• Nenhum resultado encontrado

Nota Preambular

Este capítulo assume-se como o último, mas também o de maior importância, pois confere sentido à investigação. Todo o trabalho realizado ao longo do projecto de investigação, culmina na discussão e nas conclusões finais e é também onde o investigador percepciona se conseguiu ou não responder à(s) questão(ões) a que propôs.

A linha condutora desde trabalho passa pela análise da Directiva, bem como da Lei n.º52/2014, de 25 de Agosto e dos documentos oficiais que a antecederam.

Em Anexo IV está exposta uma tabela analítica que inclui a Directiva e a Lei da transposição da Directiva, e inclui o resumo dos pontos fulcrais dos dois documentos, bem como as suas transgressões e omissões dentro do quadro jurídico português, de modo a facilitar as conclusões finais.

Assim, através da análise documental – de documentos primários como legislação, bem como de fontes deliberadas (estudos e pareceres) e de fontes secundárias (interpretações das fontes primárias) – conseguimos responder às questões formuladas no início do projecto de investigação.

A UE tem integrado cada vez mais na sua legislação e regulamentação, a Saúde Pública, bem como os direitos dos doentes em matéria de cuidados de saúde.

O caminho trilhado para atingir o elevado nível de protecção social auspiciado pela implementação do Modelo Social Europeu, no que respeita à Saúde Pública, tem-se revelado longo e sinuoso. Contudo a UE não tem poupado esforços no sentido de incutir aos EM a responsabilidade pelas suas próprias políticas públicas, uma vez que para a União é fulcral que exista uma congregação de esforços dos EM, de modo a garantir aos cidadãos da UE a universalidade, a equidade, a eficiência, a eficácia e a qualidade dos sistemas de saúde.

Assim, a transposição da Directiva ficou ao cargo dos EM, para que não sejam comprometidos o equilíbrio e a sustentabilidade dos Sistemas de Saúde. Todavia, no caso português, a transferência desta tarefa da UE para o domínio nacional, em plena crise económica pode constituir uma preocupação no âmbito do Direito de Acesso aos Cuidados de Saúde Transfronteiriços, pelos beneficiários do SNS português. Neste contexto torna-se necessário o enfoque na sustentabilidade sem que exista compromisso dos Direitos de Acesso aos Cuidados de Saúde Transfronteiriços, de modo equitativo, tendo sempre em consideração a situação económica e de vulnerabilidade dos doentes.

1. Discussão

As barreiras identificadas neste trabalho, que podem constituir obstáculos efectivos ao exercício do direito de acesso aos cuidados de saúde transfronteiriços, pelos beneficiários do SNS, são de ordem:

i. Financeira: Tendo em conta o contexto nacional actual, de crise económica, é o obstáculo que mais se evidencia e que pode causar diversas preocupações no âmbito da equidade de acesso aos cuidados de saúde transfronteiriços. Para que esta barreira potencial não constitua efetivamente um obstáculo ao acesso, é necessário que o Governo de Portugal legisle (em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços), tendo em conta as vulnerabilidades de certos grupos populacionais, tais como os pensionistas, os indivíduos com insuficiência económica comprovada, os deficientes com mais de 60% de incapacidade e as crianças. Todos os grupos mencionados estão protegidos, no que respeita ao pagamento dos cuidados prestados em Portugal e à luz da legislação portuguesa, mas tal não acontece no caso dos cuidados de saúde transfronteiriços.

ii. Linguísticas e culturais: É a barreira apontada como de maior relevância, pela literatura. Aceita-se como um dos factores de maior relevância aquando da decisão do doente em receber ou não cuidados no estrangeiro, pelo que os governos devem desenvolver acções que possam minimizar os problemas derivados deste tipo de obstáculos.

No caso português, a Lei n.º52/2014, de 25 de Agosto, é omissa em acções que possam transpor este obstáculo.

iii. Mobilidade física: Os mais vulneráveis poderão necessitar de acompanhamento por

familiar ou por profissional de saúde, custos que provavelmente não poderão suportar e que não estão previstos na Lei n.º52/2014, de 25 de Agosto, nem constituem aparentemente uma preocupação para os responsáveis do Governo pela área da saúde.

iv. Informacionais: Este tipo de barreira pode inibir o acesso dos doentes aos próprios cuidados. O Governo de Portugal ao transpor a Directiva, não teve em conta a baixa literacia dos mais idosos, especialmente no que se prende com as tecnologias de informação.

v. Proximidade geográfica: Também uma das barreiras mais apontadas pela literatura quando é acometida para o doente a decisão de preferir ser tratado perto ou longe do seu domicílio. É também mencionado pela bibliografia consultada que os custos com deslocações a regiões mais distantes podem também constituir uma barreira.

A Lei n.º52/2014, de 25 de Agosto, bem como a documentação publicada pelas entidades competentes é omissa neste ponto.

vi. Administrativas: O Governo de Portugal preocupou-se sobretudo em eliminar este tipo de barreiras. Contudo, os critérios que definem a necessidade de autorização prévia não são completamente transparentes e os pontos de contacto não estão ainda definidos, contudo constituem uma preocupação para o Governo (Costa, 2014).

vii. Capacidade de continuidade dos cuidados: Este tipo de barreira é colocada em foco pela Comissão Europeia em paridade com o suporte financeiro, no que se refere ao seu nível de importância. Este problema é omisso da Lei n.º52/2014, de 25 de Agosto.

Outro ponto sensível referido pela ERS (2012), prende-se com o gatekeeping, pois podem ser exercidas pressões ao nível dos cuidados de saúde primários para condicionar o acesso aos cuidados transfronteiriços, mas não é referido por mais nenhum autor, pelo que não é considerado neste trabalho como sendo um obstáculo ao Direito de Acesso aos Cuidados de Saúde Transfronteiriços.

Após a discussão da questão principal deste documento, é então necessário passarmos ao debate das questões específicas a que nos propusemos.