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P. aeruginosa é o principal agente etiológico entre os bacilos Gram-

negativos não-fermentadores de glicose, e está classificado como o quarto agente etiológico mais isolado em hemoculturas. Infecção causada por esses microrganismos permanece como principal causa de óbito em pacientes oncológicos, devido a alterações no mecanismo de defesa do hospedeiro decorrentes da própria neoplasia e/ou tratamento (Levine et al, 1974, Bodey, 1986).

As infecções causadas por P. aeruginosa multirresistentes a antimicrobianos tem aumentado em todo o mundo. Segundo os dados fornecidos pelo National Nosocomial Infections Surveillance (NNIS) System, entre 1992 a 2002, P. aeruginosa é considerada um dos principais patógenos responsáveis pelas infecções relacionadas à assistência a saúde devido à sua freqüência e à sua elevada resistência antimicrobiana.

A implementação de metodologias fenotípicas para detecção de MBLs em conjunto com a racionalização do uso de agentes antimicrobianos de amplo espectro pode auxiliar na contenção da disseminação destes genes de resistência, uma vez que, diante da capacidade de recombinação destas estruturas genéticas, estes genes continuarão a surgir caso a pressão seletiva sobre os microrganismos do ambiente hospitalar seja mantida.

As MBL podem ser detectadas por meio de testes fenotípicos utilizando agentes quelantes, pelo fato de terem como característica a necessidade de íons divalentes (i.e. Zn+2) atuando como co-fator para a reação de hidrólise. Segundo Picão (2007) o teste de disco aproximação utilizando um disco sem

impregnação contendo ácido mercaptopropiônico (MPA) como inibidor de MBL a dois centímetros de distância de discos de ceftazidima e imipenem, é um bom método para detecção de MBL em amostras de P. aeruginosa e

Acinetobacter spp. A metodologia de disco-aproximação desenvolvida por

Arakawa et al (2000) apresenta boa sensibilidade e especificidade, e pode facilmente ser empregada no laboratório de rotina. Adicionalmente, fitas de E- test incorporadas com imipenem em uma das extremidades, e imipenem em conjunto com EDTA em outra extremidade podem ser utilizadas, porém apresentam custo mais elevado (Walsh et al., 2002). No presente estudo pudemos observar que os testes com o EDTA e com MPA apresentaram o mesmo resultado (54%).

Os plasmídios são responsáveis pela disseminação de muitas beta- lactamases, no entanto os genes que codificam essas enzimas são encontrados inseridos em integrons, os quais freqüentemente contêm outros genes que conferem resistência a uma variedade de antibióticos. Por essa razão as beta-lactamases são usualmente produzidas por organismos que também são resistentes a múltiplos agentes antimicrobianos como, por exemplo, os carbapenêmicos (Jacoby & Munoz-Price, 2005). As MBL adquiridas são codificadas por genes cassetes localizados tanto no cromossomo quanto no plasmídio bacteriano. No entanto, com exceção da enzima SPM-1 (Toleman et al., 2002, Poirel et al., 2004), as demais MBLs adquiridas (IMP-1, VIM-1, VIM-2, SPM-1) são codificadas por genes localizados em integrons favorecendo a sua disseminação clonal (Walsh et al., 2003, Toleman et al., 2003, Mendes et al., 2004, Patzer et al., 2004).

A prevalência de MBL entre as 33 amostras de P. aeruginosa resistentes aos carbapenêmicos provenientes de hemoculturas avaliadas no presente estudo foi de 59%, sendo todas produtoras de blaSPM-1. Em um estudo realizado por Balan (2007), com 120 amostras de P. aeruginosa resistentes aos carbapenêmicos provenientes de diferentes sítios corpóreos isoladas no Hospital São Paulo, e no GRAACC em 2004 (4 amostras), a prevalência de MBL foi de 38,1%, sendo 20% de blaIMP-1 e 80% de blaSPM-1. Em nosso estudo não detectamos a presença de blaIMP-1.

O primeiro relato de SPM-1 no mundo foi realizado por Toleman et al em 2002, encontrada em uma amostra clínica de P. aeruginosa isolada no IOP- GRAACC, em fevereiro de 2001. Esta amostra (P1088) faz parte deste estudo, e foi posteriormente encontrada em diferentes regiões brasileiras (Toleman et

al., 2002; Gales et al., 2003b).

Durante o período deste estudo (novembro de 2000 a dezembro de 2005), observamos que a primeira amostra de P. aeruginosa produtora de SPM-1 foi isolada em novembro de 2000 (amostra P700), portanto, anterior ao relatado pela primeira vez por Toleman et al (2002) demonstrando que a P. aeruginosa carreando blaSPM-1 já estava presente na Instituição pelo menos 1 ano antes do primeiro relato.

Através da técnica de tipagem molecular por PFGE observamos que das 18 amostras que continham o gene blaSPM-1, 8 (44,4%) apresentaram o mesmo perfil segundo os critérios de Tenover, portanto, caracterizando um clone. Essas amostras foram isoladas em diferentes anos demonstrando claramente

que esse clone ainda permanece nesse hospital. Esse clone é o mesmo que o encontrado em diferentes regiões brasileiras descrito por Gales et al em 2003b.

A resistência aos carbapenêmicos em P. aeruginosa pode estar associada a outros mecanismos de resistência além da produção de MBL. Marra (2004), no Hospital São Paulo entre janeiro de 2000 e maio de 2002, observaram que 81,1% das amostras de P. aeruginosa isoladas de hemoculturas resistentes aos carbapenêmicos possuiam MBL. Já Balan et al (2007) em 2004, observaram que 62,5% das amostras de P. aeruginosa isoladas de diferentes sítios eram resistentes aos carbapenêmicos e não eram produtoras de MBL. A diminuição da permeabilidade de membrana externa (porinas) e/ou a hiperexpressão de bombas de efluxo, podem ser os prováveis mecanismos responsáveis por esse fenótipo de resistência.

A neutropenia está intimamente ligada ao processo neoplásco e ao seu tratamento, sendo o principal fator de risco para aquisição de complicações infecciosas nesses pacientes. Para diminuir a morbimortalidade relacionada ao processo infeccioso é muito importante a administração imediata de antibioticoterapia empírica de amplo espectro. No presente estudo, 75% dos 49 pacientes estudados e 83,3% dos 17 pacientes com infecção por P. aeruginosa produtora de MBL (SPM-1) estavam neutropênicos.

Carlesse (2005) estudaram os fatores de risco relacionados a presença de infecção clinicamente invasiva em pacientes neutropênicos febris na mesma instituição. Os fatores de risco observados foram idade menor que três anos, temperatura maior ou igual a 38,5º C, presença de cateter central de longa

permanência, doença de base em atividade, presença de mucosite graus III e IV e presença de diarréia de graus III e IV .

Dos 49 pacientes estudados, a terapeutica foi adequada em apenas 46,1% e quando consideramos apenas pacientes com amostras produtoras de MBL a porcentagem de adequação foi ainda menor (27,7%). Considerando a elevada prevalência de MBL particularmente blaSPM-1 nas amostras isoladas dos pacientes do IOP e uma elevada taxa de mortalidade, a terapêutica empírica em episódios de bacteremia nessa população de pacientes poderia incluir as polimixinas pelo menos nos pacientes de elevado risco infeccioso (leucemias, TMO e/ou com períodos de neutropenia e internação prolongados). Esses dados demonstram a importância da identificação precoce de microrganismos em hemocultura e da realização do antibiograma o mais rápido possível com determinações das concentrações inibitórias mínimas. Entretanto, o tempo entre a coleta de hemocultura, a identificação do microrganismo e a realização do antibiograma, mesmo por métodos automatizados, não é menor do que 48 horas. Para essa população de pacientes de alto risco esse tempo é muito elevado, associando-se a inadequação da terapêutica e contribuindo para uma maior mortalidade. A detecção precoce de metalo enzimas por métodos moleculares poderá contribuir para um resultado mais rápido. Mendes

et al (2007) padronizaram uma técnica de PCR Multiplex em tempo real

utilizando primers para as seguintes enzimas IMPs, VIMs, SPM-1, GIM-1 e SIM-1. Os resultados podem ser obtidos em 2 horas após o isolamento de P.

No Hospital Universitário Clemente Fraga Filho do Rio de Janeiro, P.

aeruginosa foi o agente responsável por cerca de 12% das bacteremias

hospitalares nos anos de 2003 e 2004, estando sempre entre os três primeiros agentes causadores desta infecção ao lado de S. aureus e K. pneumoniae. Outros estudos vem relatando que esse patógeno é o agente mais comum de pneumonias em pacientes oncológicos (Velasco et al, 1997), em bacteremias de unidades pediátricas (Chang, 2003) e em pacientes transplantados de medula óssea (Garnica & Nucci, 2005). Esses dados demonstram a importância das infecções causadas P. aeruginosa em qualquer setor hospitalar e sítio de infecção, principalmente em paciente imunocomprometidos como é o caso de pacientes com câncer.

O IOP-GRAACC recebe pacientes graves com câncer, neutropênicos e transplantados. Esses pacientes fazem uso constante de antimicrobiano: ou para tratamento; ou como profilaxia para impedir que o paciente adquira ou tratar uma infecção. A utilização desses antimicrobianos pode contribuir para uma pressão seletiva, selecionando bactérias com múltiplos mecanismos de resistência.

Marra et al (2006), encontraram taxas de mortalidade e morbidade entre pacientes com infecções da corrente sanguínea por P. aeruginosa produtoras de MBL do Hospital São Paulo superior a 85,7%. Em nosso estudo, apesar de ter sido realizado apenas com pacientes do IOP-GRAACC, foi observado uma taxa de mortalidade de 42,6% sendo mais elevada de 70,6% nos pacientes com amostras produtoras de blaSPM-1.

As opções terapêuticas para o tratamento de infecções causadas por P.

aeruginosa são limitadas e incluem penicilinas com atividade anti-

pseudomonas, cefalosporinas de amplo espectro, monobactâmico, carbapenêmicos, e fluoroquinolonas, particularmente a ciprofloxacina (Carmeli

et al., 1999). Os aminoglicosídeos são freqüentemente utilizados em regimes

combinados aos beta-lactâmicos na tentativa de potencializar a atividade antimicrobiana e de evitar o desenvolvimento de resistência bacteriana, sendo a monoterapia com esses antimicrobianos, raramente utilizada. Para amostras multirresistentes, incluindo os carbapenêmicos, a única opção terapêutica disponível tem sido as polimixinas (colistina e polimixina B). Apesar de muito raros já existem relatos de amostras também resistentes a esses antimicrobianos (Gales et al, 2006). Nas amostras testadas no presente estudo pelo método de disco difusão, todas (100%) foram sensíveis a Polimixina B, entretanto, o CSLI padronizou o teste sensibilidade a polimixinas apenas para diluição em ágar. Apesar da sensibilidade ao aztreonam nas amostras produtoras de blaspm, não utilizamos esse antimicrobiano na terapêutica dessas infecções, mas sim como marcador de possível presença de MBL, já que não é hidrolisado por essas enzimas.

Ainda que as medidas para o controle de infecção de microrganismos produtores de MBL não estejam bem definidas, algumas evidências sugerem que as já conhecidas medidas gerais de controle de infecção, aliadas à racionalização do uso de agentes antimicrobianos de amplo espectro, poderiam ser efetivas (Livermore, 2002).

Geralmente as amostras clínicas de P. aeruginosa isoladas de pacientes hospitalizados, onde foram realizadas as assepsias adequadamente, foram originadas da própria flora normal do trato gastro- intestinal dos pacientes (Arnow & Flaherty, 1996).

Partindo do conceito de que P. aeruginosa está em grande quantidade na região bucal, as próprias crianças hospitalizadas podem transmitir cepas contendo MBL para as outras crianças da mesma unidade ou unidades diferentes do hospital através do contato ou de objetos em comum. Por esses motivos é importante que os pais e acompanhantes também saibam como evitar a transmissão das bactérias, para prevenção de futuras infecções comunitárias através da higienização das mãos, limpeza com soluções bactericidas, dentre outras medidas.

Programas de vigilância epidemiológica, como o SENTRY (Gales et al, 2001) pode auxiliar na monitoração da resistência bacteriana em determinados locais; mas, programas como estes também apresentam a desvantagem de não possibilitarem a monitoração concomitante de um grande número de centros médicos. Programas mais completos possibilitariam a real monitoração da resistência bacteriana, e juntamente a estudos científicos, objetivando determinar e/ou caracterizar os elementos genéticos móveis (integrons e transposons), permitiria melhor compreensão do mecanismo, regulação, estabilidade dos fatores que influenciam a recombinação genética. Isto auxiliaria no controle de disseminação destes genes de resistência, bem como daqueles que poderão surgir.

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