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De acordo com os resultados apresentados, destaca-se a relação afiliativa mais intensa dos machos reprodutores com as fêmeas reprodutoras associada aos perfis hormonais diferenciados dos machos reprodutores e não reprodutores dos dois grupos. Outros estudos mostram que o macho reprodutor de Callithrix jacchus apresenta uma relação preferencial com a fêmea reprodutora quando comparada com àquelas desenvolvidas entre os demais componentes do grupo social, representada por maior afiliação, que no presente estudo se expressa nos comportamentos de contato, catação social, proximidade e comportamento sexual de cópulas. Estas interações são evidenciadas principalmente naqueles animais de pares que apresentam maior sucesso reprodutivo (EPPLE, 1970; ROTHE, 1975, EVANS & POOLE, 1983; WOODCOCK, 1982; KENDRICK & DIXSON, 1983; ABBOTT, 1984).

Neste estudo os machos reprodutores apresentaram maior freqüência de

comportamentos afiliativos direcionados às fêmeas reprodutoras, sendo este critério, inclusive, utilizado para definir qual seria o par reprodutor no estudo piloto do grupo GC1 e para a caracterização posterior do par reprodutor no grupo GR2. Estes resultados confirmam a primeira predição da primeira hipótese deste trabalho e são convergentes com os demais relatos da literatura que estudaram casais de C. jacchus vivendo tanto no ambiente de cativeiro

(KENDRICK & DIXSON, 1983; MOTA, 1992) como no ambiente natural

(ALBUQUERQUE, 1998; ALBUQUERQUE et al., 2001).

Outros trabalhos mostraram ainda que ocorre a intensificação da interação afiliativa entre o par reprodutor particularmente quando as fêmeas estão grávidas (SILVA e SOUSA, 1997). Neste estudo, os filhotes nasceram, respectivamente, 3 meses e meio e 4 meses após o inicio da coleta de dados, nos grupos GR2 e GC1, o que comprova que a fêmea encontrava-se gestante neste período. A condição da fêmea reprodutora deve ter contribuído para os resultados de afiliação entre o par observado neste trabalho.

A constatação de que houve variação diurna nos comportamentos afiliativos durante a manhã e a tarde e nos intervalos a cada duas horas distribuídos ao longo da fase de claro, confirma a segunda hipótese deste estudo. Observou-se que o contato ocorreu com mais freqüência durante a tarde. A análise complementar observando a distribuição a cada duas horas permitiu observar que é no final do período de atividade que os animais intensificam este tipo de interação. Segundo o estudo de CAMAROTTI e MONTEIRO DA CRUZ (1997) o padrão comportamental de “ficar parado” é um dos predominantes para C. jacchus vivendo em grupos naturais, nas duas horas que antecedem o recolhimento dos grupos aos locais de pernoite (cerca de 30% do tempo total), ficando apenas atrás do “andar lento” (cerca de 50%). Neste contexto, como a catação ocupa menos de 10% deste tempo, os animais devem ocupar o restante deste período em contato físico, provavelmente para o reencontro e identificação dos membros do grupo, principalmente próximo ao local de dormida.

A variação diurna na catação social acompanhou o perfil anteriormente relatado por CASTRO et al., (1995), tendo sido mais freqüente no turno matutino, principalmente nos horários entre 08:00 e 12:00 horas. A proximidade, embora não tenha apresentado diferenças no padrão de ocorrência entre a manhã e a tarde, se elevou de modo significativo ao redor do meio-dia, coincidindo com os horários de elevação da catação social e são similares aos relatados por MENEZES et al., (1994) e MOTA et al. (1993) e também por SOUSA & MOISÉS (1997). Esta resposta parece decorrer de uma diminuição da atividade motora dos animais durante a fase mais quente do dia (ALONSO & LANGUTH, 1989).

A comparação entre a interação afiliativa entre os machos reprodutores e as fêmeas reprodutoras e as interações destes machos com os não reprodutores mostrou que o macho reprodutor investe de maneira similar em ambos, confirmando a segunda predição da primeira hipótese. Todavia, a comparação entre a interação entre os animais focais nos dois grupos aponta para padrões distintos de interação, evidenciando maior interação afiliativa entre os machos do grupo GR2. Neste grupo, conforme será discutido mais adiante, houve um maior número de encontros agonísticos com animais extra-grupos, sugerindo que a afiliação entre machos pode ser um fator de recrutamento de ajudantes para a defesa do território, conforme

descrito por LAZARO-PEREA (2001). Além disso, pode-se também supor o papel funcional de redutor de tensão, relacionado à catação social, pois este comportamento foi o que mais aumentou no grupo GR2.

Além das relações afiliativas entre o par reprodutor, os comportamentos afiliativos são utilizados para estabelecer ligações entre os membros do grupo social em geral (LAZARO- PEREA, 2001), incluindo a relação mãe-filhote e entre animais adultos do grupo social. Em C. jacchus os machos parecem formar uma relação menos competitiva entre eles do que aquela registrada para as fêmeas (BAKER et al., 1999; CASTRO e SOUSA, 2005). RYLANDS (1996) sugere que a poliandria registrada para C. flaviceps pode ser uma estratégia evolutivamente estável quando os machos não dispõem de condições satisfatórias para emigrar. Ao mesmo tempo haveria o favorecimento das fêmeas, pois mais de um macho adulto no grupo social aumentaria a disponibilidade de ajudantes para os infantes. Para que machos adultos co-habitem em um mesmo grupo, se pressupõe que mecanismos de tolerância e afiliação entre os machos devem ter evoluído. SOUSA et al., (2002b) encontraram que os machos alteram mais seus níveis de cortisol diante da separação do parceiro sexual do que as fêmeas, indicando que os machos estão menos adaptados para abandonar o grupo social e por isso são o sexo que emigram menos freqüentemente. Vale a pena salientar, entretanto, que a despeito de evidências de ocorrência de poliandria (RYLANDS, 1996) e poliginia (DIGBY & FERRARI, 1994) nos calitriquídeos, uma revisão recente sobre o sistema de acasalamento para C. jacchus, a partir do monitoramento de longo prazo de grupos silvestres, descreve que este é principalmente monogâmico podendo, eventualmente, ser poligínico (ARRUDA et al., 2005).

Segundo TARDIF et al., (1993) a cooperação entre machos pode ser facilitada pelo grau de parentesco. Nos grupos estudados no presente trabalho não há como avaliar se o parentesco está influenciando os perfis de afiliação e agonismo diferentes entre os machos, pois não há registros anteriores disponíveis. Estas alianças entre machos podem também ser formadas para auxílio na defesa do território, recrutamento de ajudantes no grupo social (LAZARO-PEREA, 2001), ou ambos.

Em relação à freqüência de cópulas, os machos reprodutores foram os únicos que copularam com as fêmeas reprodutoras, confirmando a predição da terceira hipótese, e em acordo com dados registrados em estudos de grupos na Estação de Nísia Floresta (ALBUQUERQUE et al., 2001; ALBUQUERQUE, 2003; ARRUDA et al., 2005) em ambiente natural. Entretanto, ao contrário do que foi registrado por outros autores, neste estudo foram registradas cópulas extra-grupo do macho reprodutor.

O comportamento de cuidado parental que neste estudo incluiu o carregar, a catação social e o contato com os filhotes foi semelhante para machos reprodutores e não reprodutores. O sagüi comum apresenta cuidado cooperativo e além da mãe e do pai outros animais do grupo auxiliam nesta função (INGRAM, 1977; YAMAMOTO, 1990; ARRUDA, 1992). FERRARI (1987, 1992) também não encontrou diferenças no tempo de carregar os filhotes de C. flaviceps, entre o macho reprodutor e outros machos adultos do grupo social. As vantagens da participação dos ajudantes no cuidado é discutida na literatura em termos de aquisição de habilidades no cuidado que aumentam o sucesso reprodutivo do cuidador, além de aumentar a aptidão inclusiva, naqueles casos onde o infante é seu parente (SNOWDON, 1996). Neste caso, a quarta hipótese foi também confirmada.

A modulação hormonal do cuidado parental parece envolver a prolactina. O cortisol se eleva significativamente apenas em pais experientes após o nascimento dos filhotes (MOTA et al., 2006). Neste estudo observou-se que elevações nos perfis individuais de cortisol foram registradas em todos os animais focais, principalmente nos animais reprodutores após o nascimento dos filhotes e que estes potencialmente eram experientes no cuidado de filhotes nascidos no grupo social pois em ambos existiam filhotes na idade infantil, juvenil ou subadulta. Nesta fase também foram registradas cópulas entre os pares reprodutores dos dois grupos, provavelmente em função do estro pós-parto.

Os dados obtidos na comparação da excreção de andrógenos entre machos reprodutores e não reprodutores mostraram que os reprodutores apresentaram níveis mais elevados de andrógenos que os não reprodutores. Estes dados divergem daqueles obtidos em outros

estudos realizados com pais e filhos de C. jacchus. CASTRO & SOUSA (2005), observaram uma excreção maior de andrógenos fecais em filhos adultos em relação aos seus pais, cujas mães encontravam-se grávidas. BAKER et al, (1999) não evidenciaram diferenças nos níveis de testosterona entre pais e filhos. Esta diferença pode estar associada ao grau de parentesco, pois no presente estudo, provavelmente, os machos não são pais e filhos. Outro fato é que os machos reprodutores vivendo em ambiente natural estão sob influência de outras variáveis ausentes do ambiente de cativeiro, como outras oportunidades para o acasalamento. Neste caso, os machos reprodutores apresentaram níveis mais elevados de andrógenos que os não reprodutores podendo também estar associado aos encontros entre grupos.

No grupo GR2 ocorreu maior freqüência de comportamentos agonísticos que no grupo GC1. Segundo DIGBY (1995), a expressão do comportamento agonístico dentro de grupos sociais estáveis é rara, como está evidenciado na relação entre os focais observados.

Alguns fatores particulares do ambiente natural podem estar diferenciando o perfil de excreção de hormônios encontrado em machos de cativeiro, como, por exemplo, a desconhecida relação de parentesco entre os membros do grupo e assim, não se poderá levar em consideração a sugestão de evitação de incesto sugerida por BAKER et al, (1999). Os freqüentes encontros entre grupos registrados para o grupo GR2 adicionam ao macho a preocupação de guarda da fêmea, que fica mais vulnerável a cópulas com outros machos do que em ambiente de cativeiro. Portanto, as predições relacionada às hipóteses 5, 6 e 7 devem ser discutidas conjuntamente, uma vez que a dinâmica da vida no ambiente natural não permite separar os diferentes fatores envolvidos no perfil de secreção de cortisol e andrógenos. Pode-se supor, portanto que os níveis mais elevados de andrógenos observados para os machos reprodutores refletem o papel de liderança do macho, na defesa do território e monopolização da parceira reprodutiva.

Pode-se também constatar que o perfil do cortisol foi mais estável durante o período de observação do que o de andrógenos e que a variação rápida no perfil dos andrógenos associada com os encontros agonistas parece ser mais sensível para quantificar a disputa entre machos

do que os níveis de cortisol. A variação nos andrógenos também esteve relacionada à ocorrência de cópulas.

Não foram encontrados perfis basais de cortisol diferentes entre machos reprodutores e não reprodutores o que de certo modo era esperado uma vez que o agonismo intra-grupo é baixo (DIGBY & BARRETO, 1993; LAZARO-PEREA, 2001). Todavia, restava a constatação se havia de algum modo uma resposta de estresse apresentada pelos machos não reprodutores em relação aos reprodutores. Tem-se a indicação, portanto, que isto não parece ocorrer, reforçando que as relações de dominância entre machos não envolve inibição nos mecanismos de regulação da reprodução e aponta para mecanismos de inibição do comportamento sexual ou evitação de incesto, como sugerido por BAKER et al., (1999).

As alianças desenvolvidas entre os machos do mesmo grupo social, geram uma estabilidade para o mesmo. Deste modo, a emigração do macho MnR do grupo GC1 pode ter promovido uma instabilidade, que levou ao aumento dos níveis hormonais do MR. Esta elevação indica prontidão a eventuais disputas pela manutenção do posto de dominante. Associe-se a este fato a condição da fêmea reprodutora na ocasião, pois esta se encontrava no período fértil, o que deve redobrar a necessidade de sua guarda.

Na comparação efetuada entre grupos em relação ao perfil de excreção de hormônios, o GR2 apresentou maior perfil de excreção, principalmente, pela presença de encontros entre grupos, evidenciada na correlação positiva entre os comportamentos agonísticos e ambos os hormônios, cortisol e andrógenos. Estes resultados corroboram a oitava hipótese do presente estudo, sugerindo que ambos os hormônios respondem com elevação em contextos de agonismo.

Os animais do grupo GR2 habitavam uma área diferente daquela do grupo GC1, nas cercanias das áreas de uso de outros grupos, o que não ocorreu para o grupo GC1. Assim, os valores elevados de andrógenos no grupo GR2 podem estar relacionados com a alta freqüência de agonismo entre grupos, pois de acordo com ROSS et al., (2004), a elevação dos níveis de andrógenos urinários dos machos de C. kuhlii são mais uma conseqüência do que causa de

interações agressivas em sagüis. Uma outra justificativa para os níveis de andrógenos aumentarem quando ocorrem encontros entre grupos está no fato de que durante estas situações há a oportunidade dos machos copularem (ARAUJO, 1996; LAZARO-PEREA et al., 2001), como foi observado tanto para os machos reprodutores como não reprodutores deste estudo.

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