação do comportamento sexual dos filhotes também apresentou diferenças significativas entre os grupos CTRL e RS. Nos descendentes machos de ratas restritas de sono durante a prenhez, houve significativa diminuição da motivação sexual, evidenciada pelo aumento na latência para primeira monta e diminuição na quantidade de montas feitas por esses animais durante o teste experimental. Esses resultados provavelmente ocorreram devido à significativa diminuição de progesterona que esses mesmos animais apresentaram.

É bem documentado que a função sexual é modulada por hormônios esteróides. A testosterona tem sido identificada como o principal hormônio responsável pelo desempenho sexual masculino (motivação e atração) (Sakuma 2008; Wu e Gore, 2009). Entretanto, estudos feitos por nosso grupo investigando o papel da progesterona no comportamento sexual de ratos machos, mostraram resultados surpreendentes. Sabe-se que a progesterona exerce um papel central na reprodução

feminina. No entanto, pouca atenção tem sido dirigida para o seu possível papel na função do CS masculino. Nosso grupo de pesquisa tem proposto que a progesterona pode ser um fator hormonal relevante para promover uma boa resposta sexual masculina (Andersen e Tufik, 2006; Alvarenga et al, 2010). Em ratos machos castrados, foi relatado que a suplementação de progesterona poderia iniciar um vasto conjunto de CS, mesmo na ausência de outros esteróides sexuais (Witt et al, 1995; Andersen et al, 2004). Em estudo feito por nosso grupo, o pré-tratamento com mifepristona, antagonista do receptor de progesterona, reduziu significativamente o percentual de ratos que apresentaram ereções (Andersen e Tufik, 2005). Assim, pode- se dizer que a progesterona também desempenha um papel no comportamento copulatório de ratos machos.

Em relação ao comportamento de cópula, nosso grupo também mostrou que a progesterona está envolvida nos mecanismos de ejaculação em ratos privados de sono, uma vez que os ratos que apresentaram frequência de ejaculação normal tinham maiores concentrações de progesterona (Alvarenga et al, 2009, 2010). Há indícios da necessidade de uma concentração ideal de progesterona para que os animais apresentem alta atividade copulatória. Desta forma, pode-se dizer que evidências têm apontado que o bom desempenho sexual é acompanhado por altos níveis de progesterona, podendo ser considerada um fator limitante para a promoção da motivação sexual em ratos machos.

Apesar da diminuição da motivação sexual dos descendentes machos de mães restritas de sono durante a gravidez, não houve diferenças significativas no desempenho sexual desse grupo quando comparado ao grupo CTRL. Isso se deve principalmente porque não houve redução significativa na concentração de testosterona nesse grupo.

A análise do comportamento sexual das fêmeas também apresentou resultados interessantes. De forma geral, não houve diferenças significativas na receptividade, proceptividade ou latência de lordose entre as descendentes dos grupos CTRL e RS. Entretanto, as fêmeas do grupo RS apresentaram uma exacerbação do comportamento sexual, caracterizada por diversas montas realizadas nos machos indiscriminadamente durante todos os testes. Essa inesperada exacerbação do comportamento sexual feminino possivelmente se deve ao aumento significativo da concentração de testosterona no grupo RS, hormônio que influencia diretamente a motivação sexual.

Além disso, a maioria das fêmeas do grupo RS, exceto durante a fase proestro do ciclo estral, apresentaram comportamentos agressivos durante o teste de comportamento sexual, tais como gritos e patadas quando o macho se aproximava.

Em resumo, o CS é dependente da ação combinada de vários fatores que integram uma complexa cascata de eventos que envolvem os hormônios gonadais. O presente estudo demonstrou que a restrição de sono durante a gestação pode ser prejudicial ao desenvolvimento da primeira geração de filhotes (F1), acarretando marcantes alterações hormonais em ambos os gêneros, diminuição da motivação sexual dos machos e exacerbação de comportamento sexual nas descendentes fêmeas, além de alterações no sistema sensório-motor tanto nos machos quanto nas fêmeas da geração F1.

CONCLUSÕES

O estudo dos efeitos da restrição de sono durante a gravidez no desenvolvimento dos filhotes demonstrou que:

– O desenvolvimento físico e reflexológico, de um modo geral, não foi significativamente prejudicado nos animais provenientes de mães restritas de sono durante a prenhez. No entanto, o tempo para abertura dos olhos e o tempo para o desdobramento das orelhas foi significativamente maior nos descendentes RS em ambos os gêneros. O reflexo de sobressalto auditivo, parâmetro importante para avaliação do desenvolvimento reflexológico no filhote, também foi prejudicado nos grupos provenientes de mães RS.

- A restrição de sono durante a prenhez foi capaz de prejudicar a motivação sexual dos descendentes machos e alterar significativamente as concentrações de progesterona e testosterona nos filhotes. Os machos apresentaram um aumento na latência para a primeira monta, juntamente com uma diminuição do número de montas durante a avaliação do comportamento sexual. Isso se deve principalmente à diminuição na concentração de progesterona, hormônio diretamente ligado à motivação sexual do comportamento masculino. O desempenho sexual nos machos não foi prejudicado, possivelmente pelo fato que as concentrações de testosterona em ambos os grupos (CTRL e RS) não apresentaram diferenças significativas. As fêmeas, ao contrário, apresentaram um aumento significativo de testosterona, refletido na exacerbação do comportamento sexual (montas) apresentado durantes os testes.

Com base nos resultados obtidos e nas condições experimentais do presente projeto, conclui-se que a restrição de sono durante a gravidez é um fator prejudicial ao

desenvolvimento dos filhotes, afetando principalmente o desenvolvimento reprodutivo. Durante a vida adulta reprodutiva, houve alterações marcantes nas concentrações dos hormônios gonadais (progesterona e testosterona), essenciais ao bom desempenho sexual masculino e feminino, além de prejuízos no próprio ato copulatório.

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