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A produção de anticorpos inibidores ao FVIII é considerada uma das complicações mais graves associadas à HA, sendo a prevenção e a supressão dos aloanticorpos os principais desafios no manejo desses pacientes. Nesse sentido, torna-se extremamente importante a realização de trabalhos que permitam estudar indivíduos sob-risco de desenvolverem inibidores e, ao mesmo tempo, contribuir com informações relevantes para a geração de possíveis protocolos de imunoterapia.

Neste estudo foi incluído um total de 422 pacientes portadores de HA grave, pertencentes a 324 famílias independentes, procedentes das cinco regiões territoriais do Brasil, com o objetivo de se analisar simultaneamente diferentes fatores de risco que pudessem estar correlacionados ao desenvolvimento de inibidores nessa população. Aproximadamente 25% dos pacientes com HA grave desenvolvem anticorpos neutralizantes ao FVIII [43, 66]. Em nosso estudo, a prevalência de inibidor foi de 22,9% (97 dos 422 incluídos), sendo que 82 (19,4%) foram diagnosticados com inibidores de alta resposta, correspondendo ao observado em outras populações [79].

A inclusão de casos de regiões distintas de forma representativa foi uma das principais dificuldades desse estudo. O estado de São Paulo, representado principalmente pelos pacientes provenientes do Hemocentro da UNICAMP, refletiu 60,4% do total dos casos analisados, as demais regiões foram sub-representadas com cerca de 3,5% a 12%. Além da dificuldade na inclusão dos casos, devido parcialmente pela distância geográfica, outras questões técnicas, como armazenamento e transporte de amostras, representaram um fator limitante na inclusão de maior número de casos de algumas das regiões.

Pacientes com história prévia de inibidor na família apresentaram risco de 5,85 vezes maior de desenvolver inibidor quando comparados com pacientes sem histórico de inibidor (p < 0,001 e OR = 5,85; 95% IC, 3,32 a 10,30). Esses resultados vão ao encontro do estudo de Gill et al. [99] que observaram risco aumentado de 5,8 vezes para ocorrência de inibidores em pacientes com história prévia na família. A relação histórica de inibidor na família também foi observada em pesquisa do grupo

The Malmö International Brother Study (MIBS) [100, 101], onde a possibilidade de mutações no F8 influenciarem a formação de inibidores em indivíduos da mesma família foi avaliada. Pacientes cujo irmão mais velho apresentava inibidor positivo apresentaram um risco adicional de 3,2 vezes para o desenvolvimento de inibidores. Esses achados sugerem que além do tipo de mutação no gene do FVIII, possam existir outros determinantes genéticos e ambientais que estejam relacionados com o risco adicional para predisposição na formação de inibidores nessas famílias.

Ao considerarmos o risco de desenvolvimento de inibidor de acordo com o grupo étnico, assim como em outras populações descritas [67, 102, 103], observamos uma maior incidência de inibidor entre os pacientes negros (32,7%) quando comparados aos pacientes caucasoides (18,6%). O risco para o desenvolvimento de inibidores foi 2,18 vezes maior para pacientes negros do que para caucasoides (p < 0,001 e OR = 2,18; 95% IC, 1,36 a 3,50). Viel et al. [67] propuseram que a presença de haplótipos distintos do FVIII, pudesse ter correlação farmacogenética com o desenvolvimento de inibidores em negros norte-americanos. Devido os haplótipos que aparecem exclusivamente na população negra (denominados H3 e H4), estarem ausentes nos concentrados de FVIII recombinantes utilizados rotineiramente no tratamento desses pacientes. No entanto, no estudo do nosso grupo de pesquisa com pacientes brasileiros com hemofilia A grave, embora a presença de inibidor fosse maior entre negros, não houve correlação entre a presença de haplótipos do gene F8 e a produção de inibidores nesse grupo [104].

Adicionalmente, nossa análise de prevalência de inibidor em grupos étnicos revelou, pela primeira vez, que entre pacientes classificados como índios brasileiros, a presença de inibidor foi notavelmente baixa, apenas 2,6% (1/38). Em relação ao risco de desenvolvimento de anticorpos inibitórios, índios brasileiros se mostraram menos propensos em apresentar inibidores de FVIII quando comparados com caucasoides (p = 0,01 e OR = 0,12; 95% IC, 0,01 a 0,90). É importante notar que não houve diferença em relação ao acesso ou ao tipo de tratamento de reposição que esses pacientes receberam em comparação aos demais pacientes incluídos nesse estudo.

Como o padrão de mutação no gene F8 não difere entre as etnias, acredita-se que vários outros marcadores genéticos com grau significativo de variabilidade étnica possam estar envolvidos com a disparidade encontrada, como por exemplo, os alelos MHC de classe II e o perfil polimórfico de genes reguladores do sistema imunológico [50, 103, 105]. No entanto, em nossas análises não encontramos correlação entre as etnias e os polimorfismos em genes imunorregulatórios que foram associados significativamente com a presença de inibidor, demonstrando, portanto que esses fatores genéticos avaliados em nosso estudo, atuam independentemente na formação dos anticorpos inibitórios de FVIII. Sendo assim, a explicação para a discrepância étnica no desenvolvimento de inibidor ainda permanece a ser esclarecida.

O presente estudo identificou a mutação responsável pelo diagnóstico de hemofilia A grave em 278 pacientes pertencentes a 197 famílias independentes. Para os 376 pacientes submetidos à investigação do diagnóstico molecular, 200 (53,2%), de 141 famílias não relacionadas, apresentaram INV22, enquanto que 10 (2,6%), provenientes de oito famílias independentes, foram positivos para INV1. Entre os 166 pacientes com hemofilia A grave, negativos para as INV1 e INV22, foi identificado à mutação responsável pelo diagnóstico de HA grave em 68 casos, pertencentes a 48 famílias independentes. A grande proporção de famílias com INV22 pode ser explicada pelo fato dessa mutação ser mais facilmente testada laboratorialmente do que a identificação dos outros tipos de mutações, que é mais trabalhosa e requer custos adicionais para sua realização [101].

O tipo de mutação no gene F8 é o fator genético melhor estabelecido quanto ao risco do desenvolvimento de inibidor [37, 66]. As inserções, deleções e duplicação encontradas em nosso trabalho estão associadas com a alteração do quadro de leitura (frameshift) e com a introdução de códons de parada, assim como em mutações nonsense. Geralmente, alterações genéticas que resultam na ausência ou truncamento da proteína do FVIII estão associadas com maior incidência para formação de inibidores, devido à falta de FVIII endógeno circulante [50].

Em nosso estudo, a análise comparativa entre os tipos de mutação para os dois grupos avaliados, demonstrou que o risco para desenvolver inibidores foi maior para pacientes com mutações do tipo nonsense e frameshift (OR = 2,54; 95% IC, 1,17 a 5,92 e OR = 3,08; 95% IC, 1,03 a 9,22; respectivamente) quando comparados com indivíduos com INV22, a causa mais frequente do diagnóstico de HA grave. Esses dados estão de acordo aos evidenciados por Gouw et al. [37], que em estudo de meta-análise, observaram maior risco de desenvolver inibidor em pacientes com grandes deleções e mutações nonsense do que em pacientes com INV22 (OR = 3,6; 95% IC, 2,3 a 5,7 e OR = 1,4; 95% IC, 1,1 a 1,8; respectivamente). Por outro lado, o risco para pacientes com pequenas deleções e inserções, além de mutações missense foi menor do que em pacientes com INV22 (OR = 0,5; 95% IC, 0,4 a 0,06 e OR = 0,3; 95% IC, 0,2 a 0,4; respectivamente) [37].

Entre as mutações de ponto encontradas nos pacientes que apresentaram inibidor positivo, todas as mutações do tipo nonsense previamente descritas no banco de dados para hemofilia foram relacionadas com alto risco para o desenvolvimento de inibidores ao FVIII [35]. Três mutações nonsense (p.Tyr530*, p.Gln1678*, p.Trp2248*) identificadas em pacientes positivos para inibidor, ainda não foram descritas na literatura, sendo que uma delas (p.Trp2248*) foi apresentada por duas famílias independentes. Seis mutações do tipo frameshift ainda não descritas na literatura foram verificadas nesse estudo, entre as três alterações encontradas já publicadas, o risco para desenvolvimento de inibidores já era conhecido para “p.IIe1213Asnfs*28” [106]. A alteração “p.Ile2100Ilefs*43” foi detectada em um paciente inibidor positivo, porém três pacientes (dois da mesma família e um pertencente à outra) com essa mesma mutação não apresentaram inibidores.

A menor incidência de inibidores está associada com mutações no gene F8 que ainda permitam que certa quantidade de FVIII esteja presente na circulação, entre essas mutações estão as do tipo missense, pequenas deleções e mutações em sítios de splicing, consideradas de baixo risco para o desenvolvimento de inibidores [107]. Apesar do baixo risco, algumas mutações desse tipo contribuem para a incidência inesperada de inibidores. Essas mutações são principalmente localizadas em éxons que codificam a cadeia leve (domínios A3, C1 e C2) e contribuem para imunogenicidade da proteína do FVIII, desencadeando a formação de anticorpos

específicos contra o epítopo mutado [66]. Entre essas mutações estão duas identificadas em nosso estudo, “p.Arg2016Trp” e “p.Met2257Val”.

O alto risco para ocorrência de inibidor em pacientes com a mutação “p.Arg2016Trp” no domínio A3 da molécula do FVIII, foi previamente descrito por Green et al. [108]. A alteração “p.Met2257Val” no domínio C2, ainda não relacionada à presença de inibidores na literatura, foi detectada em nosso estudo para dois pacientes não- aparentados que apresentaram inibidor positivo, porém, para seis pacientes com essa mesma mutação, pertencentes a outras três famílias independentes não foi verificado o aparecimento de inibidores ao FVIII.

Apesar da mutação responsável pelo diagnóstico de HA grave estar significativamente relacionada com o desenvolvimento de inibidores, ainda não está claro por que alguns pacientes com uma mesma mutação específica no gene do FVIII desenvolvem inibidor, enquanto outros não. Entre as principais causas genéticas estabelecidas pelos pesquisadores associadas com o desenvolvimento de inibidores em pacientes com HA grave estão os polimorfismos em genes imunorregulatórios.

O gene polimórfico mais frequentemente relatado associado com risco inibidor em pacientes com HA é o gene da interleucina-10 (IL10) [69, 109, 110]. A IL-10 é uma citocina anti-inflamatória multifuncional com efeitos distintos sobre a maioria dos tipos celulares hematopoiéticos. É principalmente produzida por células Th2 e células B, e entre suas diferentes ações, a IL-10 exerce seu efeito anti-inflamatório por meio da inibição da síntese de citocinas pró-inflamatórias como TNFA, IL-1A e IL-1B e das células Th1. Associado a estas ações, a IL-10 contribui para síntese de imunoglobulinas por células B [111].

A produção diferencial de IL-10 está associada com polimorfismos de base única (SNPs) na região promotora -1082 (G>A), -819 (C>T) e -592 (C>A). A presença do alelo -1082G foi associada a níveis aumentados de expressão de IL-10, enquanto que o alelo -819T e o -592A foram relacionados com níveis diminuídos de expressão [112].

Estudos prévios sobre esses polimorfismos na região promotora do gene da IL-10 mostraram que isoladamente a presença do alelo -1082G e do genótipo -1082GG apresentaram risco aumentado para o desenvolvimento de inibidores em pacientes portadores de HA [110,113]. Nesses trabalhos, assim como encontrado por Chaves et al. [114] em estudo no Brasil com 60 pacientes com HA, o haplótipo “GCC”, relacionado à alta síntese de IL-10 foi mais frequente entre os pacientes inibidores positivos quando comparado com pacientes sem inibidores. Enquanto que a frequência do haplótipo “ATA”, relacionado à baixa produção de IL-10, foi maior entre os pacientes portadores de HA sem inibidores. Outros estudos, incluindo o nosso, não confirmaram a associação entre o alelo -1082G e o genótipo -1082GG com o desenvolvimento de inibidores em pacientes com hemofilia A [115]. Em contrapartida, em nosso estudo, os polimorfismos -819 C>T e -592 C>A foram associados significativamente com a presença de inibidor em hemofílicos na nossa população. Indivíduos portadores do genótipo -819TT, associado com níveis diminuídos de expressão de IL-10, foram menos propensos em desenvolver inibidores de FVIII quando comparados com os portadores dos outros genótipos para o polimorfismo. Adicionalmente, o genótipo -592AA, relacionado com níveis diminuídos de expressão de IL-10, também demonstrou resultado estatístico significativo para análise comparativa entre os grupos avaliados, com maior frequência entre pacientes com hemofilia A sem inibidores.

Apesar da análise comparativa dos haplótipos “GCC” e “ATA” não apresentarem diferenças significativas entre os grupos avaliados em nosso trabalho, foi possível verificar quando combinados os polimorfismos -819 C>T e -592 C>A, que indivíduos portadores do diplótipo “TA/TA” se mostraram menos propensos em apresentar inibidores de FVIII (p = 0,01 e OR = 0,34; 95% IC, 0,13 a 0,88). Esses resultados foram similares aos encontrados por Lu et al. [109] em um estudo realizado com pacientes com hemofilia A na China. Finalmente, com base nos nossos achados, o diplótipo “TA”, associado a níveis diminuídos de IL-10, pode ser considerado um dos fatores de proteção para o desenvolvimento de inibidores ao FVIII em pacientes com hemofilia A grave em nossa população.

O interferon gamma (IFNG) é uma citocina pró-inflamatória imunomoduladora produzida por células Th1, capaz de atuar sobre inúmeros elementos da resposta imune. Entre suas diferentes funções, o INFG induz a expressão do complexo principal de histocompatibilidade (MHC) de classe II e de moléculas co- estimulatórias, promove a troca de isotipos de imunoglobulinas dos linfócitos B e suprime a produção de citocinas por células Th2 [116, 117]. Polimorfismos no gene IFNG podem afetar a expressão de genes relacionados, alterar a regulação dos níveis de citocinas e/ou conduzirem o tipo de resposta imune Th1/Th2. Diferentes estudos demonstraram relação entre uma mutação de ponto no promotor do gene, INFG -1616 T>C, com a presença de doenças mediadas pelo sistema imune como, lúpus eritematoso [118] e hepatite B [119]. A presença do alelo -1616T eleva o nível de expressão de IFNG, resultando na indução de respostas com perfis pró- inflamatórios [120]. Recentemente, pesquisadores brasileiros demonstraram à associação do SNP +874 A>T com o risco de inibidor em pacientes portadores de HA grave. A presença do alelo +874T foi correlacionada com risco aumentado para o desenvolvimento de inibidores quando comparado com o alelo +874A [88]. No entanto, a influência dos genótipos do polimorfismo -1616 T>C no desenvolvimento de inibidores em pacientes com HA ainda não foi avaliada. Considerando o valor clínico do polimorfismo -1616 T>C no promotor do gene INFG, a busca de uma relevância semelhante encontrada pelo SNP +874 A>T para o desenvolvimento de inibidores foi investigada pelo presente estudo. Porém, em nossas análises, as frequências alélicas e genotípicas do polimorfismo -1616 T>C no promotor do gene INFG não apresentaram diferenças estatísticas significativas quando os dois grupos foram comparados, demonstrando que nessa população esse SNP não está associado com a ocorrência de anticorpos inibitórios de FVIII.

A interleucina 5 (IL-5) é produzida por células Th2 durante a resposta inflamatória e tem como principal ação estimular a proliferação e diferenciação de células B em plasmócitos, favorecendo a produção de anticorpos [121]. O gene da IL-5 (IL5) está localizado no cromossomo 5q31.1 e está expresso em células T CD4+, mastócitos e eosinófilos. A presença do polimorfismo -745 C>T no promotor do IL5 está relacionado com a modulação do nível de expressão desta citocina e consequentemente na regulação da resposta imune inflamatória e alérgica. Em estudos anteriores, a presença desse SNP foi associada com doenças como a asma

atópica brônquica [122] e com o risco de câncer gástrico [123]. Recentemente, Fidanci et al. [85] demonstraram pela primeira vez, em estudo realizado com pacientes com HA grave na Índia, que a frequência do alelo -745T foi maior entre os pacientes com inibidor quando comparado com pacientes sem inibidor (46% versus 29%), sugerindo associação do alelo -745T com maior suscetibilidade para o desenvolvimento de inibidores. Em nosso estudo, as frequências alélicas e genotípicas do polimorfismo -745 C>T apresentaram distribuição similar entre os grupos analisados. É importante notar que existem diferenças acentuadas entre as populações humanas em termos de distribuição das variantes polimórficas. Um alelo comum em um grupo geográfico ou étnico pode ser raro em outra população e, portanto, resultados divergentes são frequentemente observados em estudos de genética populacional.

O fator de crescimento transformante-beta1 (TGFB1) é uma citocina anti- inflamatória, que atua sobre diversas células da imunidade celular e humoral, estimulando a proliferação de células T reguladoras e a interação destas com outros tipos celulares [124]. O TGFB1 desempenha papel fundamental na resposta imune, estimulando a expressão de MHC classe II e induzindo a produção de anticorpos pelas células B [125]. Indivíduos com polimorfismos nas regiões codificadoras e reguladoras do gene TGFB1 são mais susceptíveis ao desenvolvimento de distúrbios do sistema imunológico. A presença do polimorfismo genético +869 C>T no códon 10 está associado com alta produção de TGFB1, e é utilizado como marcador molecular de risco para o desenvolvimento de diferentes doenças [126]. Recentemente, em um estudo brasileiro realizado com 117 pacientes com HA grave no estado do Paraná, foi demonstrado que o SNP +869 C>T na região reguladora da molécula do TGFB1 estava associado com o desenvolvimento de inibidores ao FVIII [88]. O genótipo +869TT foi consideravelmente mais frequente no grupo de pacientes com inibidores do que no grupo de pacientes sem inibidores (42,9% versus 23,2%). Indivíduos portadores do genótipo +869TT apresentaram um risco 2,49 vezes maior para o desenvolvimento de inibidores do que portadores dos outros genótipos para o polimorfismo. Em nosso estudo, contrariamente ao encontrado por Alencar et al. [88], não foi verificado associação significativa entre as frequências alélicas e genotípicas para o polimorfismo +869 C>T, que apresentaram distribuição similar entre os grupos analisados para nossa população. Em estudo

realizado por pesquisadores na Grécia, também não foram observadas diferenças significativas das frequências genotípicas desse SNP entre os pacientes com HA com e sem inibidores [127]. Os resultados divergentes confrontados pelo nosso grupo em relação ao trabalho desenvolvido por Alencar et al. [88], podem ser decorrentes dos diferentes tamanhos amostrais avaliados, das variações étnicas e da grande variabilidade genética observada entre as populações regionais do Brasil.

O fator de necrose tumoral alfa (TNFA) é uma citocina pró-inflamatória com efeitos pleiotrópicos, que possui importantes funções, tais como a indução de outras citocinas e mediadores lipídicos da inflamação, de proliferação, diferenciação celular e apoptose. Vários polimorfismos no gene da TNFA (TNFA) foram descritos, alguns dos quais também tem relação com doenças inflamatórias e mediadas por anticorpos [128]. Os mecanismos pelos quais estes polimorfismos podem influenciar no risco de desenvolver inibidor incluem uma maior indução dos níveis de transcrição e aumento dos níveis de TNFA que estimulam a formação de anticorpos [129].

Em 2006 Astermark et al. [86], avaliaram a frequência do polimorfismo -308 G>A em 124 pacientes com hemofilia A grave com e sem inibidores de FVIII. O genótipo - 308AA, relacionado com alta produção de TNFA, foi mais frequente entre pacientes com inibidores (22,2%) do que em pacientes sem inibidores (1,6%). Em outro estudo com pacientes na Alemanha, uma maior frequência do genótipo -308AA entre pacientes HA com inibidores (22% versus 13%) também foi observada [113]. O alelo -308A em homozigose foi associado com 4,7 vezes maior risco para desenvolvimento de inibidores de FVIII comparado aos outros genótipos para o polimorfismo. A ausência de associação com o polimorfismo -308 G>A em nosso estudo, sugere que a baixa frequência do genótipo -308AA na população estudada (3 pacientes com inibidores e 3 sem inibidores) pode não ter sido suficiente para determinar uma associação estatisticamente significante. O alto grau de miscigenação na população brasileira pode resultar na diferença da distribuição genotípica encontrada entre o grupo estudado e os grupos de pacientes predominantemente caucasianos que participaram de estudos principalmente nos Estados Unidos e Europa.

As análises comparativas das frequências alélicas e genotípicas para o polimorfismo -857 C>T no TNFA em nosso estudo, demonstraram associação estatística significativa com a presença de inibidor. O genótipo -857CT, correlacionado com o aumento do nível de expressão de TNFA [130], foi mais frequente entre indivíduos com inibidores do que em pacientes sem inibidores (29% versus 17,8%). Enquanto que, a frequência do genótipo -857CC foi maior entre pacientes sem inibidores (80% versus 69,9%). Portadores do genótipo de -857CT apresentaram 1,89 vezes maior risco em desenvolver inibidores ao FVIII quando comparados com os portadores dos outros genótipos para o polimorfismo. Esses mesmos achados foram previamente descritos em um estudo desenvolvido na Índia com a participação de 120 pacientes com HA grave, onde a prevalência do genótipo heterozigoto -857CT também foi estatisticamente mais frequente no grupo de pacientes positivos para o inibidor quando confrontada com o grupo de pacientes sem inibidor, sugerindo o genótipo - 857 CT como fator de risco para o desenvolvimento de inibidores ao FVIII nesses pacientes [110].

No presente estudo observou-se desequilíbrio de ligação entre os loci -857 C>T e - 308 G>A, sugerindo uma associação não aleatória dos alelos nas populações estudadas e justificando sua análise simultânea sob a forma de haplótipos. A distribuição das frequências haplotípicas se mostrou diferente entre os grupos analisados. A combinação “GC/CG” dos respectivos loci polimórficos mostrou-se como fator protetor no desenvolvimento de inibidores ao FVIII comparada com as outras combinações frequentes de haplótipos observadas (p = 0,01 e OR = 0,52; 95% IC, 0,33 a 0,83). Enquanto que, portadores do haplótipo “CG/TG” apresentaram

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