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De forma a analisar a analgesia adicional fornecida pela dexmedetomidina foram comparados dois grupos com CRI com um grupo apenas com dexmedetomidina IM. A CRI iniciou-se logo após a pré-anestesia e não houve dose de ataque. Após a cirurgia realizou-se a escala de recuperação, escala de dor da Universidade de Melbourn e escala de analgesia. Nas condições experimentais presentes neste trabalho foi sempre assegurada uma adequada analgesia, exigida do ponto de vista ético em todos os procedimentos.

A dexmedetomidina é um novo agonista alfa-2 adrenérgico, havendo atualmente um crescente interesse no seu uso em anestesiologia (Bagatini et al., 2002; Villela et al., 2003). O uso de dexmedetomidina em medicina veterinária, tem despertado o interesse de investigadores nacionais e internacionais (Neto 2009).

A dexmedetomidina reduz a resposta hemodinâmica à intubação e extubação, atenuando o stress causado pela resposta à cirurgia. É possível a continuação da sedação com dexmedetomidina antes e após o stress causado pelo período de extubação sem preocupações relativas a depressão respiratória e com estabilidade hemodinâmica garantida (Venn et al., 2000 citado por Campos, 2010).

A dexmedetomidina também produz sedação e relaxamento muscular bem mais pronunciados que outros agentes sedativos ou tranquilizantes utilizados na medicação pré- anestésica (Neto, 2009).

Murrel (2007), refere que uma diminuição da temperatura corporal terá que estar associada ao uso de fármacos anestésicos, que alteram os mecanismos de termorregulação, ao mesmo tempo que proporciona elevada perda de calor por vasodilatação periférica causada por alguns desses anestésicos. A hipotermia comum nos pacientes submetidos a sedação ou anestesia é provocada por recetores presentes no hipotálamo que são deprimidos pelos agentes alfa-2 agonistas (Pinto et al., 2008). Nos animais incluídos no nosso estudo, a temperatura foi mantida dentro de valores fisiológicos normais, durante os procedimentos cirúrgicos e recobro.

A acção da dexmedetomidina causa uma hiperpolarização neuronal que vai contribuir para uma diminuição da noradrenalina a nível do SNC e sedação. Atualmente o locus coeruleus foi caracterizado como a região responsável pelo efeito sedativo. As principais vias noradrenérgicas

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ascendentes e descendentes originam-se dessa área importante. Pela ativação dos receptores alfa2-adrenérgicos nessa área, ocorre a supressão da sua atividade, o que resulta num

importante aumento da atividade de interneurónios inibitórios, como os que fazem parte da via da ácido g-aminobutírico (GABA), o que determina depressão do SNC (Vender Maelen,1982; Bagatini,2002).

Em relação à pressão arterial e tónus vascular, sabe-se que tanto os recetores alfa-1 como os alfa-2 têm um papel importante na sua regulação (Piascik,1996, citado por Kuusela,2004).

Os alfa-2 agonistas têm várias vantagens, nomeadamente produzem uma boa sedação, analgesia e efeito poupador de outros fármacos. Em relação aos efeitos hemodinâmicos sabe-se que a dose que está associada a maior resistência vascular periférica é de 20μg/kg e sabe-se que as alterações hemodinâmicas são menores nas doses de 1 e 2μg/kg (Kuusela et al., 2000).

Quando são utilizadas doses inadequadas de dexmedetomidina, em animais que não sejam saudáveis, poderá ocorrer o risco de haver hipóxia do miocárdio, pelo que o melhor será o recurso a uma infusão venosa contínua deste fármaco (CRI), a qual parece não exercer efeito cumulativo a nível cardiovascular (Murrel et al., 2005). Quando a dexmedetomidina é usada em doses inapropriadas poderá não ser antagonizável pelo atipamezole. Ainda não foi determinada uma dose ótima para tanto uma boa estabilidade hemodinâmica como para uma perfusão tecidular adequada (Uilenreef J. et al., 2008).

Os resultados do nosso estudo mostram que uma CRI de dexmedetomidina, sem dose de ataque, para as condições utilizadas neste trabalho, é um complemento ao isoflurano, contribuindo para estabilizar os parâmetros hemodinâmicos em todas as cadelas. Isto notou-se com uma estabilização da FC, da FR e PAM (de acordo com Kuusella,2001, a PAM manteve-se estável durante o período intra-operatório, na maioria dos animais; esta manteve grandes períodos de estabilidade) e não foram necessários resgates de analgesia durante os grupos Dex. A

CRI parece ter contribuido para uma manutenção das doses plasmáticas do fármaco num nível adequado (Uilenreef J. et al., 2008).

Nunca houve necessidade de resgatar a analgesia, no período intra-operatório nas cirurgias do grupo Dex1 e Dex2 mas no CTR foram resgatados 2 animais, o que me sugere que a qualidade da anestesia, pelo menos em termos analgésicos, foi superior nos grupos Dex.

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Em relação aos resgates de dor no período pós-operatório devo referir que houve a necessidade de resgatar a dor a alguns dos animais do grupo CTR, a 3 Dex1 e a 1 Dex2, o que nos indica que a qualidade de recobro no CTR é pior que a dos grupos em estudo.

A nível de analgesia verificou-se que os animais dos grupos Dex1 e Dex2 apresentaram valores mais baixos na escala de dor da Universidade de Melbourn.

Já Valtolina C., 2009 refere que uma CRI de dexmedetomidina é tão efetiva como uma CRI de morfina para produzir analgesia no período pós-operatório. Este estudo mostra o potencial da dexmedetomidina como contributo para uma analgesia balanceada pós-operatória em cães.

Em relação à análise estatística das escalas de dor, notam-se sempre diferenças significativas entre o grupo CTR e o grupo Dex 2. Na escala de analgesia nota-se também uma diferença entre o grupo CTR e o grupo Dex 1. A partir destes dados, e sabendo que os resultados analgésicos dos grupos Dex 1 e Dex 2 são mais favoráreis, coloco a hipótese de que realmente existe um efeito analgésico adicional com a utilização de uma CRI de dexmedetomidina, sem dose de ataque, segundo as condições empregues neste procedimento experimental.

Assim, no nosso estudo não foi necessária uma dose de ataque de dexmedetomidina, relatada em estudos anteriores (uma CRI de dexmedetomidina de 1 μg/kg/h seguida de uma dose de 5μg/kg produzem os resultados mais favoráveis – Uilenreef J. et al., 2008), para que se assegurasse uma adequada anestesia, estabilidade hemodinâmica e boa recuperação anestésica, sem registo de episódios de dor significativos e sem necessidade de recurso à utilização de fármacos analgésicos no pós-operatório, na maioria dos animais do grupo Dex 1 e Dex 2.

Como já foi referido anteriormente, nos animais do nosso estudo também não foram observados episódios de hipotensão durante a cirurgia, presumivelmente devido ao efeito vasoconstritivo periférico, associado ao efeito da dexmedetomidina (Vickery et al., 1998; Lawrence et al., 1996a).

Uma vantagem da combinação de dexmedetomidina e isoflurano é a atenuação da vasoconstrição causada pela dexmedetomidina, devido às propriedades de vasodilatação periférica do isoflurano (Kersten et al., 1993). Assim, o esforço cardíaco não está tão comprometido sob estas condições.

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A CAM, concentração de um anestésico inalatório no alvéolo, a uma atmosfera, capaz de inibir movimentos intencionais em 50% dos animais, expostos a um estímulo muito doloroso e portanto, a dose efetiva 50, em que metade dos indivíduos estará anestesiada e a outra metade ainda não terá alcançado tal estado, é inversamente proporcional à potência, isto é, quanto menor a CAM, maior a potência do anestésico (Gremião et al., 2003). O facto de termos fixado o valor de isoflurano em 2%, provavelmente contribuiu para causar uma maior depressão respiratória nalguns animais. Durante os procedimentos cirúrgicos, foi possível observar este facto com mais objetividade no grupo Dex2, apesar de no final não se revelarem significativas a nível estatístico.

Como a dexmedetomidina aumenta a resistência vascular periférica de uma forma dose dependente (Lawrence et al., 1996b) e diminui a FC (Lawrence et al., 1996a; Pypendop & Vertsegen 1998; kuusela et al., 2000), o facto desta se manter, em média, em valores superiores no grupo CTR, sugere que a concentração plasmática de dexmedetomidina diminui mais rapidamente no grupo CTR, comparado com os outros grupos.

As doses de CRI utilizadas no estudo revelaram-se muito fiáveis, tanto para qualidade da anestesia como para a analgesia no período pós-operatório. Foi evidente que não é necessária uma dose de ataque para que houvesse estes resultados, sob as condições utilizadas.

A dose ETISO de 2% usou-se, apesar de elevada, para que nunca houvesse reversão dos efeitos de hipnose durante a cirurgia tanto nos grupos CTR como Dex1 e Dex2 e manteve-se fixo para que houvesse um termo de comparação em todos os grupos de trabalho. Inicialmente poder- se-ia pensar que este valor causasse uma depressão hemodinâmica aos animais, no entanto, nas condições utilizadas neste trabalho, isso não se verificou, apenas como foi referido, uma ligeira depressão respiratória, observada de forma empírica, nalguns animais do grupo Dex 2.

No meu entender este trabalho teve também, alguns pontos, durante o procedimento experimental, que considero que para que o trabalho seja mais completo do ponto de vista científico no futuro, poderiam ser corrigidos. O exame pré-anestésico não foi realizado de uma forma completa, não foi realizada uma avaliação comportamental dos animais, não foi feita uma seleção completa dos animais para que a amostra fosse mais homogénea sendo o número de animais também baixo, não houve registos do valor expirado de CO2, não houve registos de disritmias cardíacas, os cirurgiões foram diferentes ao longo das cirurgias e a avaliação do pós- operatório poderia ser um pouco mais extensiva, pelo que isto deverá ser estudado no futuro.

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As características desejáveis dos alfa2-adrenoreceptores agonistas incluem boa sedação, redução da quantidade de anestésicos de indução (Vickery et al. 1988; Hellebrekers & Sap 1997; Kuusela et al.2001) e manutenção (Bloor et al. 1992; Cullen 1996; Kuusela et al.2000;2001) e boa analgesia (Vainio et al. 1989; Hellebreckers & Sap 1997; Grim et al. 2000; Kuusela et al. 2000,2001).

O facto de ser um fármaco reversível permite uma rápida e boa qualidade de recuperação da anestesia (Verstegen et al. 1990; young et al.1990; Hellebrekers & Sap 1997; Hellebrekers et al. 1998).

Combinadas, todas estas características fazem dos alfa2-adrenoreceptores agonistas excelentes agentes para uso em sedação e protocolos de anestesia balanceada em animais saudáveis.

Utilizando este fármaco de uma forma mais equilibrada na prática clínica, com o recurso a cada vez maior conhecimento e avanço científico, penso que será possível no futuro, integrá-lo em protocolos de anestesia balanceada numa grande variedade de animais, de forma a serem maximizadas todas as suas excelentes características e minimizadas todas as suas alterações hemodinâmicas.

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