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3. EVOLUÇÃO DO CONTROLO REPRODUTIVO EQUINO EM PORTUGAL E

3.6. Discussão dos casos clínicos

A descrição dos casos clínicos acima relatados foi feita com o intuito de evidenciar as vantagens que a reprodução assistida e as tecnologias associadas têm na eficiência reprodutiva e, consequentemente, na produtividade.

No primeiro caso a égua 1, era uma égua com historial de insucesso reprodutivo no ano anterior e que após início da nova época reprodutiva ainda não tinha demonstrado sinais de cio. A estimulação natural nesta égua, através de um correcto maneio, do fotoperíodo e pela presença do macho não surtiu efeito e como o intuito dos donos era que a égua produzisse um poldro este ano foi contactado o Médico Veterinário do centro para avaliação reprodutiva da égua. Através deste, e após recolha do historial reprodutivo, foi decidido aplicar a estimulação hormonal na sincronização do cio. O segundo caso, é um exemplo ilustrativo do efectivo equino nacional. A égua 2 é uma antiga égua de competição e só após o término da sua carreira desportiva foi iniciada na vida reprodutiva. Embora ainda não seja considerada uma égua velha (tem 8 anos), é uma égua imatura reprodutivamente, sendo este o segundo ano em que é usada na reprodução. Este tipo de éguas têm maior dificuldade em expressar o cio, tendo sido por isso necessário despoletar o cio com o auxílio da administração de hormonas exógenas. Esta égua exemplifica também a necessidade de acoplar a estimulação hormonal às técnicas de inseminação artificial. Pelo segundo ano consecutivo não se consegue cobrir a égua através da cópula natural. Não recorrer ao uso da IA, tornaria difícil contornar o problema específico que afectava a fertilidade desta égua.

Aplicar apenas as técnicas de reprodução padrão a estas éguas é meio caminho andado para o insucesso reprodutivo. Providenciar-lhe os benefícios das novas práticas de maneio reprodutivo é obrigatório para no final se obterem descendentes. A utilização de agentes de sincronização do cio no maneio reprodutivo desempenhou um papel fundamental no sucesso reprodutivo destas duas éguas. Entretanto, para que aquela pudesse ser eficiente, a utilização das drogas indutoras de ovulação e de sincronização do cio teve de ser realizada com o acompanhamento diário do estro pelo veterinário, através de palpação rectal e ultrasonografia, monitorizando o crescimento folicular e o edema uterino, para que a inseminação fosse realizada no momento adequado e não houvesse falhas na indução. Igualmente imprescindível é possibilitar que o Médico Veterinário institua todos os tratamentos necessários, como a administração de antibioterapia, aplicação de lavagens uterinas, seguida da administração de ocitocina, quando há presença de líquido no útero. Conjuntamente, a utilização destes agentes indutores são uma importante ferramenta na aplicação das biotecnologias reprodutivas, entre elas, a IA, o uso de sémen refrigerado ou congelado e a TE. Os agentes indutores do cio e da ovulação actuam reduzindo o intervalo pré-

ovulatório, facilitando a sincronização da ovulação e, logo, sincronizando as dadoras e receptoras nos programas de TE e optimizando o uso do garanhão, bem como das doses de sémen inseminadas.

O terceiro e último caso, ilustra na perfeição casos incontornáveis sem as novas tecnologias de reprodução assistida. O proprietário queria cobrir a égua com o garanhão W, o qual se encontra no Reino Unido. Uma das principais mudanças na indústria do cavalo em Portugal foi certamente a aceitação generalizada da refrigeração e da congelação de sémen. Sem a difusão da venda de sémen congelado além fronteiras, produzir descendentes destes dois animais, implicaria maiores custos de transporte dos mesmos. Este caso tem ainda outra particularidade, a tentativa de induzir a gestação na égua ao longo dos quase três meses que esta permaneceu no centro foi infrutífera. A égua foi estimulada várias vezes hormonalmente com diferentes fármacos, tratada com 3 antibioterapias diferentes e foram realizadas várias lavagens uterinas acopladas a antibioterapia intra-uterina e administração de ocitocina, segundo protocolo pós-inseminação com sémen congelado. Mesmo assim, após quatro inseminações a égua retornou a casa sem um prognóstico definido, acabando por dias mais tarde, já com a égua de volta à exploração, o diagnóstico de gestação ter sido negativo.

Dada a conjuntura verificada, e caso houvesse urgência por parte do proprietário em cobrir a égua ainda este ano, o veterinário teria diferentes situações a ponderar, definir a capacidade ou não desta égua conseguir produzir um embrião e delimitar a origem da falha de concepção. Se a égua conseguisse produzir embriões, era uma boa candidata a transferência de embriões, já que tem uma enorme predisposição para o aparecimento de endometrites. Se se observasse um histórico de falhas ovulatórias repetidas ou a incapacidade desta égua na concepção ou na manutenção embrionária precoce, o Médico Veterinário teria de ponderar o uso de técnicas mais avançadas como a Transferência de Oócitos. Esta técnica tem aplicação prática limitada em protocolos clínicos de rotina em Portugal e seria um desafio aplicá-la.

Em todo o caso, foi igualmente averiguado que o sémen do garanhão era de baixa congelabilidade. Como a mobilidade espermática após congelação/descongelação do sémen era relativamente pobre, esta poderá ter sido uma das causas para a égua falhar na concepção em inseminações sucessivas, tornando a cobrição da égua por este garanhão difícil. Neste caso o Médico Veterinário deveria avisar o proprietário que a taxa de concepção da sua égua com este garanhão seria muito reduzida e, eventualmente, aconselhá-lo a recorrer a técnicas mais avançadas como a Injecção Intracitoplasmática de Sémen (ICSI). Esta técnica seria o método ideal para produzir poldros de garanhões com espermatozóides de má qualidade após congelação.

Os casos supracitados não deixam dúvida das repercussões positivas que os tremendos avanços no controlo reprodutivo equino originaram. A aceitação das tecnologias reprodutiva não depende contudo exclusivamente do sucesso da tecnologia, mas da atitude dos criadores e veterinários e da relação custo/benefício para a indústria e das associações da raça.